Guia para professores e alunos - Vídeo nas Aldeias
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e o mundo tão importantes quanto quaisquer outras formas religiosas e<br />
de conhecimento tradicional.<br />
3. disPutas teRRitoRiais e RecuRsos natuRais<br />
A colonização progressiva do território brasileiro, primeiro pela chegada<br />
dos europeus, e depois pelas várias ondas de ocupação em busca de novas<br />
áreas e recursos naturais, acarretou uma disputa pelos espaços dos povos<br />
indíge<strong>nas</strong> com os recém chegados. Esse processo significou o confronto entre,<br />
de um lado, várias noções tradicionais de território coletivo, sem limites<br />
definidos, muitas vezes sendo limitado ape<strong>nas</strong> pelo início do território<br />
do vizinho ou do inimigo, ou até onde aquela sociedade o utiliza, e, de outro,<br />
uma noção de propriedade privada, individual, com valor monetário,<br />
não necessariamente conectada ao uso. O primeiro encontro entre esses<br />
dois mundos é violento e acarreta uma usurpação, na qual o território dos<br />
índios é visto como “terranullius” (terra de ninguém, vazia), muitas vezes<br />
com uma argumentação jurídica espúria <strong>para</strong> populações tradicionais, como<br />
a de que, por exemplo, os índios não teriam escritura de seus territórios,<br />
ou cercas, quando essas práticas não faziam qualquer sentido <strong>para</strong><br />
eles. Pouco a pouco os índios foram cercados e tiveram que lutar <strong>para</strong> recuperar<br />
seus espaços.<br />
O momento de tomada de consciência desse processo histórico se dá<br />
geralmente muito tempo depois do contato com os brancos, e as medidas<br />
que o Estado toma, como resultado das reivindicações indíge<strong>nas</strong>, ocorrem<br />
quando o espaço já é finito, o solo já foi ocupado extensivamente pela colonização,<br />
e títulos foram dados aos novos ocupantes da terra. Quando as<br />
terras são reivindicadas e devolvidas aos povos indíge<strong>nas</strong>, no complicado<br />
processo de identificação, homologação e registro, no lugar onde havia território<br />
tradicional surge a reserva indígena, já em um processo de reconstrução<br />
a partir de uma violência histórica. É no contexto dessa reconstrução<br />
de territórios indíge<strong>nas</strong> no intuito de permitir que as sociedades tradicionais<br />
possam garantir seu modo de vida que os povos indíge<strong>nas</strong> que integram<br />
a presente coleção se encontram.<br />
Os Kuikuro, um dos povos que habitam o Parque do Xingu, tiveram parte<br />
do seu território preservado com a demarcação do Parque ainda nos anos<br />
1960, mas mesmo assim áreas importantes de uso e ocupação tradicional<br />
ficaram fora da área indígena, hoje de posse de fazendeiros. Alguns destes<br />
fazendeiros patentearam as espécies de pequi que só existem naquela região,<br />
e que são fruto do trabalho milenar dos povos Xinguanos <strong>para</strong> seleção<br />
e apuração destas espécies.<br />
Como está indicado na foto satélite da bacia do Xingu, o intenso desmatamento<br />
das cabeceiras do Xingu e de todos o seus afluentes, inicialmente<br />
pela atividade agropecuária e posteriormente pelos plantadores de soja,<br />
acarretou no assoreando dos rios e drenou <strong>para</strong> dentro do Parque pesticidas<br />
que contaminam suas águas. Agora um complexo de peque<strong>nas</strong> hidrelétricas<br />
nos vários rios que formam o rio Xingu irão alterar ainda mais o<br />
regime dos rios colocando em risco o movimento da piracema de reprodução<br />
dos peixes, a principal fonte de alimentação destes povos<br />
Os Huni Kuĩ, assim como outros povos indíge<strong>nas</strong> do Acre, se refugiaram<br />
<strong>para</strong> terras sempre mais remotas e de difícil acesso, como conseqüência das<br />
perseguições (as “correrias” das quais se fala em “Já me transformei em<br />
imagem”), fixando-se <strong>nas</strong> cabeceiras dos rios. Mas, mesmo assim, as terras<br />
<strong>nas</strong> quais se localizaram eram ricas em seringa e eles foram alcançados pelos<br />
“amansadores” de índios que ocu<strong>para</strong>m os seringais e os escravizaram<br />
<strong>para</strong> a extração da borracha. Por décadas osHuni Kuĩ foram presos ao trabalho<br />
forçado dos seringalistas. Territórios tradicionais viraram seringais, e os<br />
patrões viam esses seringais como sua propriedade. Com a queda do preço<br />
da borracha e o início de reivindição das terras pelas lideranças indíge<strong>nas</strong>,<br />
e do processo de demarcação, essas áreas foram apontadas e reapropriadas<br />
como reservas indíge<strong>nas</strong>.<br />
Tanto no caso Huni Kuĩ quanto no caso Ashaninka ocorre algo comum a<br />
vários grupos indíge<strong>nas</strong> da América que é interrupção do seu território tradicional<br />
por fronteiras nacionais, ou ainda, o impacto de diferentes políticas<br />
de Estado gerando fluxos por essas fronteiras, que são sempre zo<strong>nas</strong><br />
sensíveis. Assim, temos “Huni Kuĩ peruanos” e “Huni Kuĩ brasileiros”, quando<br />
antes tratava-se de um todo repleto de várias comunidades com diferenças<br />
entre si, porém dentro de um complexo cultural mais amplo. Os<br />
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