12 t talento ANDRÉ ROCHA A criatividade como ingrediente essencial Entre a suposta rigidez das regras arquitetónicas e a total liberdade de cidades ilustradas, um jovem arquiteto faz da persistência do traço um modo de vida e até já pensa num projeto que permita unir artistas e causas humanitárias Cx a revista da caixa Por Pedro Guilherme Lopes Fotografia Anabela Trindade DE CERTA FORMA, André Rocha sabia que o seu futuro haveria de estar ligado à arte da criação. O desenho foi algo que acompanhou a sua infância e a formação de personalidade, ao ponto de ter memória de desenhar antes dos quatro anos. Rabiscos e folhas avulsas, uma delas dedicada ao tema «primavera» e enviada para o programa de José Jorge Duarte, quando ainda só havia a RTP para ver programas à tarde. Tinha oito anos e o prémio daí resultante apenas contribuiu para continuar a desenhar, enquanto lhe iam dizendo que, quando fosse grande, seria arquiteto. A ideia sedimentou, mas só no decorrer do curso de Arquitetura, na Universidade de Coimbra, viria a perceber o quanto o desenho é essencial como ferramenta de trabalho. «Antes disso, fascinava-me a possibilidade de ver o lado formal, aliado à funcionalidade, materializar-se. Porém, o curso de Arquitetura superou as minhas expectativas, por ser uma disciplina que congrega vários saberes, desde a história da arte, a psicologia, a engenharia, o desenho, entre outros». Em 2003/2004 decide criar um blog de desenho, intitulado A Persistência do Traço, onde foi explorando algum lado surrealista associado ao esboço urbano e à formação em arquitetura. «Nunca tive medo de experimentar exaustivamente, mesmo que possa estar a desviar-me de um bom percurso», afirma. E o que não faltam são experiências urbanas, se é que assim podemos intitular estas ilustrações que mostram cidades verticais e suspensas, onde se conjuga o universo de banda desenhada com pormenores de portugalidade. «Gosto de explorar a diferença de escalas e de trabalhar espaços compactos, para, depois, deixá-los respirar com grandes vazios circundantes e inóspitos. Tal como gosto de jogar com a gravidade, provocando um certo desconcerto a quem visualiza a ilustração. A verticalidade tem, sobretudo, a ver com Portugal e a notável destreza com que os portugueses construíram cidades em paisagens tão acidentadas que, aparentemente, nos soariam a uma impossibilidade. A maioria das grandes cidades mundiais são planas. Em Portugal, em especial cidades como o Porto, Coimbra e Lisboa, são cidades quase verticais, onde a criação de sistemas de transporte como o funicular ou os elevadores fazem todo o sentido», revela. E será esta a forma como André Rocha vê as cidades portuguesas? «As cidades portuguesas cresceram desenfreadamente ao longo de três décadas, sem conseguirmos criar uma doutrina disciplinar no que diz respeito ao urbanismo», responde. Uma das grandes diferenças será, ao contrário da geração dos seus pais, o facto de André assistir à vontade dos jovens em voltar aos centros das cidades. «Voltar ao centro histórico é o desejo de encontrar uma identidade. Quanto às periferias, prevejo muito trabalho para os arquitetos intervencionarem sobre as inúmeras pontas soltas que o recente urbanismo não soube prever de raiz.» Teoricamente, seriam motivos suficientes para não faltar encomenda de arquitetura, mas a realidade é outra, ao ponto de arquitetos conceituados ameaçarem fechar portas. Enquanto isso, jovens arquitetos e pequenos ateliers são distinguidos com vários prémios internacionais. «É um percurso vulgar, para qualquer arquiteto recém-formado, a adesão a concursos de arquitetura, como esperança de encontrar aí o primeiro passo Print MADE IN PONTE DE LIMA André Rocha poderá ser o nome que se segue numa lista onde cabem o Atelier Viana Cabral, com as suas Dulcineias, e Madalena Martins, com as Marias de Portugal e o Bicho de Sete Cabeças. Em comum, dois pontos: a origem dos projetos, Ponte de Lima, e a vontade de recuperar a iconografia popular. André não segue a área do artesanato, mas, claramente, também dota o seu trabalho de portugalidade, contemporaneidade e criatividade. «É uma geração que procura resgatar e reinventar o que mais nos identifica como marca Portugal», afirma. «Num momento em que tanto se fala de perda de soberania e identidade, mais do que nunca, temos assistido à proliferação de ideias que exaltam a nossa memória. Acredito que o empreendedorismo será uma das palavras chave para vencer a crise, até porque, julgo, quem optar por ficar no seu próprio País terá de ser inovador e proativo. Algo para o qual as nossas universidades pouco ou nada nos prepararam.» para o estabelecimento do seu atelier. Eu próprio, com o meu colega António Ildefonso, chegámos a ser premiados, em Itália, no primeiro projeto que elaborámos»(o atelier pode ser visto em Ildefonsorocha.com)», analisa. «Devido à elevada quantidade de arquitetos que Portugal formou nos últimos anos, é preciso que nos consciencializemos que nem todos vão conseguir fazer arquitetura. Porém, o processo de fazer arquitetura, através da experimentação, é aplicável a outras áreas. Neste sentido, os arquitetos terão de ser bastante criativos nas saídas alternativas que a formação lhes poderá atribuir.»
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