Contadores de Histórias - Histórias Interativas
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passagens para o poético, luta contra a opressão e o adverso olvido, faz-se porta-voz<br />
dos “silenciosos lábios”: “eu vengo hablar por vuestra boca muerta” (Neruda). Mesmo<br />
vivendo em tempos não-heroicos, insiste em salvaguardar seu “sentimento do mundo”<br />
e repassar a outras mãos, para a plenitu<strong>de</strong> do que há-<strong>de</strong> vir, o fio da memória que<br />
atravessa a corrente <strong>de</strong> tempos: “Guar<strong>de</strong>i-me para a epopeia / que jamais escreverei<br />
(...) recolhei meu pobre acervo, / alongai meu sentimento” (Drummond).<br />
2. Guardiões da memória, cerzidores da túnica inconsútil<br />
Não se po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r, no <strong>de</strong>serto dos tempos,<br />
uma só gota da água irisada que, nôma<strong>de</strong>s,<br />
passamos do côncavo <strong>de</strong> uma para outra mão.<br />
Ecléa Bosi<br />
Gente da palavra. Antigos aedos e rapsodos gregos (rápthein áoidén, aqueles que<br />
sabem costurar cantos), assim como os griots da África <strong>de</strong> nossos dias, são garantes<br />
da permanência da memória em socieda<strong>de</strong>s fundadas sobre a tradição oral, em que<br />
contar histórias não é um evento à parte, mas algo constitutivo do próprio cotidiano.<br />
Com razão Alex Haley dirá: “quando um griot morre é como se toda uma biblioteca<br />
tivesse sido arrasada pelo fogo”.<br />
Guardiã das tradições orais, a cantadora-contadora Clarissa Pinkola Estés (autora<br />
<strong>de</strong> O dom das histórias e Mulheres que correm com os lobos) nasceu da confluência <strong>de</strong> duas<br />
linhagens: a das contadoras húngaras (mesenmondók) e a das latinas (cuentistas). Segundo<br />
o legado <strong>de</strong> que Clarissa <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>, “acredita-se que as histórias são escritas como<br />
uma leve tatuagem na pele <strong>de</strong> quem as viveu”. Essa espécie <strong>de</strong> “escrita levíssima” faz<br />
lembrar as tatuagens dos griots, pergaminhos <strong>de</strong> palavras andantes, <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia em al<strong>de</strong>ia.<br />
As arquetípicas narradoras velhas e sábias são transportadas para os textos impressos<br />
da cultura letrada (nas maternas figuras <strong>de</strong> criadas, amas ou avós, como a Mamãe<br />
Gansa), que ficcionam a voz carinhosa da contadora e a memória <strong>de</strong> uma origem<br />
Maria <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s Soares<br />
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