12.04.2013 Views

Editorial - Esaf - Ministério da Fazenda

Editorial - Esaf - Ministério da Fazenda

Editorial - Esaf - Ministério da Fazenda

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Memória<br />

A<br />

falar sobre o filólogo, o escritor, o acadêmico, o professor, o jornalista, o<br />

tradutor, o folclorista e o mais, prefiro agradecer, antes de tudo, as indeléveis lições<br />

de “escrever certo” que dele recebi nos cinco anos<br />

(1940 - 1945) em que fui seu secretário. A respeito<br />

desse período de diária convivência ouso transcrever<br />

parte <strong>da</strong> declaração com que ele justamente me<br />

envaideceu ao atestar, para um concurso de títulos<br />

a que me submeti, em 1974, no Curso de Comunicação<br />

Social <strong>da</strong> UFMG: “No cabal desempenho de<br />

suas funções, [José Mendonça] me auxiliou nas diferentes<br />

ativi<strong>da</strong>des intelectuais de escritor, professor e<br />

jornalista, particularmente em pesquisas arquivísticas<br />

e bibliográficas”.<br />

Certamente foi o pouco que com ele aprendi,<br />

como dedicado coadjutor, que me credenciou a<br />

ser indicado seu Professor Assistente de Filologia<br />

Românica na Facul<strong>da</strong>de de Filosofia, Ciências e<br />

Letras Santa Maria, semente <strong>da</strong> futura Pontifícia<br />

Universi<strong>da</strong>de Católica de Minas Gerais.<br />

Não quero deter-me no ponto em que recordo o<br />

grande mestre que a vi<strong>da</strong> cultural me deparou. Prefiro demorar-me em mencionar as outras<br />

provas de maior amigo que recebi do inolvidável Aires <strong>da</strong> Mata Machado Filho.<br />

“O amanuense amando está”<br />

Desde os remotos tempos em<br />

que vivíamos em Diamantina,<br />

laços íntimos de afeição ligavam<br />

minha família aos Mata Machado,<br />

a começar pelo patriarca Augusto<br />

Aires <strong>da</strong> Mata Machado e esposa,<br />

D. Mariana Flora de Godói<br />

<strong>da</strong> Mata Machado (D. Lola). Já<br />

em Belo Horizonte a amizade se<br />

estreitou com minha admissão em<br />

O Diário, de cuja Re<strong>da</strong>ção era<br />

chefe Edgar de Godói <strong>da</strong> Mata<br />

Machado, que talvez me tenha<br />

indicado para colaborar com o<br />

‘Airesinho’, como era conhecido<br />

na família o grande intelectual. A<br />

intimi<strong>da</strong>de consolidou-se ao longo<br />

dos anos em que trabalhei com o<br />

insigne Mestre.<br />

Jamais poderei esquecer as<br />

manhãs ou tardes amenas (Belo<br />

Horizonte era, àquele tempo, ci-<br />

<strong>da</strong>de de clima mais para frio que<br />

para temperado) em que subia de<br />

bonde até a Aveni<strong>da</strong> Afonso Pena<br />

esquina com Rua Piauí (onde hoje<br />

funciona a Agência ABC do Banco<br />

do Brasil) para trabalhar com<br />

o Aires. O vasto escritório dele<br />

ocupava, com livros em estantes<br />

que subiam até o teto de alto pé<br />

direito, to<strong>da</strong> a facha<strong>da</strong> lateral <strong>da</strong><br />

acolhedora casa paterna. Ali ocorreram<br />

tantos e tão belos episódios<br />

que consoli<strong>da</strong>ram a recíproca<br />

confiança e amizade fraterna<br />

(salvo a petulância) que a ele me<br />

uniram vi<strong>da</strong> afora. Lembro-me até<br />

do convite de D. Lola, lá pelas<br />

14 horas: “Mendonça e Aires, a<br />

meren<strong>da</strong> está pronta”. Sau<strong>da</strong>de...<br />

Não cabe neste espaço recor<strong>da</strong>r<br />

todos os passos memoráveis de<br />

nossa cotidiana convivência. De-<br />

sejo rememorar apenas dois.<br />

Numa <strong>da</strong>quelas frescas manhãs<br />

em que ele vestia sobre o pijama<br />

um sobretudo preto, de cujo<br />

bolso superior pendia a corrente<br />

do relógio, e calçava chinelos, o<br />

Aires <strong>da</strong>va passa<strong>da</strong>s ao comprido<br />

do escritório, enquanto eu lia<br />

não me lembra mais que autor<br />

predileto. De repente ele se detém<br />

diante de minha mesa e diz várias<br />

vezes: “O amanuense amando<br />

está.” Era o título do § 11 do<br />

pioneiro romance de Cyro dos<br />

Anjos, talvez então já na segun<strong>da</strong><br />

edição pela José Olympio. Diante<br />

de minha surpresa pelo inopinado<br />

<strong>da</strong> alusão literária, ele afinal<br />

confidenciou: “Eu estou amando<br />

a Maria Solange Mourão de Miran<strong>da</strong>”.<br />

Exultei de alegria: a eleita<br />

<br />

CECO/Casa dos Contos - Maio de 2009 - 19

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!