Dissertação MI Setembro 2011 - Cópia.pdf - RUN UNL
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Vidas Secas e Os Flagelados do Vento Leste: Veredas da seca e da fome<br />
Daí que a educação dos meninos vá no sentido de se fazerem homens duros como animais,<br />
renegando o exemplo de seu Tomás:<br />
― Indispensável os meninos entrarem no bom caminho, saberem cortar mandacaru para o gado,<br />
consertar cercas, amansar brabos. Precisavam ser duros, virar tatus. Se não calejassem, teriam o fim de seu<br />
Tomás da bolandeira. Coitado. Para que lhe servira tanto livro, tanto jornal? Morrera por causa do<br />
estômago doente e das pernas fracas.‖ (p.23).<br />
Fabiano está, pois, condenado ao isolamento, afastado dos outros homens pela incapacidade de<br />
comunicar, num silêncio que o reduz à condição animal e o aproxima da morte. Renunciando à<br />
linguagem, o homem renuncia ao pensamento, a linguagem é uma forma de fugir à morte do espírito,<br />
assim o reconhece sinha Vitória:<br />
― Indispensável ouvir qualquer som. A manhã, sem pássaros, sem folhas e sem vento, progredia<br />
num silêncio de morte (…) Sinha Vitória precisava falar. Se ficasse calada, seria como um pé de<br />
mandacaru, secando, morrendo‖ (p.103).<br />
Este papel fulcral da linguagem, enquanto definidora da condição e da natureza humana, leva<br />
Roberto Ballalai, no artigo citado, ao aplicar o esquema de Greimas à obra, a propor um segundo nível<br />
não aparente em que o objecto procurado não seria a terra ( a Fazenda, a ―terra desconhecida‖), tendo a<br />
seca como destinador, as condições naturais favoráveis (mudança de estação) como adjuvantes e a<br />
natureza hostil, o proprietário e a lei, como adversários. Este crítico propõe que o verdadeiro objecto da<br />
narrativa seja a palavra salvadora que define ontologicamente o homem: ― o sujeito desprovido de<br />
qualificações que permitam a sua nominação, deve sair à procura daquilo que lhe conceda a faculdade de<br />
ser ―eu‖, a fim de poder escapar à situação aniquiladora em que se encontra‖ 30 . Assim, o sujeito, Fabiano,<br />
busca a palavra libertadora, mas a sua passividade e aceitação da ignorância constituem um obstáculo à<br />
consciencialização da sua situação. Os adjuvantes, nesta leitura, seriam os signos cuja verdadeira leitura<br />
não se verifica.<br />
2.7 O absurdo – Sísifo vs. Fabiano<br />
A aceitação da ―sorte ruim‖ imposta pela natureza, sobretudo, mas também pelos homens,<br />
como vimos, não impede Fabiano de tentar ―brigar com ela e vencê-la‖ (p.23); o reconhecimento da<br />
necessidade da seca e da inutilidade do trabalho não o coíbe de lutar. Num típico processo de ponto e<br />
contra-ponto que já foi referido ao longo do estudo da obra, a essa esperança de que um dia ― sairia da<br />
30 ROBERTO BALLALAI, op.cit., pág. 107<br />
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