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O Anticristo | Friedrich Nietzsche - Charlezine

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LI<br />

www.mundocultural.com.br<br />

O <strong>Anticristo</strong> | <strong>Friedrich</strong> <strong>Nietzsche</strong><br />

www.mundocultural.com.br<br />

Que em certas circunstâncias a fé promove a bem-aventurança, que a bemaventurança<br />

não faz de uma idee fixe(1) uma idéia verdadeira, que a fé na realidade<br />

não move montanhas, mas as constrói onde antes não existiam: tudo isso fica<br />

bastante evidente após uma breve visita a um hospício. Mas não, é claro, para um<br />

padre: pois seus instintos o induzem a dizer que a doença não é doença e que<br />

hospícios não são hospícios. O cristianismo necessita da doença, assim como o espírito<br />

grego necessitava de uma saúde superabundante – o verdadeiro objetivo de todo o<br />

sistema de salvação da Igreja é tornar as pessoas enfermas. E a própria Igreja – não<br />

considera ela um manicômio católico como o ideal último? – Toda a Terra, um<br />

manicômio? – O tipo de homem religioso que a Igreja deseja é o típico decadente; a<br />

época em que uma crise religiosa se apodera de um povo é sempre marcada por<br />

epidemias de desordem nervosa; o “mundo interior” de um homem religioso<br />

assemelha-se tanto ao “mundo interior” de um homem sobreexcitado e exausto que é<br />

difícil distinguir entre os dois; os estados mais “elevados”, que o cristianismo colocou<br />

sobre a humanidade como valores supremos, são formas epileptóides – a Igreja<br />

concedeu nomes sagrados apenas para lunáticos ou grandes impostores in majorem<br />

Dei honorem(2)... Uma vez me aventurei a considerar todo o sistema cristão de<br />

training em penitência e salvação (atualmente melhor estudado na Inglaterra) como<br />

um método para produzir uma folie circulaire(3) sobre um solo já preparado, ou seja,<br />

um solo absolutamente insalubre. Nem todos podem ser cristãos: não se é<br />

“convertido” ao cristianismo – antes é necessário estar suficientemente doente... Nós<br />

outros, nós que temos coragem para a saúde e para o desprezo – temos o direito de<br />

desprezar uma religião que prega a incompreensão do corpo! Que se recusa a<br />

dispensar a superstição da alma! Que da insuficiência alimentar faz “virtude”! Que<br />

combate a saúde como alguma espécie de inimigo, de demônio, de tentação! Que se<br />

convenceu de que é possível trazer uma “alma perfeita” em um corpo cadavérico, e<br />

que, para isso, inventou um novo conceito de “perfeição”, um estado existencial<br />

pálido, doentio, fanático até a estupidez, a chamada “santidade” – uma santidade que<br />

não passa de uma série de sintomas de um corpo empobrecido, enervado e<br />

incuravelmente corrompido!... O movimento cristão, enquanto movimento Europeu,<br />

desde o começo não foi mais que uma sublevação de toda espécie de elementos<br />

desterrados e refugados (– que agora, sob a máscara do cristianismo, aspiram ao<br />

poder). – Não representa a degeneração de uma raça; representa, pelo contrário, uma<br />

conglomeração de produtos da decadência vindos de todas as direções, amontoandose<br />

e buscando-se reciprocamente. Não foi, como se pensa, a corrupção da<br />

Antigüidade, da Antigüidade nobre, que tornou o cristianismo possível; nunca será<br />

possível combater com violência suficiente a imbecilidade erudita que atualmente<br />

sustém tal teoria. Quando as enfermas e podres classes chandala de todo o imperium<br />

foram cristianizadas, o tipo oposto, a nobreza, alcançou seu estágio de<br />

desenvolvimento mais belo e amadurecido. A maioria subiu ao poder; a democracia,<br />

com seus instintos cristãos, triunfou... O cristianismo não era “nacional”, não estava<br />

baseado em raça – apelou a todas as variedades de homens deserdados pela vida,<br />

tinha aliados em toda parte. O cristianismo possui em seu âmago o rancor dos doentes<br />

– o instinto contra os sãos, contra a saúde. Tudo que é bem-constituído, orgulhoso,<br />

galante e, acima de tudo, belo é uma ofensa aos seus olhos e ouvidos. Novamente<br />

recordo as inestimáveis palavras de Paulo: “Deus escolheu as coisas fracas deste<br />

mundo, as coisas loucas deste mundo, as coisas ignóbeis e as desprezadas”(4): essa<br />

era a fórmula; in hoc signo(5) a décadence triunfou. – Deus na cruz – o homem nunca<br />

compreenderá o assustador significado que esse símbolo encerra? – Tudo que sofre,<br />

tudo que está crucificado é divino... Nós todos estamos suspensos na cruz,

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