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Edição especial - Visão

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Aguerra dita «preventiva» instaura um novo<br />

tempo, que tanto pode ser o de uma nova<br />

«ordem» determinada pela hegemonia<br />

americana como o de um novo caos de<br />

consequências ainda imprevisíveis. Não consigo<br />

imaginar um mundo em que as tentativas de resolver<br />

pacificamente conflitos entre Estados deixam<br />

de ter qualquer utilidade. Esta guerra, ilegítima e<br />

imoral, é um tremendo passo atrás na história da civilização.<br />

O sonho da Carta das Nações Unidas,<br />

baseado no respeito universal pelos<br />

direitos do homem, vai ser<br />

muito difícil de reconstruir.<br />

Em 1932, Einstein escrevia uma<br />

carta a Freud pondo-lhe a pergunta<br />

que considerava mais importante<br />

para a humanidade:<br />

Haverá alguma maneira de libertar<br />

os seres humanos da fatalidade<br />

da guerra? Einstein, pacifista<br />

militante, defendia a necessidade<br />

de uma organização supranacional<br />

para a solução dos conflitos<br />

entre Estados. Mas pensava que<br />

era preciso ir mais longe e perguntava:<br />

poderá o estudo do desenvolvimento<br />

psíquico dos seres<br />

humanos levar a que eles se<br />

tornem mais resistentes à psicose<br />

do ódio e da destruição?<br />

A resposta de Freud é lapidar. A humanidade, escreve,<br />

vive desde tempos imemoriais um processo de<br />

evolução cultural, a que alguns chamam civilização,<br />

de certo modo comparável à domesticação de<br />

certas espécies animais. Ora a guerra é a forma<br />

mais violenta de afrontar a atitude psíquica, imposta<br />

por este processo cultural, de controlar as pulsões<br />

de destruição e morte. É por isso que não a suportamos.<br />

Não se trata, sequer, de uma aversão intelectual<br />

ou afectiva: é uma intolerância constitucional,<br />

uma «idiossincrasia magnificada».<br />

HELENA ROSETA<br />

Um passo atrás na civilização<br />

Portugal não está militarmente na guerra, mas está politicamente<br />

a favor dos que a conduzem<br />

❝A mensagem essencial<br />

do PR e do PM é que<br />

os portugueses podem<br />

estar tranquilos. Não, não<br />

podemos. Não estamos<br />

«por cá, todos bem»,<br />

como antigamente.<br />

Estamos preocupados,<br />

solidários dos inocentes<br />

que esta guerra matará<br />

e perplexos quanto<br />

ao futuro colectivo ❞<br />

GUERRA DO GOLFO MUNDO II<br />

Palavras que ressoam com uma actualidade premente.<br />

Estamos perante uma guerra feita à margem<br />

da Carta das Nações Unidas e do direito internacional<br />

e contra a opinião da esmagadora<br />

maioria dos países do mundo. Confesso por isso<br />

que não posso deixar de me sentir profundamente<br />

decepcionada com a posição de Portugal neste<br />

conflito. Enquanto o Chefe do Estado condena<br />

a guerra e recusa qualquer envio de tropas, o<br />

primeiro-ministro, cedendo embora nesse ponto,<br />

proclama o seu apoio político à<br />

Administração Bush. No Parla-<br />

mento, até agora, houve debate<br />

mas nenhuma votação. Em suma,<br />

Portugal não está militarmente<br />

na guerra, mas está politicamente<br />

a favor dos que a<br />

conduzem. A mensagem essencial<br />

do PR e do PM é que os<br />

portugueses podem estar tranquilos.<br />

Não, não podemos. Não<br />

estamos «por cá, todos bem»,<br />

como antigamente. Estamos<br />

preocupados, angustiados, solidários<br />

dos inocentes que esta<br />

guerra matará e perplexos<br />

quanto ao futuro colectivo.<br />

Por mim, fico sem perceber<br />

os apelos à unidade e coesão<br />

nacional feitos por Jorge Sampaio<br />

e Durão Barroso nas últimas<br />

horas. Unidade contra ou a favor da guerra?<br />

É insustentável esta dualidade. Como ser humano,<br />

quero poder expressar a minha revolta contra<br />

esta guerra. Como portuguesa, tenho direito a<br />

exigir dos órgãos máximos do meu país uma posição<br />

coesa de que não foram capazes e cuja ausência<br />

não parece incomodá-los. Como deputada,<br />

quero ter a oportunidade de expressar o meu<br />

não a tudo isto. E como cidadã estarei na rua ao<br />

lado de todos os que denunciam a ilegitimidade<br />

desta guerra. Mesmo sabendo que a paz, agora, é<br />

ainda mais difícil.<br />

VISÃO 21 de Março de 2003 47

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