Edição especial - Visão
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Estes objectivos de Bush constituem<br />
uma estreia absoluta para um país – os<br />
EUA – que nunca se importou muito com<br />
a forma como os Estados árabes eram governados,<br />
desde que o petróleo continuasse<br />
a correr barato para os depósitos das<br />
«banheiras» americanas, e para um Presidente<br />
que chegou à Casa Branca manifestando<br />
desprezo pela reconstrução de países.<br />
Vejamos o que dizem os memorandos<br />
pós-guerra de Washington<br />
1. Quem vai governar o Iraque?<br />
Até os mais visionários da Administração<br />
reconhecem que conquistar o Iraque<br />
promete ser mais fácil do que devolvê-lo<br />
aos iraquianos. Mas muita coisa depende<br />
da forma como a guerra progredir. Os planos<br />
para o pós-guerra requerem inevitavelmente<br />
uma adaptação à medida que se<br />
avança. Mas tem havido uma divisão<br />
constante no seio da Administração sobre<br />
as opções preferidas. Tanto em grandes<br />
como em pequenas questões, registam-se<br />
divergências entre o Departamento de Estado<br />
e a CIA contra o Pentágono e o gabinete<br />
do vice-presidente. Só a 20 de Janeiro<br />
o Departamento de Defesa assumiu as<br />
operações de pós-guerra no novo Gabinete<br />
de Reconstrução e Assistência Humanitária,<br />
designando Jay Garner, um general<br />
na reforma e amigo de secretário da Defesa,<br />
Donald Rumsfeld, como patrão da paz.<br />
O principal <strong>especial</strong>ista em Iraque do Departamento<br />
de Estado, Ryan Cricker, falado<br />
para ir para Bagdad como embaixador,<br />
pode não assumir o cargo por haver na<br />
Defesa tanto poder do pós-guerra.<br />
Bush referiu-se a um leque amplo de intenções<br />
americanas quando apontou como<br />
modelo para o novo Iraque a reconstrução<br />
do Japão e da Alemanha após a<br />
Segunda Guerra Mundial. Embora não o<br />
digam em público, os funcionários da Casa<br />
Branca admitem em privado que o plano<br />
é, pura e simplesmente, a conquista do<br />
Iraque. A Administração gosta de lhe chamar<br />
libertação. Mas significaria uma ocupação<br />
total à moda antiga por forças dos<br />
EUA, que governariam o país até este estar<br />
pronto a ser devolvido aos iraquianos.<br />
Os responsáveis dizem que o plano prevê<br />
forte controlo militar, sob a autoridade<br />
global do comandante da invasão, general<br />
Tommy Franks. «A única coisa que está<br />
em questão agora», diz um funcionário<br />
do Departamento de Estado, «é quanto<br />
tempo vai durar essa governação».<br />
Sobre isso, Bush tem permanecido<br />
opaco: «Vamos ficar no Iraque enquanto<br />
for preciso e nem mais um dia.» Quanto<br />
DAVID GUTTENFELDER/AP<br />
lBAGDAD<br />
A reconstrução da sociedade civil é uma das tarefas mais difíceis dos planos americanos<br />
tempo será isso, depende de decisões difíceis<br />
que ainda não foram tomadas sobre<br />
o papel dos EUA. Deverá a América estar<br />
mais preocupada em assegurar a estabilidade<br />
ou em evitar a impressão de ocupação?<br />
Deverão os EUA estabelecer estruturas<br />
políticas básicas e retirar, ou ficar<br />
mais tempo para tentar construir a sociedade<br />
civil? Segundo todos os esquemas,<br />
um efectivo completo de tropas americanas<br />
– qualquer coisa entre 50 e 200 mil –<br />
formaria a autoridade central por um mínimo<br />
de seis meses, e um número menor<br />
iria provavelmente permanecer durante<br />
dois anos, embora alguns peritos afirmem<br />
que teriam de ficar 20 a 90 mil durante<br />
anos.<br />
2. Ocupar durante quanto tempo?<br />
Os chefes do Pentágono querem entrar<br />
e sair rapidamente. Devem ter franzido o<br />
sobrolho quando Bush falou do Japão.<br />
Essa reconstrução demorou sete anos aos<br />
EUA. Não é esse o modelo, insiste o subsecretário<br />
da Defesa para a Política, Douglas<br />
Feith. «Envolveríamos os iraquianos<br />
logo que possível, e transferiríamos a responsabilidade<br />
para entidades iraquianas<br />
logo que fosse viável», diz.<br />
Os estrategos estão a tentar facilitar a<br />
transição. Apostam que uma abertura feroz<br />
– aquilo a que chamam uma «campanha<br />
de choque e temor» – anulará a vontade<br />
de resistência do Iraque e porá rapidamente<br />
fim ao regime de Saddam com<br />
pouca destruição das infra-estruturas do<br />
país. Alguns responsáveis militares até<br />
murmuram que o plano de guerra deixa<br />
de lado demasiadas redes de transporte e<br />
energia como dádiva para as necessidades<br />
do pós-guerra. Mas se as hostilidades se<br />
arrastarem, a reconstrução do Iraque pode<br />
revelar-se tão dispendiosa e complicada<br />
como os quatro anos de reconstrução<br />
da Alemanha de Hitler.<br />
3. Acções imediatas<br />
Nos primeiros dias do pós-Saddam será<br />
necessária uma grande presença militar<br />
dos EUA. Alguém terá de prestar a assistência<br />
humanitária de que os civis iraquianos<br />
precisarão. Quase 60% dos iraquianos<br />
dependem das senhas de racionamento do<br />
Governo. Os «libertadores» não serão bem<br />
recebidos se não fornecerem rapidamente<br />
aos 25 milhões de habitantes do país rações,<br />
água, abrigo e cuidados médicos.<br />
Outras missões imediatas passam pela<br />
vigilância das fronteiras, impedir os iraquianos<br />
de ajustarem contas entre si, impedir<br />
as três principais comunidades do país<br />
– curdos, sunitas e xiitas – de combaterem<br />
e encontrar quaisquer armas de destruição<br />
maciça que o Iraque possua. O Pentágono<br />
já está preocupado com a dinâmica dessa<br />
busca. «Temos de encontrar e mostrar ao<br />
mundo as armas de Saddam», diz um responsável<br />
da Defesa – de uma forma, acrescenta,<br />
que não deixe suspeitas de que os<br />
EUA forjaram as provas. Essa é uma das<br />
razões pelas quais o Pentágono, ao contrário<br />
do que é habitual, decidiu deixar 500<br />
jornalistas de todo o mundo acompanharem<br />
as forças americanas na invasão.<br />
4. Comando de emergência<br />
Garner, sob o comando de Franks, será<br />
encarregado das questões civis. Irá coordenar<br />
a reconstrução e a administração<br />
civil e – rapidamente, espera Washington<br />
– transferir a assistência humanitária dos<br />
militares para a ONU e as agências não<br />
governamentais. Inicialmente, falou-se de<br />
nomear uma personalidade civil para eliminar<br />
o ónus de uma ocupação militar,<br />
mas um responsável da Casa Branca diz<br />
que «um czar civil não é o que as pessoas<br />
têm em mente». Os EUA acham que mais<br />
um anel na cadeia de comando iria afectar<br />
a eficácia da operação.<br />
VISÃO 21 de Março de 2003 61<br />
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