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Dissertação MI Setembro 2011 - Cópia.pdf - RUN UNL

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Vidas Secas e Os Flagelados do Vento Leste: Veredas da seca e da fome<br />

― Digam o que disserem - afirmou José da Cruz de si para si – pensem o que pensarem eu daqui<br />

não saio. Nem dado de vidro. Nem posto lume. Nem que viesse soldado com espingarda e baioneta.<br />

Não largo a ourela de minha casa‖ (p. 120, sublinhado nosso), para depois reafirmar a sua fé absoluta. ―<br />

O tempo ainda vai virar. Eu digo ocês. O tempo vai virar. Ocês caminharam todos um a um. Só fiquei<br />

eu e a família. Ocês vão ver o tempo virar‖ (idem, ibidem).<br />

José da Cruz paga com a sua vida e com a da família a fidelidade e a confiança que depositou na<br />

natureza, ao potenciar a morte da mulher e filhos, comete o erro trágico, o crime, e por ele será punido.<br />

António Cândido Franco, na obra citada, defende a tese de que a história de Leandro parece<br />

querer redimir a derrota de José da Cruz, tornando-a aparente, uma vez que o filho no ventre de Libânia<br />

constitui uma mensagem de esperança e renovação, a vitória da vida humana sobre as forças da natureza,<br />

renascendo continuamente. Por outras palavras, a via crucis de José da Cruz (iniciais de Jesus Cristo) seria<br />

resgatada pela ascensão do seu filho representada na subida à Montanha (simbolicamente mais próxima<br />

da terra e do céu) e na ressurreição, na figura da criança a nascer. Este filho constituiria, assim,<br />

metonimicamente, um sinal de renovação cósmica; ao renovar-se o homem, renova-se a natureza, no<br />

ciclo anual de regeneração.<br />

Esta constitui uma leitura possível, contudo o texto abre-se a outras interpretações e parece-nos<br />

demasiado idealizada a representação de um final feliz consubstanciado na renovação através de um<br />

filho.<br />

Primeiramente porque a gravidez de Libânia é apenas indiciada e não confirmada e, a confirmar-<br />

se, quem vai ser o pai daquele filho? Leandro, filho de José da Cruz, morreu, presume-se que será, então,<br />

criado pelo homem que o havia atacado e que aparece na companhia de Libânia. Em vez de<br />

continuidade, por força das circunstâncias, esta criança será filho de outro, o que representa um corte.<br />

Parece-nos, pois, mais significativa a interpretação de um absurdo trágico que aniquila pai e filho,<br />

embora tenham escolhido caminhos diferentes, uma vez que ― cada um tinha razão levando a vida<br />

consoante a criação da sua alma‖ (p. 165).<br />

José da Cruz e Leandro configuram duas castas, duas concepções do mundo e da vida, mas não<br />

há certo ou errado no jogo desumano em que o Absurdo, a Esperança e a Morte travam o seu diálogo, é<br />

preciso é manter a dignidade, como diz Nhô Lourencinho:<br />

― Soldado que perde a batalha, nem por isso fica desonrado […] A não ser se perdeu a<br />

dignidade‖ (p. 231).<br />

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