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O Ateneu - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Vai presidir às matemáticas. Preside a tudo, conforme é preciso. Incorruptível! Catão e<br />

Bruto somados... Na banca de inglês, há uns anos, reprovava a todos... Como não?!<br />

dizia; se erram escandalosamente no tieitch! Muito depois, apanharam-no consultando<br />

o Tautphoeus: Que diabo, Barão, é este célebre tieitch em que tanto se erra?...”<br />

Quando no dia do jantar subi para o dormitório com o Egbert, dançava-me no<br />

espírito, reduzida a miniatura, a imagem de Ema (era agradável suprimir o D.),<br />

pequenina como uma abelha de ouro, vibrante e incerta.<br />

Sonhei: ela sentada na cama, eu no verniz do chão, de joelhos. Mostrava-me<br />

a mão, recortada em paro jaspe, unhas de rosa, como pétalas incrustadas. Eu fazia<br />

esforços para colher a mão e beijar, a mão fugia; chegava-se um pouco, escapava<br />

para mais alto; baixava de novo, fugia mais longe ainda, para o teto, para o céu, e<br />

eu a via inatingível na altura, clara, aberta como um astro.<br />

Ela ria do meu desespero, mostrava-me o pé descalço, que a calçasse; não<br />

permitia mais. Calçar-lhe apenas o arminho que ali estava, o pequeno sapato,<br />

branco, exânime, voltando a sola, sem o conforto cálido do pé que o pisava, que o<br />

vivificava. Eu me inclinava, invejoso do arminho, sobre o crivo de seda da meia,<br />

milagre de indústria para o qual concorrera cada dia do século industrial com um<br />

esforço, tecido impalpável, de fibras vivas, filtrando a transparência branda do<br />

sangue, invólucro sutil de um mimo de joelho, de perna, de tornozelo,<br />

irremediavelmente desfalcado do espólio glorioso da estatuária pagã. Calçá-la<br />

apenas! Mas eu a fazia torcer-se, calçando-a, de dores numa tortura ardente de<br />

beijos, exalando eu próprio a alma toda em chama.<br />

Que outra criatura eu era ao despertar! A aparição encantadora extinta; mas<br />

eu sofria da reação de trevas que sucede aos deslumbramentos.<br />

Continuava cordialmente com o Egbert. Parecia-me, entretanto, a sua<br />

amizade agora uma coisa insuficiente como se houvesse em mim uma selvageria<br />

amordaçada de afetos.<br />

Egbert parecia às vezes um intruso. Passeando com ele, que diferença de<br />

outrora! produzia-me o efeito de uma terceira pessoa. Eu preferia andar só.<br />

Não sei por que conveniência de acomodação, fui transferido para o dormitório dos<br />

maiores. Esta mudança distanciava-me ainda mais do Egbert; passamos a nos<br />

encontrar somente à tarde, no campo.<br />

Depois das aulas, subia para o dormitório, aproveitando-me do relaxamento<br />

da policia do salão.<br />

O inspetor responsável era o Silvino. Receoso de uma represália dos<br />

grandes, o prudente bedel deixava andar.<br />

Eu deitava-me preguiçoso, ouvindo a grita do pátio, como coisa<br />

absolutamente alheia à minha vida. Contava as tábuas do teto, porção de traços<br />

paralelos que se perdiam num reflexo da tinta. Às vezes lia narrativas de Dumas,<br />

que não distraiam. Em outras camas, deitados como eu, de cara para cima,<br />

cruzando os botins, alguns colegas fumavam, soprando, devagarinho, colunas de<br />

fumo que subiam verticalmente, e rodavam azuis. A um canto, no fim do salão,<br />

jogavam três parceiros, bocejantes, acentuando sem entusiasmo as alternativas do<br />

azar como uma partida de sonâmbulos. Muita vez na modorra pesada da sesta, as<br />

costas aquecidas da posição, fechando-se-me os olhos, ao brilho do sol que<br />

adivinhava li fora no terreiro abrasado, eu adormecia. À hora da aula ou do jantar,<br />

um companheiro puxava-me.<br />

Estes intervalos de dormência sem sonho, sem idéias, sem definida cisma,<br />

eram o meu sossego. Pensar era impacientar-me. Que desejava eu? Sempre o<br />

desespero da reclusão colegial e da idade. Vinham-me crises nervosas de movimento,<br />

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