Dissertação MI Setembro 2011 - Cópia.pdf - RUN UNL
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Vidas Secas e Os Flagelados do Vento Leste: Veredas da seca e da fome<br />
4 PARALELO ENTRE AS OBRAS<br />
As duas obras aproximam-se, antes de mais, pela denúncia de uma realidade dura e hostil que<br />
empurra o homem para uma luta pela sobrevivência. Não é de estranhar que este tema literário do<br />
regionalismo nordestino tenha servido de inspiração ao regionalismo cabo-verdiano: são semelhantes os<br />
problemas sociais, os condicionamentos ambientais e a necessidade de consciencialização de uma<br />
realidade étnico - social e cultural específica, forma de afirmação de uma identidade face ao outro, que,<br />
para ambos os países, foi Portugal.<br />
A análise que procedemos nos capítulos anteriores revela analogias entre as duas obras, não só ao<br />
nível da temática (a seca, a fome), como da especificidade do ambiente físico (aridez) e marcas desse<br />
ambiente no homem que o povoa (a íntima relação com o chão que o condena determina o seu modo de<br />
ser, pensar e resistir). Em ambas, as condições geográficas são determinantes da vida e carácter do<br />
homem que, sujeito às adversidades da seca, enfrenta a fome e a escassez de todo o tipo de bens.<br />
As condições climáticas e geográficas da ilha de Santo Antão e do sertão nordestino não<br />
constituem um mero quadro onde se desenrola acção, elas são a figura principal de ambas as obras, tudo<br />
se passa como resposta ou antecipação a essas condições que subjugam. O ciclo estiagem - período de<br />
chuva- estiagem que caracteriza Santo Antão é semelhante ao que assola o nordeste brasileiro ( embora<br />
em FVL a situação se agrave com a multiplicação de flagelos: lestada, praga de gafanhotos, chuvas<br />
fortes). O carácter cíclico da natureza implica uma continuidade que vem de tempos ancestrais e se<br />
projecta para o futuro sem uma perspectiva de mudança; esta circularidade constitui uma marca<br />
determinante em ambas as obras.<br />
A análise estilística não constitui campo deste trabalho, contudo não podemos deixar de observar<br />
o olhar mais ―enxuto‖ e essencial de Graciliano Ramos na descrição do espaço físico e condições<br />
climatéricas, mas, de forma mais breve ou pormenorizada, essas descrições estão sempre ao serviço do<br />
estudo do comportamento psicológico do homem que nele vive; as personagens são espelhos da terra<br />
em que vivem e onde lutam contra a morte.<br />
A linguagem constitui, também, um elemento caracterizador do homem e da terra em que vive; a<br />
fala dos habitantes de Santo Antão, como do nordeste brasileiro constituem aspectos de especificidade<br />
que os identificam, em ambas as obras encontramos regionalismos não só na voz do narrador, como na<br />
voz das personagens , a qual se aproxima da oralidade, procurando registar a genuína fala dos<br />
autóctones. Mas, mais uma vez Manuel Lopes se afasta de Graciliano Ramos, pois se o primeiro explora<br />
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