GUERRA DOS MASCATES JOSÉ DE ALENCAR
GUERRA DOS MASCATES JOSÉ DE ALENCAR
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A bom entendedor meia palavra basta. A trempe do gabinete<br />
manobrava para alijar o colega do Império; mas aquela augusta<br />
solicitude manifestada pela solidariedade ministerial, abriu-lhe os<br />
olhos. Soara o buona sera; cumpria se despedirem logo, para não<br />
representarem o papel de D. Basílio.<br />
Assim operou-se a mudança política. Mal sabia a essa hora o maroto<br />
do sacristão que ele tivera a honra de servir de pretexto a um<br />
acontecimento tão importante! Se o adivinhasse, não limitaria suas<br />
ambições ao modesto lugar de inspetor, que arranjou-lhe o escrivão,<br />
e à patente. de alferes que o novo presidente prometeu-lhe.<br />
Decorreram oito ou nove meses.<br />
A câmara fora dissolvida. O jovem escritor tinha sido eleito deputado,<br />
e estava com assento na câmara. Um domingo por manhã recebi sua<br />
visita, em retribuição do cartão que lhe deixara à chegada.<br />
Conversamos a respeito de política; o autor do artigo sobre a<br />
cabeleira do capitão-mor pensava que tínhamos demasia de<br />
liberdade; a imprensa especialmente carecia de um corretivo salutar.<br />
Trouxe-me à memória o embrulho que ainda atravancava uma gaveta<br />
de minha papeleira. Sem advertir que fazia um epigrama ao Cícero<br />
pernambucano, perguntei-lhe:<br />
- Que destino devo dar aos objetos que 1'. Ex.a me confiou? Quer que<br />
os envie à sua residência?<br />
- Oh! não vale a pena! respondeu com um rubor de primeira<br />
legislatura. A mudança, que se operou na política, tirou a estes<br />
objetos sua importância.<br />
Ao sair encontrou-se a visita com um indivíduo esguio, que subia a<br />
escada. O feto ministerial não se dignou abaixar o augusto e<br />
digníssimo olhar para a zumbaia do desconhecido, cujo ar beguino<br />
cheirava de longe a morrão de igreja.<br />
Quem havia de ser o sujeito?<br />
O marreco do sacristão, que já foi encaixado na Guarda Nacional<br />
vinha à corte pretender um empregozinho para viver. Servia-lhe até<br />
mesmo o oficio de seu amigo, o escrivão, arriscado a perdê-lo por<br />
certo desfalque no cofre de órfãos.<br />
- Dizem, acrescentou ele; eu não creio; talvez não passem de<br />
calúnias; mas enfim tudo pode acontecer.<br />
Trazia-me o mirífico alferes uma carta de recomendação, que lhe<br />
dava o direito de importunar-me uma hora a contar sua genealogia,<br />
como prólogo necessário e importante da biografia. Mas nunca um<br />
tagarela caiu-me tão a propósito do céu como aquele.<br />
- Sr. Beltrão, meus pequenos serviços estão à sua disposição; mas<br />
não tenho valimento. É bom que procure os deputados de sua<br />
província.<br />
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