Antologia Encontro Literário
Poesias, contos e crônicas
Poesias, contos e crônicas
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DANIEL COSTA DOS SANTOS
voltara no tempo. Eu estava realmente fazendo uma viagem pelo tempo e
aquele senhor era o meu condutor.
Passaram-se mais uns minutos e ele terminou o seu café, guardou a
lupa e os envelopes, para então solicitar a conta. A garçonete trouxe-lhe
os valores. Ele deixou a mesa e dirigiu-se para o interior do restaurante
possivelmente para o pagamento. Ao voltar, com uma expressão de
satisfação e até de felicidade, eu diria, repetiu o bon soir de despedida,
novamente respondido por todos presentes.
E, para a minha total surpresa, ele voltou-se para mim com um sorriso
amável e indescritível, e disse uma frase que simplesmente culminou
todo aquele meu momento de perplexidade: “É muito bom estar aqui
novamente!” Após isto, ele deixou o restaurante e vi a sua silhueta dispersarse
pela Quai des Belges. Afinal, o que teria me acontecido? Seria o entrecôte
com seus temperos mágicos? Seria a bière? O ar de Marseille, moldado
por aquela maresia indelével do Mediterrâneo? O já crepuscular momento,
com sua auréola intimista revolvendo os confins da minha alma?
Atrás de respostas, encerrei meu jantar, fechei minha conta e rumei para
o cais do Vieux Port e por lá me acomodei. Imaginei que a sua similaridade
com o Canal do Rio Grande e o Porto Velho, estes tão presentes na minha
existência, viesse a me possibilitar resgates nas minhas memórias de infância
que pudessem explicar-me algo. Além disto, contemplando a profundidade
do crepúsculo, clamei ao Sol, testemunha ocular da saga humana desde
seus primórdios, que me dissesse quem seria aquele senhor e o que estaria
acontecendo. Mas quem sabe o Sol poente tenha se retirado antes que
tivesse escutado o meu clamor, pois ele não me respondeu. E o véu da noite
estendeu-se rapidamente. Passei a esperar pela Lua, também testemunha da
História. Mas naquela noite, infelizmente, ela não apareceu. Então, à minha
esquerda, no alto do céu, foi possível avistar Vênus, com seu brilho constante
e vigoroso. Era outra testemunha dos tempos e clamei-lhe por uma resposta.
Mas avistar Vênus nos céus do Mediterrâneo, sentado na borda do cais do
Vieux Port, envolto pela atmosfera de Marseille, projetou-me novamente para
o meu próprio delírio que eu estava tentando entender. Assim, caso Vênus
tenha respondido ao meu clamor, sinceramente, sequer percebi.
Dedicado aos filhos do Sr. Marcos Costa, meu avô.
Delft, Setembro 2010.
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