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Franz Kafka com Felice Bauer, em Budapeste, 1917. - Academia ...

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Maria João Cantinho<br />

evoluir no nosso rosto s<strong>em</strong> o murchar”. Aqui surge o que parece, justamente, a<br />

“pedra de toque” do método llansoliano: “Nunca <strong>com</strong>preendi o que era estar<br />

no t<strong>em</strong>po, o que era mudar, o que é agir. Sinto-me b<strong>em</strong> a moldar a metamorfose.”<br />

10 Por outras palavras, a autora segue o seu caminho, não <strong>em</strong> relação ao incognoscível,<br />

mas ao imperceptível, e é justamente neste ponto que concordo<br />

<strong>com</strong> as afirmações de Rui Magalhães, ao definir essa subtil diferença que faz<br />

toda a distância entre a literatura mística e a escrita metódica de Llansol.<br />

Avessa aos conceitos de escrita narrativa e ao próprio conceito de representação,<br />

no sentido de mimesis realista – que lhe parece pueril e inexperiente,<br />

<strong>com</strong>o a autora o afirma <strong>em</strong> Um Beijo Dado mais Tarde – ela deve ser entendida<br />

<strong>com</strong>o “experiência”, naquilo que de mais radical contém. É, aliás, de<br />

acordo <strong>com</strong> essa radicalidade que se encontram conceitos <strong>com</strong>o os dedos<br />

que escrev<strong>em</strong> e tocam a labareda, <strong>com</strong>o <strong>em</strong> São João da Cruz, ou o lápis sonhante,<br />

aquele que não representa, mas faz nascer o sonho, desenhando-o<br />

pela escrita.<br />

Arriscaria, nesta concepção de uma escrita-limite, fundadora e fundante do<br />

real, afirmar a presença de uma imanência da escrita ao corpo, imanência que<br />

faz deflagrar a distinção entre sujeito e objecto, numa operação designada por<br />

“mutação libidinal e afectiva”. 11 O objectivo que esta mutação procura levar a<br />

cabo é a reunião, mediante a travessia da escrita, “entre o que t<strong>em</strong> andado dividido:<br />

a liberdade de consciência e o dom poético”. 12 Esse dom poético jorra do “encontro<br />

inesperado do diverso”, resultante de um processo de fulgurização, no<br />

sentido <strong>em</strong> que “a matéria-prima do texto é o confronto/adequação dos afectos<br />

e da língua, sobre um solo de um lugar que é s<strong>em</strong>pre um corpo e uma paisag<strong>em</strong><br />

falando-se”. 13 O confronto ou <strong>com</strong>bate, entre os afectos e a língua, concentra<br />

<strong>em</strong> si a possibilidade do enfraquecimento da linguag<strong>em</strong> e da descoberta<br />

10 Ibid<strong>em</strong>, p. 25.<br />

11 Friso que o conceito não é usado por mim, mas sim por José Augusto Mourão, in Colóquio Letras,<br />

143, 144, “Figuras da metamorfose na Obra de Maria Gabriela Llansol”, p. 82.<br />

12 Ibid<strong>em</strong>.<br />

13 Cf. Maria Gabriela Llansol, LisboaLeipzig 2, O Ensaio da Música, Lisboa: editora Rolim, 1994, p. 6.<br />

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