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VISÃO JUDAICA • julho de 2003 • Av • 5763<br />
17 de Tamuz a 9 de Av:<br />
O pranto que se faz ouvir<br />
As três semanas: 17 de julho a 7 de agosto de 2003<br />
Três semanas inteiras de nosso ano —<br />
as três semanas “entre os apertos” de 17<br />
de Tamuz e 9 de Av — são designadas como<br />
um período de luto pela destruição do<br />
Templo Sagrado e o conseqüente exílio físico<br />
e deslocamento espiritual — no qual<br />
ainda nos encontramos.<br />
17 de Tamuz: Quinta-feira, 17 de julho<br />
Horário de jejum: de 5h47 à 18h02<br />
O jejum de 17 de Tamuz, o dia em que<br />
Moisés quebrou as Tábuas da Lei ao ver o<br />
povo judeu adorando o bezerro de ouro,<br />
“coincidentemente” provou ser o mesmo<br />
dia em que os romanos irromperam pelas<br />
muralhas de Jerusalém para dar início à<br />
destruição do Segundo Templo.<br />
Os nove dias: Quarta-feira, 30 de julho<br />
a quinta-feira, 7 de agosto<br />
“Quando começa o mês de Av, reduzimos<br />
nosso júbilo...” (Talmud, Tratado Ta’anit 26).<br />
Começando em 1º de Av, usualmente nos abstemos<br />
de diversas atividades que estão associadas<br />
à alegria.<br />
9 de Av: Quinta-feira, 7 de agosto de 2003<br />
O dia 9 de Av, Tish’á Beav, celebra uma<br />
lista de catástrofes tão graves que é claramente<br />
um dia especialmente amaldiçoado por<br />
D-us. O Primeiro Templo foi destruído neste<br />
dia. Cinco séculos mais tarde, conforme os<br />
romanos se aproximavam do Segundo Templo,<br />
prontos para incendiá-lo, os judeus ficaram<br />
chocados ao perceber que o Segundo<br />
Templo foi destruído no mesmo dia que o<br />
Primeiro.<br />
Quando os judeus se rebelaram contra o<br />
governo romano, acreditavam que seu líder,<br />
Shimon bar Kochba, preencheria suas ânsias<br />
messiânicas. Mas suas esperanças foram cruelmente<br />
destroçadas quando os judeus rebeldes<br />
foram brutalmente esquartejados na batalha<br />
final em Betar, em 9 de Av.<br />
Os judeus foram expulsos da Inglaterra<br />
também em Tish’á Beav. Em 1492, a Idade de<br />
Ouro da Espanha terminou, quando a Rainha<br />
Isabel e seu marido Fernando ordenaram que<br />
os judeus fossem banidos do país. O decreto<br />
de expulsão foi assinado em 31 de março de<br />
1492, e os judeus tiveram exatamente três<br />
meses para colocar seus negócios em ordem<br />
e deixar o país. A data hebraica na qual nenhum<br />
judeu mais teve permissão de permanecer<br />
no país onde tinha desfrutado de receptividade<br />
e prosperidade foi 9 de Av.<br />
A Segunda Guerra Mundial e o Holocausto,<br />
concluem os historiadores, foi na verdade<br />
a finalização arrastada da Primeira Guerra.<br />
E a Primeira Guerra Mundial começou, no<br />
calendário hebraico, em 9 de Av - Tish’á Beav.<br />
Os judeus vêem estes fatos como outra<br />
confirmação da convicção profundamente enraizada<br />
de que a História não ocorre por aca-<br />
so; os acontecimentos — mesmo os terríveis<br />
— são parte de um plano Divino, e têm um<br />
significado espiritual. A mensagem do tempo<br />
é que há um propósito racional, muito<br />
embora não possamos entendê-lo.<br />
7 de agosto de 2003 – 9 de Av – Início do<br />
jejum às 17h45 (do dia 6) e término às<br />
18h10 (do dia 7)<br />
Tishá Beav<br />
O dia 9 de Av – Tishá Beav – é um dia<br />
de jejum publico (semelhante ao de Iom<br />
Kipur) e luto pela destruição dos dois Templos<br />
de Jerusalém.<br />
Depois do Iom Kipur, Tishá Beav é o dia<br />
de jejum mais importante do calendário judaico.<br />
Ele marca o último dia do período<br />
de três semanas de intenso luto nacional<br />
pelos eventos que levaram à perda da independência<br />
judaica.<br />
Tal como no Iom Kipur, o jejum começa<br />
antes do pôr-do-sol e termina após o pôrdo-sol<br />
no dia seguinte. Nada pode ser comido<br />
ou bebido, inclusive água. Na sinagoga a<br />
cortina existente na frente da Arca é retirada.<br />
No serviço do anoitecer, acendem-se velas<br />
suficientes para a leitura do serviço e os<br />
fiéis não se sentam em bancos ou cadeiras,<br />
mas no chão ou em banquinhos baixos e descalços<br />
que são sinal de luto.<br />
Na ultima refeição antes do jejum,<br />
come-se pãezinhos redondos e ovos e às<br />
vezes se espalham cinzas sobre os ovos. O<br />
círculo não tem começo nem fim, assim<br />
como a eternidade. Portanto, estes alimentos<br />
têm sido, desde longa data, associados<br />
com o luto e a vida eterna.<br />
Após o serviço ao anoitecer, lê-se o Livro<br />
das Lamentações, e isto é seguido pela leitura<br />
de elegias, hinos e preces de luto, que<br />
são publicadas num livreto especial e mantidas<br />
na sinagoga para este dia.<br />
Há cinco coisas proibidas em Nove de Av:<br />
comer e beber, lavar-se, untar-se com óleo,<br />
vestir sapatos de couro e coabitar.<br />
Todos devem jejuar em Nove de Av,<br />
incluindo mulheres grávidas e mães em fase<br />
de amamentação. Quem estiver doente, porém,<br />
pode comer, mesmo se sua doença não<br />
lhe ameaça a vida. Entretanto, uma pessoa<br />
doente deve abster-se de comer iguarias e<br />
deveria ingerir somente o que for absolutamente<br />
necessário para seu bem-estar físico.<br />
Costuma-se dizer que a pessoa que come<br />
ou bebe em Nove de Av sem ter de fazê-lo<br />
por razões de saúde não merecerá ver o júbilo<br />
de Jerusalém. E quem prantear sobre<br />
Jerusalém merecerá ver sua felicidade, como<br />
promete o versículo (Yeshayahu 66:10): “Rejubile-se<br />
grandemente com ela, todos que<br />
por ela pranteiam.”<br />
O que é a hudna?<br />
Ela entrou em vigor dias atrás e deverá ser válida por três meses. Não<br />
espere que os jornais e TVs digam a você o que é hudna. Para a grande mídia,<br />
que não consegue traduzir nem Road Map to Peace para Roteiro da Paz, hudna<br />
significa trégua. Só que “trégua” no sentindo ocidental da palavra, enquanto<br />
ela é proferida por muçulmanos mais fundamentalistas ou menos fundamentalistas<br />
no seu próprio conceito geopolítico e não no nosso.<br />
Nas agências de notícias internacionais, hudna está sendo traduzida como<br />
truce (em inglês) que significa claramente “suspensão (temporária) das hostilidades”.<br />
“Trégua” em português tem o mesmo significado. No contexto militar<br />
ocidental uma trégua é declarada para recolher feridos no campo de batalha, por<br />
exemplo, para evacuar civis, ou num momento de exaustão das forças que leva<br />
há um rendição e fim de conflito maior ou localizado. A Segunda Guerra Mundial,<br />
por exemplo, não terminou após uma trégua: terminou a após a tomada da<br />
capital da Alemanha e uma rendição incondicional. A guerra do Vietnã terminou<br />
com a fuga do exército americano e a invasão de Saigon pelas tropas do Norte.<br />
A Guerra da Coréia ainda não terminou... A Associated Press declarou que “o<br />
sucesso do processo de paz pode ficar estagnado em um conceito legal datando<br />
do nascimento do Islã: a hudna, ou trégua de duração fixa”.<br />
O New York Times acrescentou que a hudna vai constituir “o maior avanço...<br />
após 33 meses de violência”. Hudna tem um significado distinto para os<br />
fundamentalistas islâmicos bem versados em sua própria história: o profeta<br />
Maomé declarou uma lendária hudna de 10 anos com a tribo Quraysh que<br />
controlava Meca no século VII. Durante os dois anos seguintes, Maomé rearmou<br />
seu exército e usou uma desculpa de quebra da hudna por uma infração<br />
cometida pela tribo Quraysh para lançar um ataque total e conquistar Meca, a<br />
cidade mais sagrada para o Islã. Portanto, o significado islâmico de hudna é:<br />
o meu lado fazer uma trégua para que o meu lado se prepare para a conquista<br />
final do inimigo. Como um dos objetivos dos fundamentalistas islâmicos é a<br />
idealização de uma sociedade islâmica como nos tempos do profeta, é por aí<br />
que eles devem estar pensando. A hudna não é uma trégua técnica: é um<br />
trégua estratégica. Para a mídia ocidental a declaração de uma hudna pelo<br />
Hamas significa um compromisso com um resolução pacífica, quando na verdade<br />
significa a preparação para esmagar o inimigo.<br />
Essa não é a primeira hudna declarada no processo de paz entre israelenses<br />
e palestinos. Em 1994, Yasser Arafat explicou, em árabe, para os palestinos<br />
que os acordos de Oslo eram uma hudna no caminho para Jerusalém.<br />
Depois, em 2000, usando como pretexto a visita de Ariel Sharon à Esplanada<br />
das Mesquitas, criou a tal da “pequena infração inimiga” quebrando a hudna<br />
e se lançando à nova guerra, conhecida como Intifada de Al Aqsa, ou Intifada<br />
II. Em relação ao Hamas, a coisa não é muito diferente. Nos últimos 10<br />
anos o grupo declarou 10 situações de cessar-fogo, mas nunca parou de<br />
lutar. Essa é apenas a décima-primeira.<br />
É claro que qualquer pessoa racional espera que os termos ocidentais da<br />
“trégua” prevaleçam e é muito improvável que isso ocorra. Nestes próximos 3<br />
meses deverão ser implementados outros itens e fases do Roteiro da Paz. Um<br />
deles é a continuação da construção do muro de 350 km de extensão. Já pipocam<br />
na mídia militante as comparações de que esse muro (dentro de Israel) e<br />
que não cerca os territórios palestinos é pior que o muro de 14 km do Gueto de<br />
Varsóvia, que enclausurava os judeus para o extermínio pela fome e doença<br />
dentro da capital polonesa. Dentro do direito internacional, cada país cuida de<br />
suas fronteiras, de seu lado, como quiser. Poucos se importam com os muros e<br />
fossos entre os Estados Unidos e México para tentar conter a imigração ilegal.<br />
Mas cá entre nós: quanto tempo você acha que a hudna vai durar? Três<br />
meses? Uma semana? Um dia? Algumas horas? Agora se trata de achar o tal do<br />
incidente catalisador da quebra da hudna. Como os israelenses não têm hudna<br />
nenhuma, estão cumprindo sua parte do acordo e retirando o exército da Faixa<br />
de Gaza imediatamente. E o que os palestinos fizeram?<br />
No primeiro dia, depois da meia-noite, hora de Israel, com a hudna já em<br />
vigor um morteiro atingiu Gush Katif, um míssil antitanque foi disparado contra<br />
posições do Exército de Israel em Nvei Dekalim e outro posto do Exército<br />
foi atacado a tiros em Rafiach. Pela manhã, os palestinos, num ato heróico de<br />
sublime coragem atacaram um grupo de trabalhadores que asfaltava um trecho<br />
de estrada perto de Kalkilya, matando Raskov Karisto, 45, trabalhador búlgaro<br />
estrangeiro. Isso ocorreu algumas horas depois da Brigada dos Mártires de Al<br />
Aqsa, parte da Fatah dirigida por Yasser Arafat declarar que vai aceitar a hudna.<br />
Na sua declaração oficial de propaganda após o assassinato, este grupo<br />
declarou que o ataque “é em resposta à hudna”. Você entendeu? Nem precisa:<br />
os eles têm o direito de continuar assassinando quem bem quiserem enquanto<br />
os ocidentais pensam em trégua e paz.<br />
Às primeiras horas de segunda-feira, foram passando e a estrada Tancher,<br />
em Gaza foi reaberta para a circulação de palestinos. Menos de quatro horas<br />
depois da reabertura, posições do exército israelense foram atacadas a tiros<br />
por palestinos a partir dessa estrada. Essa é a grande trégua pacífica islâmica.<br />
Para os palestinos, o primeiro dia da hudna foi como qualquer outro. Será que<br />
amanhã as coisas serão diferentes?