A cegueira ajudou-o a ajudar os outros EMPREENDEdorismo 22 <strong>PME</strong> Jorge Pina tem 40 anos e continua a fazer desporto adaptado CRÉDITOS: DR
EMPREENDEdorismo RESPONSABILIDADE SOCIAL Perdeu 90% da visão com apenas 28 anos e foi assim, diz, que começou a ver. Desde ajudar jovens desfavorecidos a empresas na coesão de grupo, Jorge Pina tornou-se num verdadeiro empreendedor social. Por: Ana Rita Justo Como lidar com a perda de visão? Como desistir de um sonho para abraçar outros? A tudo isto Jorge Pina teve de adaptar-se quando, em 2006, perdeu 90% da visão. Hoje, quer ser uma “fonte de energia e de inspiração” para os outros. Foi este propósito que o fez lançar o livro A Visão Depois da Cegueira no início deste ano. Uma obra onde conta quando começou verdadeiramente a ver. “Costumo dizer que dantes é que eu era cego e agora é que vejo, porque não vejo só com os olhos, vejo com o sentimento, com o coração. Geralmente, os olhos enganam-nos e julgamos as pessoas pela roupa, pela raça, pela cor e esquecemo-nos de ir à verdadeira essência de cada ser.” Foi esta aprendizagem que Jorge Pina teve de fazer. Depois de uma vida inteira dedicada ao boxe – foi campeão nacional ao serviço do Sporting – e, na altura em que se preparava para lutar pelo título de campeão mundial, viu-se a braços com um descolamento de retina que o atiraria para uma série de cirurgias que ditaram a sua cegueira. “Tive de aceitar a minha condição de vida e partir em busca de outra coisa que me desse alegria e felicidade. Essa força interior, essa fé fez-me aceitar e pensar: ‘Sei que ainda vou ser muito feliz se aceitar. Porque é que vou estar a sofrer com o que aconteceu? Porque é que vou estar a fazer-me de vítima’”, explica. A vida mudaria totalmente, mas outros valores mais altos surgiram. Jorge agarrou-se à sua fé e à sua religião, muito própria: “Fui batizado, mas a minha religião é a partilha, o amor. É o que posso dar sem querer receber, é a felicidade que eu tiro de saber que o outro está feliz”. Assim adaptou-se e iniciou-se no atletismo adaptado, que o levou aos Jogos Paralímpicos de Pequim (2008), de Londres (2012) e, mais recentemente, aos do Rio de Janeiro, onde participou na maratona paralímpica. Uma associação e um bom exemplo Em 2011, Jorge Pina conseguiu criar a sua própria associação, a partir da qual ajuda pessoas com deficiência e jovens provenientes de bairros desfavorecidos. Dentro da Associação Jorge Pina foi criada a Escola de Atletismo Adaptado, através da qual o antigo boxista dá formação a crianças e jovens com deficiência. Ao todo, 70 alunos beneficiam dos ensinamentos de Jorge Pina. A associação lançou, ainda, o projeto Music Boxe, no qual crianças e jovens desfavorecidos têm aulas de boxe, dança ou música, sendo assim compelidos a optarem pela vida ativa e pela inclusão social. “Não é o bairro onde eles [jovens] moram que os pode tornar diferentes, têm de ser eles a querer mudar. E eu não sou diferente de nenhum deles. Tudo o que me foi dado à nascença também lhes foi dado a eles. Eu podia ter culpado a minha família, os meus pais por ter passado pelas experiências que tive. Podia ter culpado o Estado por ter nascido num bairro social… Tive de transformar-me para chegar onde cheguei”, recorda o atleta, que sublinha também a essência da sua Escola de Atletismo Adaptado. “Por vezes preocupamo-nos muito com a deficiência e não com a eficiência de cada um. Se procurarmos o melhor de cada um e tentarmos que no seu melhor façam bem, podemos ajudá-los a crescer e a ganhar outras valências.” <strong>PME</strong> 23