Controlando o poder de matar - Núcleo de Estudos da Violência
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narrativas fizessem eco junto aos valores dos jurados ou, em outras palavras, para que<br />
fossem por eles percebi<strong>da</strong>s como verossímeis.<br />
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No “Caso Ex-PM” 22 , promotor e <strong>de</strong>fensor acor<strong>da</strong>ram, na sala secreta, diante do<br />
juiz e <strong>de</strong> mim, minutos antes <strong>de</strong> iniciar-se a sessão, que retirariam tanto uma <strong>da</strong>s<br />
qualificadoras do homicídio <strong>de</strong> que o réu era acusado como autor, quanto do homicídio<br />
em que ele era acusado como partícipe. “Retira<strong>da</strong> <strong>de</strong> qual <strong>de</strong>las?”, perguntou o juiz. ”Eu<br />
<strong>de</strong>cido e o colega advogado me acompanha”, respon<strong>de</strong>u o promotor. O advogado assentiu,<br />
com a cabeça, e o juiz comentou, com ar meio zombeteiro: “Prestem bastante atenção,<br />
então, no que um e outro vai dizer, hein!”. Em segui<strong>da</strong>, num tom bastante informal, os três<br />
comentaram que a nova pena, portanto, seria <strong>de</strong> 14 anos, o que, na prática, significaria<br />
aproxima<strong>da</strong>mente 2 anos e meio em regime fechado. Já a caminho do plenário, o<br />
promotor comentou comigo: “Na prática, mesmo, isso significa liber<strong>da</strong><strong>de</strong> para o réu, porque<br />
se fosse eu, <strong>de</strong>sapareceria. O homem que está sendo julgado hoje não é mais o mesmo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>zesseis anos atrás. É só ele comprar uma passagem <strong>da</strong> Itapemirim e sumir.”<br />
O acordo somado a esses comentários <strong>po<strong>de</strong>r</strong>iam levar qualquer um que os<br />
presenciassem à conclusão <strong>de</strong> que aquela sessão seria um jogo <strong>de</strong>sinteressante <strong>de</strong><br />
cartas marca<strong>da</strong>s, contudo, não foi o que ocorreu.<br />
A sustentação oral do promotor foi longa (<strong>da</strong>s 13h36’ às 15h20’), pois ele leu<br />
várias peças processuais e comentou-as, <strong>de</strong>talha<strong>da</strong>mente. Contou múltiplas micro-<br />
histórias que entrecruzou, <strong>de</strong> forma nem sempre clara, tanto que os jurados, em certos<br />
momentos, expressaram incompreensão. Até as 15h05’, havia somente reiterado o<br />
pedido <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação. Apenas então, pediu aos jurados que negassem o motivo torpe<br />
— vingança — pois na<strong>da</strong> provava que as vítimas tinham assaltado o réu e <strong>de</strong> que esse,<br />
<strong>de</strong>pois, as teria procurado para vingar-se. Um jurado, não satisfeito, perguntou se<br />
existia boletim <strong>de</strong> ocorrência — B.O — <strong>de</strong>sse suposto assalto. Foi o <strong>de</strong>fensor quem<br />
indicou as páginas em que o B.O encontrava-se no processo e o promotor as leu,<br />
22 - 15/08/2001, <strong>da</strong>s 12h às 16h45’, Plenário 7 do 1 o Tribunal do Júri (Barra Fun<strong>da</strong>): tratava-se do<br />
3 o julgamento do réu por autoria <strong>de</strong> um homicídio duplamente qualificado (motivo torpe + recurso<br />
que impossibilitou a <strong>de</strong>fesa <strong>da</strong> vítima, incisos I e IV do art. 121 do CP) e por participação em<br />
outro homicídio, igualmente qualificado duas vezes. No 1 o julgamento, foi con<strong>de</strong>nado a 35 anos,<br />
mas houve anulação por falha técnica no libelo acusatório. No 2 o , foi novamente con<strong>de</strong>nado, a<br />
31 anos, e houve protesto por novo Júri (recurso sempre possível quando a pena exce<strong>de</strong> 20<br />
anos). Esteve <strong>de</strong>tido por apenas 8 dias, em prisão disciplinar. O crime ocorreu em 23/08/1985.<br />
Consta que o réu, juntamente com seu enteado, matou dois homens que eram irmãos, no interior<br />
<strong>de</strong> um barraco, porque, tempos antes, eles o roubaram.<br />
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