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Controlando o poder de matar - Núcleo de Estudos da Violência

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Segundo alguns juristas, esses acordos ofen<strong>de</strong>m a soberania dos veredictos<br />

proferidos pelo Júri, inclusive porque o processo penal brasileiro, salvo exceções<br />

relativas a infrações consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> pequeno potencial ofensivo, não prevê a<br />

possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> transação entre Estado-acusador e réu, ou seja, não prevê acordos<br />

entre o representante do Ministério Público e o <strong>de</strong>fensor do réu. Contudo, são<br />

relativamente comuns situações em que o juiz presi<strong>de</strong>nte do Júri presencia tais acordos.<br />

Promotor e <strong>de</strong>fensor, por exemplo, po<strong>de</strong>m concor<strong>da</strong>r com a culpa do réu,<br />

pedindo aos jurados que o con<strong>de</strong>nem pela prática <strong>de</strong> homicídio privilegiado, caso em<br />

que a pena diminuirá <strong>de</strong> 1/6 a 1/3 (art. 121, § 1 o do Código Penal). Nessa hipótese, o<br />

promotor abre mão <strong>de</strong> sustentar eventuais qualificadoras do homicídio e o <strong>de</strong>fensor não<br />

pe<strong>de</strong> a absolvição por negativa <strong>de</strong> autoria ou pela ocorrência <strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> ilicitu<strong>de</strong><br />

ou <strong>de</strong> culpabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, como a alegação <strong>de</strong> legítima <strong>de</strong>fesa, por exemplo. Também há<br />

situações em que o acordo é pela absolvição do réu, caso em que somente o promotor<br />

abre mão <strong>de</strong> sustentar a acusação e concor<strong>da</strong> com o <strong>de</strong>fensor (Nucci, 1999: 124-129).<br />

De um ponto <strong>de</strong> vista ético-jurídico, há quem aponte como sendo o maior<br />

problema <strong>de</strong> tais acordos o fato <strong>de</strong> o Ministério Público e a <strong>de</strong>fesa, ao apresentarem<br />

uma tese comum, <strong>de</strong>ixarem <strong>de</strong> informar os aspectos contraditórios <strong>da</strong> causa aos<br />

jurados, como versões divergentes a respeito <strong>da</strong>s intenções do acusado ou <strong>de</strong> seu<br />

envolvimento com a vítima, o que po<strong>de</strong> induzi-los a acatar a única tese apresenta<strong>da</strong><br />

(Nucci, 1999: 125) 18 . Outros profissionais do Júri não se opõem à ocorrência <strong>de</strong><br />

acordos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que <strong>de</strong>notem um encontro <strong>de</strong> opiniões a ser <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente exposto aos<br />

jurados para que o avaliem 19 .<br />

É unânime, to<strong>da</strong>via, que acordos não <strong>de</strong>vem ocorrer quando se prestam apenas<br />

a tornar as sessões mais fáceis, rápi<strong>da</strong>s, mecânicas e consequentemente, “não<br />

arrebatadoras” para promotores, advogados e juízes que, em poucas horas <strong>po<strong>de</strong>r</strong>ão se<br />

<strong>de</strong>sincumbir <strong>de</strong> suas tarefas. Quando isso acontece e os jurados percebem “o jogo <strong>de</strong><br />

cartas marca<strong>da</strong>s”, duas são as <strong>de</strong>corrências mais comuns: ou eles contribuem para que<br />

18 - Quase a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma amostra <strong>de</strong> jurados do 3 o Tribunal do Júri <strong>de</strong> São Paulo (87,83%)<br />

<strong>de</strong>clarou saber ter autonomia para <strong>de</strong>cidir casos em que promotor e <strong>de</strong>fensor sustentam a<br />

mesma tese. To<strong>da</strong>via, ao respon<strong>de</strong>rem se, nessas situações, sentiam -se compelidos a acatar tal<br />

tese, 39,16% <strong>de</strong>clararam que sim; 15,49% que às vezes e somente 38,27% que não. Lembra<br />

ain<strong>da</strong> o juiz que <strong>de</strong>senvolveu essa pesquisa <strong>de</strong> opinião, que <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 1.524 julgamentos<br />

realizados, nos últimos 18 anos, naquele tribunal, houve somente um caso em que Ministério<br />

Público e <strong>de</strong>fesa pediram a absolvição do réu e o Conselho <strong>de</strong> Sentença o con<strong>de</strong>nou (Nucci,<br />

1999: 128, 353 e 354).<br />

19 - Essa é a opinião que o Promotor Dr. Octávio Borba <strong>de</strong> Vasconcelos expressou ao final <strong>da</strong> já<br />

menciona<strong>da</strong> palestra ministra<strong>da</strong> no curso sobre O futuro do Júri no Brasil, em 31 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong><br />

1999.<br />

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