ARQUITETURA
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e<br />
educação<br />
MOBBING<br />
Carga no trabalho<br />
Para lá dos limites físicos, a pressão psicológica exercida<br />
sobre trabalhadores não tem de ser suportada como uma inevitabilidade.<br />
Quando a carga não dá tréguas, há que não se deixar abater<br />
SÓ A ENTRADA, espiada pelos ponteiros do<br />
relógio a anunciar as 9 horas, dá conta da<br />
presença de João. Para lá do limiar da porta<br />
do 2.º andar, tudo o resto grita a ausência.<br />
A secretária e a cadeira há muito que foram<br />
expulsas do espaço que chamava seu, um<br />
entre tantos no labirinto de cubículos. Do<br />
computador e do telefone, só resta a memória<br />
que ficou gravada na fotografia que a parede<br />
ainda não largou, em tributo a tempos mais<br />
felizes. O serviço que durante anos a fio lhe<br />
coube, dizem, deixou de lhe servir, para ir cair<br />
em novos braços. Só ficou o vazio, talhado à<br />
medida de um desespero sem tamanho.<br />
Apesar de fictícia na identidade do<br />
protagonista, a história que aqui se conta<br />
cabe na realidade de um sem-número<br />
de trabalhadores, seja qual for o setor de<br />
atividade. Funcionários que, por mais<br />
empenhados que sejam e capacidades<br />
demonstrem, esbarram numa espiral de<br />
violência que sobre eles se exerce.<br />
Embora essa violência não costume<br />
assumir contornos de maus-tratos físicos,<br />
conhecem-se as mossas que as agressões<br />
psicológicas sistemáticas podem deixar. Se<br />
o fenómeno em causa é, geralmente,<br />
descrito pelo estrangeirismo<br />
mobbing (em inglês, «to<br />
mob» pode significar<br />
Cx<br />
a revista da caixa<br />
Por Ana Rita Lúcio<br />
agredir com violência), em bom português<br />
ele é sinónimo de um ambiente de coação<br />
moral ou psicológica que se abate sobre os<br />
trabalhadores. Muito além das situações em<br />
que o stresse organizacional se intensifica<br />
pontualmente, trata-se de uma gestão das<br />
relações profissionais instilando o terror<br />
psicológico, através de comportamentos<br />
continuados que, inclusivamente, se tendem<br />
a tornar cada vez mais agressivos com o<br />
passar do tempo. Ainda que, habitualmente,<br />
um cenário de mobbing seja protagonizado<br />
por superiores hierárquicos em relação aos<br />
seus subordinados, também podem surgir<br />
casos entre colegas, conduzindo, em todo o<br />
caso, à degradação óbvia das condições de<br />
trabalho e pondo, ainda, em perigo a saúde<br />
física e psicológica do trabalhador.<br />
Precariedade gera (mais) violência<br />
As vítimas desta violência laboral gratuita<br />
são, não raras vezes, alvo de um ataque<br />
que esconde razões mais profundas: forçar<br />
os funcionários a abandonar o seu posto<br />
de trabalho e a organização. Uma pressão<br />
que é tanto mais forte numa conjuntura<br />
económica que tende a enfraquecer as<br />
condições de trabalho, facilitando o abuso<br />
de poder por parte de alguns empregadores,<br />
que, por exemplo, podem pretender reduzir<br />
MOBBING É<br />
SINÓNIMO DE<br />
UM AMBIENTE<br />
DE COAÇÃO<br />
NO TRABALHO<br />
Print<br />
DORES LABORAIS<br />
Se só recentemente ouviu a<br />
expressão mobbing, saiba que<br />
atrás dela se esconde uma<br />
realidade antiga, reconhecida<br />
pela Organização Mundial<br />
de Saúde e pela maioria das<br />
autoridades nacionais para<br />
as condições do trabalho. As<br />
consequências desta forma de<br />
terrorismo laboral são graves<br />
e podem traduzir-se em:<br />
> Baixa autoestima;<br />
> Ansiedade;<br />
> Apatia;<br />
> Problemas de concentração;<br />
> Depressão;<br />
> Isolamento social;<br />
> Alterações de humor;<br />
> Comportamentos<br />
disfuncionais, como<br />
distúrbios alimentares ou<br />
aumento de consumo de<br />
álcool e drogas;<br />
> Suicídio (em casos<br />
extremos).<br />
o número de assalariados sem terem de<br />
recorrer ao despedimento.<br />
O modus operandi neste tipo de situações é<br />
variável. No entanto, mobbing pode traduzir-<br />
-se, como no exemplo fictício do João que<br />
aqui se retratou, no isolamento da vítima, no<br />
esvaziamento do seu conteúdo de trabalho<br />
ou na atribuição de funções para as quais é<br />
sobrequalificada. Ou mesmo na humilhação<br />
perante os colegas, no ataque à sua esfera<br />
profissional ou privada e, ainda, na agressão<br />
verbal ou física, em casos extremos. Ferido<br />
na dignidade e no profissionalismo, é<br />
importante, porém, que quem trabalha saiba<br />
que não está sozinho e que resistir é possível:<br />
o Código do Trabalho proíbe o assédio moral<br />
que crie um «ambiente intimidativo, hostil,<br />
degradante, humilhante ou desestabilizador»<br />
e confere à vítima «o direito a uma<br />
indemnização por danos patrimoniais e não<br />
patrimoniais». Perante uma pressão que não<br />
cede, há que não baixar os braços.<br />
Foto: iStockphoto