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Imagens e Simbolos - Luiz Fernando

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162<br />

xamanismo. Mostrámos algures que o transe xamânico restabelece a<br />

situação de homem primordial: durante o seu transe, o xamã recupera a<br />

existência paradisíaca dos Primeiros Humanos, que não estavam<br />

separados de Deus. De fato as tradições falam-nos de um tempo mítico<br />

em que o homem comunicava diretamente com os deuses celestes;<br />

escalando uma montanha, uma árvore, uma liana, etc., os Primeiros<br />

Homens podiam subir realmente e sem esforço, ao Céu. Os deuses, por<br />

seu turno, desciam regularmente à terra para se misturarem com os<br />

Humanos. Em consequência de um acontecimento mítico qualquer<br />

(geralmente uma falta ritual), as comunicações entre o Céu e a Terra<br />

foram cortadas (a Árvore, a liana, foram cortadas, etc.), e o Deus retirouse<br />

para o fundo do Céu. (Em inúmeras tradições esta retirada do Deus<br />

celeste traduziu-se pela sua transformação posterior em deus otiosus.)<br />

Mas o xamã, por meio de uma técnica de cujo segredo é detentor,<br />

consegue restabelecer — provisoriamente e só para seu uso particular —<br />

as comunicações com o Céu e retomar o diálogo com o Deus. Por outras<br />

palavras, consegue abolir a história (todo o tempo que decorreu após a<br />

«queda», após a ruptura das comunicações diretas entre Céu e Terra);<br />

volta para trás, reintegra a condição paradisíaca primordial. Esta<br />

reintegração de um illud tempus mítico opera-se no êxtase: o êxtase<br />

xamânico pode ser considerado quer como condição, quer como<br />

consequência da recuperação da condição paradisíaca. Em qualquer dos<br />

casos é evidente que a experiência mística dos «primitivos» está<br />

dependente também da reintegração extática do «Paraíso» 8 .<br />

Não se trata de explicar a mística judaico-cristã pelo xamanismo,<br />

nem de identificar «elementos xamânicos» no cristianismo. Mas existe<br />

um ponto cuja importância não pode escapar a ninguém: a experiência<br />

8 Não se pode, bem entendido, reduzir a experiência extática do xamanismo a esse<br />

«regresso ao Paraíso»: uma quantidade de outros elementos se encontram<br />

nela. Tendo dedicado um livro tinteiro a este problema extremamente<br />

complexo, não pensamos ser necessário retomar uma vez mais a discussão.<br />

Notemos no entanto que a iniciação xamânica consiste numa experiência<br />

extática de morte e de ressurreição, experiência decisiva que se encontra em<br />

todas as místicas hístóricas, inclusivé a mística cristã.

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