Maria Fernanda Diniz Avidos eLucas Tadeu FerreiraTradução: Roberto W.S.Ferreira, Brasília-DFBRASIL E RÚSSIAA união faz a força na agricultura e na biotecnologiaA Academia de Ciências Agrícolas da Rússia foi criada em 1992com o objetivo de desenvolver pesquisas básicas e aplicadas, visandoacelerar o progresso científico e tecnológico da agropecuária eagroindústria daquele país. A Academia, com sede em Moscou, é umainstituição pública mista, que conta com a participação maciça dainiciativa privadaAtualmente, a Academia é composta de cerca de 270 membros, alémde cientistas convidados de 32 países, e congrega 225 institutos de pesquisae desenvolvimento, sendo 39 de melhoramento de plantas, oito de melhoramentoanimal, quatro de biotecnologia e 405 estações experimentais.O presidente da Academia e vice-ministro da Agricultura da Rússia,G.A. Romanenko, esteve no Brasil, acompanhado dos diretores dos institutosde Fruticultura e Horticultura, A.M. Sapiev e I.I. Létvinov, respectivamente,e do diretor do Centro Experimental Krasnaia Poima, N.I.Issaenkov, para firmar acordo de cooperação técnico-científica com aEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, nos campos debiotecnologia aplicada à agricultura e à agroindústria, de recursosgenéticos de plantas e animais, de horticultura, fruticultura e medicinaveterinária. Romanenko é engenheiro agrônomo, formado no Instituto deAgronomia da cidade de Krasnodar, e possui doutorado em economiapela Universidade da Ucrânia. Acompanhado do conselheiro da Embaixadada Federação da Rússia, Wladimir Makhanov,Romanenko concedeu esta entrevista à revista BIOTECNOLOGIACiência & Desenvolvimento, na qual ressaltou os avanços da Rússiaproporcionados pelos conhecimentos gerados pela Academia que dirige,nos últimos anos, nas áreas de agricultura, pecuária e biotecnologia, etambém a oportunidade de ter o Brasil como mais um aliado na corridada pesquisa científica e tecnológica.BIOTECNOLOGIA Ciência & Desenvolvimento- Em primeiro lugar, gostaríamosque falasse quais são as principais atividadesda Academia de Ciências Agrícolas.Romanenko - A Academia atua em todas asáreas da agricultura, que podem ser agrupadasem três grandes blocos. O primeirorefere-se ao quadro de cientistas que écomposto de 270 membros da Rússia eUnião Soviética e 99 representantes de 32países, dentre os quais Inglaterra, EUA,China, Japão, Irlanda; o segundo blocorepresenta os 225 institutos de pesquisaque estão ligados à Academia; e o terceirocongrega a produção experimental e atransferência de tecnologia. Atualmente,fazem parte da Academia 405 estaçõesexperimentais, que possuem uma área decinco milhões de hectares, dos quais 1,7milhão já foram cultivados e estão empleno processo de produção, além de 100mil animais utilizados para o melhoramentogenético e cerca de 300 mil animais depequeno porte. Os centros experimentaisproduzem, anualmente 1.467 mil toneladasde grãos; mais de 40 mil toneladas de carne;400 mil toneladas de leite; 200 mil toneladasde sementes de alta qualidade de grãospara produção alimentícia e agroindustrial.BC&D - O senhor poderia explicitar quaissão os principais produtos pesquisadospela Academia?Romanenko - Entre os principais produtospesquisados pela Academia, posso citar asoja, o milho, o girassol e o trigo, gado decorte e de leite, além de outros que têmaplicação direta na alimentação humana,na produção de ração animal e naagroindústria, como um todo. As pesquisasdesenvolvidas com esses produtos permitirama melhoria de qualidade, resistência apragas e doenças e um aumento substancialna produção e produtividade.BC&D - Além desses produtos, que outrosassuntos fazem parte do programade pesquisa da Academia?Romanenko - A Academia engloba tambémcerca de 30 instituições que desenvolvempesquisas básicas nas áreas de genética,biotecnologia e energia nuclear aplicadas àagricultura, além de centros de especializaçãoem melhoramento genético de plantase animais; estudo do uso, mapeamento econservação de solos; monitoramentoambiental por satélites; mecanização agrícola;economia agrícola; medicina veterinária;piscicultura; temos ainda bancosgenéticos de conservação de raças deanimais de interesse zootécnico, que incluembovinos, caprinos, ovinos e tambémanimais silvestres como o urso e a raposa,entre outros.30 <strong>Biotecnologia</strong> Ciência & Desenvolvimento
BC&D - Quais são os principais paísescom os quais a Academia desenvolve acordosde cooperação técnica e científica?Romanenko - Temos, atualmente, 120 acordosde cooperação técnica com ministériosda agricultura de muitos países, como, porexemplo, EUA e Alemanha, entre outros. AAcademia mantém ainda acordos de cooperaçãocientífica com a França, Suécia eChina, além de acordos de cooperaçãocelebrados diretamente com universidadesde diversos países e com empresas privadas,como a Monsanto, Pioneer, por exemplo.BC&D - Como é a relação, hoje, entre aAcademia de Ciências Agrícolas da Rússiae o governo brasileiro? Já existem projetosde cooperação técnica sendoimplementados com alguma instituiçãodo Brasil?Romanenko - Até o momento, não tínhamosnenhum acordo de cooperação técnicacom o Brasil. E esse foi justamente omotivo da nossa vinda ao país. Acabamosde assinar com o Ministério da Agriculturae do Abastecimento brasileiro um protocolode intenções do primeiro acordo decooperação técnica, que será desenvolvidocom a Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária - Embrapa, nas áreas derecursos genéticos de plantas e animais,horticultura (especialmente de culturassubtropicais), fruticultura, monitoramentoambiental e medicina veterinária, principalmentena produção de vacinas. O acordocontempla ainda pesquisas de biotecnologiacom plantas, animais e microrganismos.BC&D - E por falar em biotecnologia,como estão as pesquisas com plantas eanimais nessa área na Rússia?Romanenko - Na Rússia, temos um institutode biotecnologia de plantas e dois debiotecnologia animal, além de institutosespecializados em microbiologia e virologia.Na área vegetal, firmamos acordo de cooperaçãotécnica e de transferência detecnologia com a Monsanto e estamostestando variedades de batatas resistentes avírus, e de canola (colza) resistente aherbicida. Com animais, desenvolvemosum tipo de ovelha transgênica que já tem,no seu leite, um fermento especial para ofabrico de queijo. O leite e o queijo oriundosdessa ovelha já foram testados emlaboratório e com seres humanos paraverificação de toxidez, pureza, valor nutritivoe protéico, e, atualmente, estão sendoproduzidos em pequena escala. Eu mesmojá provei esses produtos, achei-os deliciosose, como podem ver, estou aqui bastantesaudável! Desenvolvemos também, atravésde processos biotecnológicos, um tipo decodorna que produz ovos grandes, quasedo tamanho dos de galinha e muito saborosos.Também já os provei e recomendo.BC&D - A Academia desenvolve tambémpesquisas biotecnológicas a partir demicrorganismos?Romanenko - Sim. E nesse campo, temosobtido avanços significativos em nossopaís, como o desenvolvimento de um tipode cerveja que pode ser conservada por até180 dias, sem o uso de conservantes, graçasao emprego de microrganismos. Essa cervejajá é exportada para os EUA, Israel e, atémesmo, para a Alemanha, a terra da cerveja.Há também uma tecnologia à base demicrorganismos que permite a produçãode ácido de limão, que tem ampla aplicaçãoalimentícia, quer seja na produção desucos, como no emprego industrial. Ademanda por microrganismos nas pesquisasbiotecnológicas tem sido tão grandeque a Academia resolveu investir na criaçãode um banco de germoplasmamicrobiano. Esse banco conta com espéciesmicrobianas utilizadas na fermentaçãode iogurtes, leite e queijo e na conservaçãode salsichas. Mantemos conservadas nessebanco, por muitos anos, em condiçõesadequadas de iluminação, temperatura eumidade, muitas variedades de fungos que,depois de catalogadas e caracterizadas,apresentam características e potencial deuso e emprego na agricultura, nabiotecnologia, na agroindústria, tanto hojecomo no futuro.BC&D - E com relação à saúde animal,quais os avanços que vêm sendo obtidosa partir de pesquisas biotecnológicas?Romanenko - A saúde animal é uma grandepreocupação na Rússia, apesar de o nossoplantel ser muito resistente a doenças.Contudo, o nosso rebanho é constantementesubmetido a cruzamentos com ogado europeu, e isso, potencialmente, podecausar sérios problemas de suscetibilidadea doenças que não conhecemos em nossopaís. Assim, temos investido muito no controlepreventivo e erradicação de focosdessas enfermidades, e, com isso, obtidomuitos avanços na produção de medicamentosveterinários à base de pesquisasbiotecnológicas com o emprego de microrganismos.A brucelose, por exemplo, desapareceuda União Soviética, graças a esseesforço de pesquisa. Quanto à febre aftosa,nunca foi um problema para nós, graças aotrabalho de prevenção permanente.BC&D - Para desenvolver esse amplotrabalho de biotecnologia com plantas,animais e microrganismos, a Academiade Ciências Agrícolas da Rússia tem comopreocupação a conservação de recursosgenéticos?Romanenko - Sim. Os cientistas russos têmtradição secular na realização de atividadesde coleta, classificação e conservação dematerial genético. Um dos pioneiros dessetrabalho, no mundo, foi o russo Vavilovque, hoje, empresta seu nome ao nossoInstituto Vavilov de Conservação e Uso deRecursos Genéticos, que é mundialmenteconhecido. Esse instituto conta com umacoleção de mais de 360 mil amostras deplantas de importância socioeconômica,como cereais, oleaginosas, algodão, borracha,cítricos, forrageiras, entre outras. Alémdo Instituto Vavilov, existem ainda cincoestações experimentais de conservação euso de recursos genéticos, nas quais sãoconservados de cinco a dez mil exemplaresde sementes e plantas in vivo e in vitro.Essas estações conservam ainda, a longoprazo, espécies de animais de interessezootécnico e aquelas ameaçadas deextinção, através da preservação de animaisvivos e do congelamento de embriões,sêmen e óvulos. Os animais quecorrem risco de extinção são catalogadosno "livro vermelho" da nossa Academia.Existem algumas espécies animais na UniãoSoviética que não estão ameaçadas deextinção, mas que têm característicaszootécnicas, de resistência a condiçõesadversas e rusticidade, devido a nossagrande extensão territorial e diversidadeclimática, que estão sendo estudadas pelosnossos cientistas. É o caso do cavalo yakutig,que sobrevive e produz muito bem emtemperaturas de 50 a 55ºC abaixo de zero.E também de um tipo de gado leiteiro queproduz a temperaturas de 30ºC negativos.Nossos cientistas estão tentando caracterizare isolar os genes desses animais quedeterminam essas características para, atravésde processos biotecnológicos, tentartransferi-las para outros animais domésticose de interesse zootécnico.BC&D - A Academia realiza, sistematicamente,expedições de coleta degermoplasma para aumentar o acervo ea variabilidade genética dos produtos?Romanenko - Sim. Já realizamos expediçõesde coleta em toda a União Soviética e<strong>Biotecnologia</strong> Ciência & Desenvolvimento 31