MOBILIDADE URBANA NO BRASIL
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MOVIMENTOS SOCIAIS: CONTRA A CULTURA<br />
DO AUTOMÓVEL, PELO DIREITO À <strong>MOBILIDADE</strong><br />
Outro foco de críticas, a horizontalidade<br />
é questionada, por um lado, pela<br />
sua sinceridade, já que as atividades são<br />
organizadas por um grupo fechado; por<br />
outro lado, em sua efetividade, ao não<br />
impedir a presença de militantes de direita<br />
(como aconteceu em 2013) ou de<br />
black blocs. Internamente as contradições<br />
foram sentidas, com a saída de militantes<br />
em diversas cidades ao longo de<br />
2015. O texto intitulado “O Movimento<br />
Passe Livre acabou?” 2 , do ex-militante<br />
do MPL Legume Lucas, publicado em<br />
agosto de 2015, deu visibilidade às divisões<br />
internas. “Como consequência dessa<br />
concepção peculiar de consenso, a discussão<br />
pública tornou-se um tabu. Todas<br />
as discussões deveriam ser feitas internamente<br />
para que respeitássemos a construção<br />
coletiva e assim desenvolvíamos<br />
– sem perceber – práticas muito semelhantes<br />
às das organizações que criticávamos,<br />
enxergando como traição qualquer<br />
divergência aberta”, acrescenta.<br />
Massa crítica<br />
O movimento de ciclistas emergiu no<br />
Brasil no mesmo período do surgimento<br />
do MPL. Em São Paulo, a primeira Bicicletada<br />
aconteceu em 2001, no âmbito<br />
dos protestos do movimento altermundista.<br />
Além das melhores condições para o<br />
uso da bicicleta como meio de transporte,<br />
2<br />
“O Movimento Passe Livre acabou?”.<br />
Passa Palavra, 4/8/2015. Em http://www.<br />
passapalavra.info/2015/08/105592<br />
as primeiras manifestações tinham como<br />
objetivo denunciar a cultura do automóvel<br />
e a estrutura de ocupação do espaço<br />
público. Assim como o Passe Livre, o<br />
movimento também trazia influências<br />
marxistas, anarquistas e autonomistas – a<br />
crítica do filósofo ecologista André Gorz<br />
sobre a “Ideologia Social do Automóvel” é<br />
uma referência bastante importante nesse<br />
período. Nesse texto dos anos 1970, o<br />
autor francês compara o uso de carros a<br />
bens de luxo, como praias particulares,<br />
que só fazem sentido quando possuídos<br />
apenas por poucos. Sua democratização<br />
é impossível, portanto a resposta deve ser<br />
o uso coletivo tanto das praias quanto das<br />
vias públicas. Circulando pela internet<br />
desde o início dos anos 2000, o texto foi<br />
incluído na coletânea Apocalipse Motorizado,<br />
da editora Conrad, em 2005.<br />
A inspiração veio dos eventos de Massa<br />
Crítica, passeios periódicos auto-organizados<br />
de cicloativistas surgidos nos anos<br />
1990 nos Estados Unidos. O nome original<br />
faz referência à noção de que, após<br />
conquistar um número crítico de adeptos,<br />
os passeios passam a garantir a segurança<br />
e a preferência dos ciclistas. Isso também<br />
se refletiria de forma mais ampla: exisitiria<br />
uma “massa crítica” de militância<br />
e apoio a partir da qual as conquistas se<br />
acelerariam. Em São Paulo, alguns anos<br />
se passaram para atingir este ponto. Nos<br />
primeiros anos, as Bicicletadas não conseguiam<br />
reunir muito mais do que duas<br />
dezenas de participantes a cada edição, e<br />
ainda com ameaça de intervenção da polícia<br />
e da Companhia de Engenharia de<br />
Tráfego para “liberar” o trânsito.