23.01.2015 Views

Franz Kafka com Felice Bauer, em Budapeste, 1917. - Academia ...

Franz Kafka com Felice Bauer, em Budapeste, 1917. - Academia ...

Franz Kafka com Felice Bauer, em Budapeste, 1917. - Academia ...

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

O Processo, de <strong>Franz</strong> <strong>Kafka</strong> – Uma interpretação<br />

A má interpretação da novela, portanto, é <strong>com</strong>preensível. Poucos consegu<strong>em</strong><br />

o distanciamento necessário, mergulhados que estão no chamado “mundo-vida”,<br />

<strong>com</strong>o o denomina Husserl. Acorrentados à ética do cotidiano, não consegu<strong>em</strong><br />

ver nenhuma culpa numa vida absolutamente “normal”. Aceitam <strong>com</strong>o corretos<br />

seus protestos de inocência. Dentro desta perspectiva, a leitura é conduzida para<br />

perceber <strong>em</strong> O Processo uma “sátira à burocracia”. “É isso que ele é. Negar esse<br />

fato, advogando para o livro somente sentido metafísico, é absurdo. As cortes<br />

são apenas o que são e suger<strong>em</strong> simplesmente o que faz<strong>em</strong>.” 26<br />

Este é o tipo mais popular de analista de O processo. Muitos dentre eles são<br />

divulgadores famosos da obra, produtores de filmes, <strong>com</strong>o Orson Welles, um<br />

dos primeiros a transpor O processo para o cin<strong>em</strong>a. Ganham o público, mas se<br />

afastam do sentido real da obra.<br />

Na novela a Corte nada t<strong>em</strong> de “Corte <strong>com</strong>um, de Corte <strong>com</strong>o ela é”. Não<br />

se conhece nenhuma Corte que só se reúna aos domingos, que tenha audiências<br />

<strong>em</strong> lugares estranhos que mais parec<strong>em</strong> arenas de circo, que trabalhe <strong>em</strong><br />

sótãos escuros de prédios velhos, que tenha todos que entram <strong>em</strong> contato <strong>com</strong><br />

o acusado <strong>com</strong>o seus auxiliares, inclusive crianças. S<strong>em</strong> entender o simbolismo<br />

de todo o conjunto, é difícil se posicionar ante a mensag<strong>em</strong> kafkiana. Domingo<br />

é um dia de ócio. Longe do trabalho e das tarefas obrigatórias, t<strong>em</strong>os condições<br />

de refletir. Os “sótãos” escuros, lá no alto, são lugares adequados a uma<br />

consciência errante na vastidão enevoada <strong>em</strong> que transita. O mesmo ambiente<br />

de símbolos <strong>com</strong>plicados está conosco desde o início.<br />

A condenação já está implícita no “processo”. Implícita no “despertar” do<br />

acusado. Razão pela qual os guardas que o prend<strong>em</strong> o mandam vestir-se “de<br />

preto” para ir ao encontro do Inspetor. A ord<strong>em</strong> soa <strong>com</strong> tons perturbadores<br />

porque Joseph K. associa o fato a uma condenação capital. Responde: “mas<br />

não é condenação de morte ainda”. 27 O “ainda” é bastante expressivo, indicando<br />

o universo cifrado <strong>em</strong> que se vai mover a novela.<br />

26 Ronald Gray (ed.), <strong>Kafka</strong>, a Collection of Critical Essays. New York: Prentice Hall, Inc, Englewood<br />

Cliffs, 1962, p. 2 (introdução preparada pelo editor).<br />

27 Op. cit., p. 14.<br />

163

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!