Efeitos <strong>de</strong> algumas drogas sobre a proliferação <strong>de</strong> fibroblastos <strong>de</strong> pterígio primário in vitro109INTRODUÇÃOOpterígio do grego pterygos, “braço” é caracterizado porser um tecido fibrovascular, <strong>de</strong>generativo, elastótico,basofílico e subepitelial <strong>de</strong> aspecto triangular, que crescea partir <strong>da</strong> conjuntiva bulbar <strong>em</strong> direção a córnea. Po<strong>de</strong> serprimário ou recorrente, sendo este <strong>de</strong>finido como a proliferação<strong>de</strong> tecido fibrovascular <strong>de</strong> aspecto s<strong>em</strong>elhante ao pterígio primárioretirado e secundário a uma reação inflamatória. A recidivav<strong>em</strong> acompanha<strong>da</strong> <strong>de</strong> inflamação conjuntival e envolvimentocorneano pronunciado. Múltiplas intervenções cirúrgicas na regiãolímbica <strong>de</strong>terminam disfunções locais severas e o crescimento<strong>de</strong> tecido fibroso que po<strong>de</strong> levar a formação do simbléfaro.O pterígio é uma anormali<strong>da</strong><strong>de</strong> que afeta gran<strong>de</strong> número<strong>de</strong> pessoas <strong>em</strong> todo o mundo, principalmente <strong>em</strong> áreas geográficasmais próximas ao equador, tropicais e subtropicais on<strong>de</strong> oclima é mais quente e on<strong>de</strong> os raios ultra-violetas são mais intensos.Este fato, b<strong>em</strong> como a observação <strong>de</strong> maior prevalência<strong>em</strong> indivíduos que trabalham ao ar livre, acaba por estabeleceruma forte relação com a exposição a radiações actínicas, maisespecíficos raios UV do tipo UV-A e UV-B (1) . De fato, a radiaçãoUV é consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> fator indutor <strong>de</strong> <strong>da</strong>no às célulasgerminativas límbicas, aumentando o risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<strong>de</strong> pterígio e tornando-o uma <strong>da</strong>s causas mais frequentes <strong>de</strong>procura ao oftalmologista. É uma afecção <strong>de</strong> etiologiamultifatorial, relaciona<strong>da</strong> também a inflamações crônicas,microtraumatismos <strong>de</strong> repetição, hereditarie<strong>da</strong><strong>de</strong>, i<strong>da</strong><strong>de</strong>,exposição ao vento, areia, poeira e distúrbios imunológicos (2) .Apresenta evolução lenta e progressiva, frequent<strong>em</strong>enteassocia<strong>da</strong> a sintomas irritativos (ardor, sensação <strong>de</strong> corpo estranho,hiper<strong>em</strong>ia) e diminuição <strong>da</strong> AV a qual po<strong>de</strong> ocorrer pelainvasão do eixo visual (área pupilar) e por alterações do filmelacrimal e astigmatismo irregular induzido (po<strong>de</strong>ndo chegar a 3dioptrias) (1) .Até o presente momento, a única conduta disponível parasua resolução completa é a r<strong>em</strong>oção cirúrgica que está indica<strong>da</strong><strong>em</strong> casos <strong>em</strong> que há prejuízo <strong>da</strong> AV, inflamações crônicas, alteraçõescosméticas, restrição <strong>da</strong> motili<strong>da</strong><strong>de</strong> ocular e sintomasirritativos persistentes (2) . O alto índice <strong>de</strong> recidiva d<strong>em</strong>onstradoapós a excisão do pterígio levou ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> diversastécnicas cirúrgicas e utilização <strong>de</strong> terapias adjuvantes (3) . Entreas técnicas <strong>em</strong>prega<strong>da</strong>s para sua r<strong>em</strong>oção cita-se retalhoconjuntival, transplante autólogo <strong>de</strong> conjuntiva (4) , enxerto d<strong>em</strong>ucosa oral (5) , ceratoplastia lamelar, ceratoplastia penetrante (4) ,escleroceratoplastia e m<strong>em</strong>brana amniótica (4) . A excisão com raspag<strong>em</strong><strong>de</strong> esclera, técnica <strong>de</strong>scrita por D’Obraim (1948) é o procedimentomais comum para o tratamento do pterígio. Entretanto,esta técnica é acompanha<strong>da</strong> por uma taxa <strong>de</strong> recorrência<strong>de</strong> 5% a 89%. Diferentes tratamentos adjuvantes à ressecção dopterígio têm possibilitado diminuir a taxa <strong>de</strong> recorrência, mascomplicações varia<strong>da</strong>s têm sido relata<strong>da</strong>s por causa dos seususos (3) . Nosso trabalho t<strong>em</strong> o objetivo <strong>de</strong> pesquisar novas drogasque possam auxiliar na diminuição <strong>da</strong> recorrência do pterígio.Para isso verificamos a inibição do crescimento <strong>de</strong> fibroblastos<strong>de</strong> pterígio in vitro na presença <strong>de</strong> algumas drogas.MétodosPacientesOs pterígios foram retirados <strong>de</strong> 7 pacientes (3 homens e 4mulheres), com i<strong>da</strong><strong>de</strong> entre 30 e 60 anos, após consentimentoinformado. Todos os pterígios eram primários s<strong>em</strong> nenhuma doençaocular associa<strong>da</strong>.MétodosCultura <strong>de</strong> células epiteliais do pterígioO protocolo para o cultivo celular foi estabelecido <strong>de</strong> acordocom modificações <strong>da</strong> técnica Kria et al. (6) , on<strong>de</strong> imediatamenteapós a retira<strong>da</strong> do pterígio, este era lavado <strong>em</strong> solução balancea<strong>da</strong><strong>de</strong> Earle’s (Materbaby, Maringá, PR, Brasil) contendo penicilina(200 micra/ml), estreptomocina (100 micra/ml) (SIGMA,St Louis, MO, USA), anfotericina B (100 micra/ml) e fungizona(5 micra/ml) (GIBCO, Grand Island, NY, USA). Os pterígios foramcortados <strong>em</strong> pe<strong>da</strong>ços <strong>de</strong> aproxima<strong>da</strong>mente 2x2 ou 2x3 mme colocados <strong>em</strong> placas plásticas <strong>de</strong> 60mm contendo meio MEM“Minimal essential media” (Fun<strong>da</strong>ção Ezequiel Dias, BeloHorizonte (MG), Brasil) supl<strong>em</strong>entado com 10% <strong>de</strong> soro fetalbovino (Nutricell, Campinas, SP, Brasil) e antibióticos na mesmaconcentração <strong>de</strong>scrita acima. As placas foram então incuba<strong>da</strong>s a37º <strong>em</strong> incubadora umidifica<strong>da</strong> contendo 5% <strong>de</strong> CO 2 . O meioera trocado duas vezes por s<strong>em</strong>ana, sendo retirado 70% do meioe recolocado 70% <strong>de</strong> meio fresco.Testando o efeito <strong>da</strong>s drogas sobre as célulasQuando houve a formação <strong>da</strong> primeira cama<strong>da</strong> <strong>de</strong> células,estas foram <strong>de</strong>staca<strong>da</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> incubação <strong>em</strong> solução <strong>de</strong>tripsina – EDTA 0,25% s<strong>em</strong> Ca ++ e MG ++ (GIBCO, Grand Island,NY, USA) à t<strong>em</strong>peratura ambiente por 1 minuto. Depois <strong>da</strong>tripsinização, a tripsina foi inativa<strong>da</strong> por adição <strong>de</strong> MEM com10% <strong>de</strong> soro fetal bovino e as células foram lava<strong>da</strong>s no mesmomeio, centrifuga<strong>da</strong>s e ressuspensas para uma contag<strong>em</strong> primária.As células foram então adiciona<strong>da</strong>s às placas <strong>de</strong> 4 buracos auma <strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> 2x10 4 células/ml, para ser<strong>em</strong> subcultiva<strong>da</strong>s.Após 2 dias <strong>de</strong> crescimento as drogas foram adiciona<strong>da</strong>s às célulasnas seguintes concentrações: 1000 micra/ml ou 20 mg/ml:ciclofosfami<strong>da</strong> (Baxter Oncology Gmbh, Frankfurt, Al<strong>em</strong>anha),500 micra/ml ou 10 mg/ml; metotrexato (Galena Química eFarmacêutica Lt<strong>da</strong>., Campinas (SP), Brasil), 1000 micra/ml ou 20mg/ml e mitomicina (Bristol-Myers Squibb Brasil S.A., SantoAmaro, SP, Brazil), 20 micra/m2 ou 0,4 mg/ml. As drogas foramdiluí<strong>da</strong>s <strong>em</strong> meio MEM com 10% <strong>de</strong> soro colocado na estufa 12horas antes <strong>da</strong> utilização para estabilização do PH. Imediatamenteapós a diluição as drogas eram adiciona<strong>da</strong>s às células e as placasretornavam para a estufa. As células foram observa<strong>da</strong>sdiariamente por 5 dias ao microscópio <strong>de</strong> contraste <strong>de</strong> fase paraavaliar a proliferação celular. Foi realizado controle negativoquando nenhuma droga era adiciona<strong>da</strong>. Os experimentos foramrepetidos 5 vezes.RESULTADOSCom a utilização <strong>da</strong> mitomicina observou-se umasignificante inibição <strong>da</strong> proliferação celular. Já nas primeiras 24horas observou-se que as células <strong>de</strong>sprendiam-se <strong>da</strong> placa <strong>em</strong>quase a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> extensão. Quando a ciclofosfami<strong>da</strong> erautiliza<strong>da</strong> observou-se também inibição do crescimento. As célulasencontravam-se não a<strong>de</strong>ri<strong>da</strong>s à placa <strong>de</strong> cultivo <strong>em</strong> aproxima<strong>da</strong>mente50% <strong>de</strong> sua extensão após 24 horas <strong>de</strong> cultura apósexposição à droga, aumentando nos dias subsequentes, atingindoquase a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> extensão após 72 horas. Nenhum efeitofoi observado, no entanto as células não apresentaram <strong>de</strong>generaçãoaparente, mesmo após 120 horas <strong>de</strong> cultivo <strong>em</strong> presença<strong>da</strong> droga. Nenhum efeito foi observado quando o metotrexatofoi utilizado, mesmo após 120 horas <strong>de</strong> cultivo, as células mantiveram-sea<strong>de</strong>ri<strong>da</strong>s às placas e um crescimento aparente foiobservado. O mesmo foi observado na placa <strong>de</strong> controle, cresci-Rev Bras Oftalmol. 2013; 72 (2): 108-11
110Almodin J, Almodin F, Almodin E, Minguetti-Câmara VC, Neves JP, Bezzon AKT, Safar CEDM, Ama<strong>de</strong>u HBBFigura 1: Ciclofosfami<strong>da</strong> 24h Figura 2: Metotrexato 24h Figura 3 - Mitomicina 24hsFigura 4: Controle 24h Figura 5: Ciclofosfami<strong>da</strong> 72h Figura 6 - Metotrexato 120hsFigura 7: Ciclofosfami<strong>da</strong> 72h Figura 8: Mitomicina 72h Figura 9: Controle 72hmento celular com as células a<strong>de</strong>ri<strong>da</strong>s às placas. O PH <strong>da</strong>s placasfoi medido após 24 horas e observou-se que nas placas on<strong>de</strong>a mitomicina, o metotrexato e a ciclofosfami<strong>da</strong> eram adiciona<strong>da</strong>so PH encontrava-se <strong>em</strong> torno <strong>de</strong> 7,0 (Ver figuras 1 - 9).DISCUSSÃOComo terapia adjuvante <strong>da</strong> excisão do pterígio amitomicina C t<strong>em</strong> sido bastante utiliza<strong>da</strong> para prevenir arecorrência <strong>de</strong>ste, seja através do uso intraoperatório ou pósoperatório.Singh et al. após ressecção do pterígio pela técnica<strong>de</strong> esclera exposta e uso <strong>de</strong> colírio <strong>de</strong> mitomicina C relataramtaxa <strong>de</strong> recorrência <strong>de</strong> 2,2% compara<strong>da</strong> com 88,9% dos controlestratados com placebo (7) . A partir <strong>da</strong>í o uso <strong>de</strong>sse antimitóticopopularizou-se, sendo atualmente indicado para reduzirrecorrências pós-operatórias do pterígio. Entretanto sérias complicaçõesvisuais <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> seu uso preocupam muitos cirurgiões.Efeitos como irritação conjuntival e complicações como ceratite,necrose <strong>da</strong> esclera com ou s<strong>em</strong> inflamação (escleromalácea),glaucoma secundário, catarata, ed<strong>em</strong>a e perfuração <strong>de</strong> córnea ecalcificação <strong>da</strong> esclera têm sido relatados (8) . A mitomicina C éum agente “radiomimético” que po<strong>de</strong> causar uma necroseavascular similar àquela <strong>da</strong> radiação beta.Em 1992, Rubinfeld et al. relataram 10 casos <strong>de</strong> complicaçõesgraves relaciona<strong>da</strong>s ao uso <strong>de</strong> mitomicina C tópica apóscirurgia <strong>de</strong> pterígio e raspag<strong>em</strong> <strong>da</strong> esclera. Essa técnica predispõeo olho a efeitos avasculares <strong>da</strong> mitomicina, que pod<strong>em</strong> levarà corrosão <strong>de</strong> esclera, mas ain<strong>da</strong> assim é a técnica mais utiliza<strong>da</strong>por ser a mais fácil <strong>de</strong> ser realiza<strong>da</strong> (9) .A busca por maior segurança no uso <strong>da</strong> mitomicina C levouao uso <strong>de</strong> concentrações ca<strong>da</strong> vez menores <strong>de</strong>sta droga, que continuaramsendo eficazes na redução <strong>da</strong>s recorrências. Entretanto,recent<strong>em</strong>ente foi relatado um caso on<strong>de</strong> uma baixa dose (0,02%)usa<strong>da</strong> por apenas 3 minutos levou à perfuração córneo-escleral (10) .A mitomicina t<strong>em</strong> sido bastante utiliza<strong>da</strong>, mas há que setomar certos cui<strong>da</strong>dos <strong>em</strong> sua utilização. A droga não <strong>de</strong>ve entrar<strong>em</strong> contato com áreas <strong>de</strong>sepiteliza<strong>da</strong>s e n<strong>em</strong> <strong>de</strong>ixar a escleraexposta após sua aplicação. A mitomicina coloca<strong>da</strong> <strong>em</strong> contatocom área <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito epitelial corneano, como aquele produzidoquando <strong>da</strong> r<strong>em</strong>oção do pterígio, provoca retardo na sua reparação(11) . Deve-se evitar excessiva cauterização <strong>da</strong> esclera e não<strong>de</strong>ixar a área escleral <strong>de</strong> ressecção do pterígio exposta no finalRev Bras Oftalmol. 2013; 72 (2): 108-11
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