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Dissertação MI Setembro 2011 - Cópia.pdf - RUN UNL

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Vidas Secas e Os Flagelados do Vento Leste: Veredas da seca e da fome<br />

Deste modo imaginamos, com Camus, Sísifo feliz: no absurdo do seu fixamento (pai) ou da sua<br />

caminhada (filho), ambos morrem, mas fazem jus à sua alma, aos seus princípios.<br />

José da Cruz, já com um filho morto e na miséria absoluta, vendidos todos os bens, de casa<br />

vazia, é ainda um homem digno que recusa receber alimentos do seu filho Leandro porque suspeita que<br />

são roubados. Apesar do adensar das circunstâncias fatais (tríade perfeita: seca, gafanhotos e lestada),<br />

parece não haver em José da Cruz qualquer sentimento de revolta ― porque ninguém se revolta contra o<br />

destino; o destino é um enviado de Deus e, nessa qualidade, representava Deus nas decisões que tomava,<br />

nos caminhos que traçava para os homens‖ (p. 131, 132).<br />

Embora se resigne às determinações que vêm de cima, o homem não deixa de se interrogar:<br />

‖ Fiz bem o que fiz? Que devo fazer agora para, sem sair fora do caminho traçado pelo destino,<br />

fazer o melhor que devo fazer‖(p. 132).<br />

E é neste momento de paragem, de reflexão que advém a consciência do absurdo; do outro lado<br />

há o silêncio, não há voz que possa responder com certeza, resta a fé:<br />

― Mas com fé ou sem fé cada um tem de cumprir a sua obrigação nesta vida. Procurar fazer o<br />

melhor para sossego do espírito e paz da consciência. Quando se faz uma coisa para sossego do<br />

espírito e paz da consciência, não faz mal que tenha sido o pior, porque foi assim a vontade<br />

Deus. Quem andou direito com a sua consciência andou direito mesmo, já que não pode ver as coisas<br />

doutra maneira‖( p. 145 sublinhado nosso).<br />

Nas palavras de seu filho que o julga morto, José da Cruz terá ―sucumbido ao seu destino de<br />

homem honesto, agarrado às suas crenças, aos seus hábitos de dono da sua casa, ao amor da sua gente e<br />

do chão que pisava desde longa data. A vida apagara-se-lhe à sombra da ruína das suas esperanças‖( p.<br />

203).<br />

Mas na perspectiva de Leandro ―Este mundo não fora feito para quem se agarrava demasiado<br />

aos hábitos da vida, para quem criava amor às suas coisas‖ (p. 203).<br />

Leandro e Libânia são duas personagens que se opõem a seus pais: para eles a sobrevivência<br />

admite o roubo, o que não é aceite pelos valores morais dos progenitores. Leandro é o homem solitário,<br />

vive numa gruta, o útero da terra, o protector ventre materno, em harmonia com o cosmos, o mundo<br />

anímico das pedras e dos animais, afastado dos homens, das suas leis e princípios morais; a sobrevivência<br />

na montanha legitima o roubo, ela é sua companheira, sua cúmplice. Anti-social não só pelo isolamento,<br />

como pela conduta, e fisicamente através da cicatriz que o condena e estigmatiza, é pelo amor que se<br />

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