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Revista Elas por elas 2016

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

A revista sobre gênero Elas por Elas foi criada, em 2007, com o objetivo de dar voz às mulheres e incentivar a luta pela emancipação feminina. A revista enfatiza as questões de gênero e todos os temas que perpassam por esse viés. Elas por Elas traz reportagens sobre mulheres que vivenciam histórias de superação e incentivam outras a serem protagonistas das mudanças, num processo de transformação da sociedade. A revista aborda temas políticos, comportamentais, históricos, culturais, ambientais, literatura, educação, entre outros, para reflexão sobre a história de luta de mulheres que vivem realidades diversas.

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ciados pelo SUS para a realização do<br />

processo transexualizador, a espera é<br />

absurda, podendo chegar até a 15<br />

anos. Esse processo é mais que cirurgia<br />

– passa <strong>por</strong> hormonização, fonoaudiologia<br />

para o apoio na voz, psicoterapia<br />

para a pessoa se sentir mais feliz<br />

no meio da sociedade, etc.<br />

Para a defensora Júnia Carvalho, o<br />

problema é que, com a falta do atendimento<br />

público especializado, muitas<br />

pessoas fazem a hormonização sozinhas,<br />

sem qualquer tipo de atendimento<br />

médico, correndo risco inclusive de<br />

morrer. A mulher trans precisa do anticoncepcional,<br />

que consegue na farmácia,<br />

facilmente, sem orientação e<br />

sem acompanhamento médico, o que<br />

gera consequências para a saúde. No<br />

caso do homem trans, ainda é mais<br />

grave: com a adolescência, vem o crescimento<br />

dos seios e a menstruação, o<br />

que traz grande sofrimento. Como o<br />

hormônio que precisa não é vendido<br />

em farmácia, “compra ou falsifica receita<br />

e adquire o produto no mercado<br />

clandestino, sem saber que tipo de remédio<br />

está tomando. Algumas pessoas<br />

não querem a cirurgia. As travestis<br />

querem se identificar com o gênero feminino,<br />

mas nem sempre têm interesse.<br />

A cirurgia não deve ser um remédio<br />

para consertar a pessoa para a sociedade.<br />

Todo mundo tem que ter o direito<br />

de ser como quer ser. Todos temos<br />

que estar felizes”, acrescenta.<br />

Segundo Júnia Carvalho, na falta<br />

de avanços <strong>por</strong> iniciativa dos próprios<br />

órgãos públicos, o caminho são as<br />

ações judiciais em busca do acesso ao<br />

tratamento transexualizador. “A dificuldade<br />

maior é para os homens trans,<br />

pois a cirurgia é considerada pelo Conselho<br />

Nacional de Medicina como experimental.<br />

Assim, não temos como<br />

obrigar o Estado a proceder esta cirurgia.<br />

As consequências disso são que<br />

muitas pessoas juntam dinheiro durante<br />

anos e fazem a cirurgia fora do país,<br />

como na Tailândia. Coisa insana, pois<br />

o pós-operatório é muito pesado e a<br />

pessoa sozinha, sem acompanhante,<br />

e ainda em outro idioma que não domina,<br />

corre muitos riscos”, explica.<br />

A promotora, ao falar que a sociedade<br />

deve atuar sempre cobrando as<br />

autoridades uma mudança, conta que<br />

já existe um enunciado do Conselho<br />

Nacional de Justiça (CNJ), órgão fiscalizador<br />

do judiciário, que diz que a retificação<br />

do gênero e a retificação do<br />

nome independem de cirurgia de redesignação<br />

genital. “Quando o CNJ<br />

faz enunciado é <strong>por</strong>que a matéria é<br />

im<strong>por</strong>tante e recorrente. Um magistrado<br />

pode se apoiar nesse enunciado do<br />

CNJ para dar decisão de retificação,<br />

independente de cirurgia. Se isso for<br />

condição, estaremos sempre excluindo<br />

aquela travesti que não quer fazer a cirurgia<br />

e o homem trans para a qual o<br />

Estado não oferece”, explica.<br />

Um ciclo de violências<br />

Para a defensora pública Júnia Carvalho,<br />

na medida em que não se possibilita<br />

condições para que a pessoa<br />

trans viva sua identidade com plenitude,<br />

“são gerados outros custos para a<br />

saúde, pois isso traz doenças físicas e<br />

psicológicas e a infelicidade volta para<br />

o sistema de saúde. Só pela economia<br />

se deveria investir nisso”, explica.<br />

Quando a pessoa trans está em situação<br />

de privação de liberdade, o problema<br />

é ainda mais grave. Em alguns<br />

poucos presídios têm c<strong>elas</strong> especiais,<br />

ajudando a evitar que tanto a mulher<br />

como o homem trans sofram violência<br />

em c<strong>elas</strong> masculinas. “Mas em geral a<br />

gente vê um monte de discriminação e<br />

um total despreparo das polícias para<br />

lidar com a situação”, afirma. Também<br />

quando o assunto é mercado de trabalho<br />

a realidade não muda. Segundo Júnia<br />

Carvalho, há muito desrespeito, mas o<br />

mais grave é que poucas pessoas trans<br />

conseguem ser contratadas. Para isso,<br />

é preciso mudar a documentação. Um<br />

homem trans, <strong>por</strong> exemplo, se não<br />

mudar o gênero na documentação, não<br />

pode pedir ao Exército o certificado de<br />

dispensa do serviço militar sem o qual<br />

não consegue emprego. Mas para a<br />

Justiça, não pode mudar o gênero no<br />

documento se não fez cirurgia, a qual o<br />

Estado não é obrigado a oferecer, <strong>por</strong>que<br />

ainda é considerada experimental no<br />

Brasil. Uma negação de direito que<br />

leva a muitas outras”, explica.<br />

Para a promotora, a invisibilidade<br />

da pessoa trans nos traz um desafio.<br />

“Já ouvi algumas pessoas trans falarem:<br />

‘eu sou passável’, o que quer dizer que<br />

ninguém percebe que é trans, que passa<br />

“<br />

A cirurgia não deve<br />

ser um remédio para<br />

consertar a pessoa<br />

para a sociedade.<br />

Todo mundo tem<br />

que ter o direito de<br />

ser como quer ser.<br />

Todos temos que<br />

estar felizes.<br />

36 <strong>Revista</strong> <strong>Elas</strong> <strong>por</strong> <strong>Elas</strong> - Junho <strong>2016</strong>

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