VJ FEV 2010.p65 - Visão Judaica
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VISÃO JUDAICA fevereiro de 2010 Adar 5770<br />
Um dia em memória das vítimas do Holocausto<br />
Antonio Carlos Coelho *<br />
á poucos dias comemoramos<br />
o Dia Internacional<br />
de Memória<br />
do Holocausto, no<br />
dia 27 de janeiro, data<br />
em que, há 65 anos, os<br />
campos de Auschwitz –<br />
Birkenau foram libertados pelos russos.<br />
A Inglaterra foi o primeiro país a estabelecer<br />
esse dia como um Dia de Memória<br />
do Holocausto. Em 2005 a data<br />
foi internacionalizada pela ONU.<br />
O Conselho Muçulmano Britânico<br />
manifestou-se com contrariedade à<br />
institucionalização de um dia para lembrar<br />
o Holocausto. Alegaram que a Inglaterra<br />
não estava considerando outras<br />
vítimas, como palestinos, ruandeses,<br />
armênios e outros. Não é preciso<br />
ter muitas luzes para perceber que a<br />
intenção do Conselho Muçulmano era,<br />
mais uma vez, culpar Israel pelo sofrimento<br />
do povo palestino.<br />
As manifestações contra a criação<br />
e, principalmente após sua internacionalização,<br />
foram relativamente<br />
grandes, principalmente no Reino<br />
Unido. Em razão disso, desde 2007,<br />
corre na internet a notícia de que a<br />
Inglaterra teria excluído o ensino sobre<br />
o Holocausto das escolas públicas.<br />
Isto nunca ocorreu. É mais uma<br />
mentira que circula na rede. Houve<br />
sim, um debate interno, junto aos órgãos<br />
de educação, sobre o modo de<br />
"Faltam-me palavras para expressar<br />
a indescritível experiência no Yad<br />
Vashem. Aprendemos tantos e tantos<br />
assuntos oportunos e interessantes<br />
conexos à temática da Shoá!". Assim<br />
se expressou o professor Marcelo<br />
Walsh, curitibano professor da Universidade<br />
Católica de Goiás, em Goiânia,<br />
que integrou o Grupo de Educadores<br />
Brasileiros na qualidade de<br />
Amigo e Convidado da B'nai B'rith<br />
para um curso em Israel. Este foi o<br />
primeiro grupo de educadores brasileiros<br />
que participaram do curso no<br />
Yad Vashem. Porém, já houve anteriormente,<br />
participação de pesquisadores<br />
brasileiros integrados em turmas<br />
multinacionais.<br />
O objetivo do curso é fazer professores<br />
brasileiros pensarem na questão<br />
do Holocausto, dentro de formação<br />
acadêmica, atuação profissional,<br />
perspectiva e vivência particulares.<br />
"Os professores, tanto do Yad Vashem,<br />
como da Universidade Hebraica de<br />
Jerusalém foram fantásticos", declarou<br />
Walsh, observando que o curso de<br />
capacitação de professores no Ensino<br />
da Shoá, foi de altíssimo nível, dentro<br />
do mais elevado espírito acadêmi-<br />
tratar a questão em sala de aula. Os<br />
professores reclamavam da dificuldade<br />
que tinham de debater um tema,<br />
tão delicado, com os jovens.<br />
Além do tema ser delicado, há<br />
uma acirrada propaganda antijudaica<br />
que induz erroneamente aos jovens<br />
(não só jovens) equiparar a<br />
morte de palestinos ao sofrimento e<br />
morte das vítimas do Holocausto.<br />
Soma-se a isso, o antissemitismo<br />
histórico impregnado na cultura ocidental<br />
que acolhe propagandas dessa<br />
natureza, e ainda, a exigência de<br />
se ter uma postura chamada de politicamente<br />
correta, deixa o professor<br />
inseguro e temeroso em ferir sensibilidades<br />
- (aqui é preciso salientar<br />
o antijudaismo exclui os judeus<br />
das categorias sensíveis). Diante disso<br />
todo o professor deve estar muito<br />
bem preparado, tanto em conhecimento<br />
histórico como no trato com<br />
valores morais, para falar do Holocausto<br />
em sala de aula e administrar<br />
uma discussão que possa surgir.<br />
Chama a atenção o fato de que o<br />
Conselho Muçulmano Britânico, apesar<br />
de se opor ao Dia da Memória,<br />
não fez nenhuma negação e nem<br />
questionou a veracidade do Holocausto.<br />
“O que fez foi se manifestar politicamente<br />
a favor dos palestinos,<br />
acrescentando armênios, ruandeses<br />
na relação dos “esquecidos”. No entanto,<br />
haveria outros esquecidos que<br />
o Conselho não mencionou: as vítimas<br />
co. Particularmente, ele gostou muito<br />
dos testemunhos de Carlos Plaut e do<br />
Sr. Jacky, de um sobrevivente do Gueto<br />
de Budapeste e de uma mulher de<br />
Sarajevo, considerada Justa entre as<br />
Nações, dos quais, infelizmente, não<br />
recorda os nomes.<br />
Ele diz que apreciou ainda as aulas<br />
de Mário Synai (Yad Vashem) e de<br />
Avraham Milgram (conhecido por Tito<br />
e que é natural de Curitiba) e ainda da<br />
palestra do representante do Escritório<br />
do Simon Wiesenthal Center em<br />
Israel. Os integrantes do curso fizeram<br />
uma excursão interna através do complexo<br />
de prédios do Yad Vashem, quando<br />
aprenderam sobre as esculturas,<br />
fotos, pinturas, monumentos relacionados<br />
à Shoá e também puderam adquirir<br />
livros sobre Shoá.<br />
O programa incluiu uma viagem ao<br />
kibutz Lohamei Haguetaot fundado pelos<br />
combatentes do Gueto de Varsóvia,<br />
onde assistiram ao testemunho de uma<br />
ex-combatente, Chavka Folman-Raban,<br />
e uma palestra da dra. Nora Gaon, que<br />
incluiu ainda a visita ao Museu das<br />
Crianças. O grupo também visitou o histórico<br />
kibutz Ramat Rachel.<br />
de Dafur, do episódio do Setembro<br />
Negro, do massacre à cidade de<br />
Hama, na Síria. Coincidentemente,<br />
são vítimas dos próprios irmãos de fé.<br />
É também da Inglaterra o bispo<br />
ultraconservador, da linha lefebvriana,<br />
vinculado à Fraternidade Sacerdotal<br />
São Pio X que vem, seguidamente negando<br />
o Holocausto. O bispo Richard<br />
Williamson, que foi expulso da Argentina<br />
pelas suas declarações, tem seus<br />
simpatizantes, cerca de 600 mil.<br />
Para o bispo Williamson, com o<br />
Holocausto “uma ordem mundial<br />
completamente nova foi construída”<br />
com base neste “fato”, os judeus, ele<br />
acrescentou, “se transformaram em<br />
salvadores substitutos, graças aos<br />
campos de concentração”. Entendese<br />
que, para o bispo, a aceitação do<br />
Holocausto traz um incômodo à sua<br />
“teologia”. Isto é pior do que negar<br />
o fato por não acreditar, é pior que<br />
negar por razões políticas, como faz<br />
Ahmadinejad. Ele nega por motivações<br />
de uma suposta fé, nega em<br />
nome de sua crença. É um desvirtuado<br />
para si, para a Igreja e para a<br />
Humanidade. Seu discurso é aplaudido<br />
pelos nazistas – suas declarações<br />
ganharam espaço em sites do<br />
ramo. Há, nas suas palavras, não<br />
somente em relação aos judeus, mas<br />
também de ordem moral, características<br />
próprias do nazismo.<br />
Negar o Holocausto, tentar minimizá-lo<br />
ou tentar impor uma sombra<br />
Do grupo de professores brasileiros<br />
participaram também colegas de<br />
Marcelo Walsh no Laboratório de Estudos<br />
sobre Intolerância (LEI/USP)<br />
Samuel Feldberg e Daniela Levy.<br />
Como foi dito no dia do encerramento<br />
do seminário, com a entrega dos<br />
certificados, os participantes se tornaram<br />
Embaixadores do Yad Vashem<br />
no Brasil. O fato constitui uma grande<br />
responsabilidade de cultivar a<br />
memória histórica da Shoá, durante a<br />
qual pereceram seis milhões de judeus<br />
e mais de cinco milhões de nãojudeus<br />
- e da sua relação com a cultura<br />
da paz, coexistência, direitos<br />
humanos e diálogo.<br />
No entendimento do professor<br />
Marcelo Walsh, "Memória e Esperança",<br />
resumiriam tudo o que aprendeu<br />
em termos de conteúdo e, sobretudo,<br />
de reflexão. Ele acredita que<br />
com essa mensagem - particular e<br />
ao mesmo tempo universal - poderá<br />
contribuir decisivamente para a<br />
construção de um mundo melhor,<br />
mais fraterno, justo e solidário, onde<br />
o respeito à diversidade torne-se a<br />
regra universal. E Holocausto nunca<br />
mais! Para ele, "devemos sempre<br />
sobre seu significado somente vem<br />
confirmar a sua grandiosidade como<br />
ato de barbárie contra a Humanidade.<br />
No entanto, as maiores vítimas<br />
fazem parte do povo judeu. Portanto,<br />
não é preciso explicar o porquê da<br />
negação e da minimização do fato. O<br />
sentimento de culpa que paira na comunidade<br />
não judaica levou milhões<br />
de pessoas a se engajarem em trabalhos<br />
de sensibilização e educação<br />
sobre o Holocausto; mas, o mesmo<br />
sentimento de culpa pode, também,<br />
levar alguém, como o bispo britânico,<br />
a negar a existência do fato. Sua<br />
forma de pensar, tão próxima ao nazismo,<br />
senão igual, não o permite,<br />
como bispo e suposto cristão, ter que<br />
carregar essa culpa.<br />
Quando se recorda o maior crime<br />
cometido contra os judeus não se excluem<br />
outras tantas vítimas, cerca de<br />
três milhões, que sofreram e morreram<br />
da mesma forma que a comunidade<br />
judaica da Europa. Acontece que o Holocausto<br />
sintetiza, da forma mais cruel,<br />
dois mil anos de perseguição, preconceitos<br />
e mortes de judeus. Isto dá ao<br />
ato nazista uma dimensão astronômica.<br />
Seus efeitos se perpetuam em muitas<br />
famílias e, portanto, o Holocausto<br />
é algo vivo que ainda se manifesta no<br />
seio da comunidade judaica.<br />
Ao lembrar as vítimas da vontade<br />
nazista é um alerta, agora, graças a<br />
ONU, há uma data universal contra<br />
todas as formas de genocídio que<br />
possam vir a ocorrer.<br />
Yad Vashem promove curso de capacitação sobre<br />
a Shoá para professores brasileiros<br />
dizer não ao<br />
antissemitismo,<br />
à xenofobia,<br />
ao racismo,<br />
aos extremismos<br />
e a<br />
qualquer outro<br />
tipo de intolerância.<br />
A ideia da<br />
realização curso foi da família Politansky<br />
e o evento foi possível realizar<br />
graças aos esforços de Jayme Melsohn,<br />
representante do Yad Vashem no<br />
Brasil, de Jacques Griffel, coordenador<br />
da Marcha da Vida pelo Brasil, de Perla<br />
Hazan, diretora do Yad Vashem para<br />
América Latina e Península Ibérica, de.<br />
Mario Synai e Raquel Orensztajn, do<br />
Yad Vashem), do professor Celso Zilbovicius,<br />
coordenador do Grupo e as<br />
seguintes entidades: B'nai B'rith, Centro<br />
de Cultura <strong>Judaica</strong>, Unibes, Instituto<br />
Unibanco, Universidade de São<br />
Paulo (LEI e LEER), Nova Escola <strong>Judaica</strong>,<br />
Escolas Municipais, Yad Vashem,<br />
Universidade Hebraica de Jerusalém,<br />
Claims Conference, Fundação Família<br />
Adelson, Centro Simon Wiesenthal, Revista<br />
Shalom, El Al e Estado de Israel.<br />
21<br />
* Antônio Carlos<br />
Coelho é<br />
professor<br />
universitário,<br />
escritor, diretor<br />
do Instituto<br />
Ciência e Fé, e<br />
colaborador do<br />
jornal <strong>Visão</strong><br />
<strong>Judaica</strong>.<br />
Marcelo Walsh entre dois colegas do Laboratório<br />
de Estudos sobre Intolerância (LEI) da USP:<br />
Daniela Tonello Levy e Samuel Feldberg