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TUDO É RIO<br />
CARLA MADEIRA<br />
“Todas as emoções são líquidas e se manifestam<br />
através da adrenalina, do suor, do sêmen e de<br />
outros fluxos presentes no ser humano”<br />
Como uma cuidadosa cozinheira, que<br />
deixa aquecer seus assados no forno,<br />
durante horas, antes o levar à mesa, a publicitária<br />
Carla Madeira, guardou seu livro<br />
numa gaveta por quinze anos. Muitos autores<br />
buscam algum distanciamento dos<br />
seus textos - mas não nessa extensíssima<br />
medida. O propósito geralmente é o de<br />
conferir se a obra é realmente consistente<br />
para resistir ao tempo.<br />
Da minha parte, acredito, adicionalmente,<br />
que a autora buscava coragem para<br />
tornar público uma obra de palavras duras,<br />
sujas e enlameadas, em certos capítulos,<br />
pois a personagem mais destacada é uma<br />
desbocada prostituta de nome Lucy. A filha<br />
de Carla só foi autorizada a ler aquelas<br />
narrativas depois de completar 18 anos.<br />
Mas esse é apenas um aspecto de um<br />
denso romance de 210 páginas que fala<br />
da bobagem de sempre: gostar de quem<br />
não gosta da gente. Há outros enredos<br />
paralelos, não menos emocionantes do<br />
que a vida dessa degenerada que amava<br />
submeter a clientela ao império de suas<br />
fantasias. Está tudo minuciosamente narrado<br />
naquelas páginas.<br />
O livro chegou às livrarias no final de<br />
2014 e teve a primeira edição esgotada. A<br />
editora prepara a terceira remessa de mil<br />
exemplares, fato que é raridade entre os<br />
autores de primeira viagem. Não há registro<br />
de tamanho sucesso editorial na capital<br />
mineira nos últimos vinte anos. Carla Madeira<br />
é uma moça fina, com dois cursos<br />
superiores e absolutamente elegante em<br />
seus gestos e fala. É incompreensível que<br />
seus personagens sejam capazes de palavreado<br />
tão agressivas, frequentemente sórdidas.<br />
Mas das mesmas mãos também<br />
brotam palavras amáveis e análises admiráveis<br />
sobre a complexidade mental daquelas<br />
personagens tão corriqueiras,<br />
como marceneiros,<br />
donas de casa e a mais uma<br />
vez citada pros ti tuta Lucy.<br />
Claramente, as pessoas<br />
que trafegam pelas páginas<br />
do livro têm vida própria e<br />
seguem seus caminhos sem<br />
pedir permissão a ninguém.<br />
Carla não se incomoda com<br />
a insubordinação, desde que<br />
elas sejam pessoas capazes<br />
do bem e do bem e do mal.<br />
Exatamente como somos todos<br />
nós, na vida real.<br />
Há generosidade e malvadeza<br />
caminhando juntas;<br />
há discussões fortes sobre<br />
o perdão e reflexões poderosas<br />
sobre questões existenciais.<br />
Os personagens<br />
estão em permanente discussão<br />
com Deus. Eles são<br />
inflexíveis com o Criador,<br />
cobram certos defeitos, esquecimentos<br />
e muita negligência<br />
naqueles sete dias da criação. Há<br />
algumas blasfêmias, mas não a ponto de<br />
dizer que algumas obras, como o homem<br />
e a mulher, foram projetadas e realizadas<br />
por estagiários enquanto Ele desfrutava o<br />
fim de semana na praia.<br />
16<br />
MAIO DE <strong>2018</strong> • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR