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Memória Por José Mendonça (*) 18 - CECO/Casa dos Contos - Maio de 2009 Aires da Mata Machado Filho, grande mestre e maior amigo Muito feliz a iniciativa desta revista de celebrar a memória de Aires da Mata Machado Filho, por motivo de centenário de seu nascimento, ocorrido no dia 24 de fevereiro de 1909, em São João da Chapada, então distrito de Diamantina. Dessa maneira, o periódico ata os objetivos do Centro de Estudos do Ciclo do Ouro à pessoa de um dos mais competentes pesquisadores do Ciclo do Diamante.
Memória A falar sobre o filólogo, o escritor, o acadêmico, o professor, o jornalista, o tradutor, o folclorista e o mais, prefiro agradecer, antes de tudo, as indeléveis lições de “escrever certo” que dele recebi nos cinco anos (1940 - 1945) em que fui seu secretário. A respeito desse período de diária convivência ouso transcrever parte da declaração com que ele justamente me envaideceu ao atestar, para um concurso de títulos a que me submeti, em 1974, no Curso de Comunicação Social da UFMG: “No cabal desempenho de suas funções, [José Mendonça] me auxiliou nas diferentes atividades intelectuais de escritor, professor e jornalista, particularmente em pesquisas arquivísticas e bibliográficas”. Certamente foi o pouco que com ele aprendi, como dedicado coadjutor, que me credenciou a ser indicado seu Professor Assistente de Filologia Românica na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santa Maria, semente da futura Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Não quero deter-me no ponto em que recordo o grande mestre que a vida cultural me deparou. Prefiro demorar-me em mencionar as outras provas de maior amigo que recebi do inolvidável Aires da Mata Machado Filho. “O amanuense amando está” Desde os remotos tempos em que vivíamos em Diamantina, laços íntimos de afeição ligavam minha família aos Mata Machado, a começar pelo patriarca Augusto Aires da Mata Machado e esposa, D. Mariana Flora de Godói da Mata Machado (D. Lola). Já em Belo Horizonte a amizade se estreitou com minha admissão em O Diário, de cuja Redação era chefe Edgar de Godói da Mata Machado, que talvez me tenha indicado para colaborar com o ‘Airesinho’, como era conhecido na família o grande intelectual. A intimidade consolidou-se ao longo dos anos em que trabalhei com o insigne Mestre. Jamais poderei esquecer as manhãs ou tardes amenas (Belo Horizonte era, àquele tempo, cidade de clima mais para frio que para temperado) em que subia de bonde até a Avenida Afonso Pena esquina com Rua Piauí (onde hoje funciona a Agência ABC do Banco do Brasil) para trabalhar com o Aires. O vasto escritório dele ocupava, com livros em estantes que subiam até o teto de alto pé direito, toda a fachada lateral da acolhedora casa paterna. Ali ocorreram tantos e tão belos episódios que consolidaram a recíproca confiança e amizade fraterna (salvo a petulância) que a ele me uniram vida afora. Lembro-me até do convite de D. Lola, lá pelas 14 horas: “Mendonça e Aires, a merenda está pronta”. Saudade... Não cabe neste espaço recordar todos os passos memoráveis de nossa cotidiana convivência. De- sejo rememorar apenas dois. Numa daquelas frescas manhãs em que ele vestia sobre o pijama um sobretudo preto, de cujo bolso superior pendia a corrente do relógio, e calçava chinelos, o Aires dava passadas ao comprido do escritório, enquanto eu lia não me lembra mais que autor predileto. De repente ele se detém diante de minha mesa e diz várias vezes: “O amanuense amando está.” Era o título do § 11 do pioneiro romance de Cyro dos Anjos, talvez então já na segunda edição pela José Olympio. Diante de minha surpresa pelo inopinado da alusão literária, ele afinal confidenciou: “Eu estou amando a Maria Solange Mourão de Miranda”. Exultei de alegria: a eleita CECO/Casa dos Contos - Maio de 2009 - 19
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