Anuário DHPP - Polícia Civil - Governo do Estado de São Paulo
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Enfrentamento à escravidão mo<strong>de</strong>rna<br />
O princípio da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana i<strong>de</strong>ntifica<br />
um espaço <strong>de</strong> integrida<strong>de</strong> moral a ser assegura<strong>do</strong> a todas<br />
as pessoas por sua só existência no mun<strong>do</strong>. Assim <strong>de</strong>ve ser<br />
trata<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o ser humano: acima <strong>de</strong> qualquer preço. Como<br />
o crime organiza<strong>do</strong> <strong>do</strong> tráfico <strong>de</strong> seres humanos simplesmente<br />
ignora a máxima da dignida<strong>de</strong> humana, resta à<br />
socieda<strong>de</strong> e ao po<strong>de</strong>r público prevenir e enfrentar esse tipo<br />
<strong>de</strong> prática criminosa, pautan<strong>do</strong> suas condutas e <strong>de</strong>cisões<br />
pela concreção <strong>do</strong> princípio da dignida<strong>de</strong> humana, verda<strong>de</strong>ira<br />
progênie <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os princípios – <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento<br />
da persecução investigatória, no contato com as vítimas,<br />
até o momento da aplicação da pena aos infratores.<br />
O tráfico <strong>de</strong> pessoas é uma das formas mais explícitas <strong>de</strong><br />
escravidão mo<strong>de</strong>rna. Embora tenha si<strong>do</strong> abolida oficialmente,<br />
a escravidão nunca foi realmente erradicada. Trata<strong>do</strong>s<br />
internacionais, leis nacionais e resoluções compulsórias po<strong>de</strong>m<br />
ser capazes <strong>de</strong> proibir o tráfico, no entanto, colocar um<br />
ponto final nessa prática <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> muito mais <strong>do</strong> que<br />
ferramentas legais, políticas e procedimentos legislativos.<br />
Proteger os direitos humanos, prevenin<strong>do</strong> e enfrentan<strong>do</strong> o<br />
tráfico <strong>de</strong> seres humanos, é uma tarefa extremamente difícil e<br />
ambiciosa, principalmente no que diz respeito ao tráfico <strong>de</strong><br />
mulheres, por ensejar lucros altíssimos, supera<strong>do</strong>s pelo tráfico<br />
1 Anália Belisa Ribeiro é Coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Escritório <strong>de</strong> Prevenção e<br />
Enfrentamento ao Tráfico <strong>de</strong> Pessoas da Secretaria <strong>de</strong> Justiça e da Defesa<br />
da Cidadania.<br />
Anália Belisa Ribeiro 1<br />
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<strong>de</strong> armas e <strong>de</strong> drogas (da<strong>do</strong>s da United Nations Office on<br />
Drug and Crime Prevention – UNODCP). Demais disso, as<br />
pessoas traficadas, na maioria <strong>do</strong>s casos, não se consi<strong>de</strong>ram<br />
vítimas, quer por não possuírem a verda<strong>de</strong>ira noção <strong>de</strong> que<br />
estão pratican<strong>do</strong> contra elas um crime, ou, ainda, por sentirem-se<br />
francamente seguras <strong>de</strong> que foi livre sua opção <strong>de</strong><br />
aceitar as sedutoras propostas. Por oportuno, vale salientar<br />
que dada a situação <strong>de</strong> ilegalida<strong>de</strong> das vítimas no local <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>stino, não têm elas condições <strong>de</strong> reivindicar seus direitos.<br />
As pessoas vítimas <strong>do</strong> tráfico <strong>de</strong> seres humanos, ao chegarem<br />
ao local <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino, têm os <strong>do</strong>cumentos confisca<strong>do</strong>s<br />
e são forçadas a trabalhar em condições miseráveis, mediante<br />
pagamento irrisório a pretexto <strong>de</strong> que <strong>de</strong>vem quitar<br />
uma dívida pretensamente contraída com passagens, roupas,<br />
entre outros objetos. Em breve espaço <strong>de</strong> tempo,<br />
percebem que jamais irão conseguir pagar tais dívidas,<br />
transforman<strong>do</strong>-se em verda<strong>de</strong>iras escravas <strong>do</strong>s alicia<strong>do</strong>res,<br />
inclusive impedidas <strong>de</strong> sair <strong>do</strong> local em que se encontram<br />
confinadas, bem como proibidas <strong>de</strong> manter qualquer tipo<br />
<strong>de</strong> comunicação com amigos e/ou familiares.<br />
O incremento da prática <strong>de</strong>sses tipos <strong>de</strong> crime revela que<br />
não há limites à violência contra pessoas frágeis e in<strong>de</strong>fesas<br />
<strong>do</strong> po<strong>de</strong>rio das organizações criminosas globalizadas.<br />
“O drástico nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social no Brasil e a falta<br />
<strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> emprego são fatores que impulsionam<br />
brasileiros a <strong>de</strong>ixarem suas casas e até o seu país” (tradução<br />
não oficial, Almeida, Leite e Ne<strong>de</strong>rstigt, 2006, 34). Essa cau-