centro de filosofia e ciências humanas - UFRJ

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA
A TAREFA DE ERRO INTENCIONAL PREDIZ A COMPETÊNCIA
ORTOGRÁFICA DA CRIANÇA? – INVESTIGAÇÕES ACERCA DE
ASPECTOS MORFOSSINTÁTICOS E CONTEXTUAIS DA
LÍNGUA PORTUGUESA
Elisabet de Sousa Meireles
Rio de Janeiro
2004

A TAREFA DE ERRO INTENCIONAL PREDIZ A COMPETÊNCIA
ORTOGRÁFICA DA CRIANÇA? – INVESTIGAÇÕES ACERCA DE
ASPECTOS MORFOSSINTÁTICOS E CONTEXTUAIS DA
LÍNGUA PORTUGUESA
Elisabet de Sousa Meireles
Universidade Federal do Rio de Janeiro – Mestrado em
Psicologia
Professora Orientadora: Jane Correa
Doutora
Rio de Janeiro
2004

A TAREFA DE ERRO INTENCIONAL PREDIZ A COMPETÊNCIA
ORTOGRÁFICA DA CRIANÇA? – INVESTIGAÇÕES ACERCA DE ASPECTOS
MORFOSSINTÁTICOS E CONTEXTUAIS DA LÍNGUA PORTUGUESA
Elisabet de Sousa Meireles
Dissertação submetida ao corpo docente da Pós-Graduação em
Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte
dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por:
Prof.________________________ - Jane Correa
(Doutora)
Prof.________________________ - Angela Donato Oliva
(Doutora)
Prof.________________________ - Rosinda Martins Oliveira
(Doutora)
Rio de Janeiro
2004

FICHA CATALOGRÁFICA
Meireles, Elisabet de Sousa.
A Tarefa de Erro Intencional prediz a Competência Ortográfica da Criança? –
Investigações acerca de Aspectos Morfossintáticos e Contextuais da Língua Portuguesa /
Elisabet de Sousa Meireles. – Rio de Janeiro, 2004.
xiv, 102 f.: il.
Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade Federal do Rio
de Janeiro - UFRJ, Instituto de Pós-Graduação em Psicologia, 2004.
Orientador: Jane Correa
1. Tarefa de Erro Intencional. 2. Ortografia. 3. Psicologia - Teses.
I. Correa, Jane (Orient.).
II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Pós-
Graduação em Psicologia.
III. Título.

AGRADECIMENTOS
À CAPES e ao CNPQ, pelo apoio financeiro como Bolsista de Mestrado fornecido
em diferentes períodos do curso.
À Faperj pelo apoio financeiro e credibilidade recebidos como Bolsista de Apoio
Técnico, nos anos anteriores a minha entrada no Mestrado.
Ao Conselho Regional de Educação (CRE) e à Escola Municipal Minas Gerais, por
terem possibilitado a realização deste trabalho.
À Marcelo Nascimento, pela amizade, carinho e disponibilidade irrestrita.
À Rosane Braga Melo, Joyce Lys Sabak Nogueira de Sá, Tânia Campos Lopes e
Joyce de Paula e Silva, pelo incentivo e pelas contribuições valiosas dadas a este trabalho.
Um agradecimento especial à professora Jane Correa. Sua dedicação, conhecimento,
compreensão e apoio foram imprescindíveis para a realização deste trabalho e contribuíram
tanto para minha formação pessoal quanto profissional.

DEDICATÓRIA
À minha família, sempre presente em todos os momentos de minha vida.
À Bruna Meireles Werner, que, de longe, é a melhor das minhas produções.
É um privilégio poder acompanhar seu crescimento e fazer parte de sua
vida. Sua presença é fonte de inspiração e alegria, me estimulando a
buscar, cada vez mais, qualidade de vida. Agradeço a Deus pela
oportunidade de ser sua mãe e agradeço a você por tudo que tem me
ensinado.

RESUMO
MEIRELES, Elisabet de Sousa. A Tarefa de Erro Intencional prediz a
Competência Ortográfica da Criança? – Investigações acerca de Aspectos
Morfossintáticos e Contextuais da Língua Portuguesa. Orientadora: Jane Correa.
Rio de Janeiro: UFRJ/IP; CAPES e CNPq, 2004. Dissertação (Mestrado em
Psicologia).
Este estudo procura investigar a eficiência da tarefa de erro intencional em predizer
o desempenho ortográfico de crianças em idade escolar. A tarefa de erro intencional
consiste na transgressão proposital da criança sobre sua produção escrita. Com isto, seria
possível avaliar o nível de conhecimento já elaborado em relação à ortografia, na medida
em que para cometer este tipo de violação seria necessário certo domínio da regra ou
princípio em questão. Participaram 52 crianças cursando a 2 a e 4 a séries do ensino
fundamental de uma escola pública do Rio de Janeiro. Foram aplicadas tarefas de ditado e
tarefas de erro intencional, nas quais foram abordadas especialmente regularidades
morfossintáticas e contextuais da Língua Portuguesa. Os resultados indicaram que a tarefa
de erro intencional relaciona-se a competência ortográfica no que tange ao processo de
aquisição da ortografia, podendo informar sobre o nível de conhecimento consciente e não
verbalizado já construído pela criança. Desta forma, a tarefa de erro intencional pode ser
um importante instrumento a ser utilizado pelo professor em sala de aula, pois facilita a
identificação do nível de conhecimento ortográfico que a criança possui.

ABSTRACT
MEIRELES, Elisabet de Sousa. The task of Intentional Error predicts the spelling
competence of a Child? – Research about the morphosyntax-contextual aspects of the
Portuguese Language. Orientadora: Jane Correa. Rio de Janeiro: UFRJ/IP;
CAPES e CNPq, 2004. Dissertação (Mestrado em Psicologia).
This study tries to investigate the efficiency of the task of the intentional error in
predicting the spelling performance of children at school age. The task of the intentional
error consists in the deliberate transgression of the child on his/her writing production.
Taking this into consideration, it would be possible to evaluate the level of knowledge
which has already been developed in relation to the spelling, since to make this kind of
violation it would be necessary to master the rule or the principle which is being
mentioned. Fifty-two second and fourth-grade children from a public middle school in RJ
took part in this research. Dictations and tasks of intentional error were applied, in which
morphosyntax and contextual regularities of the Portuguese Language were approached.
The results indicated that the task of the intentional error is related to the spelling
competence when talking about the acquisition processes of spelling,which may inform
about the conscious and non verbal knowledge already built by the children. This way, the
task of the intentional error may be an important instrument to be used by the teacher in a
classroom, since it makes easier the identification of the spelling knowledge that the child
dominates.

SUMÁRIO
Páginas
RESUMO VII
ABSTRACT VIII
1. INTRODUÇÃO 1
2. ORTOGRAFIA DA LÍNGUA PORTUGUESA 3
3. ESTUDOS SOBRE ORTOGRAFIA 7
3.1. Estudos sobre a Descrição do Desempenho Ortográfico 7
3.2. Estudos sobre a Relação entre Competências Metalingüísticas e
Desempenho Ortográfico
3.3. Estudos sobre Desenvolvimento da Escrita Ortográfica 17
4. O DESEMPENHO ORTOGRÁFICO DA CRIANÇA E A
TRANSGRESSÃO INTENCIONAL DA NORMA ORTOGRÁFICA
5. QUESTÕES ACERCA DA PESQUISA 39
6. METODOLOGIA 41
6.1. Participantes 41
6.2. Tarefas propostas 41
6.2.1. Medidas de Desempenho Ortográfico 41
6.2.2. Tarefas de Erro Intencional 43
6.3. Procedimento 44
12
27

7. ANÁLISE DOS RESULTADOS 46
7.1. Análise dos Contextos Ortográficos Específicos 46
7.1.1. Desempenho ortográfico das crianças 48
7.1.1.1. Uso do r e rr 48
7.1.1.2. Utilização de m e n diante de consoantes (Nasalização) 50
7.1.1.3. Regras Morfossintáticas 52
7.1.1.4. Análise conjunta das diferentes regras ortográficas investigadas 53
7.1.2. Desempenho das crianças na Tarefa de Transgressão Intencional 57
7.1.2.1. Uso do r e rr 57
7.1.2.2. Utilização de m e n diante de consoantes (Nasalização) 60
7.1.2.3. Regras Morfossintáticas 62
7.1.3. Relação entre desempenho na tarefa de erro intencional e escores nas
tarefas de avaliação da ortografia
7.2. Análise Geral do Desempenho das Crianças 69
7.2.1. Erros Ortográficos 70
7.2.2. Erros Intencionais 77
7.2.3. Relação entre Erro Intencional e Erro Ortográfico 84
8. CONCLUSÃO E DISCUSSÃO FINAL 87
8.1. Influência da escolaridade sobre o desempenho ortográfico e a tarefa de
erro intencional
64
88

8.2 Regularidades Contextuais e Morfossintáticas 90
8.3 Relação do Erro Intencional com Desempenho Ortográfico 93
8.4 Diferenças nos estudos de Cavalcante (2000) e Morais (1996, 1998, 2000) 95
8.5 Implicações Educacionais 97
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 100

ÍNDICE DE QUADROS, TABELAS, FIGURAS E GRÁFICOS
Páginas
Quadro 1: Classificações do Sistema Ortográfico 6
Tabela 1: Proporção Média de Acertos na Regra de Contexto de
Uso do r e rr
Tabela 2: Proporção Média de Acertos na Regra de Contexto de
Nasalização diante de Consoantes
Tabela 3: Proporção Média de Acertos nas Regras
Morfossintáticas
Figura 1: Dendograma do Ditado de Palavras para a 2 a série 54
Tabela 4: Esquema de Aglomeração no Ditado de Palavras para
a 2 a série
Figura 2: Dendograma do Ditado de Palavras para a 4 a série 55
Tabela 5: Esquema de Aglomeração no Ditado de Palavras para
a 4 a série
Figura 3: Dendograma do Texto para a 2 a série 55
Tabela 6: Esquema de Aglomeração no Texto para a 2 a série 56
Figura 4: Dendograma do Texto para a 4 a série 56
Tabela 7: Esquema de Aglomeração no Texto para a 4 a série 56
48
50
52
54
55

Tabela 8: Proporção Média de Erros Intencionais na Regra de
Contexto de Uso do r e rr
Tabela 9: Proporção Média de Erros Intencionais na Regra de
Contexto de Nasalização
Tabela 10: Proporção Média de Erros Intencionais nas Regras
Morfossintáticas
Tabela 11: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos no contexto /R/ intervocálico
Tabela 12: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos na nasalização com m
Tabela 13: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos na nasalização com n
Tabela 14: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos no sufixo eza
Tabela 15: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos no contexto /R/ consoante
Tabela 16: Análise de Regressão Múltipla para a Proporção
Média de acertos no contexto /R/ vogal nasal
Gráfico 1: Porcentagem de Erros Ortográficos cometidos pelas
crianças no Ditado de Palavras
Gráfico 2: Porcentagem de Erros Ortográficos cometidos pelas
crianças no Texto
58
61
63
66
67
67
68
68
69
74
74

Tabela 17: Número médio de Erros Ortográficos 76
Gráfico 3: Porcentagem dos Tipos de Erros Intencionais
cometidos pelas crianças no Ditado de Palavras
Gráfico 4: Porcentagem dos tipos de Erros Intencionais
cometidos pelas crianças no Texto
Tabela 18: Número médio de Erros Intencionais 83
Tabela 19: Análise de Regressão Múltipla para o Erro
Ortográfico e os Erros Intencionais Sofisticados
Tabela 20: Análise de Regressão Múltipla para o Erro
Ortográfico e os Erros Intencionais Incipientes (Categoria 10)
81
81
85
86

ANEXOS
ANEXO I – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
ANEXO II – Lista de palavras infreqüentes utilizadas no ditado de palavras
ANEXO III – Lista de palavras contendo regularidades morfossintáticas e
contextuais utilizadas no ditado do texto
ANEXO IV – Protocolo do ditado de palavras
ANEXO V – Respostas do Protocolo do ditado de palavras
ANEXO VI – Texto para ditado
ANEXO VII – Protocolo para ditado do texto

1. INTRODUÇÃO
A aprendizagem da ortografia é muito mais do que a simples memorização de
regras, implicando a compreensão e domínio de princípios gerativos que vão determinar
a escrita de palavras. Este não é um trabalho simples: a ortografia possui diversas
facetas que devem ser consideradas pelo aluno, já que suas regras não são de uma
mesma natureza e envolvem diferentes competências para sua aquisição. A criança
possui, então, um papel ativo neste processo de construção e re-construção da língua
escrita. Os erros cometidos por elas devem ser encarados não como cópias imperfeitas,
mas como tentativas válidas baseadas em suas idéias sobre a escrita. Portanto, as
produções infantis refletem o nível de elaboração alcançado sobre o conhecimento
ortográfico.
Saber grafar corretamente uma palavra pode implicar diferentes níveis de
conhecimento: desde a realização competente da tarefa à capacidade de verbalização da
norma ortográfica ou, até mesmo, da sua inexistência.
Neste estudo procuramos acessar o conhecimento que a criança tem sobre os
aspectos regulares e irregulares da Língua Portuguesa, especialmente as regularidades
contextuais e morfossintáticas. A tarefa de erro intencional foi o foco da investigação.
Nesta tarefa, a criança deve cometer uma transgressão proposital sobre sua produção
escrita. O objetivo principal deste estudo foi verificar se a tarefa de erro intencional
estaria relacionada ao desempenho ortográfico da criança. Esperava-se que este
instrumento metodológico acessasse o nível de conhecimento que a criança tenha
elaborado sobre a ortografia.
Inicialmente foram descritos os diversos aspectos ortográficos que constituem e
regem o funcionamento da Língua Portuguesa. Para escrever de acordo com a norma
vigente, a criança precisa ter conhecimento sobre estes aspectos regulares e irregulares
do português.
1

Em seguida, foram abordados diversos estudos sobre a aquisição da ortografia,
que indicam que sua aprendizagem implica um processo gerativo, no qual a criança
constrói hipóteses acerca da escrita que vão sendo reformuladas a partir das
informações que esta vai recebendo. Paulatinamente, a criança vai compreendendo o
emprego de determinado contexto ortográfico e vai aplicando seu conhecimento em sua
produção escrita. Isto requer, como mostram os estudos, o desenvolvimento de
competências metalingüísticas necessárias à aprendizagem da leitura e da escrita.
Posteriormente, foram descritos estudos que procuraram associar a tarefa de erro
intencional ao desempenho ortográfico da criança. Discordâncias sobre a eficácia deste
instrumento em acessar o conhecimento da criança sobre ortografia foram encontradas.
Estes resultados foram discutidos e atribuídos a diferenças metodológicas, o que deu
origem ao presente estudo.
O presente estudo procurou investigar a relação da tarefa de erro intencional
com a competência ortográfica da criança. Para isto, foram analisados contextos
ortográficos específicos referentes às regras de contexto (uso do r e rr e nasalização
diante de consoantes) e às regras morfossintáticas (sufixos esa, eza e oso) e também o
desempenho geral das crianças nas tarefas, onde foram considerados contextos
ortográficos além dos críticos. A influência da escolaridade foi examinada, bem como o
tipo de tarefa utilizada.
Por fim, os resultados encontrados foram analisados e discutidos à luz das
evidências empíricas presentes na literatura e implicações educacionais foram
suscitadas.
2

2. ORTOGRAFIA DA LÍNGUA PORTUGUESA
A Língua portuguesa é regida pelo sistema alfabético de escrita, onde os sons da
fala são representados graficamente. Entretanto, para escrever corretamente a criança
não poderá se basear apenas no conhecimento de regras mais básicas de
correspondência grafofônica, pois nem sempre poderá fazer a transcrição literal do que
fala para o que escreve. Os erros cometidos pelas crianças nesta fase estão intimamente
relacionados com a impossibilidade de se escrever certas palavras da forma como estas
são pronunciadas.
Para escrever convencionalmente, a criança terá que se preocupar com os
aspectos ortográficos da língua, que vão constituir uma nova fonte de dificuldades para
ela. A ortografia possui diversas facetas que devem ser consideradas pelo aluno, já que
as suas regras não são da mesma natureza e envolvem diferentes competências para sua
aquisição. A criança terá, então, que realizar análises mais complexas da língua. Em
alguns momentos precisará atentar para a posição de determinada letra na palavra, em
outros precisará observar a classe gramatical a qual a palavra pertence, entre outras
estratégias que precisará utilizar.
Esta fase, na qual a criança passará a considerar normas referentes à escrita
correta de palavras onde não há uma correspondência biunívoca entre letra e som,
corresponderia ao estágio pós-alfabético da escrita conforme descrito por Nunes,
Buarque e Bryant (1992). Estas normas incluem regras contextuais referentes à própria
representação fonológica e outros fatores como a sintaxe e a semântica.
A ortografia surge como uma necessidade de tornar a língua unificada para
facilitar a comunicação entre as pessoas (Morais 1998, 1999). É importante que exista
um código único que seja compreendido e utilizado por todos. Em virtude disto, as
regras e normas ortográficas foram estabelecidas não por algum caráter óbvio, mas a
partir de uma convenção social. Daí a grande dificuldade enfrentada pelos escritores
3

iniciantes na composição de seus textos. A criança terá que passar por um período de re-
construção desta convenção.
Para a reprodução da grafia convencional é necessário um trabalho cognitivo
complexo por parte do aprendiz. Aspectos fonológicos, morfológicos, sintáticos,
semânticos e pragmáticos devem ser considerados pelo sujeito, implicando a elaboração
de conhecimentos lingüísticos variados (Morais, 1999).
A língua portuguesa não pode ser considerada absolutamente regular do ponto
de vista ortográfico. Aspectos regulares e irregulares do português precisam ser
compreendidos para a escrita correta de palavras. As classificações do sistema
ortográfico apresentadas por Morais (1998), Faraco (1992) e Lemle (1987) serão
abordadas a seguir.
Morais (1998) faz uma distinção entre as ortografias regulares e irregulares. As
regulares são passíveis de compreensão das regras subjacentes permitindo uma escrita
baseada em normas ortográficas, enquanto as irregulares dependeriam da memorização
para escrita correta. Haveria três tipos de relações regulares: diretas, contextuais e
morfológico-gramaticais.
Na relação regular direta, cada letra corresponde a apenas um som e vice-versa,
independente de sua posição na palavra. Isto implica numa regularidade absoluta entre
letra e som. Constituem este grupo as letras . Podemos citar como
exemplo as palavras pato, capa e vatapá, onde a letra p é representada pelo mesmo
fonema, independente da posição que ocupe na palavra. Em Faraco (1992) esta
categoria corresponderia à relação biunívoca entre unidades sonoras e letras e em Lemle
(1987) seria denominada como casamento monogâmico entre sons e letras.
Para Morais (1998), as relações regulares contextuais se referem àquelas em que
é possível prever a escrita correta da palavra levando-se em consideração o contexto,
isto é, a posição que a letra ocupa na palavra ou a letra subseqüente. Por exemplo, a
nasalização da sílaba que vier antes das letras e deve ser obtida pelo uso da
4

letra , como em pomba e tampa e não através da letra , que deve ser utilizada
no restante dos casos, como em canto e voando.
Nos casos em que fosse necessário recorrer à categoria gramatical e à
morfologia para obter a grafia correta de uma palavra, estaríamos lidando com as
relações regulares morfológico-gramaticais. Escolher entre o sufixo EZA ou ESA vai
depender da categoria gramatical da palavra em questão: caso seja um adjetivo derivado
de substantivo será escrita com a letra (chinesa, consulesa), mas se for um
substantivo derivado de adjetivo deverá ser escrita com a letra (realeza, pureza).
Esta categoria juntamente com as relações contextuais estaria incluída nas relações
cruzadas descrita por Faraco (1992) e na poligamia entre sons e letras de Lemle (1987).
Entretanto, apenas em Morais (1998) encontramos as relações morfossintáticas como
uma categoria à parte e com uma descrição específica.
Na relação cruzada descrita por Faraco (1992), a mesma letra pode representar
sons diferentes como a letra nas palavras sapato e casa. Outra possibilidade é
diferentes letras estarem representando um mesmo som como é o caso da letra na
palavra copo e do dígrafo qu na palavra quilo. Em Lemle (1987) esta descrição é
encontrada como teoria poligâmica entre sons e letras. Uma parte destas relações
cruzadas tem sua escrita previsível a partir do contexto em que a letra está inserida.
Um último caso se aplicaria às irregularidades da língua, onde não há um
princípio gerativo subjacente que indique a forma correta de grafar a palavra. Esta
categoria é chamada por Faraco (1992) de variação imprevisível das relações cruzadas e
por Lemle (1987) de concorrência, pois diferentes grafemas em uma mesma posição
concorrem para representar o mesmo fonema.
Como não existem regras a serem seguidas, não há como prever a escrita destas
palavras. Este é o caso das palavras sino, cidade e auxílio que possuem o mesmo
fonema /s/ sem ter uma norma que justifique a escolha desta ou daquela letra. Outras
estratégias para a escrita destas palavras se tornam necessárias neste caso, como
recorrer a etimologia, por exemplo. Para Morais (1998), a memorização destas palavras
seria a forma mais eficaz de evitar o erro.
5

A classificação do sistema ortográfico apresentada por Faraco (1992) é similar à
de Lemle (1987), diferindo essencialmente nas nomenclaturas empregadas por cada
autor (ver quadro 1). No entanto, ambas possuem uma divergência com a classificação
proposta por Morais (1998) quanto às relações regulares contextuais e às relações
regulares morfológico-gramaticais. Para Faraco (1992) e Lemle (1987), estas
constituiriam uma única categoria, a relação cruzada ou teoria poligâmica entre letras e
sons.
Quadro 1. Classificações do Sistema Ortográfico
Direta - Relação Biunívoca - Casamento Monogâmico
Regular Contextual Relações Cruzadas – Teoria Poligâmica
Relação Morfológico-gramatical
Legenda:
Irregular – Variação imprevisível das relações cruzadas – Concorrência
Morais (1998)
Faraco (1992)
Lemle (1987)
Por considerar, de maneira mais específica, a natureza da relação envolvida na
escrita das palavras, a classificação formulada por Morais (1998) parece ser mais
pertinente para sua utilização pelo professor em sala de aula. Sua categorização do
sistema de escrita facilita a sistematização do ensino da ortografia e fornece aos
professores ferramentas contextuais para compreender os princípios gerativos
envolvidos no aprendizado da ortografia.
6

3. ESTUDOS SOBRE ORTOGRAFIA
De forma geral, os estudos sobre a aquisição da ortografia podem ser divididos
em três classes. No primeiro grupo, os estudos que visam descrever o desempenho
ortográfico, avaliando os tipos de erros ortográficos cometidos pelas crianças. O
segundo grupo compreende os estudos que procuraram estabelecer uma relação entre
competências cognitivas e a aprendizagem de aspectos ortográficos específicos. Por
último, estão os estudos que tiveram por objetivo investigar o processo de
desenvolvimento da ortografia. Estes três tipos de estudo serão mais detalhados a
seguir.
3.1. Estudos sobre a Descrição do Desempenho Ortográfico
Carraher (1985, ver também Nunes, 1992) investigou o desenvolvimento da
escrita ortográfica analisando erros cometidos por crianças de 1 a a 4 a séries. Para isto,
foram analisados dados provenientes de três fontes: a) ditado de palavras reais e
inventadas, realizado com crianças de uma escola particular de Recife; b) redações com
tema livre de uma amostra de crianças de um colégio próximo de Recife; e c)
acompanhamento da produção escrita de uma criança pelos dois anos iniciais de
escolarização.
Os erros cometidos pelas crianças foram classificados em sete diferentes
categorias, conforme descrito a seguir:
1) Erros de transcrição de fala – neste tipo de erro a criança escreve a palavra
exatamente da forma como esta é pronunciada. Como não há uma relação
biunívoca absoluta entre fala e escrita, a representação escrita de cada som que
se ouve não é suficiente para a escrita correta de palavras. A criança, por
exemplo, escreve istrela para a palavra estrela porque é desta forma que ela a
7

pronuncia. Outros exemplos de erro que Carraher (1985) classificou nesta
categoria: bulacha, nuveim e cauça.
2) Supercorreção – a criança, ao se dar conta de que nem sempre é possível
representar pontualmente os sons da fala, pode tentar corrigir os erros de
transcrição da fala, generalizando o uso de certas grafias inadequadamente. É o
que acontece quando a criança escreve vasolra no lugar de vassoura. É provável
que, anteriormente, a criança tenha cometido um erro ao escrever, por exemplo,
sal com o grafema ao invés de e passe, a partir disto, a corrigir casos
semelhantes, mesmo quando a retificação não se aplica. Outros exemplos:
emitação ao invés de imitação ou fragio para frágil.
3) Não utilização de regras de contexto – a escolha de certos grafemas é feita a
partir do contexto em que estes estão inseridos, ou seja, de acordo com a letra
antecedente e/ou subseqüente e pela sua posição dentro da palavra. Ao cometer
este tipo de erro, a escrita da criança não se baseia na regra contextual que
determina a opção correta para grafar determinada palavra. Como exemplo, o
uso das letras e , ambas marcadoras da nasalização, é determinado por
uma regra de contexto: o só pode ser colocado diante de e ,
enquanto o deve ser usado antes das demais consoantes. Então, ao escrever
camtor, a crianças estaria infringindo uma regra contextual. Outros exemplos:
rrolha, profesora.
4) Não marcação da nasalização – esta categoria se refere à não utilização pelas
crianças de nasalização de palavras. É muito comum que elas escrevam, por
exemplo, oça no lugar de onça ou roma no lugar de romã, por não considerarem
as marcas de nasalização quando estas são necessárias.
5) Erros relacionados à origem da palavra – para a escrita de determinadas palavras
é necessário se basear na origem das mesmas, pois o contexto ou o som não
indicam a grafia correta. Este é o caso, por exemplo, do uso de ou
para representar /š/ na palavra bolacha. Além da pronúncia não diferir com o
uso de uma ou outra consoante, não há uma regra contextual que indique qual
8

seria a letra mais adequada. Para Carraher (1985) a memorização facilitaria a
escrita, inclusive das palavras derivadas destes morfemas. Exemplos: bulaxa
(bolacha), jema (gema), omen (homem).
6) Troca entre letras – nesta categoria se encaixam a troca entre letras que possuem
som semelhante, facilmente confundidas pelos alunos. Normalmente, as crianças
fazem trocas entre consoantes com sons surdos e sonoros, que apresentam traços
distintivos no som. Alguns exemplos: encrassado (engraçado), blástico
(plástico), tivam (divã).
7) Dificuldade na escrita de sílabas complexas – as sílabas que se distanciam do
padrão CV (consoante + vogal), que é bastante enfatizado no início da
escolarização, geram certa dificuldade na sua escrita. As crianças tendem a
omitir ou incluir letras para deixar a sílaba num formato mais simples. Exemplos
disto são as palavras guarda e jornalismo que, muitas vezes, aparecem sem o
, letra que nesta posição da palavra está marcando o travamento da sílaba
(guada e jonalismo).
No ditado de palavras, para garantir uma escrita produtiva e evitar uma escrita
baseada apenas na reprodução contínua, foram utilizadas palavras pouco conhecidas
para as crianças, além de pseudopalavras ou palavras inventadas compostas por
morfemas existentes na língua. O critério para seleção das palavras foi a sua pouca
utilização nos livros didáticos de Português destinados àquelas séries. Como as palavras
mais infreqüentes para as séries iniciais não são as mesmas para as séries posteriores,
foi aplicada uma lista diferente de palavras para cada uma.
A maioria dos erros cometidos pelas crianças pôde ser enquadrada nas
categorias acima descritas. No entanto, Carraher (1985) descreve três tipos de erros que
não se encaixaram: trocas por palavras que apresentam certa similaridade na grafia
(bacalhau no lugar de batalhão), omissão ou acréscimo de acentuação (revolver,
ônesto) e erros “aleatórios”, ou seja, sem justificativa aparente (maham ao invés de
manhã).
9

Carraher (1985) observou que, com a escolarização, há uma tendência ao
decréscimo de erros de transcrição da fala, erros por desconhecimento da etimologia da
palavra e erros por dificuldade na escrita de sílabas complexas. No entanto, o uso de
palavras diferentes para cada série pode ter interferido na distribuição dos erros pelas
categorias, o que dificulta uma comparação entre os desempenhos observados em cada
série.
Os erros ortográficos das palavras reais e das pseudopalavras foram classificados
de forma muito semelhante. Além disto, nas palavras inventadas, apesar de ser
foneticamente plausível que sufixos tais como agem e oso fossem escritos com outros
grafemas (ajem, ozo), com o aumento da escolaridade as crianças tenderam a utilizar os
sufixos com a grafia convencional. Exatamente por tratar-se de palavras inexistentes
não se pode dizer que o correto emprego destes morfemas se baseie necessariamente em
mero treino e memorização.
Com relação às redações de tema livre, os erros ortográficos observados foram
classificados segundo as mesmas categorias utilizadas no ditado de palavras. Os erros
por transcrição da fala foram os mais freqüentes em todas as séries, enquanto que a não
utilização dos marcadores de nasalização foi diminuindo a partir da 2 a série. Os erros
por troca entre letras foneticamente semelhantes não foram relevantes em nenhuma das
séries estudadas.
A partir da utilização de textos, houve o aparecimento de uma nova categoria de
erro: a dificuldade de segmentação. A criança pode não segmentar (tipego) ou fazê-lo
indevidamente (a legre). Sua ocorrência foi mais presente nos textos das crianças de 1 a
e 2 a séries, apresentando um grande declínio a partir da 3 a ano.
Objetivando investigar o desenvolvimento da escrita ortográfica por um período
mais extenso de tempo, Carraher (1985) analisou as redações de tema livre de uma
criança nos dois anos iniciais de alfabetização. O objetivo deste estudo foi verificar se
as categorias utilizadas anteriormente também serviram para classificar os erros
cometidos. Os erros pela transcrição de fala e pela não marcação da nasalização vão
diminuindo ao longo do tempo, enquanto que os erros por supercorreção apresentam um
10

aumento considerável, indicando um trabalho intelectual constante da criança sobre as
regras da língua. De fato, conforme a criança vai percebendo que a escrita não é a
correspondência perfeita da fala, parece haver uma tentativa, muitas vezes inadequada,
de corrigir os erros de transcrição da fala.
Carraher (1985) concluiu que os erros ortográficos cometidos pelas crianças não
são casuais, mas indicam uma compreensão da escrita, que vai se modificando
conforme vão sendo adquiridos novos conhecimentos sobre a língua. Durante este
processo, a criança vai estabelecendo algumas regularidades que auxiliam na utilização
do sistema de escrita.
A classificação dos erros ortográficos apresentada por Carraher (1985)
estabelece uma concepção relevante acerca dos obstáculos encontrados pela criança na
aquisição da língua escrita. No entanto, algumas das categorias descritas deveriam ser
reelaboradas. A classificação da nasalização se refere apenas a ausência de marcação,
não incluindo a utilização inadequada do marcador. Carraher (1985) também não faz
distinção entre os erros pelo desconhecimento da origem da palavra e as dificuldades
com regras morfossintáticas, agrupando-os em uma mesma categoria.
De qualquer forma, o estudo de Carraher (1985) contribui para uma visão mais
adequada e específica acerca das dificuldades na escrita com as quais as crianças se
deparam do que a avaliação, comumente realizada por professores, que se baseia apenas
na reprodução correta da grafia convencional da palavra. A natureza do erro aponta para
um nível de compreensão acerca dos aspectos lingüísticos. Ao perceber que as relações
entre letra e som não apresentam uma regularidade absoluta, gradualmente a criança vai
procurando reconhecer as particularidades que vão determinar a escrita correta das
palavras (Correa, 2001) e vai aprendendo a lidar com as regularidades e irregularidades
da língua.
11

3.2. Estudos sobre a Relação entre Competências Metalingüísticas e Desempenho
Ortográfico
Alguns estudos procuraram estabelecer uma relação entre diferentes habilidades
cognitivas e aspectos ortográficos específicos. Bryant, Nunes e Bindman (2000)
investigaram a influência da consciência morfossintática 1 sobre a escrita de palavras nas
quais é necessária a consideração de aspectos morfológicos e sintáticos para obtenção
da grafia correta. O foco da investigação foi o emprego do apóstrofo, que
corresponderia, na Língua Portuguesa, a um pronome possessivo.
Crianças inglesas de 2 a e 4 a séries foram acompanhadas durante dois anos.
Inicialmente, estas crianças foram testadas quanto à consciência fonológica 2 ,
consciência sintático-semântica 3 e consciência morfossintática. Em um momento
posterior, foi realizada uma tarefa de escrita, onde foi pedido as crianças que
escrevessem palavras que continham caso genitivo (por ex. boy´s), no qual a letra s
acompanha o apóstrofo para marcar a posse; e plural nominativo ou acusativo (por ex.
boys), no qual a letra s indica quantidade.
O desempenho das crianças na tarefa de escrita foi melhorando com o avanço da
idade. Os resultados mostraram que apenas a consciência morfossintática influencia na
escrita destas palavras. As crianças que apresentaram melhor desempenho nas tarefas de
consciência morfossintática discriminaram melhor onde deveriam empregar o apóstrofo,
limitando seu uso às palavras genitivas. A consciência fonológica e a consciência
sintático-semântica não foram boas preditoras da utilização adequada do pronome
possessivo.
Portanto, cada uma das diferentes competências metalingüísticas está
relacionada a aprendizagem de aspectos lingüísticos específicos. O aprendizado de
1 A consciência morfossintática implica na reflexão e manejo consciente sobre as estruturas morfológica e
sintática das frases, ou seja, sobre a formação da palavra e a estrutura gramatical das frases (Sá, 1999,
Leal e Roazzi, 2000, Correa, 2001).
2 A consciência fonológica se refere à capacidade de reflexão e manipulação intencional sobre as
unidades sonoras da palavra (Gombert, 1990, Correa, 2001).
3 A consciência sintático-semântica é a habilidade de refletir e manipular de forma intencional a estrutura
gramatical e o significado das sentenças (Rego, 1995).
12

palavras cuja grafia é determinada por aspectos morfossintáticos é suscetível a
influência do nível de desenvolvimento da consciência morfossintática, mas não sofre
influência direta nem da consciência sintático-semântica nem da consciência
fonológica.
Rego e Buarque (1997) realizaram estudo longitudinal para examinar a
influência da consciência fonológica e da consciência sintática na aquisição de regras
ortográficas. Foram investigadas regras envolvendo aspectos morfossintáticos da língua
e regras que se baseiam em uma análise do contexto fonológico para a escrita correta
das palavras. Participaram do estudo 46 crianças de uma escola particular, que já
haviam sido testadas em relação à consciência sintática e à consciência fonológica no
início de sua alfabetização, tendo sido constatado que estas competências
metalingüísticas não trouxeram benefícios significativos para a leitura destas crianças.
Nesta investigação, as crianças foram avaliadas quanto à consciência sintática e à
consciência fonológica no início da 1 a série e quanto à competência ortográfica, no final
da 1 a série e no final da 2 a série.
No final da 1 a série, a competência ortográfica foi medida através de ditado de
palavras isoladas e ditado de palavras inseridas em sentenças e texto. Foram utilizadas
palavras e pseudo-palavras que continham regularidades contextuais (por ex. uso dos
dígrafos rr e qu) e regularidades morfossintáticas (por ex. a representação de /ow/ em
verbos e substantivos). No final da 2 a série, foi aplicada nova testagem sobre os mesmos
contextos abordados anteriormente e foi refeita a tarefa de categorização de palavras
como medida da consciência sintática.
Os resultados indicaram relação entre consciência sintática e a aquisição de
regras que implicam em uma análise gramatical. O conhecimento sobre os morfemas
indicadores do tempo passado, por exemplo, seria facilitado pela consciência sintática e
não dependeria nem da capacidade de leitura nem da compreensão de textos. Um outro
dado relevante se refere a não importância da consciência sintática como determinante
na aquisição de regras de contexto grafofônico, que seriam influenciadas pela
consciência fonológica.
13

Desta forma, consciência fonológica e consciência sintática estariam
relacionadas com a aprendizagem de regras ortográficas específicas. A aquisição de
regras de contexto seria facilitada pelo desenvolvimento da consciência fonológica,
enquanto que aspectos ortográficos ligados à morfologia e à sintaxe estariam
relacionados à consciência sintática.
Sá (1999), através de estudo transversal, procurou examinar se a consciência
morfossintática estaria relacionada à aquisição da ortografia. Participaram deste estudo
sessenta crianças brasileiras de 2 a e 3 a séries do ensino fundamental de uma escola
particular. Foram realizadas tarefas de avaliação da consciência morfossintática e do
desempenho ortográfico.
Para medir a competência ortográfica das crianças foram utilizadas tarefas de
ditado de palavras e escrita espontânea. O ditado de palavras era constituído por verbos
de 2 a e 3 a conjugação do pretérito perfeito do modo indicativo (exs. escreveu, partiu) e
do pretérito imperfeito do modo subjuntivo (exs. comesse, descobrisse), palavras de
outras categorias gramaticais cuja terminação apresenta similaridade fonética mas não
gráfica com a dos verbos já indicados (exs. agradável, fértil, merece, maluquice) e
palavras inventadas para controlar o efeito da memorização (exs. desumiu, aflitisse,
sujável, atorece). O objetivo era investigar a utilização das terminações eu, iu, isse e
esse, cuja escrita correta depende de considerações morfossintáticas.
Os resultados indicam que há uma relação significativa entre a consciência
morfossintática e o desempenho ortográfico apresentado pelas crianças. Quanto maior o
nível de consciência morfossintática, maior o número de acertos nas palavras
investigadas.
Guimarães (2003) investigou a importância da consciência fonológica e
consciência sintática na leitura e escrita de palavras isoladas. Participaram da pesquisa
crianças de 1 a , 3 a e 4 a séries do ensino fundamental de escola pública de Curitiba.
Foram formados três grupos, sendo que os dois últimos foram equiparados com
o primeiro pelo nível de leitura e escrita ou pela idade cronológica: a) 20 crianças com
14

dificuldade de aprendizagem e idade média de 11 anos e 6 meses; b) 20 crianças sem
dificuldade de aprendizagem e idade média de 7 anos e 1 mês, mas com mesmo nível de
leitura e escrita do primeiro grupo; e c) 20 crianças sem dificuldade de aprendizagem e
idade média de 11 anos e 1 mês, com nível de leitura e escrita superior aos dois
primeiros grupos. Foram realizados teste de inteligência, tarefa de memória verbal,
tarefas de leitura e escrita de palavras reais e inventadas, tarefas de consciência
fonológica e tarefas de consciência sintática.
Quanto à avaliação da consciência fonológica, o grupo das crianças com
dificuldade de aprendizagem obteve desempenho inferior nas tarefas em relação aos
outros dois grupos, especialmente no que concerne à consciência fonêmica. No entanto,
nas tarefas de consciência sintática, a performance do grupo de crianças com
dificuldade de aprendizagem foi inferior ao grupo emparelhado pela idade cronológica,
mas não em relação ao grupo com o mesmo nível de leitura e escrita.
Para Guimarães (2003), estes resultados indicam que a consciência fonológica
promove o desenvolvimento da leitura e escrita, enquanto a consciência sintática seria
desenvolvida a partir do contato da criança com material escrito. A dificuldade das
crianças na aprendizagem deve-se, portanto, a problemas na análise fonológica das
palavras, o que atrapalharia, por conseguinte, a ampliação da consciência sobre a
estrutura gramatical. Entretanto, deve ser feita uma ressalva ao estudo realizado por
Guimarães (2003), em relação às palavras utilizadas para avaliar o desempenho
ortográfico.
Como indicado nos estudos de Bryant, Nunes e Bindman (2000) e Rego e
Buarque (1997), diferentes competências metalingüísticas parecem influenciar a escrita
de diferentes aspectos lingüísticos. No entanto, as palavras utilizadas por Guimarães
(2003) não foram controladas quanto aos diferentes contextos ortográficos envolvidos.
Além disto, pode-se observar que poucas palavras deste estudo necessitavam de pistas
gramaticais para determinação da grafia correta.
Os resultados obtidos nos estudos de Bryant, Nunes e Bindman (2000), Rego e
Buarque (1997) e Sá (1999) sugerem a existência de uma relação entre competências
15

metalingüísticas e o desenvolvimento da leitura e da escrita, sendo que diferentes
competências facilitariam a aquisição de diferentes aspectos ortográficos. A consciência
morfossintática parece influenciar a escrita de palavras cuja grafia correta implica na
compreensão de aspectos morfossintáticos da língua, enquanto que a consciência
fonológica estaria relacionada à aprendizagem das regularidades contextuais.
16

3.3. Estudos sobre o Desenvolvimento da Escrita Ortográfica
Os estudos desta seção voltam-se para a investigação da transição de uma fase
alfabética de escrita para uma ortográfica, em que a criança passaria a lidar com
aspectos da Língua que iriam além das correspondências básicas entre letra e som.
Nunes, Bryant e Bindman (1997) procuraram compreender como ocorre esta passagem
e o que provocaria esta transição. Este trabalho procurou investigar exclusivamente a
aquisição de um padrão ortográfico relacionado à gramática 4 - o sufixo ed, marcador do
passado dos verbos regulares em inglês. Durante três anos 5 , crianças inglesas com
escolaridade entre a 2 a e 4 a série participaram de sessões onde foram realizadas tarefas
de escrita, tarefas de consciência gramatical e testes padronizados de inteligência e
leitura. As palavras da tarefa de escrita se constituíam de verbos regulares no passado
(terminação ed), verbos irregulares no passado e não verbos, cuja consoante final
possuía som /t/ ou /d/.
Os resultados deste estudo apontam a existência de um percurso no
desenvolvimento da escrita ortográfica, que vai além da simples passagem da não
utilização de aspectos morfossintáticos para seu emprego correto na escrita. Os autores
propõem um modelo de desenvolvimento da ortografia, que seria constituído por cinco
estágios. A transição de uma fase para outra ocorreria pela crescente experiência com
palavras escritas e pelo progresso das crianças na consciência das relações gramaticais.
No primeiro estágio, pré-fonético, as crianças escrevem sem considerar aspectos
fonéticos ou morfossintáticos. O marcador do passado dos verbos regulares (ed) é
omitido ou são colocadas letras que não guardam nenhuma semelhança fonética ou
gráfica com o sufixo. Este grupo de crianças claramente apresenta dificuldades com as
correspondências mais básicas entre letra e som. Apesar dos autores citarem esta como
sendo a primeira fase de aquisição do sufixo ed, não parece que a criança tenha
estabelecido ainda uma compreensão alfabética da escrita.
4 Os autores utilizam o termo gramática para se referir tanto a aspectos morfológicos quanto sintáticos.
5 O artigo cita apenas uma parte do projeto total, sendo descritas três das seis sessões ocorridas durante
dois anos de trabalho.
17

No segundo estágio, as crianças escrevem tendo como base apenas o som das
palavras, ou seja, utilizam estratégias fonéticas, que são consideradas as mais básicas.
As convenções ortográficas estabelecidas para a escrita de morfemas são ignoradas
pelas crianças. Com isto, o sufixo ed é omitido na produção infantil. Este estágio é
descrito por Nunes et al. (1997) como “fonético”.
Quando as crianças começam a utilizar o sufixo ed para representar o som final
/d/ e /t/, sem se basear numa regra gramatical, trata-se do terceiro estágio. Nesta fase,
apesar das crianças terem percebido que algumas palavras são grafadas com ed no final,
ainda não compreenderam que estas fazem parte de uma categoria específica (verbos).
A característica essencial desta fase é a generalização do uso do sufixo ed também para
os passado dos verbos irregulares e para palavras terminadas em /d/ ou /t/ pertencentes a
outra classe gramatical. O uso do ed estaria sendo feito, portanto, sem que sejam
considerados os aspectos gramaticais envolvidos.
Posteriormente, as crianças passam a limitar o uso do ed somente para verbos no
tempo passado, não fazendo, entretanto, distinção entre os regulares e os irregulares.
Isto sugere que as crianças já identificam a restrição imposta pela gramática, mas não se
deram conta das exceções quanto ao uso adequado do sufixo marcador do passado dos
verbos.
Finalmente, a derivação sufixal ed estaria restrita ao passado dos verbos
regulares, implicando em um entendimento integral acerca de seu uso e função. Esta
última etapa seria decorrente de uma progressiva sofisticação das estratégias utilizadas
pelas crianças, que passariam a levar em conta não apenas os aspectos fonéticos mas
também a morfologia e a sintaxe.
Muitas das crianças que participaram deste estudo escreveram algumas palavras
incorretamente apesar de, em testagens anteriores, já as terem grafado de acordo com a
norma ortográfica. Isto indica que o fato de escrever a palavra de maneira certa não
significa, necessariamente, um conhecimento elaborado sobre o que está convencionado
na língua. Pode estar apenas indicando um conhecimento elementar, sem que haja de
fato um domínio da regra.
18

Os estágios intermediários denotam uma compreensão parcial sobre o aspecto
ortográfico em questão. A derivação sufixal já é utilizada, mas nem sempre de forma
apropriada. Para Nunes et al. (1997), as generalizações que as crianças fazem são
decorrentes de uma simplificação, onde, por ignorar certos aspectos relativos à
ortografia, encontram uma forma alternativa de lidar com a situação com a qual se
deparam. A criança iria, paulatinamente, adquirindo mais conhecimentos a respeito da
norma ortográfica em questão, até atingir um nível de elaboração que lhes permitiria
entender as implicações gramaticais intrínsecas ao emprego do sufixo ed, e utilizá-lo de
forma correta em sua escrita. O progresso no emprego deste conhecimento estaria
vinculado ao aumento da consciência gramatical. As tarefas destinadas a medir a
consciência gramatical foram boas preditoras do desempenho das crianças ao longo das
cinco etapas.
No que concerne à língua portuguesa, Nunes (1992) procurou examinar a
trajetória de erros ortográficos relacionados às regras contextuais, para verificar se estes
são corrigidos simultaneamente pelas crianças ou em momentos diferentes da aquisição
da leitura e da escrita. Para isto, regras cujo ensino não ocorre de forma explícita na
escola foram investigadas através do uso de palavras inventadas que apresentavam
apenas uma pronúncia ou grafia possíveis, não sendo derivadas de palavras primitivas
conhecidas.
Nunes (1992) comparou regras de contexto semelhantes. Nas sílabas átonas em
final de palavras, apesar da pronúncia ser /i/ ou /u/, deve-se usar as letras ou
respectivamente, para grafar corretamente a palavra. O objetivo, então, foi o de verificar
se as crianças aprenderiam a colocar as letras e concomitantemente ou se uma
regra precederia a outra, apesar de serem tão parecidas. Também estaria sendo
examinada a diferença existente entre os processos de leitura e escrita.
Dois grupos de crianças participaram deste estudo. O primeiro grupo era
constituído de trinta e duas crianças de 1 a a 4 a série. Estas crianças fizeram a leitura de
um texto que continha as palavras inventadas juntamente com palavras reais, para que a
história pudesse ter sentido. O segundo grupo era composto por sessenta e quatro
19

crianças de 1 a a 8 a série, que deveriam escrever as palavras inventadas depois que o
pesquisador lesse a história.
Os resultados desta pesquisa indicam que a aquisição de regras ortográficas de
mesma natureza não ocorre simultaneamente pelas crianças. A representação do /u/
átono no final de palavras é aprendido mais rapidamente do que a representação do /i/,
tanto na leitura quanto na escrita. Observou-se também que, na leitura, a utilização das
regras contextuais foi maior do que na escrita. A diferença encontrada entre a leitura e a
escrita provavelmente estaria refletindo as características particulares de cada um destes
processos. Na leitura, as pistas semânticas facilitariam na decodificação do que está
escrito, enquanto que na escrita não haveria este tipo de artifício.
Nunes (1992) conclui que as regras ortográficas não são adquiridas
concomitantemente, pois mesmo aquelas que se apresentam gramaticalmente similares
não são aprendidas pelas crianças ao mesmo tempo. Portanto, cada contexto ortográfico
seria adquirido sem estar subordinado a uma aprendizagem conjunta para regras de
natureza semelhante.
Rego e Buarque (2000) investigaram as dificuldades que as crianças encontram
para escrever regras ortográficas específicas. Foram abordadas regras referentes à
utilização do r e rr e o contraste entre as grafias das terminações ou (presente na 3 a
pessoa do singular do pretérito perfeito de verbos de 1 a conjugação), e or (presente em
substantivos), além da comparação entre o iu (terminação da 3 a pessoa do singular do
pretérito perfeito de verbos de terceira conjugação), io e il (terminações de substantivos
e adjetivos). O estudo envolveu setenta e nove crianças do ensino fundamental em
Recife, divididas em dois grupos: 38 cursavam a 1 a e a 3 a séries de uma escola
particular e 41 cursavam a 2 a e a 4 a séries de uma escola pública.
Foram realizadas duas sessões, no início e no final do ano, e em cada uma foi
aplicado um ditado contendo palavras reais e inventadas. As palavras inventadas foram
incluídas para assegurar uma grafia produtiva, que não pudesse se basear em mera
memorização. O pesquisador lia as frases nas quais as palavras estavam inseridas e as
20

crianças completavam os protocolos recebidos, escrevendo apenas estas palavras
previamente escolhidas nos espaços destinados.
Com relação ao uso do r e rr, foram examinados os contextos /R/ intervocálico,
/R/ inicial, /r/ intervocálico e /R/ entre consoante e vogal (que inclui o /R/ depois de
vogal nasal). O desempenho apresentado pelas crianças nestes contextos foi dividido em
seis categorias:
1) A criança não faz uso do dígrafo, utilizando apenas um r para representar
todos os contextos (Exs. rajão, coredor, omra).
2) A criança passa a utilizar o dígrafo apenas no meio da palavra, sem fazer, no
entanto, discriminações sonoras (Exs. ragão, corredor, onrra).
3) A criança discrimina o uso do r ou rr de acordo com o som apresentado
(Exs. rrajão, corredo, garinpão, onrra)
4) Algumas vezes o contexto /R/ intervocálico é representado com apenas um r
e o contexto /R/ entre consoante e vogal é representado de forma isolada
pelo dígrafo (Ex. guitarista)
5) A criança grafa corretamente os contextos, com exceção do entre consoante
e vogal, que é marcado pelo uso uniforme do dígrafo (Exs. raquetão,
garimpão, genrro).
6) Todos os contextos são representados de acordo com a norma ortográfica
(guitarrista, garimpão, genro).
No início do ano, a categoria 1 foi a mais predominante para as crianças de
menor escolaridade tanto da escola pública quanto da particular. Na segunda testagem,
praticamente todas as crianças se concentraram na categoria 5, com exceção das
pertencentes à 2 a série da escola pública, que permaneceram na categoria 1 de
desempenho. Portanto, as crianças já escreveriam a maior parte dos contextos de forma
apropriada, mas grafavam o /R/ entre consoante e vogal com o dígrafo. A concentração
na categoria 5 parece estar relacionada ao conhecimento de que o dígrafo aparece
21

apenas no meio da palavra e também ao número mais reduzido de palavras na língua
portuguesa que apresentam o contexto /R/ entre consoante e vogal.
O outro aspecto observado foi a diferenciação entre as grafias ou e or. Em
Recife, a pronúncia dos verbos terminados em ou é igual a dos substantivos terminados
em or. Para verificar a aquisição destes aspectos morfossintáticos, a produção escrita
das crianças foi novamente categorizada de acordo com o desempenho apresentado:
1) Utilização da letra para representar a terminação do verbo e do
substantivo (Exs. izagero, jogado).
2) Uso indiscriminado do ou e or.
3) A criança já distingue as palavras gramaticalmente, utilizando ou e ol para
marcar a terminação verbal e o e or para o substantivo (Exs. zangol, calor).
4) A criança escreve corretamente uma das categorias gramaticais, cometendo
erros na outra (Exs. jogou, zombado ou jogool, sombador).
5) Utilização correta das terminações nos verbos e nos substantivos (Exs.
sangou, jogador).
No final do ano letivo, grande parte das crianças se encontravam nas categorias
4 e 5, ou seja, escrevendo corretamente apenas uma das categorias ou grafando as
palavras (verbos e substantivos) corretamente. No entanto, mais uma vez, as crianças da
2 a série da escola pública apresentaram um desempenho inferior, mantendo-se
distribuídas por todas as categorias descritas.
Quanto à aquisição do iu para grafar a 3 a pessoa de verbos de terceira
conjugação no pretérito perfeito e do io e il para grafar substantivos e adjetivos, foram
obtidas as seguintes categorias de desempenho:
1) A criança escreve fazendo uma transcrição da fala e, portanto, utilizando iu
para grafar todas as classes gramaticais, indistintamente (Exs. ouviu, paviu).
22

2) A criança utiliza indiscriminadamente as representações investigadas ou
uma das representações é eleita para representar a terminação de todas as
categorias gramaticais.
3) A representação iu é utilizada apenas em verbos e as outras representações
ainda são utilizadas indiscriminadamente (Ex. partiu, presitio, bario).
4) A criança escreve corretamente as terminações dos verbos, adjetivos e
substantivos (Exs. navio, partiu).
Ao final do ano letivo, em ambas as escolas, o desempenho das crianças se
concentrou na categoria 2 e nenhuma das crianças alcançou a categoria 4. Rego e
Buarque (2000) discutem a diferença existente entre as aquisições dos verbos de
primeira e terceira conjugação, dada a similaridade entre estes contextos ortográficos, e
sugerem que isto seja decorrente da freqüência de ocorrência na língua. É mais comum
que as crianças se deparem com verbos de primeira conjugação do que com os de
terceira, o que poderia estar determinando os resultados encontrados.
Para uma investigação mais acurada acerca do percurso de aprendizagem dos
contextos investigados no estudo de Rego e Buarque (2000) seria interessante que fosse
realizado um estudo longitudinal mais extenso e com um número maior de testagens
durante o período escolar, para acompanhar melhor as diferenças nas performances
individuais ocorridas ao longo do ano.
Monteiro (2000) procurou averiguar como ocorre a aprendizagem de regras
contextuais na leitura e na escrita. Mais especificamente foi analisada a regra de
contexto de uso do entre vogais, tendo sido feita a inclusão do e em início
de palavras para verificar se as crianças fariam generalizações inadequadas da regra
para estes contextos. Quando entre vogais, o som /s/ deve ser representado com o
dígrafo ss, enquanto que para marcar o som /z/ apenas um deve ser utilizado.
Participaram deste estudo 100 crianças de ensino fundamental, abrangendo a
classe de alfabetização até a 4 a série. As crianças realizaram dois tipos de atividades,
compreendendo a leitura e a escrita de palavras reais e inventadas. Os erros cometidos
23

pelas crianças foram analisados em função do padrão de comportamento adotado ao
grafar ou ler as palavras das tarefas, procurando determinar em que período de
compreensão da regra a criança estaria. A partir disto, foram montadas categorias
relativas ao desempenho apresentado pelas crianças, que sugerem a existência de fases
na aprendizagem da regra de contexto de uso do entre vogais. As categorias
referentes à escrita estão descritas a seguir:
1) A criança representa o som /s/ com a letra e o som /z/ com a letra .
Exemplos: vazo, sono, asado.
2) A segunda categoria inclui duas possibilidades de escrita das crianças:
a) A criança percebe que a letra pode representar mais de um som e
faz generalizações para todos os contextos. Exemplos: sacola, sona,
dise.
b) A criança passa a utilizar grafias como s, ss, ç, c e z para representar
os sons /s/ e /z/, algumas vezes empregando corretamente a
representação e em outros fazendo generalizações inadequadas.
Exemplos: pezado, zebra, nosso.
3) A criança emprega corretamente as letras e ou comete apenas erros
eventuais. Exemplo: mesa, zelador, dise.
Na leitura, foram obtidas as seguintes categorias de desempenho:
1) As palavras grafadas com são lidas, independente do contexto, com som
/s/ e as palavras grafadas com são lidas com som /z/. Exemplos: vasso,
zebra.
2) A criança já identifica diferenças na pronúncia do s e ss, mas ainda as
confunde. Exemplos: seco, pessado.
3) A leitura do s, ss e z já é feita apropriadamente, podendo haver erros
casuais.
24

Monteiro (2000) verificou grande semelhança nas estratégias utilizadas pelas
crianças na leitura e na escrita. A leitura se destacou pela maior facilidade que a tarefa
impõe a criança. Entretanto, foram observadas dificuldades parecidas na leitura e escrita
das palavras inventadas. Um outro ponto a ser considerado se refere às etapas de
aquisição do s entre vogais, que indicam que as crianças vão estabelecendo
regularidades para escrever palavras e, pouco a pouco, vão reconstruindo as hipóteses
elaboradas de acordo com as novas informações que lhes são apresentadas.
Os estudos citados neste capítulo apresentam um percurso comum no
desenvolvimento de aspectos ortográficos. Inicialmente a criança escreve as palavras
foneticamente, ou seja, a pronúncia da palavra é representada integralmente na escrita.
Conforme a criança vai tendo contato com novas possibilidades de se grafar
determinado contexto ortográfico, vai havendo uma reestruturação das hipóteses
anteriores a partir das novas informações. Isto gera uma fase de generalizações
indevidas, pois a criança ainda não sabe onde deve empregar a nova grafia, podendo
inclusive cometer erros em palavras que antes escrevia corretamente. Gradualmente, a
criança vai compreendendo as restrições implicadas naquele determinado padrão
ortográfico. Por fim, a criança começa a utilizar adequadamente o contexto ortográfico,
o que indica uma aprendizagem efetiva, com a aquisição de um conhecimento mais
elaborado.
Nos estudos mencionados pode-se observar diferenças em termos da
complexidade apresentada pelos contextos ortográficos. Com isto, o processo de
desenvolvimento apresenta variações de acordo com as particularidades e
especificidades de cada padrão ortográfico investigado. No entanto, isto não invalida
um modelo mais geral de desenvolvimento, pois as características de cada contexto
parecem gerar diferenças em relação à produção, mas não ao processo.
25

4. O DESEMPENHO ORTOGRÁFICO DA CRIANÇA E A TRANSGRESSÃO
INTENCIONAL DA NORMA ORTOGRÁFICA
Investigando a aquisição da norma ortográfica por crianças, Morais (1996, 1998,
1999) utilizou como instrumento metodológico, a “brincadeira de escrever errado de
propósito”, também denominada por Cavalcante (2000) e Cavalcante e Rego (2001)
como tarefa de erro intencional. Basicamente esta tarefa consistiria na transgressão
intencional da norma ortográfica pela criança. Seu objetivo seria investigar o
conhecimento explícito que a criança tem elaborado em relação à ortografia. Esta
atividade está baseada na concepção de que para cometer erros propositalmente a
criança precisaria ter domínio da regra ou princípio em questão. Então, a análise das
transgressões realizadas pelas crianças forneceria informações sobre o conhecimento
que ela já tem construído sobre a ortografia. Os erros intencionais que envolvessem
aspectos da ortografia evidenciariam um conhecimento mais sofisticado e os realizados
fora deste âmbito indicariam um conhecimento incipiente da criança.
De acordo com Morais (1996, 1998, 1999), o modelo de “redescrição
representacional” proposto por Karmiloff-Smith (1986, 1992, 1994) dá fundamento à
tarefa de erro intencional. Neste modelo, a aprendizagem inicialmente se daria de uma
forma mecânica e limitada, envolvendo apenas um nível implícito de conhecimento.
Depois haveria um maior domínio e compreensão dos princípios subjacentes àquele
determinado conhecimento acarretando num nível mais explícito de elaboração. Esta
explicitação poderia ocorrer de forma consciente, onde o indivíduo saberia inicialmente
aplicar seu conhecimento, como, posteriormente, de forma consciente verbal, onde
saberia, também, explicar o conhecimento utilizado. Portanto, haveria uma clara relação
entre o nível de explicitação dos conhecimentos elaborados pelo sujeito e seu progresso
na utilização destes mesmos conhecimentos.
Uma análise mais acurada da exposição feita por Morais (1996, 1998, 1999)
acerca das bases teóricas sobre as quais a tarefa de erro intencional se fundamenta nos
mostra que este toma o modelo de Karmiloff-Smith (1986, 1992, 1994) tão somente por
26

tal modelo abordar a passagem de um conhecimento implícito para outro cada vez mais
flexível e acessível à consciência. Entretanto, a adoção deste modelo traz outras
implicações importantes, que não são discutidas por Morais (1996, 1998, 1999). Uma
delas diz respeito à predominância dos fatores internos na reorganização do
conhecimento da segunda fase do desenvolvimento cognitivo, ou seja, quando ocorre o
estabelecimento de relações entre as representações armazenadas durante a primeira
fase, dando início ao processo de redescrição representacional. Todas as situações de
interação social, inclusive a relação aluno-professor, teriam um papel secundário na
aquisição do conhecimento, uma vez que o primordial nesta fase seria uma
reorganização interna do conhecimento. No entanto, é difícil imaginar que a criança
simplesmente ignore as situações externas, apoiando sua aprendizagem basicamente
sobre a redescrição interna da representação.
A tarefa de erro intencional não poderia ser considerada como uma derivação
necessária do Modelo de Redescrição Representacional. Apenas traz consigo subjacente
à idéia de transformação de um conhecimento básico e implícito em um conhecimento
mais sofisticado e explícito. Mas esta concepção não é empregada exclusivamente por
Karmiloff-Smith (1986, 1992, 1994). Outros autores, dentre os quais Gombert (1990),
também tratam dos diferentes níveis de elaboração do conhecimento, enfocando o
processo de tomada de consciência do conhecimento.
27

Gombert (1990), por exemplo, elaborou um modelo hierárquico para o
desenvolvimento metalingüístico 6 . As primeiras habilidades lingüísticas seriam
adquiridas pelas crianças e utilizadas apenas no nível processual (da ação), envolvendo
um conhecimento implícito. Para Gombert (1990), conhecimento implícito,
diferentemente de Karmiloff-Smith (1986, 1992, 1994), implica uma compreensão,
ainda que elementar, das formas lingüísticas e não apenas a reprodução mecânica. Este
conhecimento vai sendo progressivamente controlado epilingüísticamente, ou seja, a
criança vai fazendo as reformulações necessárias para atingir um uso funcional e eficaz
da linguagem. A partir de demandas externas, como tarefas lingüísticas que requeiram
do sujeito maior refinamento acerca da língua, o conhecimento pode alcançar um nível
de controle metalingüístico, ou seja, a utilização de determinado aspecto da linguagem
será feita de forma consciente e refletida. Este conhecimento pode incidir tanto sobre o
nível declarativo quanto processual 7 . Por fim, o processo metalingüístico seria
automatizado, isto é, após uso repetido e eficaz, se torna automático e o comportamento
passa a ocorrer sem a necessidade da reflexão, podendo, no entanto, ser acessado
conscientemente a qualquer momento.
Desta forma, fica claro que o conhecimento faz parte de um processo de
desenvolvimento, que não implica em um modelo tudo ou nada. Existe um saber
prático vinculado a ação que pode ser plenamente competente e eficaz e que seria
também passível de manipulação consciente, embora muitas vezes não expresso em
palavras. O conhecimento, portanto, não é exclusividade dos indivíduos capazes de
construir um discurso verbal.
A partir da concepção do desenvolvimento do conhecimento em níveis cada vez
mais sofisticados, Morais (1996, 1998, 1999) procurou investigar a relação entre
desempenho ortográfico e nível de conhecimento elaborado sobre ortografia. Para tal,
realizou experimentos com 116 crianças brasileiras alfabetizadas de 2 a a 4 a série, tanto
de escola pública quanto de escola particular e com 32 crianças espanholas de 3 a e 5 a
6 Gombert (1990) utiliza os termos epilingüístico e metalingüístico para diferenciar, respectivamente, o
uso competente porém não consciente e o uso consciente e refletido da linguagem.
28

séries de educação básica de uma escola pública. Sua hipótese era a de que a criança
que apresentasse um nível elevado de explicitação das regras ortográficas apresentaria
uma melhor performance em ortografia.
Foram realizadas três atividades para acessar os diferentes níveis de explicitação
de conhecimento: ditado de um texto, tarefa de transgressão intencional da norma e
entrevista. O ditado foi feito pela própria professora da turma e avaliaria a competência
ortográfica da criança. Foram usadas palavras freqüentes e outras menos usuais,
contendo a maioria das correspondências regulares e irregulares entre letra e som
existentes na língua.
Num segundo momento, utilizando o texto escrito pelas crianças no ditado, foi
feita a atividade de “escrever errado de propósito”, onde as crianças deveriam
transgredir as normas ortográficas reescrevendo este texto com a inclusão de erros
propositais, inventados por elas próprias.
Finalmente, foram realizadas entrevistas individuais com os alunos que
obtiveram os piores e os melhores desempenhos, onde foram feitos esclarecimentos
referentes à transgressão cometida, além de questionamentos acerca do entendimento da
criança a respeito do erro ortográfico e da importância da escrita ortograficamente
correta. O objetivo destas entrevistas era ter acesso ao que a criança sabia explicar sobre
as normas ortográficas relacionadas aos erros propositalmente infringidos, mesmo sem
utilização de termos mais técnicos para tal.
Os erros cometidos pelas crianças brasileiras foram classificados em quatro
grupos: erros referentes à correspondência entre letra e som, erros de acentuação, erros
na segmentação de palavras e erros de concordância gramatical. As substituições de
letra foram os casos mais comuns de erro na categoria de correspondência letra-som,
sendo as consoantes o grande foco das transgressões cometidas. Poucos foram os casos
de omissão de letra, sendo mais freqüentes a omissão do M ou N na nasalização das
sílabas ou de consoantes não pronunciadas dentro da palavra.
7 O nível declarativo implica na verbalização do conhecimento, enquanto o processual estaria restrito a
ação.
29

Os erros das crianças espanholas foram classificados em um número maior de
categorias: substituição, omissão, adição, deslocamento de letras, acentuação,
segmentação de palavras e outros. Para estas crianças, assim como para as brasileiras, as
substituições de letras também representaram a maioria dos casos ocorridos, sendo
seguidos pelos de omissão de letras. Foram pouco representativos os erros por adição e
inversão da ordem de letras nas palavras. Mas a freqüência de erros por acentuação, em
sua maioria pela omissão do acento, foi bastante considerável. A hipossegmentação foi
a tendência mais comumente encontrada, principalmente entre alunos de escolaridade
mais baixa.
De uma maneira geral, os resultados foram semelhantes para as crianças
brasileiras e espanholas. Houve uma melhora no desempenho conforme o aumento da
escolaridade. No entanto, Morais (1996, 1998, 1999) constatou grande heterogeneidade
entre os alunos, mesmo quando se encontravam no mesmo ano escolar. As palavras
menos freqüentes no vocabulário infantil e as que continham relações irregulares entre
fonema e grafema apresentaram maior dificuldade na escrita.
Ao comparar a escrita do texto nas duas tarefas, no ditado e na transgressão
intencional, foi confirmada a hipótese anteriormente formulada por Morais (1996, 1998,
1999). As crianças com melhor desempenho no ditado apresentaram um maior número
de transgressões, além destas envolverem aspectos mais elaborados de nossa ortografia.
Os pontos críticos da ortografia foram o alvo principal destas crianças, demonstrando
maior nível de conhecimento a respeito da norma. Muitas vezes, as transgressões
cometidas possuíam a mesma pronúncia da palavra em questão, como em oji (hoje) e
sidadi (cidade). Verificou-se também que estes alunos conseguiam verbalizar as regras
que haviam transgredido com facilidade, ao contrário do que aconteceu com os alunos
com desempenho mais baixo, que apresentavam justificativas não diretamente
relacionadas a estrutura da palavra. As crianças com pior rendimento ortográfico
cometiam muitos erros envolvendo o uso impróprio de letras maiúsculas e sinais de
pontuação ou omissão de letra como, por exemplo, a retirada da letra na palavra
cavalo (caalo), que foram os casos de transgressão mais freqüentes.
30

No entanto, foi mais fácil para todas as crianças escrever corretamente as
palavras do ditado do que ter explicar as razões para as violações cometidas,
principalmente as ligadas aos aspectos gramaticais, que apresentaram especial
dificuldade para os alunos. Este já era um resultado esperado, pois elaborar um discurso
sobre determinada ação é uma tarefa muito mais complexa e sofisticada do que praticar
a ação em si. Por isto, mesmo as crianças que acertaram a grafia das palavras do texto
ditado, tinham dificuldade para verbalizar explicitamente os conhecimentos ortográficos
que demonstraram possuir.
Foi constatada também uma diferença entre as explicações dadas sobre as
correspondências regulares e irregulares da língua. De modo geral, era mais fácil
explicitar a não existência de regras para as correspondências irregulares do que
relacionar uma correspondência regular à regra correspondente. Também pode-se
verificar que mesmo regras de um mesmo tipo implicavam em níveis distintos de
complexidade. Entre as regras contextuais, por exemplo, era mais difícil para as
crianças explicitar a regra relacionada ao uso do O, U, E e I no final das palavras do que
a relacionada ao uso de R e RR. No primeiro caso para conseguir a escrita correta seria
necessário considerar a tonicidade e a posição do fonema dentro da palavra. No caso do
R e RR, o aluno deveria utilizar um recurso fonológico aliado à posição da letra na
palavra.
Um outro aspecto interessante observado diz respeito à não utilização de termos
gramaticais nas justificativas dadas pelas crianças, apesar de ficar claro o princípio
gerativo a que elas se referiam. Leal e Roazzi (2000) ressaltam que a criança que
consegue explicitar verbalmente o seu conhecimento sobre a língua, mesmo que não
fazendo uso de terminologia técnica nem de explicações muito elaboradas, apresenta
um desempenho melhor na escrita, utilizando as regras ortográficas de maneira mais
pertinente e adequada.
Com base no trabalho de Morais (1996, 1998, 1999), Cavalcante (2000) realizou
um estudo com o objetivo de investigar os distintos níveis de conhecimento ortográfico
acessados através de três diferentes procedimentos metodológicos, além da provável
influência da escolaridade para a realização competente das atividades propostas.
31

Participaram deste estudo 60 crianças de 2 a e 4 a séries de duas escolas particulares de
Recife.
Duas regras contextuais foram alvo de investigação: a utilização do R ou RR e a
nasalização diante de consoantes e diante do P e B. No caso do R e RR, foram usadas
12 palavras e 8 pseudopalavras para representação de 4 contextos: /R/ intervocálico (por
exemplo, barriga, parrena), /r/ intervocálico (por exemplo, fera, fanera), /R/ inicial
(por exemplo, rotina, rulipa) e /R/ entre consoante e vogal (por exemplo, honra,
desrada). Para representação da nasalização diante de P e B foram utilizadas 6 palavras
e 4 pseudopalavras (por exemplo, samba, rampa, vacimba, calampa) e para a
nasalização nas demais consoantes, 6 palavras e 2 pseudopalavras (por exemplo, venda,
tanla).
Os procedimentos metodológicos utilizados foram:
a) Ditado de palavras e pseudopalavras para acesso ao nível de conhecimento
explícito não-verbal
b) Tarefa de transgressão intencional para acesso ao nível de conhecimento
explícito não-verbal
c) Entrevista clínica para acesso ao nível de conhecimento explícito verbal
Foram realizadas três sessões individuais com cada criança. Num primeiro
momento, foi feito o ditado de palavras e pseudopalavras que continham as restrições
ortográficas investigadas. As crianças receberam dois protocolos contendo frases com
lacunas, sendo que em um deles deveriam completá-las com as palavras e no outro com
as pseudopalavras.
Na sessão seguinte foi realizada a tarefa de transgressão intencional, onde os
alunos produziram erros propositais sobre as mesmas palavras que eles haviam escrito
anteriormente no ditado. Para isto, eles receberam de volta o protocolo, que continha
espaços em branco logo abaixo das palavras e pseudopalavras ditadas. Para realização
da tarefa foi utilizada uma brincadeira de faz-de-conta visando facilitar a compreensão
32

da criança sobre a atividade, sendo esta semelhante a usada nos trabalhos de Morais
(1996, 1998, 1999). As crianças tinham que escrever como se fossem um menino
estrangeiro, que, apesar de conhecer a língua portuguesa, cometia muitos erros em sua
escrita.
Por último, foi realizada a entrevista clínica, onde as crianças justificaram a
escrita das palavras. Para esta atividade foram selecionadas duas palavras de cada
contexto abordado na pesquisa.
No ditado de palavras e pseudopalavras, quando investigados os contextos de
uso do R e RR, a escolaridade não teve influência na escrita das crianças. Observou-se
que tanto a 2 a quanto a 4 a série apresentaram um alto índice de acertos, com exceção da
representação do /R/ entre consoante e vogal. Este poderia ser considerado, portanto, o
ponto crítico da aprendizagem nesta regra contextual. Isto demonstra a existência de
dificuldades específicas na aquisição das restrições ortográficas.
De maneira similar, nos contextos de nasalização, as crianças também obtiveram
um alto percentual de acertos. No entanto, houve diferença significativa entre a 2 a e a 4 a
série nas palavras e pseudopalavras envolvidas na representação da nasalização diante
de P e B e apenas nas pseudopalavras quanto se tratou da nasalização frente às demais
consoantes. Portanto, as crianças de 4 a série tiveram um melhor desempenho na
atividade de ditado do que as crianças da 2 a , indicando maior compreensão a respeito
dos princípios subjacentes à escrita correta destas palavras. Os resultados obtidos
sugerem que inicialmente as crianças percebem a necessidade de nasalizar a palavra e,
posteriormente, consideram os diferentes contextos para utilização adequada dos
marcadores de nasalização.
O alto índice de acertos apresentados no ditado de palavras, tanto da
representação do R e RR quanto da nasalização diante de P e B e demais consoantes,
pode estar indicando que as palavras utilizadas no estudo são de freqüente exposição
para as crianças de 2 a e 4 a séries. Apesar do controle sobre a memorização introduzido
pelo uso de pseudopalavras, julgamos que seria importante que a freqüência de
ocorrência das palavras também fosse uma variável controlada na pesquisa.
33

Na tarefa de transgressão intencional, a escolaridade foi um fator determinante
na performance das crianças. Em todos os contextos investigados, tanto nas palavras
como nas pseudopalavras, as crianças da 4 a série realizaram um número
significativamente maior de erros intencionais sobre as dificuldades ortográficas
abordadas do que as crianças de 2 a série.
Na entrevista verificou-se que as crianças verbalizaram com maior facilidade as
regras ligadas a nasalização de palavras do que as pertinentes ao uso do R e RR.
Cavalcante (2000) atribui esta diferença a particularidades do contexto ortográfico
como a sua maior ou menor exposição na escola e a possibilidade de apoio nas
correspondências grafofônicas. Mas este resultado pode também estar relacionado à
necessidade de domínio de diferentes tipos de regras, no caso do uso do R e RR, já que
em alguns momentos a crianças precisará justificar sua escolha pela posição que a letra
ocupa na palavra e em outros pela utilização de recurso fonológico. No que diz respeito
à nasalização de palavras diante de consoantes, a criança precisará dar conta de apenas
uma regra, o que simplificaria e, de certa forma, facilitaria sua explicitação verbal.
Foi constatada grande dificuldade da criança em explicitar verbalmente a regra
envolvendo o /R/ entre consoante e vogal. A maior parte das justificativas se baseou em
recursos fonológicos, o que não seria adequado já que, neste caso, não é possível fazer
uma escolha correta considerando apenas o som (apesar do som ser forte, a palavra deve
ser escrita com apenas um R). Também foi observado, neste contexto, uma diferença no
desempenho das crianças da 2 a e 4 a séries. As crianças da série mais avançada foram
capazes de verbalizar mais do que as de 2 a série.
Nos outros contextos de emprego do R e RR, ao contrário, as crianças
apresentaram um maior número de justificativas corretas, demonstrando maior
conhecimento e compreensão a respeito destas restrições ortográficas. Portanto, nas
representações do /r/ e /R/ intervocálico, as explicações se basearam na diferença entre
os sons, enquanto que para o /R/ inicial, a posição da letra na palavra foi a justificativa
predominante. Além disto, a escolaridade não teve influência na habilidade das crianças
em explicitar discursivamente estas mesmas restrições.
34

Nos contextos de nasalização, as crianças da 4 a série foram mais capazes de
verbalizar a regra do que as com menor escolarização. Isto demonstra que a
escolaridade é um fator importante na aquisição desta regra, tendo as crianças de 4 a
série um maior conhecimento explícito verbal do que as de 2 a série.
Ao realizar uma comparação entre os procedimentos metodológicos
empregados, Cavalcante (2000) observou a não existência de relação entre a escrita do
ditado e a capacidade de transgredir nos contextos críticos investigados. Apesar das
crianças terem um alto percentual de acertos na tarefa do ditado, o número de erros
intencionais se manteve muito reduzido, especialmente na 2 a série.
A tarefa de erro intencional, portanto, não poderia ser considerada uma medida
fidedigna para acessar o conhecimento ortográfico explícito não-verbal e,
conseqüentemente, não seria um bom preditor para a competência ortográfica.
Cavalcante (2000) argumenta que esta seria uma atividade complexa de natureza
metacognitiva, o que exigiria concepções mais elaboradas sobre a ortografia. Além
disto, ao realizar esta tarefa, a criança pode não fazer uma transgressão num contexto
em que teria conhecimento para fazê-lo, dado o caráter opcional e livre que a situação
implica. Com isto, o desempenho ortográfico da criança seria subestimado, como foi
verificado no estudo de Cavalcante (2000).
Outra crítica ao uso da tarefa de erro intencional como medida do conhecimento
ortográfico se refere a presença de transgressões paradoxais na representação do /R/
entre consoante e vogal. A transgressão paradoxal implica numa inversão, onde a
criança escreve a palavra de forma correta quando seu objetivo era escrever um erro
propositalmente. Isto significa que a criança, na verdade, não possui uma compreensão
a respeito do princípio ortográfico em questão, apenas conhece diferentes possibilidades
para ortografar a mesma palavra. Por isto, esta capacidade de explicitar de forma não-
verbal não indicaria uma reelaboração do conhecimento ortográfico que facilitaria a
escrita correta da palavra.
É importante ressaltar aqui duas questões de base metodológica. Em primeiro
lugar, Cavalcante (2000) não utiliza a tarefa de erro intencional da mesma forma que
35

Morais (1996, 1998, 1999). Nos estudos realizados por Morais (1996, 1998, 1999), a
tarefa de erro intencional era feita sobre um texto que continha diversos aspectos
regulares e irregulares da língua. A criança podia escolher livremente a palavra que
desejasse para cometer a transgressão e poderia, com isto, demonstrar um maior ou
menor conhecimento sobre uma determinada restrição ortográfica. Já no estudo de
Cavalcante (2000), a tarefa de erro intencional estava dirigida a palavras com os pontos
ortográficos críticos investigados, o que limita, de certa forma, a possibilidade de
atuação da criança, que só pode transgredir dentro de contextos restritos.
Em segundo lugar, na avaliação da competência ortográfica, Morais (1996,
1998, 1999) utilizou um texto para o ditado, enquanto Cavalcante (2000) fez uso de
palavras. Como apontado pelo próprio Morais (1996, 1998), as crianças cometem um
maior número de erros ortográficos na escrita de textos do que em atividades como o
ditado de palavras. No ditado a criança focaliza toda sua atenção para a grafia daquela
determinada palavra. Já na escrita de histórias, o escritor tem que dar conta de uma série
de fatores simultaneamente. Apesar das crianças não terem que criar uma história, é
necessário que seja mantida a coesão e coerência, além da escrita das palavras de forma
correta.
Neste sentido, pode-se pensar que as diferenças encontradas nos estudos de
Morais (1996, 1998, 1999) e Cavalcante (2000) quanto à eficácia da tarefa de erro
intencional em predizer o desempenho ortográfico das crianças, talvez sejam
decorrência das diferenças nas tarefas empregadas nestes dois estudos.
Com relação à escrita do ditado e a entrevista clínica, pôde ser observada uma
relação entre estes dois procedimentos. Segundo Cavalcante (2000), os níveis de
conhecimento ortográfico abordados através destes instrumentos seriam
complementares e forneceriam um diagnóstico mais seguro a respeito da aquisição
ortográfica das crianças. Em alguns dos contextos investigados, a capacidade de
verbalização parece preceder a escrita correta de palavras. Cavalcante (2000) sugere
que durante o desenvolvimento da ortografia, a criança, ao invés de primeiramente
saber como escrever corretamente a palavra para depois conseguir explicar as razões
36

para tê-lo feito desta forma, ela poderia dominar o conhecimento explícito verbal e, a
partir daí, empregar adequadamente seu conhecimento na escrita.
Entretanto, é preciso certo cuidado em relação às conclusões de Cavalcante
(2000) ao considerar aquilo que a criança é capaz de explicitar verbalmente sobre
determinado aspecto ortográfico. Saber recitar uma regra não implica necessariamente
num conhecimento elaborado sobre a mesma, podendo, na verdade, ser apenas resultado
da repetição contínua sem um real entendimento do princípio gerativo. A criança pode
ser capaz de reproduzir a regra na fala, mesmo não conseguindo aplicá-la na escrita das
palavras. Portanto, não implica necessariamente um processo de reflexão da criança, no
qual ela demonstra compreensão e domínio do conhecimento, mas pode tratar-se apenas
da memorização de uma regra.
Desta forma, o presente estudo pretende discutir as abordagens de Morais (1996,
1998, 1999) e Cavalcante (2000), buscando uma compreensão maior acerca da
aquisição da ortografia e dos fatores relacionados à esta aquisição.
37

5. QUESTÕES ACERCA DA PESQUISA
Os resultados encontrados por Cavalcante (2000) apontam para a imprecisão da
tarefa de erro intencional em acessar o conhecimento explícito não-verbal da criança
sobre regras contextuais específicas. Mas, de maneira alternativa, o fato da tarefa de
erro intencional não ter discriminado o bom desempenho ortográfico das crianças pode
estar relacionado à natureza da regra utilizada neste estudo. Ou seja, a tarefa de erro
intencional não seria uma boa preditora para o desempenho ortográfico da criança
relacionado às regras contextuais. No entanto, esta tarefa poderia predizer o
desempenho ortográfico da criança se fossem investigados outros aspectos da
ortografia, quais sejam àqueles referentes à morfologia e à sintaxe.
Um estudo longitudinal realizado por Rego e Buarque (1997) demonstrou a
importância da consciência sintática e da consciência fonológica na aquisição de regras
ortográficas específicas. A aquisição de regras de contexto seria facilitada pelo
desenvolvimento da consciência fonológica, enquanto que aspectos ortográficos ligados
à morfologia e à sintaxe estariam relacionados à consciência sintática.
Além disto, a consciência fonológica e a consciência morfossintática parecem se
desenvolver em momentos distintos da aquisição da língua escrita. A consciência
fonológica é necessária ao processo de alfabetização (Byrne, 1995, Correa, 2001). Em
outras palavras, a criança precisa ter um certo nível de consciência dos segmentos
sonoros da fala para aprender a ler e escrever. Esta habilidade continua a se desenvolver
ao longo da alfabetização. No entanto, uma estratégia puramente fonológica mostra-se
insuficiente para a escrita correta de palavras. As crianças precisam compreender outros
aspectos da língua referentes à ortografia. É apenas nesta fase, quando a criança já
domina o sistema alfabético, que a consciência morfossintática se torna importante para
o aperfeiçoamento da língua escrita (Nunes, Bryant & Bindman, 1995). Para gerar
certas grafias deverão ser feitas, portanto, considerações sobre a estrutura gramatical
das frases e sobre a formação das palavras.
38

Desta forma, este estudo se propôs a investigar, a relação entre a transgressão
intencional da norma e o desempenho ortográfico, considerando não apenas regras
contextuais como também regras ortográficas de natureza morfossintáticas da língua
portuguesa. Portanto, a eficácia da tarefa de erro intencional em predizer o
desenvolvimento ortográfico do aluno foi foco de investigação. Observamos também as
diferenças no desempenho dos alunos de uma série escolar para outra.
Foi feita também uma comparação entre os procedimentos utilizados por Morais
(1996, 1998, 1999) e Cavalcante (2000), para verificar se a diferença entre as tarefas
poderia estar interferindo e determinando o desempenho das crianças.
Procuramos, então, responder as seguintes questões:
1) Qual a influência da escolaridade sobre a performance da criança na tarefa de
avaliação da competência ortográfica e na tarefa de transgressão intencional da
norma quanto às regularidades morfossintáticas e às regularidades contextuais?
2) Qual a relação entre o desempenho ortográfico da criança quanto às regras de
contexto e às regras morfossintáticas e a capacidade de transgredir
intencionalmente? A tarefa de erro intencional estaria relacionada à competência
ortográfica em relação a algum contexto específico?
3) A diferença nas tarefas utilizadas por Morais (1996, 1998, 1999) e Cavalcante
(2000) poderia explicar os resultados discrepantes entre este dois estudos em
relação à eficácia da tarefa de erro intencional? As crianças apresentariam
desempenhos diferentes dependendo da forma escolhida para realização das
tarefas ?
39

6. METODOLOGIA
6.1. Participantes
Participaram deste estudo 52 crianças cursando o ensino fundamental de uma
escola pública do Rio de Janeiro. Foram 24 crianças de 2 a série, com média de idade de
9 anos, e 28 de 4 a série, com média de idade de 11 anos e 1 mês. Todos os alunos foram
autorizados pelos responsáveis a participar deste estudo, assinando o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo I).
O intervalo de um ano dado entre as séries segue o mesmo delineamento traçado
por Cavalcante (2000), em função de um estudo realizado por Monteiro (1995), no qual
foi constatado que apenas com uma intermitência superior a um ano pode-se verificar
diferenças na aquisição da ortografia.
6.2. Tarefas propostas
6.2.1. Medidas de Desempenho Ortográfico
1) Ditado de palavras
O objetivo desta tarefa foi verificar a competência ortográfica das crianças
especificamente em relação aos contextos investigados. Os alunos receberam um
protocolo contendo sentenças com lacunas, que foram completadas com as palavras
ditadas pela professora (Anexo IV e V). As sentenças foram lidas integralmente e, em
seguida, a palavra que estava faltando foi repetida isoladamente para que a criança
pudesse escrevê-la. As palavras foram repetidas por até três vezes. Os professores foram
instruídos a ler as frases e as palavras de forma corrente, sem artificialização da
pronúncia. Devido a grande quantidade de palavras, o ditado foi dividido e realizado em
duas sessões.
40

As palavras utilizadas foram as mesmas para todas as séries (Anexo II). Foram
estudadas as regularidades morfossintáticas presentes no sufixo EZA, que é empregado
na formação de nomes abstratos derivados de adjetivos, como é o caso das palavras
delicadeza e moleza; no sufixo ESA relacionado a nomes que indicam profissão, título
ou posição social e o local de origem do sujeito, como nas palavras camponesa e
japonesa; e no sufixo OSO referente a adjetivos como famoso e populoso.
No caso das regras de contexto trabalhamos com as mesmas estudadas por
Cavalcante (2000): o emprego do R e RR e a nasalização. Examinamos o emprego do R
e RR nos seguintes contextos: /R/ intervocálico (beterraba), /r/ intervocálico
(maratona), /R/ inicial (rotina), /R/ precedido de vogal nasal (genro) e /R/ precedido de
consoante (desrespeito). Estes dois últimos casos constavam no estudo de Cavalcante
como /R/ entre consoante e vogal. No entanto, optamos pela classificação feita por
Faraco (1992) por considerá-la mais adequada. Avaliamos a nasalização diante de p e b
(empada e pomba) e a nasalização diante das demais consoantes (lenda).
A tarefa de ditado de palavras foi composta por palavras reais e com baixa
freqüência de ocorrência em todas as séries investigadas (Pinheiro, 1996), minimizando
assim a possibilidade de escrita da palavra baseada apenas na exposição contínua a sua
grafia ou na memorização. Desta forma, não foi considerado necessário a utilização de
pseudopalavras, cujo único objetivo seria o controle do efeito da memorização.
Na seleção das palavras, foram evitadas aquelas que apresentavam mais de um
tipo de restrição ortográfica. Com isto, pretendia-se aumentar a probabilidade das
crianças, na tarefa de erro intencional, transgredirem apenas nos contextos críticos
investigados. Todavia, nem sempre foi possível escolher palavras com apenas uma
restrição, dada a limitação imposta pelo uso de palavras infreqüentes.
Para a maioria dos contextos estudados foram selecionadas cinco palavras. Nos
casos de nasalização, seguindo os moldes do trabalho de Cavalcante (2000), foram
escolhidas doze palavras, sendo três delas para nasalização antes de P, três para antes de
B e seis diante das demais consoantes. A listagem de palavras infreqüentes para todas as
séries do ensino fundamental possuía um número restrito de palavras com a
41

epresentação /R/ precedido de consoante. Por isto, só foi possível a inclusão de duas
palavras deste contexto no ditado de palavras.
2) Ditado do Texto
Foi ditado um texto contendo a maioria das correspondências regulares e
irregulares presentes na língua portuguesa (Anexo VI). Com isto, o desempenho
ortográfico da criança foi avaliado de uma forma mais ampla. Especificamente para as
regularidades morfossintáticas presentes nos sufixos EZA, ESA e OSO, e para as
regularidades contextuais referentes ao emprego do R e RR e a nasalização diante de p
e b e a nasalização diante das demais consoantes foram selecionadas pelo menos 4
palavras para cada contexto abordado, com exceção da representação /R/ precedido de
consoante que teve apenas duas palavras incluídas (Anexo III).
O texto foi o mesmo para todas as séries e continha em torno de 150 palavras.
Os alunos receberam um protocolo contendo apenas linhas onde puderam apoiar sua
escrita (Anexo VII). A professora foi instruída a ler todo o texto e, posteriormente, ditar
cada frase. Estas foram lidas correntemente com pausas entre elas para que as crianças
pudessem escrever. Quando necessário, as frases foram repetidas por, no máximo, três
vezes.
6.2.2. Tarefas de Erro Intencional
1) Tarefa de Erro Intencional nas palavras do ditado
A finalidade desta atividade também foi a de acessar o conhecimento explícito
da criança em relação aos contextos investigados. Para isto, foi utilizada a tarefa de
transgressão intencional análoga a realizada por Cavalcante (2000). As crianças
receberam de volta o protocolo utilizado no ditado de palavras, que contém um espaço
abaixo das palavras produzidas pelas crianças (Anexo IV). Neste espaço foi escrito o
erro intencional. As crianças foram solicitadas a cometer transgressões
42

propositadamente nas palavras anteriormente ditadas, tendo como base sua própria
escrita. Esta atividade foi feita dentro de um contexto de faz-de-conta, onde as crianças
imitaram um menino estrangeiro que sabia falar português mas não escrevia as palavras
corretamente (Morais, 1996, 1998, 1999 e Cavalcante, 2000).
2) Tarefa de Erro Intencional sobre o texto
O objetivo desta atividade foi avaliar o conhecimento explícito da criança sobre
a língua. Esta tarefa de transgressão intencional foi semelhante à utilizada por Morais
(1996, 1998, 1999). A criança recebeu o protocolo onde escreveu o texto da tarefa de
ditado (Anexo VII). Ela teve, então, que cometer o maior número de transgressões
ortográficas que conseguisse produzir nas palavras do texto, baseada em sua própria
escrita. Para isto, num contexto de brincadeira, foi pedido que ela escrevesse como um
estrangeiro que conhece a língua mas comete muitos erros em sua escrita. Não foi
necessária a reescrita de todo o texto. Os alunos foram instruídos a envolver com uma
caneta colorida a palavra na qual eles pretendiam cometer a violação e escrever o erro
intencional abaixo desta.
6.3. Procedimento
Neste estudo foram utilizados dois procedimentos metodológicos: ditado e tarefa
de erro intencional. Foram aplicadas, pela própria professora em ocasiões diferentes,
duas tarefas de ditado para todos os alunos da turma. Num segundo momento, foram
realizadas as tarefas de transgressão intencional com grupos de 10 crianças de uma
mesma série, de forma a evitar possíveis cópias entre colegas e permitindo um melhor
esclarecimento de dúvidas que pudessem surgir durante a aplicação desta atividade.
Esta atividade foi particularmente divertida para as crianças, que competiram entre si
para ver quem faria o maior número de erros propositais.
43

Inicialmente, foi realizado o ditado de palavras que contém casos de
regularidades morfossintáticas e contextuais e o ditado de um texto, onde foram
investigados vários aspectos da ortografia. Estas atividades aconteceram em dias
diferentes para evitar que as crianças cometessem erros por falta de atenção ou cansaço.
Posteriormente, foram feitas as tarefas de transgressão intencional onde as crianças
cometeram erros propositalmente sobre a sua produção escrita. Para isto, elas receberam
de volta os protocolos utilizados nos ditados. Num primeiro momento elas
transgrediram sobre o texto e, num outro dia, sobre o ditado de palavras. A ordem de
apresentação das atividades aos alunos foi fixa, pois a realização das tarefas de erro
intencional dependia da conclusão dos ditados.
44

7. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os dados obtidos através dos protocolos de avaliação do desempenho
ortográfico e da tarefa de erro intencional foram analisados de duas formas. Num
primeiro momento, foram considerados apenas os contextos ortográficos específicos
referentes às regras de contexto (uso do r e rr e nasalização diante de consoantes) e às
regras morfossintáticas (sufixos esa, eza e oso), de acordo com o estudo realizado por
Cavalcante (2000). Posteriormente, foi avaliado o desempenho ortográfico geral das
crianças, assim como feito por Morais (1996, 1998, 1999). Com isto, pretendeu-se
comparar estas diferentes abordagens para verificar se a diferença entre as tarefas
empregadas por Cavalcante (2000) e Morais (1996, 1998, 1999) poderia estar
interferindo e determinando o desempenho das crianças.
7.1. Análise dos Contextos Ortográficos Específicos
Inicialmente foi feita uma análise do desempenho ortográfico das crianças de 2 a
e 4 a séries nas tarefas de ditado de palavras e do texto. A partir da correção dos
protocolos pode-se obter a proporção média de acertos nos contextos críticos
investigados. Isto significa que foram computados apenas os acertos das crianças nos
contextos específicos referentes às regras de contexto (/R/ intervocálico, /r/
intervocálico, /R/ inicial, /R/ precedido de vogal nasal, /R/ precedido de consoante,
nasalização diante de p e b e nasalização diante das demais consoantes) e às regras
morfossintáticas (sufixos oso, eza e esa). Ao escrever, por exemplo, cerenata ao invés
de serenata, apesar da palavra conter um erro de ortografia, a criança receberá
pontuação pelo acerto, pois, neste momento, apenas o contexto /r/ intervocálico está
sendo investigado. A partir disto, foram comparados os desempenhos obtidos nos
contextos ortográficos específicos nas duas tarefas, ditado de palavras e ditado de texto,
avaliando-se também a influência da escolaridade na performance das crianças.
45

Em um segundo momento, foi analisada a capacidade das crianças de transgredir
propositalmente a norma ortográfica, a partir do desempenho das crianças de 2 a e 4 a
séries na tarefa de erro intencional. Na tarefa de erro intencional das palavras do ditado
e do texto, foi calculada a proporção média de erros intencionais para os contextos
críticos em cada série. Aqui foram contabilizados apenas os erros realizados nos
contextos investigados neste estudo - regras de contexto e regras morfossintáticas, que
foram os mesmos considerados para o desempenho ortográfico.
Como erro intencional somente foi considerada a transgressão cometida pela
criança no contexto específico que envolvesse uma outra escrita ortográfica possível
para aquele contexto, mas descartada em função da convenção ortográfica que a ele se
aplica. Considerando, por exemplo, o contexto /R/ intervocálico, uma transgressão
possível para a palavra beterraba seria beteraba; caso a criança, ao invés disto,
escrevesse betecaba, este erro já não seria considerado. Isto porque ao escrever
betecaba, o erro, apesar de feito em um ponto ortográfico crítico, não estaria
relacionado ao conhecimento da dificuldade ortográfica apresentada.
Também foram considerados como erro os casos de transgressão paradoxal
(Morais, 1996, 1998), onde a criança escreve a palavra incorretamente achando que é a
forma certa e faz o erro intencional colocando a palavra correta. Este é o caso da criança
que no ditado escreve belesa e, ao cometer a transgressão, põe beleza. Apesar da
criança ainda não dominar a escrita correta da palavra, já demonstra possuir
conhecimento a respeito das possíveis grafias implicadas na regra em questão.
Assim como foi feito para a análise do desempenho ortográfico, foi examinada a
influência da escolaridade para realização das tarefas de erro intencional, além de
comparados os desempenhos das crianças nestas tarefas.
Em um terceiro momento, foi analisada a relação entre o desempenho nas tarefas
de erro intencional com os escores das tarefas ortográficas (ditado de palavras e texto)
para a 2 a e 4 a série, segundo o que foi proposto por Cavalcante (2000). Desta forma,
examinou-se a relação entre o desempenho na tarefa de erro intencional e o desempenho
ortográfico tomando-se separadamente cada contexto crítico investigado.
46

7.1.1. Desempenho ortográfico das crianças
7.1.1.1. Uso do r e rr
Foi calculada a proporção média de acertos das crianças de 2 a e 4 a série para a
regra de contexto do uso do r e rr, tanto no ditado de palavras quanto no ditado do texto
(Tabela 1). Observa-se que nos contextos /R/ inicial e /r/ intervocálico, as crianças de 2 a
e 4 a série apresentaram elevado número de acertos. Isto indica que, a partir da 2 a série,
as crianças já dominam estas representações. Estes dois contextos não foram
considerados na execução da análise de variância devido ao efeito de teto que
apresentaram.
Tabela 1. Proporção Média de Acertos na Regra de Contexto de Uso do r e rr
Série /R/ cons /R/ vog nasal /R/ interv /r/ interv /R/ inicial
2a 0,44 0,51 0,78 0,94 0,99
(0,43) (0,35) (0,31) (0,12) (0,04)
4a 0,64 0,64 0,89 1,00 1,00
(0,43) (0,38) (0,25) (0) (0)
2a 0,54 0,46 0,72 0,98 0,98
(0,49) (0,41) (0,36) (0,05) (0,06)
4a 0,64 0,57 0,88 0,98 1,00
(0,41) (0,42) (0,24) (0,05) (0)
Os valores entre parênteses estão indicando o Desvio Padrão.
Contextos de uso do r e rr
Ditado de Palavras
Texto
Foi realizada uma análise de variância de delineamento misto, com medidas
repetidas para os fatores tarefa (ditado de palavras X texto) e regra (/R/ intervocálico X
/R/ depois de consoante X /R/ depois de vogal nasal). Os resultados da análise de
variância revelam que há diferença significativa no desempenho das crianças
47

determinada pela escolaridade, F(1,50) = 5,48, p = 0,023. De maneira geral, as crianças
da 4 a série obtêm melhor desempenho do que as da 2 a série.
Observa-se também que algumas regras são mais fáceis para as crianças que
outras, F (2,100) = 10,04, p < 0,001. Os resultados do Post-Hoc Teste (Neuman Keuls)
mostram que são significativas as diferenças entre o contexto /R/ intervocálico e os
demais contextos. Contudo, não há diferença significativa no desempenho das crianças
nos contextos /R/ depois de consoante e /R/ depois de vogal nasal. A partir desta análise
é possível dispor os contextos ortográficos do uso do r e rr em dois grupos. Um grupo
conteria a representação /R/ intervocálico; e o outro, as representações /R/ depois de
consoante e /R/ depois de vogal nasal. As representações /R/ depois de consoante e /R/
depois de vogal nasal parecem ser a grande fonte de dificuldade para as crianças devido
a considerável diminuição do número de acertos apresentados nestes contextos.
O tipo de tarefa utilizada não influenciou nos resultados encontrados. Nos
contextos de uso do r e rr, as crianças ou tem muita facilidade ou tem muita dificuldade.
Com isto, nem o contexto de produção nem o tipo de palavras selecionadas chegam a
interferir na produção escrita das crianças.
Nenhuma interação foi significativa.
Estes resultados confirmam o que foi constatado por Cavalcante (2000) em
termos de uma hierarquia na aprendizagem das regras envolvidas na utilização do r e rr.
As representações /R/ inicial e /r/ intervocálico seriam internalizadas mais rapidamente
pelas crianças. As crianças já utilizariam tais representações do r e rr de acordo com a
norma ortográfica vigente já na 2 a série. O /R/ intervocálico se encontraria em uma fase
intermediária, estando as crianças em processo de superação deste obstáculo na sua
escrita e, portanto, a utilização desta representação ainda não estaria completamente
consolidada, mesmo na 4ª série. A principal dificuldade para as crianças de 2 a e 4 a
séries, entretanto, estaria nas representações /R/ depois de consoante e /R/ depois de
vogal nasal. Isto pode estar relacionado ao próprio ensino da ortografia nas escolas, que
não inclui estes contextos ao trabalhar com o uso de r e rr, mesmo em séries mais
avançadas.
48

Cavalcante (2000) não observou influência da escolaridade na performance das
crianças. Isto contraria os dados obtidos no presente estudo, onde a 4 a série apresenta
melhor desempenho nos contextos do uso do r e rr, com exceção do /R/ inicial e /r/
intervocálico, cuja aprendizagem se encontraria em um patamar mais avançado desde a
2 a série.
7.1.1.2. Utilização de m e n diante de consoantes (Nasalização)
A proporção média de acertos no contexto de nasalização para as crianças de 2 a
e 4 a séries feita para o ditado de palavras e para o texto encontra-se na Tabela 2.
Os dados das regras de contexto referentes à nasalização foram submetidos a
uma análise de variância para delineamento misto, com medidas repetidas para os
fatores tarefa (ditado de palavras X texto) e regra (nasalização com n X nasalização com
m). Os resultados da análise mostraram um efeito significativo para escolaridade, F
(1,50) = 14,81, p < 0,01. A produção escrita das crianças de 4 a série apresenta um maior
número de acertos referentes ao contexto da nasalização do que a das crianças de 2 a . O
49

desempenho no contexto da nasalização varia segundo a regra, F(1,50) = 16,77, p <
0,01. A utilização do n como marcador de nasalidade é mais fácil para as crianças do
que o m.
A interação regra X escolaridade foi significativa, F (1,50) = 12,68, p = 0,01. O
Post-Hoc Teste (Neuman Keuls) demonstrou que a diferença entre as séries está
relacionada apenas ao contexto do uso do m antes de p e b. As crianças da 4 a série já
utilizam a regra de nasalização relacionada aos dois contextos com facilidade, mas a 2 a
série apresenta uma aprendizagem ainda parcial, com alto índice de acertos apenas no
uso do n como marcador de nasalização.
A tarefa foi também um fator determinante nos resultados encontrados, tendo
efeito significativo no desempenho das crianças, F (1,50) = 4,08, p = 0,049. No ditado
de palavras as crianças apresentaram melhor desempenho do que no texto. É provável
que o volume de palavras de cada tarefa esteja influenciando na escrita destes contextos.
No ditado de palavras, a criança escreve uma palavra de cada vez, o que facilitaria na
escolha entre as letras m e n para marcar a nasalização, pois a atenção estaria toda
focalizada. Já no texto, a criança teria uma maior quantidade de palavras para escrever,
o que favoreceria erros por mera distração.
Outras interações não foram significativas.
Cavalcante (2000) também observou a influência exercida pela escolaridade na
nasalização diante de p e b. As crianças de 2 a série apresentaram um número maior de
erros ortográficos neste contexto do que as de 4 a série. Já a aquisição da nasalização
das vogais diante das demais consoantes estaria consolidada para as séries investigadas,
não sendo um fator de dificuldade para as crianças.
50

7.1.1.3. Regras Morfossintáticas
O cálculo da proporção média de acertos das crianças de 2 a e 4 a séries para as
regras morfossintáticas, tanto no ditado de palavras quanto no texto, consta na Tabela 3.
Tabela 3. Proporção Média de Acertos nas Regras Morfossintáticas
Contextos dos sufixos
Série eza esa oso
Ditado de Palavras
2a 0,30 0,72 0,88
(0,34) (0,27) (0,24)
4a 0,66 0,87 0,99
(0,32) (0,20) (0,04)
Texto
2a 0,42 0,81 0,85
(0,33) (0,30) (0,22)
4a 0,68 0,96 0,96
(0,30) (0,10) (0,11)
Os valores entre parênteses estão indicando o Desvio Padrão.
Os dados foram submetidos a uma análise de variância para delineamento misto,
com medidas repetidas para os fatores tarefa (ditado de palavras X texto) e regra
(sufixos oso X eza X esa). A análise de variância aplicada às regras morfossintáticas
mostra a influência da escolaridade na produção das crianças, F (1,50) = 38,30, p <
0,01. As crianças de 4 a série acertaram mais nos contextos investigados.
Quanto às regras, há uma diferença significativa nos contextos morfossintáticos
relacionados aos sufixos oso, esa e eza, F (2,100) = 46,01, p < 0,01. Post-hoc Teste
(Neuman Keuls) revela que são significativas as diferenças entre o sufixo eza e os
sufixos esa e oso, mas não entre os sufixos esa e oso. As crianças apresentaram maior
número de acertos nas representações do sufixo oso e esa do que na representação do
sufixo eza. A predominância de utilização da letra s para marcação destes sufixos
51

parece estar indicando que as crianças, ao invés de estarem se reportando a regras
morfossintáticas, tenderiam a colocar o grafema s para marcar o fonema /z/ baseando-se
em uma regra contextual: a letra s, quando se encontra entre vogais, apresenta som /z/.
Houve um efeito significativo relacionado à tarefa, F (1,50) = 6,92, p = 0,011. A
tarefa de ditado do texto se mostrou mais fácil para as crianças do que o ditado de
palavras. Diferentemente das regras contextuais, algumas das palavras infreqüentes para
as regras morfossintáticas que foram selecionadas para o ditado de palavras eram
também desconhecidas para as crianças. Constantes foram os comentários, durante
aplicação do ditado, em que as crianças indagavam o significado destas palavras. Por
isto, o tipo de palavra provavelmente influenciou na escrita das crianças.
A interação regra X tarefa se mostrou significativa, F (2,100) = 3,57, p = 0,032.
A utilização de post-hoc teste (Neuman Keuls) demonstra que o contexto da tarefa não
difere significativamente para o sufixo oso, tendo as crianças apresentado desempenho
semelhante tanto na tarefa do ditado de palavras quanto no texto. Também pode-se
observar que, na tarefa do ditado de palavras, ficou evidenciada uma diferença
significativa entre os sufixos esa e oso. O sufixo oso, neste contexto de produção, é
mais fácil para as crianças do que o sufixo esa. Isto pode estar relacionado ao fato do
sufixo oso não possuir uma grafia alternativa como ocorre com o sufixo esa.
Outras interações não se mostraram significativas.
7.1.1.4. Análise conjunta das diferentes regras ortográficas investigadas
A fim de analisar as diferenças e similaridades entre os contextos ortográficos
foi realizada uma Análise Hierárquica de Agrupamento (Hierachical Cluster Analysis)
com os dados obtidos nas tarefas de avaliação do desempenho ortográfico. As Tabelas
4, 5, 6 e 7 apresentam o esquema de aglomeração com o registro dos coeficientes de
aglomeração para a constituição dos diversos grupos dentro das regras ortográficas
estudadas nos contextos de produção (ditado de palavras e texto) segundo a
escolaridade das crianças (2 a e 4 a séries).
52

As Figuras 1, 2, 3 e 4 mostram a representação visual de cada estágio de
aglomeração (Dendrograma) para cada tipo de tarefa (ditado de palavras e texto) e para
cada série (2 a e 4 a séries). A análise dos dendrogramas aliada a inspeção dos
coeficientes de aglomeração mostram que o melhor agrupamento que se pode obter dos
dados é o de 3 grupos: um reunindo as regras de nasalização diante de consoantes, os
sufixos oso e esa, o /R/ inicial, /R/ intervocálico e /r/ intervocálico; o segundo com as
regras de contexto /R/ depois de vogal nasal e /R/ depois de consoante; e, um último,
contendo o sufixo eza.
Figura 1. Dendograma do Ditado de Palavras para a 2 a série
Dendrogram using Average Linkage (Between Groups)
Rescaled Distance Cluster Combine
C A S E 0 5 10 15 20 25
Label Num +---------+---------+---------+---------+---------+
/R/INIC 3 -+
N 9 -+-----+
/r/INT 2 -+ +-----+
OSO 6 -------+ +-----+
ESA 8 -------------+ +-----------------------------+
/R/INT 1 ---------+---------+ I
M 10 ---------+ I
/R/VOGNAS 4 -----------------+---------------+ I
/R/CONS 5 -----------------+ +---------------+
EZA 7 ---------------------------------+
Tabela 4. Esquema de Aglomeração no Ditado de Palavras para a 2a série
Cluster Combined
Stage Cluster First Appears
Stage Cluster 1 Cluster 2 Coefficients Cluster 1 Cluster 2 Next Stage
1 3 9 0,179 0 0 2
2 2 3 0,529 0 1 3
3 2 6 1,495 2 0 5
4 1 10 2,197 0 0 7
5 2 8 2,828 3 0 7
6 4 5 3,830 0 0 8
7 1 2 4,255 4 5 9
8 4 7 7,015 6 0 9
9 1 4 10,437 7 8 0
53

Figura 2. Dendograma do Ditado de Palavras para a 4 a série
Dendrogram using Average Linkage (Between Groups)
Rescaled Distance Cluster Combine
C A S E 0 5 10 15 20 25
Label Num +---------+---------+---------+---------+---------+
/r/INT 12 -+
/R/INIC 13 -+
OSO 16 -+-------+
N 19 -+ +---+
M 20 -+ I +---------------------+
ESA 18 ---------+ I +-------------+
/R/INT 11 -------------+ I I
EZA 17 -----------------------------------+ I
/R/VOGNAS 14 ---------+---------------------------------------+
/R/CONS 15 ---------+
Tabela 5. Esquema de Aglomeração no Ditado de Palavras para a 4a série
Cluster Combined Stage Cluster First Appears
Stage Cluster 1 Cluster 2 Coefficients Cluster 1 Cluster 2 Next Stage
1 12 13 0 0 0
2 16 19 0,029 0 0 3
3 12 16 0,048 1 2 4
4 12 20 0,204 3 0 6
5 14 15 1,460 0 0 9
6 12 18 1,525 4 0 7
7 11 12 2,082 0 6 8
8 11 17 5,586 7 0 9
9 11 14 7,988 8 5 0
Figura 3. Dendograma do Texto para a 2 a série
Dendrogram using Average Linkage (Between Groups)
Rescaled Distance Cluster Combine
C A S E 0 5 10 15 20 25
Label Num +---------+---------+---------+---------+---------+
/r/INT 2 -+-+
/R/INIC 3 -+ +-+
N 10 ---+ +-----+
OSO 6 -----+ +-------+
ESA 8 -----------+ +-------------------+
/R/INT 1 -----------+-------+ +---------+
M 9 -----------+ I I
EZA 7 ---------------------------------------+ I
/R/VOGNAS 4 ---------+---------------------------------------+
/R/CONS 5 ---------+
54
3

Tabela 6. Esquema de Aglomeração no Texto para a 2a série
1
3
5
7
9
Cluster Combined Stage Cluster First Appears
Stage Cluster 1 Cluster 2 Coefficients Cluster 1 Cluster 2 Next Stage
2 3 0,110 0 0 2
2 2 10 0,795 1 0 3
2 6 1,350 2 0 6
4 4 5 1,875 0 0 9
1 9 2,257 0 0 7
6 2 8 2,429 3 0 7
1 2 3,865 5 6 8
8 1 7 8,166 7 0 9
1 4 10,519 8 4 0
Figura 4. Dendograma do Texto para a 4 a série
Dendrogram using Average Linkage (Between Groups)
Rescaled Distance Cluster Combine
C A S E 0 5 10 15 20 25
Label Num +---------+---------+---------+---------+---------+
/R/INIC 13 -+
N 20 -+
/r/INT 12 -+-+
ESA 18 -+ I
OSO 16 ---+-------+
M 19 ---+ +-----------------+
/R/INT 11 -----------+ +-------------------+
EZA 17 -----------------------------+ I
/R/VOGNAS 14 -------------+-----------------------------------+
/R/CONS 15 -------------+
Tabela 7. Esquema de Aglomeração no Texto para a 4a série
Cluster Combined
Stage Cluster First Appears
Stage Cluster 1 Cluster 2 Coefficients Cluster 1 Cluster 2 Next Stage
1 13 20 0,0665 0 0 2
2 12 13 0,0917 0 1 3
3 12 18 0,2883 2 0 4
4 12 16 0,4347 3 0 5
5 12 19 0,4983 4 0 6
6 11 12 1,7954 0 5 8
7 14 15 2,3750 0 0 9
8 11 17 4,9353 6 0 9
9 11 14 8,5097 8 7 0
55

A análise dos agrupamentos sugere que os contextos ortográficos problemáticos
são os mesmos para a 2 a e a 4 a séries, ou seja, os contextos que são difíceis para uma
série também são difíceis para a outra. A diferença entre as duas séries estaria na
quantidade de erros ortográficos cometidos, sendo que as crianças da série mais
avançada apresentariam um número mais reduzido de erros do que as de série mais
baixa. Também pode-se observar que nos três grupos que se formaram, dois se
constituem exatamente pelas principais fontes de dificuldade encontradas pelas crianças
– /R/ depois de consoante, /R/ depois de vogal nasal e sufixo eza – e o terceiro conteria
a maior parte das regularidades contextuais enfocadas neste estudo. Curiosamente, nota-
se que os sufixos esa e oso, que poderiam ser considerados como contextos difíceis pela
regra morfossintática subjacente, encontram-se no grupo mais fácil para as crianças,
junto com as regularidades contextuais. Tais resultados parecem indicar que seja pouco
provável que as crianças estejam fazendo a escolha da letra com base na categoria
gramatical das palavras para grafar os sufixos esa e oso. Na verdade, a opção pela letra s
para grafar estes sufixos parece estar relacionada a uma regra de contexto na qual a letra
s entre vogais representa o som /z/.
7.1.2. Desempenho das crianças na Tarefa de Transgressão Intencional
7.1.2.1. Uso do r e rr
Foi calculada a proporção média de erros intencionais cometidos pelas crianças
de 2 a e 4 a séries nas tarefas de ditado de palavras e texto para a regra de contexto do uso
do r e rr (Tabela 8).
56

Foi realizada análise de variância para delineamento misto, com medidas
repetidas para os fatores tarefa (ditado X texto) e regra (/r/ intervocálico X /R/ inicial X
/R/ depois de consoante X /R/ depois de vogal nasal X /R/ intervocálico). Os resultados
desta análise mostram que a escolaridade foi um fator que influenciou no desempenho
apresentado pelas crianças, F (1,50) = 21,44, p < 0,01. As crianças de 4 a série
cometeram um número maior de transgressões do que as crianças de 2 a .
Há um efeito significativo relacionado às regras, F (4,200) = 21,56, p < 0,01.
Com a utilização de post-hoc teste (Neuman Keuls) pode-se constatar que as
representações /R/ inicial e /r/ intervocálico não apresentam diferença significativa entre
si, apenas em relação aos outros contextos. Também não há uma diferença significativa
da representação /R/ depois de vogal nasal com as representações /R/ depois de
consoante e /R/ intervocálico. Entretanto, os contextos /R/ depois de consoante e /R/
intervocálico apresentam diferença significativa entre si. As crianças cometeriam um
maior número de transgressões intencionais nos contextos /R/ intervocálico, /R/ depois
de vogal nasal e /R/ depois de consoante do que nas representações /R/ inicial e /r/
57

intervocálico. Isto mostra que as crianças tendem a fazer um número maior de erros
intencionais exatamente nos contextos ortográficos em que elas apresentam maior
dificuldade na escrita. Esta escolha pelos contextos mais difíceis pode estar indicando
que elas os identificam como entrave em sua produção.
O contexto da tarefa também demonstrou ser fator influente na produção escrita,
F (1,50) = 77,26, p < 0,01. As crianças produzem um maior número de erros
intencionais no ditado de palavras. Isto já era esperado já que neste contexto de
produção as crianças deveriam realizar transgressões em todas as palavras investigadas,
enquanto que no texto as palavras eram selecionadas a critério do aluno participante.
A interação entre regra e tarefa é significativa, F (4,200) = 3,74, p < 0,01. No
ditado de palavras, as representações /R/ inicial e /r/ intervocálico não diferiram
significativamente da representação /R/ depois de consoante. Isto se deve a um aumento
na incidência de erros intencionais cometidos nos dois primeiros contextos. O /r/
intervocálico, inclusive, não apresentou diferença significativa com a representação do
/r/ depois de vogal nasal. Durante realização da tarefa as crianças parecem procurar
pontos que elas consideram como mais críticos para realizar a transgressão intencional.
Uma das preocupações na montagem da tarefa do ditado de palavras envolvia a seleção
de palavras que, preferencialmente, apresentassem como restrições ortográficas apenas
o contexto que fosse foco do estudo. As palavras selecionadas com as representações
/R/ inicial e /r/ intervocálico possuíam basicamente estes pontos como mais
problemáticos, com poucas exceções, o que pode ter facilitado na opção da criança por
estes contextos. No texto, dada a grande variedade de contextos ortográficos possíveis
para invenção de erros pelas crianças, estas representações podem ter acabado passando
desapercebidas, já que, como observado no desempenho ortográfico, elas não
representam dificuldade na produção infantil.
Também foi observado, no ditado de palavras, que há uma diferença
significativa da representação do /R/ intervocálico em relação a representação do /R/
depois de vogal nasal. Houve um aumento no número de transgressões cometidas pelas
crianças no contexto do /R/ intervocálico, que, na verdade, passou a diferir de todos os
outros. Além deste ser um obstáculo para a escrita convencional e possivelmente
58

identificado pela criança desta forma, não havia praticamente concorrência de outros
contextos ortográficos críticos nas palavras utilizadas, o que já é o caso do /R/ depois de
vogal nasal. As palavras com esta representação tem, por exemplo, a própria
nasalização como contexto possível para a realização de transgressões propositais.
No texto foi constatada uma diferença significativa entre as representações /R/
depois de consoante e /R/ depois de vogal nasal. As crianças realizaram um número
maior de erros intencionais no /R/ depois de vogal nasal do que no /R/ depois de
consoante.
Outras interações não foram significativas.
Assim como encontrado no presente estudo, Cavalcante (2000) também
constatou que a escolaridade interfere no desempenho das crianças ao cometerem as
transgressões intencionalmente. As crianças de série mais avançada fizeram mais erros
propositais nos contextos críticos investigados do que as de série anterior. A
representação /R/ intervocálico foi o contexto no qual as crianças cariocas e as de
Recife cometeram o maior número de violações. No entanto, as representações /R/
depois de consoante e /R/ depois de vogal nasal, onde neste estudo as crianças
realizaram grande número de erros propositalmente, foram exatamente os contextos
ortográficos onde as crianças de Recife menos realizaram suas transgressões.
7.1.2.2. Utilização de m e n diante de consoantes (Nasalização)
A proporção média de erros intencionais realizados no contexto de nasalização
pelas crianças de 2 a e 4 a séries foi obtida para o ditado de palavras e para o texto
(Tabela 9).
59

Os dados foram submetidos a uma análise de variância para delineamento misto,
com medidas repetidas para os fatores tarefa (ditado de palavras X texto) e regra
(nasalização com m X nasalização com n). A escolaridade mostrou-se como fator
determinante no desempenho apresentado pelas crianças, F(1,50) = 10,09, p < 0,01. As
crianças de 4 a série fazem um maior número de transgressões nos contextos críticos do
que as de 2 a .
Em relação às regras de nasalização, há diferença significativa entre elas, F
(1,50) = 28,98, p < 0,01. As crianças cometem mais erros intencionais sobre o m.
Novamente a incidência de erro intencional recai sobre o contexto ortográfico que se
apresenta como obstáculo na escrita infantil.
No fator tarefa há diferença significativa, F (1,50) = 82,83, p < 0,01. É mais fácil
para as crianças cometerem erros intencionais nos contextos críticos no ditado de
palavras do que no texto. Isto confirma a expectativa de que as crianças das séries
investigadas realizariam mais transgressões propositalmente na tarefa de ditado de
palavras.
60

A interação entre tarefa e série também demonstrou ser significativa, F(1,50) =
7,42, p < 0,01. O post-hoc teste (Neuman Keuls) indica que o desempenho das crianças
de 4 a série na tarefa do texto não difere do apresentado pelas crianças de 2 a série no
ditado de palavras. Isto mostra que nem sempre a performance das crianças de 4 a série é
superior às de 2 a , além da tarefa de ditado de palavras não influenciar de maneira
absoluta na realização de transgressões propositais pelas crianças.
Outras interações não foram significativas.
No estudo realizado por Cavalcante (2000), a escolaridade apresenta-se como
fator determinante na performance das crianças. O número de transgressões cometidas
pelas crianças de 4 a série é bastante superior ao da 2 a . Este resultado coincide com o
encontrado no presente estudo. Entretanto, Cavalcante (2000) não encontra diferença
entre o m e o n na nasalização diante de consoantes, o que vai de encontro à preferência
das crianças deste estudo em realizar um maior número de erros intencionais na
nasalização do m diante de p e b.
7.1.2.3. Regras Morfossintáticas
A Tabela 10 indica a proporção média de erros intencionais das crianças de 2 a e
4 a série referentes às regras morfossintáticas nas tarefas propostas no estudo.
61

Foi realizada uma análise de variância para delineamento misto, com medidas
repetidas para os fatores tarefa (ditado de palavras X texto) e regra (sufixos oso X esa X
eza). Houve influência significativa da escolaridade, F (1,50) = 10,06, p < 0,01. As
crianças de 4 a série tiveram uma performance melhor do que as de 2 a . Não houve
diferença significativa entre as regras.
O tipo de tarefa utilizada é um fator que interfere na produção infantil, F (1,50)
= 25,45, p < 0,01. As crianças cometem mais erros propositais na tarefa do ditado de
palavras do que no ditado do texto. A interação tarefa X série apresentou efeito
significativo, F (1,50) = 4,84, p = 0,03. O emprego de post-hoc teste (Neuman Keuls)
mostra que há uma diferença significativa na produção das crianças da 4 a série no ditado
de palavras e texto, enquanto que, para a 2 a série, o contexto da tarefa não interferiu
significativamente na performance das crianças. A 4 a série produziu mais erros
intencionais sobre o ditado de palavras.
Outras interações não foram significativas.
62

7.1.3. Relação entre desempenho na tarefa de erro intencional e escores nas tarefas
de avaliação da ortografia
Finalmente, foi analisada a relação entre os desempenhos das crianças nas
atividades realizadas – ditados de palavra e texto e tarefas de erro intencional. Foram
examinadas as correlações (Pearson) entre a tarefa de erro intencional e a avaliação da
competência ortográfica para cada contexto ortográfico estudado, sendo considerada
separadamente a tarefa (ditado de palavras e texto). Os contextos /R/ inicial e /r/
intervocálico não foram incluídos na correlação pelo efeito de teto que apresentaram.
No ditado de palavras, a correlação entre as tarefas se mostrou significativa para
/R/ intervocálico (r = 0,454, p < 0,01), /R/ depois de consoante (r = -0,297, p < 0,05),
/R/ depois de vogal nasal (r = -0,328, p < 0,05), sufixo eza (r = 0,309, p < 0,05) e
nasalização com m diante de p e b (r = 0,411, p < 0,01). A nasalização com n diante de
consoantes não foi significativa pelo efeito de teto apresentado neste contexto de
produção. Os sufixos esa e oso também não apresentaram correlação significativa.
No texto, foram significativas as correlações para o /R/ intervocálico (r = 0,396,
p < 0,01), /R/ depois de consoante (r = -0,374, p < 0,01), /R/ depois de vogal nasal (r = -
0,348, p = 0,01), sufixo eza (r = 0,349, p = 0,01), nasalização com m diante de p e b (r =
0,320, p < 0,05) e nasalização com n diante de consoantes (r = 0,287, p < 0,05).
Novamente os sufixos esa e oso não se correlacionaram significativamente.
Os resultados da correlação mostram que a tarefa de erro intencional está
relacionada a maioria dos contextos específicos investigados. Nos contextos /R/
intervocálico, sufixo eza, nasalização com m e nasalização com n (apenas no texto), as
correlações entre as tarefas foram positivas. Isto significa que quanto melhor a
competência ortográfica maior o número de erros intencionais feitos pela criança.
Entretanto, as correlações para o /R/ depois de consoante e /R/ depois de vogal
nasal foram negativas. As correlações negativas indicam que quanto mais baixo o
desempenho ortográfico em relação ao contexto ortográfico em questão, maior foi o
número de transgressões intencionais que as crianças cometeram neste contexto. Isto
63

sugere que o erro intencional não indica necessariamente o bom desempenho
ortográfico.
O fato das crianças realizarem erros intencionais sobre contextos nos quais não
apresentaram um bom desempenho ortográfico parece estar indicando que as crianças
transgridem propositalmente sobre os contextos que elas identificam como
problemáticos. Portanto, mesmo grafando determinado contexto incorretamente, ela
pode vir a realizar a transgressão sobre ele se o perceber como difícil.
Os contextos nos quais as crianças tiveram ótimo desempenho na escrita mas
realizaram poucas transgressões, tais como /R/ inicial e /r/ intervocálico, e aqueles em
que não houve relação entre a tarefa de erro intencional e a competência ortográfica –
sufixos esa e oso – também confirmam que a tarefa de erro intencional não reflete
sempre a competência ortográfica da criança. Por um lado, parece haver uma certa
despreocupação das crianças em cometer erros intencionalmente sobre o óbvio, isto é,
sobre os contextos já adquiridos e que, por não representarem mais uma dificuldade
para as crianças, estariam em um nível automatizado de utilização (Gombert, 1990). De
outro lado, a tarefa de erro intencional pode não ser realizada de maneira sistemática em
determinado contexto, caso a criança não o identifique como problemático.
No estudo de Cavalcante (2000), apesar das crianças de 2 a série terem obtido um
bom desempenho na maioria dos contextos do r e rr e nasalização diante de consoantes,
praticamente não realizaram transgressões intencionais sobre estes contextos. Com isto,
Cavalcante (2000) concluiu que a tarefa de erro intencional não acessa o conhecimento
da criança acerca das regras ortográficas. Este resultado, no entanto, pode estar
apontando para uma não preocupação das crianças com estes contextos específicos. As
crianças realizam transgressões sobre os contextos que são focos de atenção. A tarefa de
erro intencional, pode, em alguns contextos, não estar relacionada a um bom
desempenho ortográfico, na medida em que o uso automatizado não requer consciência
imediata, aspecto essencial para realização da tarefa de erro intencional.
Com o objetivo de examinar se, mesmo considerando a influência da
escolaridade, os escores nas tarefas de erro intencional continuariam relacionados
64

significativamente ao desempenho ortográfico das crianças nos contextos em que a
correlação entre ambas as tarefas foi significativa, utilizou-se a análise de regressão
múltipla tanto para o ditado de palavras quanto para o texto, em que os fatores foram
introduzidos em ordem fixa. A variável independente Série foi introduzida
primeiramente para verificar se a tarefa de erro intencional ainda assim estaria
relacionada ao desempenho ortográfico da criança, mesmo após considerada a
variabilidade explicada pela escolaridade.
A análise de regressão dos contextos /R/ intervocálico, M e N diante de
consoantes e sufixo eza indicaram que a tarefa de erro intencional está
significativamente relacionada com o desempenho ortográfico das crianças, mesmo
tendo sido consideradas diferenças em relação a escolaridade (Tabelas 11, 12, 13, 14).
65

Tabela 14. Análise de Regressão Múltipla para a proporção média de acertos no sufixo eza
R 2
B SE B Beta
Série 0,662 0,471 0,099 0,561**
Tarefa de Erro Intencional 0,662 0,315 0,119 0,312**
Série 0,652 0,486 0,097 0,548**
Tarefa de Erro Intencional 0,652 0,491 0,159 0,337**
Nota. ** A correlação é significativa no nível 0.01.
* A correlação é significativa no nível 0.05.
Desempenho Ortográfico - Sufixo eza
Ditado de Palavras
Texto
No entanto, as análises de regressão realizadas para os contextos /R/ depois de
consoante e /R/ depois de vogal nasal não apontam a tarefa de erro intencional como
relacionada significativamente com o desempenho ortográfico, uma vez tendo sido
introduzida previamente a escolaridade (Tabelas 15 e 16).
Tabela 15. Análise de Regressão Múltipla para a proporção média de acertos no contexto /R/ consoante
* A correlação é significativa no nível 0.05.
Tabela
16. Análise de Regressão Múltipla para a proporção média de acertos no contexto /R/ vogal nasal
R 2
R 2
B SE B Beta
Série 0,458 0,643 0,142 0,677**
Tarefa de Erro Intencional 0,458 0,000 0,163 0,000
Série 0,436 0,791 0,141 0,784**
Tarefa de Erro Intencional 0,436 -0,347 0,213 -0,227
Nota. ** A correlação é significativa no nível 0.01.
Desempenho Ortográfico - /R/ consoante
Ditado de Palavras
Texto
Desempenho Ortográfico - /R/ vogal nasal
B SE B Beta
Ditado de Palavras
Série 0,477 0,523 0,148 0,562**
67

Portanto, nos contextos /R/ depois de consoante e /R/ depois de vogal nasal é a
escolaridade que melhor explica o desempenho das crianças na escrita. As crianças de
4 a série possuem mais conhecimento sobre estes contextos e, por isso, cometem um
número de erros ortográficos menor do que as de 2 a .
7.2. Análise Geral do Desempenho das Crianças
A partir deste tópico, os dados foram analisados com base no estudo realizado
por Morais (1996, 1998, 1999). Portanto, o desempenho das crianças nas tarefas de
avaliação da ortografia e nas tarefas de erro intencional foi considerado de forma mais
ampla, incluindo contextos outros além dos relacionados ao uso do r e rr, nasalização
diante de consoantes e sufixos esa, oso e eza.
Desta forma, inicialmente foi abordado o desempenho ortográfico geral das
crianças de 2 a e 4 a série nas tarefas de ditado de palavras e do texto. Os erros
ortográficos foram classificados em categorias para posterior análise. Também foi
obtido o número médio de erros cometidos pelas crianças de ambas as séries nos
contextos de produção.
68

Em seguida, o desempenho na tarefa de erro intencional das crianças de 2 a e 4 a
série foi analisado tanto para o ditado de palavras quanto para o texto. Foi feita uma
classificação dos erros intencionais, além de calculada a média de transgressões
realizadas pelas crianças de ambas as séries. Para esta análise foi considerada a
totalidade de transgressões propositais feitas pelas crianças, considerando o conjunto de
contextos ortográficos possíveis em função das palavras selecionadas.
Por último, foi examinada a relação entre o desempenho na tarefa de erro
intencional com os escores das tarefas ortográficas (ditado de palavras e texto). A
influência da escolaridade foi também examinada.
7.2.1. Erros Ortográficos
Morais (1996, 1998, 1999) utilizou quatro categorias para classificar os erros
das crianças: erros de correspondência entre letra e som, erros de acentuação, erros de
segmentação e erros ligados à concordância gramatical. A maior parte dos erros
cometidos pelas crianças ficou concentrada na primeira categoria. Na classificação do
presente estudo, optou-se por desmembrar a categoria referente à correspondência entre
letra e som por ser muito ampla, abarcando desde a dificuldade em marcar a
nasalização, passando por erros por desconsiderar regularidades contextuais indo até o
desconhecimento da etimologia da palavra. Desta forma, para uma análise mais
detalhada, os erros ortográficos foram classificados em 12 categorias, baseadas nas
classificações de erros de ortografia adotadas por Carraher (1985) e Correa (2001). As
categorias utilizadas estão descritas abaixo:
1. Troca entre letras com sons foneticamente semelhantes (Silva, 2002): a
criança escreve a palavra trocando letras que possuem similaridade fonética. É o
caso, por exemplo, da substituição da letra da palavra viveu pela letra
formando fiveu, ocorrendo, neste caso, uma troca entre um fonema sonoro e
surdo. Outros exemplos: corila (gorila), lampida (lambida).
69

2. Dificuldade no uso de marcadores de nasalização: a criança omite, faz uso
inadequado ou utiliza uma grafia alternativa para o marcador de nasalização.
Um exemplo desta dificuldade é a omissão do til na palavra são, que é grafada
sem o indicativo de nasalização (sao). Outros exemplos: sam (são), erolado
(enrolado).
3. Dificuldade com as regularidades contextuais: a criança escreve a palavra
com uma letra que não seria adequada devido a uma regra contextual que
determina a opção mais apropriada. Por isto, o contexto deve ser considerado,
ou seja, a partir da posição que a letra ocupa na palavra e pela letra subseqüente
e/ou antecedente é que vai ser definido o grafema a ser utilizado. A título de
ilustração consideremos o uso do rr. O rr pode ser colocado apenas entre vogais
para representar o som de /R/, não sendo utilizado no início ou final da palavra,
nem entre consoante e vogal para marcar este som. Ao escrever honrra com dois
rr, portanto, a criança está violando uma regra de contexto. Outros exemplos:
tanpa (tampa), alugel (aluguel), viagante (viajante).
4. Dificuldade nas regularidades morfossintáticas: a criança comete o erro sobre
algum aspecto morfossintático da palavra. É o caso da utilização do ou
para grafar o sufixo /eza/. O que determina qual seria a letra adequada para
escrever o sufixo é a categoria gramatical da palavra: quando for um adjetivo o
é a escolha mais apropriada (inglesa); quando for um substantivo deve-se
colocar o (beleza). Portanto, o erro ocorre quando a criança coloca o sufixo
do adjetivo com (ingleza) ou o do substantivo com (belesa). Outros
exemplos: voão (voam), viajol (viajou), famozo (famoso).
5. Dificuldade na marcação de acentos gráficos: a criança não utiliza o acento
ou acentua indevidamente as palavras. Alguns exemplos: hortencia (hortência),
aguá (água).
70

6. Dificuldade na escrita de sílabas complexas: ao escrever, a criança simplifica
as sílabas mais complexas, aproximando-as do padrão CV, que é a configuração
mais básica da língua portuguesa. As sílabas complexas compreenderiam os
encontros consonantais, dígrafos, sílabas travadas e ditongos. Um exemplo
muito comum deste tipo de erro é a omissão da letra de palavras tais como
em sempre, que a criança grafa como sempe. Outros exemplos: bincam
(brincam), enroca (enrosca).
7. Segmentação: ao escrever o texto, a criança agrupa palavras como se
representassem um único segmento (hipossegementação) ou desmembra uma
palavra, dividindo-a em dois ou mais segmentos (hipersegmentação). Alguns
exemplos: acasa (a casa), em rugado (enrugado).
8. Modificações na palavra: a criança escreve a palavra omitindo, adicionando,
deslocando letras de posição ou fazendo trocas “inusitadas” entre letras. Com
isto, a palavra em questão sofre modificações que interferem na sua integridade,
dificultando ou inviabilizando a compreensão. Alguns exemplos: regionhoõsas
(regiões), arras (arrastados).
12. Transcrição da Fala: a fala não pode ser representada de forma fiel na escrita,
já que não existem apenas relações biunívocas entre letras e sons. A criança,
então, pode cometer um erro por escrever a palavra da mesma forma como esta é
pronunciada. É o caso da palavra faz que na fala apresenta o som /i/, mas que, no
entanto, não deve ser grafado com a letra . Caso a criança a escreva com
(faiz) estará cometendo um erro de transcrição de fala. Outros exemplos: olia
(olha), naisceu (nasceu).
13. Desconhecimento da etimologia da palavra: o erro ortográfico está
relacionado à opção por uma grafia que, apesar de adequada fonologicamente,
não é a forma correta de escrita daquela palavra. Neste caso, o que determina a
71

escrita correta é a etimologia da palavra. Alguns exemplos: sigarra (cigarra),
mechendo (mexendo), preza (presa), jirassol (girassol), onra (honra).
14. Hipercorreção: ao se dar conta de que a escrita não representa fielmente a fala,
a criança pode, numa tentativa de corrigir os erros de transcrição da fala, fazer
generalizações indevidas para outros contextos em que este cuidado não deveria
ser empregado. É comum que palavras terminadas com a letra apresentem o
som /u/. Ao perceber isto, é possível que a criança utilize indiscriminadamente a
letra o para marcar o som /u/, cometendo erros tais como enrogado (enrugado).
15. Troca de letras por semelhança na grafia: a criança substitui uma letra por
outra que é similar na forma ou por uma inversão na posição. São freqüentes os
casos em que a criança confunde as letras e na letra cursiva, pois há
grande semelhança no traço. Poderia-se encontrar, então, casos como romos no
lugar de ramos. Outro exemplo: sen (sem).
A distribuição dos erros ortográficos cometidos pelas crianças de 2 a e 4 a séries nas
categorias descritas acima para o ditado de palavras e o texto está indicada nos Gráficos
1 e 2.
72

A maioria dos erros ortográficos recai basicamente nas mesmas categorias tanto
para as crianças de 2 a quanto para as de 4 a série, ou seja, os pontos de dificuldade são
similares para ambas as séries.
No ditado de palavras, a maioria dos erros ortográficos, tanto das crianças de 2 a
quanto as de 4 a série, estavam relacionados à não consideração de regras contextuais
(40% dos erros para 2 a e 4 a séries) e dos aspectos morfossintáticos da língua (30% para
2 a série e 27% para 4 a ). Isto indica desconhecimento para os aspectos da língua
referentes ao contexto e à morfossintaxe. O restante dos erros ficou distribuído nas
outras categorias, que mostraram menor relevância dada a baixa freqüência de
ocorrência, com um percentual que variou de 1% a, no máximo, 8%. Isto ocorreu
porque, no ditado de palavras, além de todas as palavras estarem relacionadas a
regularidades contextuais e morfossintáticas (uso do r e rr, nasalização diante de
consoantes e sufixos esa, eza e oso), procurou-se evitar a utilização de outros contextos
ortográficos problemáticos presentes na língua.
No texto houve uma queda no número de erros relacionados às regras
contextuais (20% para a 2 a série e 23% para a 4 a ) e aos aspectos morfossintáticos (14%
para a 2 a série e 17% para a 4 a série). Mesmo assim, estes continuam se destacando
como importantes fontes de dificuldades para as crianças. Com a maior diversificação
de contextos ortográficos, a proporção relativa dos erros devido ao contexto e à
morfossintaxe tinha que cair, pois as crianças tinham muitos outros contextos críticos
para errar, o que levou a uma maior distribuição pelas categorias de erro. Foi notado um
aumento especialmente dos erros por desconhecimento da etimologia da palavra (17%
para 2 a série e 21% para a 4 a série) e por dificuldade na acentuação (10% para a 2 a série
e 16% para a 4 a série). As crianças, de um modo geral, têm dificuldade para lidar com
os aspectos irregulares da língua, para os quais não há nenhuma regra que facilite a
escolha pelo grafema adequado para se grafar a palavra. Além disso, estas crianças
também têm muita dificuldade de acentuação, que se concentra na omissão dos acentos
gráficos, evidenciando um desconhecimento acerca das regras sobre tonicidade.
74

Também houve uma maior incidência dos erros ligados a modificações da
palavra (2 a série com 11% e 4 a com 8%) e a transcrição literal da fala (9% para 2 a série
e 5% para 4a). Mas são as crianças de 2 a série que fazem um maior número de erros que
alteram a palavra-base e têm mais dificuldade do que as de 4 a para lidar com as
diferenças entre a fala e a escrita.
Foi calculado o número médio de erros ortográficos cometidos pelas crianças de
2ª e 4ª séries no ditado de palavras e no texto, tanto nos contextos críticos investigados
quanto fora deles (Tabela 17).
Com o emprego do Teste T para amostras independentes foi examinada a
diferença entre a quantidade de erros ortográficos de ambas as séries, sendo
considerados separadamente o ditado de palavras e o texto. Os resultados mostram que
existe diferença significativa entre o número de erros das crianças de 2ª e 4ª séries no
ditado de palavras, t(50) = 5,028, p < 0,01 e no texto, t(50) = 5,298, p < 0,01. As
crianças de 2 a série erraram mais do que as de 4 a série em ambos os contextos de
produção. Isto reflete a influência da escolaridade na escrita correta de palavras. No
texto, as crianças cometeram um número maior de erros devido a maior quantidade de
palavras utilizadas neste contexto de produção. No entanto, observa-se que a razão entre
o número de erros das 2 a e 4 a séries é semelhante em ambas as tarefas.
75

7.2.2. Erros Intencionais
Neste estudo optamos por realizar uma categorização não só específica mas
também mais minuciosa do que a realizada por Morais (1996, 1998, 1999) para os erros
intencionais por duas razões. Ao categorizar os erros ortográficos procura-se verificar
que aspectos da norma ortográfica a criança estaria infringindo. Caso escrevesse a
palavra viajou com a letra no lugar do estaria desconsiderando um aspecto
morfossintático da língua portuguesa, onde os verbos na 3 a pessoa do singular do
pretérito perfeito nunca seriam grafados com a letra no final da palavra. No entanto,
na tarefa de erro intencional, caso a criança substituísse o pela letra , não se
poderia afirmar que a criança teve a intenção de cometer a transgressão sobre um
aspecto morfossintático da palavra. A criança poderia simplesmente estar demonstrando
saber que a letra também representa o som /u/, e que esta representação é
inadequada na palavra. Um segundo motivo se refere as categorias usadas por Morais
(1996, 1998, 1999) que são por demais amplas. A categoria de erros intencionais
referentes à correspondência letra-som recobrem erros que vão desde a alteração pura e
simples da identidade da palavra à transgressões mais elaboradas relacionadas à
concorrência de várias representações gráficas para um determinado som.
A seguir estão descritas as categorias utilizadas para classificar os erros
intencionais cometidos pelas crianças de 2 a e 4 a séries no ditado de palavras e no texto:
1. Transgressão Paradoxal: a criança escreve a palavra errada como se fosse a
certa e escreve o erro intencional com a grafia correta da palavra. Alguns
exemplos: girassol (girrassol), beleza (belesa).
2. Troca, omissão ou acréscimo de letra relacionada à nasalização das
palavras: A criança pode fazer uma omissão, acréscimo de letra ou grafia
alternativa para a representação da nasalização. Ao escrever como erro
intencional regiam no lugar de regiões, a criança estaria fazendo uso de um
marcador alternativo para a nasalização. Outros exemplos: pinrata (pirata),
desora (desonra), nao (não), ponba (pomba).
76

3. Omissão ou acréscimo de acentuação: a criança omite a acentuação ou
acentua letras indevidamente. Alguns exemplos: ja (já), rubí (rubi), eńŕrosĝa
(enrrosca).
4. Categoria do “Seu Creisson”: a criança imita um personagem do programa de
televisão “Casseta e Planeta”, o Seu Creisson, incluindo a letra na última
sílaba da palavra, formando um ditongo. Alguns exemplos: farofia (farofa),
lendia (lenda).
5. Deslocamento de letras: a criança comete o erro apenas trocando a posição de
letras ou sílabas. É o caso da troca de posições das letras e na palavra
beteraba, formando beretaba. Outros exemplos: lebeza (beleza), espreteza
(esperteza), surioco (curioso).
6. Transcrição da Fala: a criança transgride escrevendo a palavra da forma como
ela é pronunciada. É freqüente que na pronúncia do gerúndio seja omitido o som
/d/, especialmente nas classes de baixa renda. A criança, por se dar conta desta
diferença entre a fala e a escrita, cria erros transcrevendo a fala literalmente,
colocando mexeno no lugar de mexendo.
Outros exemplos: inpada (enpada), enroladu (enrolado).
7. Hipossegmentação: a criança junta duas palavras, formando um único
segmento. Exs: elenão (ele), dadele (ele).
8. Simplificação silábica: a criança comete a transgressão simplificando sílabas
complexas, aproximando-as do padrão CV (consoante e vogal). Alguns
exemplos: pesa (presa), sota (solta).
9. Complexificação Silábica: a criança torna as sílabas simples em estruturas mais
complexas, ou seja, cria um travamento, um encontro consonantal, um ditongo
77

ou um dígrafo. Alguns exemplos: betreraba (beteraba), enriquecher
(enriquecer), vilvel (vivel).
10. Modificações na palavra: a criança transgride através de substituição, omissão
ou acréscimo de letra (s) de maneira a modificar a palavra-base, causando
dificuldade ou até impossibilitando a compreensão do significado anterior da
palavra. Pela ortografia, não haveria uma razão que justificasse a transgressão
cometida pela criança, se constituindo, portanto, como um erro intencional num
nível mais elementar. Alguns exemplos: corrideira (corrida), farou (farofa), sar
(lar), desrencado (delicadesa), interro (inveja).
11. Troca de letras por semelhança na grafia: a criança comete o erro
substituindo uma letra por outra que se assemelhe a esta na forma ou devido a
uma inversão na posição. As letras b e d são bastante parecidas no seu formato,
tendo como diferença apenas o lado em que é grafada a “barriga”. Portanto, ao
escrever besrespeito para a palavra desrespeito, a criança estaria transgredindo
intencionalmente pela similaridade gráfica entre as letras. Outros exemplos:
carrida (corrida), naratona (maratona).
12. Troca entre letras que representam sons foneticamente semelhantes 8 :
substituição da letra por outra que possua similaridade fonética com a forma
ortograficamente correta. Alguns exemplos: bederaba (beteraba), carra (garra),
fiachou (viajou).
13. Troca entre letras que representam o mesmo som em outro contexto, mas
que representam sons diferentes no contexto atual: a criança faz uma troca
entre letras que não apresentam o mesmo som no contexto da palavra em
questão, mas que, em um contexto diferente, estes grafemas concorrem para
representar o mesmo som. As letras e , por exemplo, concorrem para
8 Exemplos de pares de sons foneticamente semelhantes segundo a classificação de Silva (2002): p/b, t/d,
k/g, f/v, z/j, l/r, m/ŋ, n/ŋ.
78

epresentar o som /j/. No entanto, a letra jamais pode ser usada para
representar o som /g/. Ao substituir a letra pela na palavra gara, criando
o erro jara, a criança está demonstrando conhecimento de que estas letras são
utilizadas para representar o mesmo som em outro contexto, mesmo não se
aplicando no contexto atual. Outros exemplos: sorrida (corrida), espochição
(espoxição), inglessa (inglesa), beteraba (beterraba).
14. Troca entre letras que representam o mesmo som: a criança substitui a letra
por outra que, naquele contexto, apresenta o mesmo som que a primeira,
mantendo, desta forma, a mesma pronúncia para a palavra em questão. Alguns
exemplos: cerenata (serenata), enraivesser (enraivecer), viajol (viajou), famozo
(famoso), onrra (onra), çurra (surra).
15. Violação da estrutura silábica da língua portuguesa: a criança comete o erro
por violar a estrutura básica da sílaba ou susbtituir letras por outras que não
fazem parte da nossa língua. Na língua portuguesa, a duplicação de consoantes
em uma sílaba só é possível para algumas letras, tal como ocorre nos encontros
consonantais, mas não com o , que foi duplicado no erro intencional da
palavra gorila, formando gorrilla. Outros exemplos: ssura (surra), thintha
(tinta), ruby (rubi).
Abaixo segue a distribuição nas categorias descritas dos erros intencionais
cometidos pelas crianças de 2 a e 4 a séries no ditado de palavra e no texto (Gráficos 3 e
4).
79

%
%
40
35
30
25
20
15
10
5
0
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Gráfico 3. Porcentagem dos Tipos de Erros Intencionais cometidos pelas
crianças do Ditado de Palavras
1 2 3 4 5 6 8 9 10 11 12 13 14 15
Categorias de Erro Intencional
Gráfico 4. Porcentagem dos Tipos de Erros Intencionais cometidos pelas
crianças no Texto
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Categorias de Erro Intencional
80
2a série
4a série
2a série
4a série

Os erros intencionais que as crianças de 2 a série cometem com mais freqüência
são os que envolvem modificações na palavra (categoria 10 - 35% no ditado de palavras
e 32% no texto). No ditado de palavras, também podem ser verificadas, de forma menos
expressiva, transgressões relacionadas à marcação da nasalização (categoria 2 – 12%) e
trocas entre letras concorrentes para o mesmo som em contextos diferentes (categoria
13 – 13%). No texto, houve um aumento da utilização de transgressões pela substituição
de letras que representam o mesmo som pelas crianças de 2 a série (categoria 14 - 12%) e
uma diminuição das transgressões referentes à nasalização (categoria 2 - 8%) e à troca
entre letras concorrentes (categoria 13 - 10%).
As categorias nas quais as crianças de 4 a série mais transgrediram no ditado de
palavras foram as mesmas do texto: troca entre letras concorrentes para o mesmo som
em contextos diferentes (categoria 13 - 19% no ditado de palavras e 15% no texto) e
trocas entre letras com o mesmo som (categoria 14 - 17% no ditado de palavras e 23%
no texto). No ditado de palavras, para as crianças de 4 a série, as transgressões referentes
à marcação da nasalização também se destacaram (categoria 2 - 20%), mas houve um
grande declínio de seu uso no texto (categoria 2 – 10%).
A modificação das palavras (categoria 10) é a transgressão intencional mais
realizada pelas crianças de 2 a série em ambos os contextos de produção. Já as crianças
de 4 a série fazem menor uso desta opção (apenas 9% tanto no ditado de palavras quanto
no texto). A modificação da palavra base não envolve nenhum aspecto ortográfico e
afeta geralmente a identidade da palavra. Este tipo de erro intencional estaria, portanto,
em um nível mais simples e rudimentar.
As transgressões na marcação da nasalização (categoria 2) são realizadas tanto
pelas crianças de 2 a quanto pelas de 4 a série, mas, principalmente, pelas crianças de
escolaridade mais avançada. Ao fazer este tipo de erro intencional, a criança demonstra
conhecimento ou sensibilidade apurada para os aspectos relacionados à nasalização de
palavras. Quando comparados os dois contextos de produção, verifica-se uma
diminuição da utilização desta categoria no texto. Provavelmente isto ocorre devido a
ampliação dos contextos ortográficos, que se encontravam limitados no ditado de
81

palavras. As crianças, então, teriam outras opções onde poderiam realizar as
transgressões propositais.
As trocas envolvendo letras que representam o mesmo som (categoria 14)
juntamente com a troca entre letras concorrentes para o mesmo som em outro contexto,
mas não no da palavra em questão (categoria 13) são as opções mais freqüentes das
crianças de 4 a série para realização do erro intencional. Ao substituir uma letra por outra
que apresenta o mesmo som, a criança está evidenciando ter conhecimento sobre uma
outra forma de se grafar o fonema que, apesar de não corresponder a grafia
convencional na palavra, até seria possível foneticamente, já que representam
alternativas para um mesmo som. Desta forma, fica mantida a homofonia 9 e a
integridade da palavra. No caso da categoria 13, apesar da criança estar substituindo
uma letra por outra que naquele contexto não representa o som que se pretende, ela está
demonstrando ter conhecimento de que aquelas letras, em contextos diferentes, podem
representar o mesmo som.
Finalmente foi calculado o número médio de erros intencionais realizados pelas
crianças de 2ª e 4ª séries no ditado de palavras e no texto, tanto para os contextos
críticos investigados quanto fora deles (Tabela 18).
Tabela 18. Número médio de erros intencionais
N Palavras Texto
2a série 24 58,8 58,6
(9,0) (18,4)
4a série 28 65,8 76,6
(10,1) (37,0)
Os valores entre parênteses estão indicando o Desvio Padrão.
Para verificar se há diferença entre a quantidade de erros intencionais realizados
pelas crianças de 2ª e a 4ª série foi realizado o Teste T para amostras independentes,
analisando separadamente o ditado de palavras e o texto. Os resultados mostram que
existe diferença significativa entre o número de transgressões realizadas pelas crianças
de 2ª e 4ª séries no ditado de palavras, t(48) = 2,537, p < 0,05 e no texto, t(48) = 2,120,
9 Semelhança na pronúncia.
82

p < 0,05. Na tarefa de erro intencional as crianças de escolaridade mais alta cometeram
um maior número de transgressões do que as de 2ª série.
7.2.3. Relação entre Erro Intencional e Erro Ortográfico
Procuramos então analisar se o desempenho das crianças em realizar
transgressões intencionais, avaliado em diversos contextos ortográficos além dos
contextos críticos examinados, estaria relacionado ao desempenho ortográfico da
criança. Para esta análise consideramos o conjunto dos diversos contextos ortográficos
possíveis em função das palavras apresentadas no ditado de palavras e no texto, como
sugeria a abordagem proposta por Morais (1996, 1998, 1999).
Para analisar se as crianças que produzem erros intencionais mais elaborados
apresentam um melhor desempenho ortográfico, foi realizada a correlação (Pearson)
entre as variáveis erro ortográfico e erro intencional, considerando separadamente as
transgressões incipientes, que alteram a própria identidade da palavra (categoria 10) e
os erros intencionais mais sofisticados, que envolvem algum aspecto da ortografia
(todas as categorias restantes).
No ditado de palavras, foram significativas as correlações entre erro ortográfico
e erros intencionais incipientes (r = 0,463, p < 0,01) e erro ortográfico e erros
intencionais sofisticados (r = -0,448, p < 0,01). No texto, foram significativas as
mesmas correlações do ditado de palavras: erro ortográfico e erros intencionais
incipientes (r = 0,439, p < 0,01) e erro ortográfico e erros intencionais sofisticados (r = -
0,339, p < 0,01).
Os resultados da correlação mostram que quanto mais erros intencionais
elaborados as crianças fazem, menor é o número de erros na sua produção escrita e
quanto menos transgressões sofisticadas as crianças produzem, maior é a quantidade de
erros ortográficos. Com relação às transgressões incipientes, quanto maior é o número
de erros ortográficos, mais as crianças cometem erros intencionais deste tipo. Portanto,
83

as crianças com melhor desempenho ortográfico fazem transgressões mais elaboradas e
as com pior performance cometem erros intencionais elementares.
Para verificar se o resultado da correlação não poderia ser confundido à
influência da escolaridade no desempenho das crianças, foi realizada análise de
regressão múltipla para o desempenho ortográfico com os erros intencionais
sofisticados e os erros intencionais incipientes, tanto para o ditado de palavras quanto
para o texto (Tabelas 19 e 20). A variável independente Série foi inserida primeiramente
para examinar se a tarefa de erro intencional continuaria se relacionando ao
desempenho ortográfico da criança, mesmo depois de considerada a influência da
escolaridade.
Tabela 19. Análise de Regressão Múltipla para o Erro Ortográfico e os Erros Intencionais
Sofisticados
R 2
B SE B Beta
Série 0,593 -11,490 3,696 -0,490**
Erros Intencionais Sofisticados 0,593 0,360 0,051 1,119**
Série 0,389 -10,961 9,956 -0,188
Erros Intencionais Sofisticados 0,389 0,495 0,112 0,755**
Nota. ** A correlação é significativa no nível 0.01.
* A correlação é significativa no nível 0.05.
Total de Erros Ortográficos
Ditado de Palavras
Texto
84

Tabela 20. Análise de Regressão Múltipla para o Erro Ortográfico e os Erros Intencionais
Incipientes (Categoria 10)
R 2
B SE B Beta
Série 0,638 6,443 2,045 0,275**
Erros Intencionais Incipientes 0,638 0,641 0,081 0,692**
Série 0,551 13,388 5,691 0,230*
Erros Intencionais Incipientes 0,551 1,390 0,208 0,653**
Nota. ** A correlação é significativa no nível 0.01.
* A correlação é significativa no nível 0.05.
Total de Erros Ortográficos
Ditado de Palavras
Texto
Os resultados da análise de regressão mostram que erros intencionais
sofisticados e erros intencionais incipientes estão significativamente relacionados com o
desempenho ortográfico, mesmo tendo sido examinadas variações decorrentes da
escolaridade.
85

8. CONCLUSÃO E DISCUSSÃO FINAL
O objetivo principal desta investigação foi o de examinar se a tarefa de erro
intencional estaria relacionada à competência ortográfica das crianças em idade escolar.
Para isto, foram investigadas regularidades contextuais e morfossintáticas da Língua
Portuguesa.
Neste capítulo, retomaremos alguns pontos de interesse para discutir os
resultados encontrados, a fim de responder as seguintes questões:
1) Qual a influência da escolaridade sobre a performance da criança na tarefa de
avaliação da competência ortográfica e na tarefa de transgressão intencional da
norma quanto às regularidades morfossintáticas e às regularidades contextuais?
2) Qual a relação entre o desempenho ortográfico da criança quanto às regras de
contexto e às regras morfossintáticas e a capacidade de transgredir
intencionalmente? A tarefa de erro intencional estaria relacionada à competência
ortográfica em relação a algum contexto específico?
3) A diferença nas tarefas utilizadas por Morais (1996, 1998, 1999) e Cavalcante
(2000) poderia explicar os resultados discrepantes entre este dois estudos em
relação à eficácia da tarefa de erro intencional? As crianças apresentariam
desempenhos diferentes dependendo da forma escolhida para realização das
tarefas?
86

8.1 Influência da escolaridade sobre o desempenho ortográfico e a tarefa de erro
intencional
Antes de introduzir a questão da escolaridade, é importante esclarecer que os
dados foram analisados de duas formas diferentes, com base nos estudos realizados por
Morais (1996, 1998, 1999) e Cavalcante (2000). A finalidade é comparar a abordagem
destes dois autores para examinar o efeito nos resultados, proveniente das diferenças
metodológicas empregadas. Em um primeiro momento foram avaliados apenas os
acertos e transgressões intencionais realizadas sobre contextos particulares – regras de
contexto (uso do r e rr e nasalização diante de consoantes) e regras morfossintáticas
(sufixos esa, oso, eza). Posteriormente, os erros ortográficos e as transgressões
intencionais foram classificados, não sendo considerados contextos específicos, mas sim
a totalidade de violações – ortográficas e propositais – presentes na produção escrita da
criança. Vamos nos referir separadamente para cada uma destas abordagens.
Conforme demonstrado pela análise de variância, a escolaridade influenciou no
desempenho ortográfico das crianças nas regras de contexto (uso do r e rr e nasalização
diante de consoantes) e nas regras morfossintáticas (sufixo esa, oso e eza) tanto no
ditado de palavras quanto no texto. As crianças da 4 a série apresentaram um maior
número de acertos nos contextos investigados do que as de 2 a série.
No entanto, foi observado, a partir de análise do agrupamento hierárquico, que
os contextos ortográficos nos quais as crianças possuem dificuldade na escrita são
similares para a 2 a e 4 a séries. Ou seja, o que é difícil para uma série, também o é para a
outra. A diferença estaria basicamente na quantidade de erros cometidos. A 4 a série
apresenta um número menor de erros ortográficos nestes contextos de uma forma geral,
sugerindo que as crianças vão, com o aumento da escolaridade e da idade, superando as
fontes de dificuldade e obtendo maior êxito em sua produção escrita.
A escolaridade também interferiu no desempenho das crianças ao cometerem as
transgressões intencionalmente sobre as regras de contexto e as regras morfossintáticas
investigadas no ditado de palavras e no texto. As crianças de série mais avançada
fizeram mais erros propositais nos contextos críticos do que as de série anterior.
87

Quanto à classificação dos erros ortográficos, novamente confirma-se o papel da
escolaridade sobre o desempenho ortográfico das crianças. As crianças de 2 a série
apresentam uma quantidade maior de erros do que as de 4 a . No entanto, a divergência
entre as séries se limita a quantidade de erros observados. A distribuição de ambas as
séries nas categorias de erro ortográfico é bastante similar, isto é, as crianças de 2 a e 4 a
série cometem erros de mesma natureza. Pode-se observar que, no ditado de palavras,
as crianças de 2 a e 4 a série erram basicamente sobre os aspectos contextuais e
morfossintáticos da língua. No texto, outras categorias também apresentam destaque,
dada a ampliação dos contextos ortográficos utilizados para investigação. Erros de
acentuação e por desconhecimento da etimologia da palavra também foram bastante
comuns na produção infantil.
Na classificação dos erros intencionais, as crianças da série mais avançada
realizaram um número expressivamente maior de transgressões propositais. Também
foram notadas diferenças relativas à qualidade do erro efetuado. A maior parte das
transgressões da 2 a série envolveu a modificação da palavra-base, que não se refere a
nenhum aspecto ortográfico e dificulta a compreensão por parte do leitor pela alteração
feita na identidade da palavra. Já a maioria das crianças da 4 a série fez erros
intencionais mais elaborados, como trocas entre letras concorrentes para representar o
mesmo som em contextos diferentes e trocas entre letras que representam o mesmo som.
Estas violações implicam no conhecimento de aspectos ortográficos e não afetam o
significado da palavra.
Em suma, a escolaridade influencia no desempenho ortográfico da criança e na
sua capacidade de cometer violações intencionais sobre a norma. Em relação a
competência ortográfica, a diferença entre as séries reside basicamente na quantidade de
erros cometidos, já que as dificuldades para a 2 a e a 4 a série são semelhantes, não
havendo, portanto, uma variação em termos qualitativos. No caso do erro intencional,
não só pode ser notada diferença na quantidade de transgressões realizadas entre as
séries, como também na qualidade destas. As crianças da série mais avançada cometem
uma maior quantidade de erros propositais do que as de 2 a , além destes envolverem uma
88

maior sofisticação pois estão direcionados para aspectos críticos da norma ortográfica,
enquanto que a 2 a série realiza transgressões em um nível mais elementar.
8.2. Regularidades Contextuais e Morfossintáticas
Certos contextos ortográficos são mais fáceis para as crianças do que outros.
Entretanto, apesar da suposição de que as crianças teriam melhor desempenho nas
regras contextuais do que nas morfossintáticas, os contextos mais fáceis não se
constituem apenas das regularidades contextuais. Os sufixos esa e oso fazem parte do
grupo onde as crianças apresentaram boa performance, provavelmente pela utilização
“emprestada” de uma regra contextual. As representações /R/ depois de consoante, /R/
depois de vogal nasal e o sufixo eza são os contextos nos quais as crianças encontraram
maior dificuldade.
Os resultados encontrados apontam a existência de uma hierarquia na
aprendizagem dentro das regras ortográficas estudadas. Certos contextos ortográficos
seriam utilizados de forma adequada mais rapidamente do que outros. Esta hierarquia
interna aponta para uma aprendizagem que se daria inicialmente de forma parcial.
Apenas uma parte das representações relacionadas à regra ortográfica seria empregada
corretamente pelas crianças em sua produção escrita, isto é, a criança inicialmente
consideraria somente alguns aspectos referentes a estas regras. A medida em que vai
aumentando a idade e a escolaridade, a criança passa a usar de forma mais consistente a
regra ortográfica.
O modelo de estágios para o desenvolvimento da ortografia proposto por Nunes,
Bryant e Bindman (1997) parece se adequar a esta perspectiva. Outros estudos como o
de Monteiro (2000) e Rego e Buarque (2000) confirmam a existência de um percurso
para a aquisição da ortografia, que apresenta variações de acordo com o padrão
ortográfico em questão.
Inicialmente as crianças fariam uma escrita fonética das palavras. Depois,
perceberiam que apenas as correspondências entre letra e som mais básicas não são
suficientes para gerar a escrita correta. Este segundo momento envolveria a
89

incorporação da nova possibilidade de se grafar a palavra, mas ainda não haveria uma
compreensão clara acerca dos contextos em que esta deveria ser aplicada. Isto geraria
um uso indiscriminado da nova aquisição, com generalizações para contextos
inapropriados. Posteriormente, a criança passaria a utilizar a regra ortográfica
adequadamente.
Tomando como base as fases indicadas por Rego e Buarque (2000) pode-se
organizar, por exemplo, a aquisição do r e rr em etapas. As crianças utilizariam
inicialmente apenas uma letra r para marcar tanto o som /R/ quanto /r/. Posteriormente,
a criança se daria conta da utilização dos dois rr, mas adotaria a nova grafia de forma
indiscriminada, não considerando ainda nem o som nem a posição que a letra ocupa na
palavra. Seria possível, por exemplo, verificar na escrita da criança a representação do
som /r/ com dois rr. Em uma terceira etapa, a criança já utilizaria a regra ortográfica de
forma adequada, se baseando no som para escrever a palavra – o som forte seria
representado com dois rr e o som fraco com um r só – e também na posição da letra na
palavra – não se usa dois rr no início da palavra, apenas no meio. Por último, as crianças
compreenderiam que no meio da palavra, mesmo que o som seja /R/, só é possível
utilizar os dois rr quando entre vogais.
As crianças deste estudo, de forma geral, estariam alcançando a terceira fase do
desenvolvimento das regras contextuais de uso do r e rr. Já haveria uma escrita
consistente das representações /R/ inicial e /r/ intervocálico, que seriam as primeiras a
serem aprendidas pelas crianças. A representação /R/ intervocálico estaria ainda em um
nível intermediário de aquisição, especialmente para as crianças de 2 a série. Já o /R/
depois de consoante e o /R/ depois de vogal nasal, que só serão devidamente
incorporados posteriormente, destacaram-se pelo nível de dificuldade que colocam para
as crianças, inclusive as de 4 a série.
Aplicando este modelo também à nasalização diante de consoantes e aos sufixos
esa, oso e eza, considerando-se as particularidades e especificidades de cada regra,
pode-se chegar a um possível percurso de desenvolvimento para uma cada uma destas
regras em questão, tendo como base os resultados encontrados no presente estudo.
90

Na nasalização diante de consoantes, as crianças inicialmente tenderiam a omitir
o marcador de nasalização. Posteriormente fariam uso dos marcadores
indiscriminadamente, o que geraria a escrita, por exemplo, de tãpa ao invés de tampa.
Após esta fase, notariam que a nasalização em final de sílaba, diante de consoantes, é
feita pelo uso do m ou n. O emprego do n diante de consoantes já estaria estabelecido na
grafia das crianças, enquanto que o m só seria completamente adquirido em um estágio
posterior.
Neste estudo, as crianças já teriam adotado o n como marcador de nasalização
com sucesso para ambas as séries. Já o emprego correto do m diante de p e b está
consolidado apenas na série mais avançada. Portanto, as crianças de 2 a série estariam na
terceira fase de desenvolvimento da escrita da nasalização diante de consoantes,
enquanto que a aquisição desta regra de contexto já estaria completa na 4 a série.
Quanto às regras morfossintáticas investigadas neste estudo, a fase fonética
implicaria na escrita dos sufixos oso, esa e eza com o grafema z, que é a letra que as
crianças inicialmente mais associam ao som /z/. Na segunda fase, a criança percebe que
o s também é uma letra possível para grafar este som e passa a fazer um uso
indiscriminado dos grafemas s e z. Isto nos remete ao estudo realizado por Monteiro
(2000) sobre a aprendizagem da regra contextual referente ao uso da letra s entre
vogais. Algumas vezes criança também adota outros grafemas para grafar o /z/, como o
ss, ç e c. Estes não são empregados por apresentarem o som /z/, mas, provavelmente,
por concorrerem com a letra s em outros contextos para marcar o som /s/. Em seguida, a
utilização do s se torna mais consistente e não há mais a utilização de grafias
alternativas. O mesmo não ocorre ainda com a letra z. Diferentemente do que foi
encontrado no estudo de Nunes, Bryant e Bindman (1997), onde a utilização do sufixo
ed passou a acontecer exclusivamente nos verbos, apesar de não haver uma
diferenciação ainda dentro desta categoria gramatical, a adoção da letra s não parece
refletir um conhecimento gramatical, mas sim a aplicação de uma regra contextual, na
qual o s teria valor sonoro /z/ quando se encontra entre vogais. O uso do s ocorreria,
deste modo, tanto nos adjetivos quanto nos substantivos.Finalmente, a criança faz a
91

utilização adequada das letras s e z nos sufixos oso, esa e eza, possivelmente por um
conhecimento, mesmo que implícito, da classe gramatical das palavras.
As crianças deste estudo estariam, de forma geral, utilizando os sufixos esa e oso
apropriadamente, principalmente as de 4 a série, provavelmente pela adoção da letra s
como preferencial para marcar o som /z/. Análise do agrupamento hierárquico
estabelece uma proximidade dos sufixos esa e oso com regularidades contextuais mais
fáceis para as crianças, sugerindo que a escrita destes sufixos pode estar sendo
determinada pela regra contextual referente a utilização da letra s entre vogais. Na
escrita do sufixo eza, as crianças apresentaram desempenho mais baixo, sendo, portanto,
o contexto problemático na aprendizagem destas regularidades morfossintáticas. Isto
indica que a criança ou não utiliza ou não possui um conhecimento gramatical
necessário para facilitar a escrita destas palavras.
Com base nos estágios de desenvolvimento da ortografia, fica evidente que o
desempenho ortográfico deve ser avaliado a partir da consideração de todos os
contextos implicados na aquisição da regra. Desta forma, pode-se determinar em que
nível se encontra a aprendizagem de determinado aspecto ortográfico. Ao investigar a
aquisição do uso do r e rr, por exemplo, não é suficiente examinar apenas dois dos cinco
contextos em que se deve empregar esta regra, pois isto resultaria numa visão parcial e
até mesmo enganadora, na medida em que os erros cometidos sobre determinado
contexto não necessariamente indicam um nível mais básico de aquisição, podendo ser
resultado de generalizações indevidas que fazem parte do curso do desenvolvimento.
8.3. Relação do Erro Intencional com Desempenho Ortográfico
Nos contextos específicos, a correlação realizada entre o desempenho
ortográfico e a tarefa de erro intencional indicou que, em alguns contextos (/R/
intervocálico, nasalização com m, nasalização com n – apenas no texto, sufixo eza), a
competência ortográfica da criança e a capacidade de transgredir intencionalmente
variam de forma direta, ou seja, quanto melhor a performance na escrita destes
92

contextos específicos, maior é o número de erros intencionais realizados pela criança.
Nos contextos /R/ depois de consoante e /R/ depois de vogal nasal, o desempenho
ortográfico e a tarefa de erro intencional variam de forma inversa, e portanto, quanto
pior o desempenho ortográfico, maior a quantidade de transgressões propositais feitas
pelas crianças.
Ao considerar o papel da escolaridade no comportamento demonstrado pelas
crianças a partir da análise de regressão múltipla, a tarefa de erro intencional
permaneceu relacionada ao desempenho ortográfico na maioria dos contextos
investigados nos quais foi observada relação entre o desempenho ortográfico e a tarefa
de erro intencional, à exceção do /R/ depois de consoante e do /R/ depois de vogal
nasal. Portanto, nestes dois contextos, a escolaridade é o fator determinante do
desempenho ortográfico.
A tarefa de erro intencional nem sempre reflete o bom desempenho ortográfico.
Alguns dos contextos nos quais as crianças tiveram melhor performance na escrita,
como o /R/ inicial e o /r/ intervocálico, foram pouco escolhidos para realização das
transgressões ou, como os sufixos oso e esa, não apresentaram relação com a tarefa de
erro intencional.
Os resultados sugerem que as crianças não realizam transgressões nos contextos
mais óbvios, isto é, onde não haveria mais dúvidas quanto à grafia correta, nem
naqueles que elas ainda não consideram como problemáticos. Portanto, sob esta
perspectiva, a tarefa de erro intencional apenas estaria relacionada ao desempenho
ortográfico nos contextos identificados pelas crianças como obstáculos para sua
produção escrita, isto é, a tarefa de erro intencional demanda certo nível de consciência
acerca da ortografia da língua.
Considerando a totalidade de contextos ortográficos presentes nos ditados, pode-
se observar que as crianças que cometeram violações mais elaboradas, ou seja, que
envolviam algum aspecto da ortografia, apresentaram uma quantidade menor de erros
em sua produção escrita do que aquelas que realizaram transgressões incipientes, que
93

não denotavam qualquer conhecimento sobre aspectos ortográficos. Este resultado se
mantém mesmo depois de considerada a influência da escolaridade.
Portanto, a partir de uma perspectiva mais abrangente, a tarefa de erro
intencional pode predizer a competência ortográfica da criança. As crianças que
realizam erros intencionais mais elaborados apresentam desempenho ortográfico
melhor, ou seja, com menor quantidade de erros ortográficos do que aquelas que fazem
transgressões mais elementares.
8.4. Diferenças nos estudos de Cavalcante (2000) e Morais (1996, 1998, 1999)
Cavalcante (2000) e Morais (1996, 1998, 1999) utilizaram a tarefa de erro
intencional para investigar a competência ortográfica da criança. No entanto, seus
trabalhos diferem metodologicamente. Cavalcante (2000) abordou, através de ditado de
palavras, contextos específicos referentes às regras contextuais de uso do r e rr e
nasalização diante de consoantes. Morais (1996, 1998, 1999), entretanto, utilizou a
tarefa de erro intencional sobre um texto que continha diversos aspectos regulares e
irregulares da língua.
O tipo de tarefa empregada (ditado de palavras e texto) não parece interferir de
modo consistente nos resultados encontrados. No ditado de palavras, as crianças
tenderam a realizar um maior número de transgressões nos contextos específicos (regras
de contexto e morfossintáticas). Mas isto parece estar relacionado ao fato de que, nesta
atividade, as crianças tinham que cometer obrigatoriamente alguma transgressão nas
palavras selecionadas. Já no texto, houve maior liberdade para a escolha das palavras
nas quais seriam cometidas as transgressões.
No estudo realizado por Cavalcante (2000), as crianças de 2 a série obtiveram um
bom desempenho ortográfico nos contextos críticos investigados, mas fizeram poucas
transgressões nestes contextos. Com isto, Cavalcante (2000) concluiu que não há
relação entre a tarefa de erro ortográfico e a tarefa de erro intencional. Entretanto, este
resultado pode estar indicando uma não preocupação das crianças com estes contextos,
ou seja, as crianças não vêem estes contextos específicos como problemáticos, o que
94

seria essencial para a realização do erro intencional. Soma-se a isto, o fato de
Cavalcante não ter feito uma análise estatística de seus dados, o que também pode ter
influenciado na não obtenção de uma relação entre desempenho ortográfico e tarefa de
erro intencional.
Os resultados de nossa investigação mostram que o desempenho das crianças na
tarefa de erro intencional, realizada conforme Cavalcante (2000), relaciona-se ao
desempenho ortográfico das crianças nos contextos críticos nos quais elas têm
consciência de suas dificuldades ou que ainda lhes demanda atenção para grafar
corretamente. Paradoxalmente, a internalização da regra pode levar a um baixo
desempenho na tarefa de erro intencional uma vez que a criança não vê grande valia em
errar sobre o óbvio. Desta forma, em certos casos, não é possível discriminar o
desempenho de crianças que internalizaram determinada regra ortográfica daquelas que
possuem desempenho ortográfico muito ruim. Nestes casos, ambos os grupos teriam
desempenho semelhante na tarefa de erro intencional. Um porque a regra foi
automatizada, outro porque não possui qualquer conhecimento da regra e portanto não
problematiza a grafia do vocábulo que deve escrever.
Desta feita, quando analisamos a relação da tarefa de erro intencional com o
desempenho ortográfico nos contextos específicos, esta nos dá informação sobre o
processo de aquisição da ortografia mais do que discriminar entre crianças que têm bom
e mau desempenho ortográfico, conforme seria o objetivo expresso em Cavalcante
(2000).
Morais (1996, 1998, 1999) avaliou a capacidade de violar propositalmente a
norma ortográfica de maneira geral, considerando a totalidade de erros intencionais.
Desta forma, as crianças tiveram liberdade para demonstrar um maior ou menor
conhecimento sobre determinada restrição ortográfica. Seguindo esta base, pode-se
observar que as crianças que cometeram mais erros intencionais sofisticados
apresentaram uma quantidade menor de erros ortográficos do que as que fizeram
transgressões incipientes. Quanto maior o número de erros intencionais incipientes, pior
foi o desempenho ortográfico da criança.
Importante observar o papel exercido pela escolaridade para o desempenho das
crianças na tarefa de erro intencional como na tarefa de ortografia. Quanto maior a
95

escolaridade, menor o número de erros ortográficos bem como mais elaborados são os
erros intencionais. Entretanto, não se pode afirmar que a escolaridade explique de
maneira absoluta o desempenho das crianças na tarefa de erro intencional uma vez que
ao ser considerada a variabilidade decorrente da escolaridade, a tarefa de erro
intencional continuou se relacionando ao desempenho ortográfico.
A tarefa de erro intencional prediz a competência ortográfica da criança quando
considerada de uma perspectiva mais geral, assim como feito por Morais (1996, 1998,
1999). As crianças que fazem transgressões mais sofisticadas e em maior quantidade
apresentam menor número de erros ortográficos em sua escrita. Quanto aos contextos
ortográficos específicos, a tarefa de erro intencional apenas prediz o desempenho
ortográfico quando a criança identifica aquele contexto em particular como
problemático, ou seja, a criança realiza violações propositais sobre aspectos
ortográficos que ela tem consciência da dificuldade inerente. Aqueles contextos já
adquiridos ou aqueles em que a criança ainda não tem compreensão do grau de
complexidade envolvido ficam excluídos das transgressões intencionalmente cometidas.
8.5. Implicações Educacionais
A tarefa de erro intencional é um instrumento importante na identificação do
nível de conhecimento ortográfico que a criança possui. Esta tarefa, aliada à avaliação
da performance ortográfica das crianças que é comumente realizada pelos professores
através de ditados, permite uma visão mais apropriada e fidedigna acerca do nível de
desenvolvimento ortográfico em que a criança se encontra.
Ao avaliar o desempenho ortográfico da criança a partir de sua escrita estamos
limitados àquilo que ela escreveu da maneira correta e ao tipo de erro apresentado, o
que não indica necessariamente o nível de conhecimento que a criança tem, podendo
inclusive levar a erros de julgamento. Por exemplo, no ditado uma criança pode
escrever corretamente a palavra maratona, enquanto outra a escreveria com um erro
ortográfico, marratona. O fato da criança ter escrito a palavra corretamente não
significa necessariamente que ela possua um nível de conhecimento mais elevado do
que a segunda criança, que escreveu a palavra com erro. O acerto pode estar relacionado
96

apenas a um nível mais básico de conhecimento (familiaridade com a grafia da palavra
em especial) e não a uma maior elaboração da regra. Já a criança que escreveu
marratona, está indicando uma generalização indevida por não saber ainda onde deve
aplicar esta ou aquela grafia, decorrência da reelaboração das hipóteses construídas
pelas crianças acerca da escrita do r e rr.
A tarefa de erro intencional, juntamente com a avaliação da competência
ortográfica, nos permite acessar o nível de conhecimento de uma forma mais clara e
precisa. Por exemplo, a criança, ao trocar, na tarefa de erro intencional, a letra r pela c,
formando macatona, indica que ainda não tem consciência sobre os aspectos
ortográficos envolvidos. Esta é uma troca de letras bastante elementar, não envolvendo
sequer uma similaridade fonética ou gráfica entre as letras. Já a criança que faz uma
transgressão escrevendo marratona, evidencia um nível mais elaborado de
conhecimento sobre aquele contexto ortográfico específico. Desta forma, fica evidente o
conhecimento que a criança possui acerca de grafias alternativas e de qual seria a grafia
correta para aquele contexto em questão. A criança experimenta diferentes
possibilidades de escrita na aprendizagem de determinada palavra, sendo esta
experimentação um reflexo de sua atividade cognitiva.
A transgressão paradoxal, na qual a criança escreve a palavra com erro como se
fosse certa e escreve o erro intencional com a grafia correta, pode estar indicando
exatamente uma dúvida da criança quanto à forma adequada para se escrever
determinada palavra. A crianças identificam o contexto ortográfico em questão, mas
ainda não o grafam apropriadamente. Também é possível que a transgressão paradoxal
seja reflexo de uma revisão feita sobre a produção escrita, em que a criança percebe
algum erro ortográfico cometido e tenta corrigi-lo, escrevendo a palavra da maneira
certa. Um exemplo em que fica evidente esta tentativa de consertar o erro foi
encontrado na palavra arrastados. No ditado do texto, a criança escreveu arrastos,
omitindo algumas letras da palavra. O erro intencional correspondente foi arrastados.
Este caso não estaria indicando um conhecimento da criança acerca de grafias
alternativas, mas estaria sugerindo a correção de sua escrita anterior.
97

A tarefa de erro intencional pode ser, portanto, um importante instrumento a ser
utilizado pelo professor em sala de aula. Esta tarefa fornece elementos para o professor
discutir com as crianças sobre as regularidades e irregularidades da língua, promovendo
a reflexão e compreensão sobre o uso das regras implicadas na grafia das palavras.
Através desta atividade é possível realizar um trabalho com a ortografia de uma forma
geral ou com aspectos ortográficos específicos, visando maior desenvolvimento do
contexto em questão. Favorece também um trabalho de revisão da criança sobre seu
texto, o que a torna mais atenta e promove uma postura mais crítica quanto a sua própria
produção.
Portanto, é imprescindível que o professor compreenda melhor como ocorre a
aquisição de aspectos ortográficos e os níveis de conhecimento que a criança constrói
acerca da língua escrita. Isto pode auxiliá-lo na elaboração de situações pedagógicas
que promovam a aquisição da ortografia pela criança, tornando a sala de aula um espaço
de discussão e elaboração deste conhecimento.
98

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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linguistic awareness and spelling: The case of the apostrophe. Reading and Writing: Na
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fazê-lo e qual o seu efeito? Em Cardoso-Martins (Org.) Consciência Fonológica e
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ortografia em português. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 1 (3), 269- 285.
CAVALCANTE, T. C. F. (2000). Acessando o conhecimento de regras ortográficas em
crianças: um estudo comparativo de diferentes metodologias. Dissertação de Mestrado
não-publicada. Universidade Federal de Pernambuco, Recife.
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acessado pela tarefa de erro intencional? [Resumos]. In Sociedade Brasileira de
Psicologia (Org.), XXXI Reunião Anual de Psicologia. Resumos, (p. 160). Rio de
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99

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_____________. (1998) Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática.
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100

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Em C. Cardoso-Martins (Org.) Consciência Fonológica e Alfabetização. (pp. 129 –
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NUNES, T., BUARQUE, L. e BRYANT, P. (1992). Dificuldades na Aprendizagem da
Leitura: Teoria e Prática. São Paulo: Cortez.
PINHEIRO, A. M. V. (1996) Contagem de freqüência de ocorrência de palavras expostas a
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REGO, L. L. B. e BUARQUE, L. L. (1997). Consciência sintática, consciência fonológica e
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ortografia. (pp. 21-41). Belo Horizonte: Autêntica.
SÁ, J. L. S. N. (1999). A relação entre consciência morfossintática e escrita ortográfica.
Dissertação de Mestrado não-publicada. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro.
SILVA, T. C. (2002). Fonética e Fonologia do Português: roteiro de estudos e guia de
exercícios. São Paulo: Contexto.
101

ANEXO I
Escola Municipal Minas Gerais
Sr. Responsável,
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(1 a via – Pais e/ou responsáveis)
Rio de Janeiro, 10 de março de 2003.
Gostaríamos de informar que a escola, através de parcerias, promove atividades
de pesquisa que têm como objetivo uma melhor compreensão sobre o aprendizado da
leitura e da escrita.
A aluna de Mestrado em Psicologia da UFRJ, Elisabet Meireles, está realizando
uma pesquisa com alunos da escola, intitulada “A tarefa de erro intencional prediz a
competência ortográfica da criança? – Investigações acerca de aspectos morfossintáticos
e contextuais da língua portuguesa”. O objetivo deste trabalho é analisar o
conhecimento da criança sobre a forma correta de escrita das palavras. A pesquisa será
realizada no horário normal das aulas e as crianças participarão de ditados, tarefas de
escrita de palavras e entrevista. Os resultados da pesquisa poderão auxiliar o professor
na preparação de atividades que facilitem o aprendizado da forma correta de escrita das
palavras.
Pedimos sua autorização para que o aluno ______________________________
possa participar dessa atividade. Gostaríamos de esclarecer que a participação é
voluntária, não havendo nenhum tipo de prejuízo ao aluno que não participar.
Ressaltamos que será mantido o anonimato do aluno e os dados que forem obtidos serão
tratados de forma confidencial.
Para qualquer informação sobre nossas atividades, por favor, entre em contato
com Elisabet Meireles – Tel: 9695-8012 ou com a direção da Escola.
Obrigada pela colaboração,
Atenciosamente,
____________________________________
Pesquisador Responsável
Autorizo ________________________________________________________
a participar das atividades de pesquisa sobre a aquisição da ortografia realizadas na
escola pela aluna de Mestrado em Psicologia da UFRJ.
______________________________ _______________________________
Responsável Aluno

Escola Municipal Minas Gerais
Sr. Responsável,
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(2 a via –Escola / Pesquisadora)
Rio de Janeiro, 10 de novembro de 2002.
Gostaríamos de informar que a escola, através de parcerias, promove atividades
de pesquisa que têm como objetivo uma melhor compreensão sobre o aprendizado da
leitura e da escrita.
A aluna de Mestrado em Psicologia da UFRJ, Elisabet Meireles, está realizando
uma pesquisa com alunos da escola, intitulada “A tarefa de erro intencional prediz a
competência ortográfica da criança? – Investigações acerca de aspectos morfossintáticos
e contextuais da língua portuguesa”. O objetivo deste trabalho é analisar o
conhecimento da criança sobre a forma correta de escrita das palavras. A pesquisa será
realizada no horário normal das aulas e as crianças participarão de ditados, tarefas de
escrita de palavras e entrevista. Os resultados da pesquisa poderão auxiliar o professor
na preparação de atividades que facilitem o aprendizado da forma correta de escrita das
palavras.
Pedimos sua autorização para que o aluno ______________________________
possa participar dessa atividade. Gostaríamos de esclarecer que a participação é
voluntária, não havendo nenhum tipo de prejuízo ao aluno que não participar.
Ressaltamos que será mantido o anonimato do aluno e os dados que forem obtidos serão
tratados de forma confidencial.
Para qualquer informação sobre nossas atividades, por favor, entre em contato
com Elisabet Meireles – Tel: 9695-8012 ou com a direção da Escola.
Obrigada pela colaboração,
Atenciosamente,
____________________________________
Pesquisador Responsável
Autorizo ________________________________________________________
a participar das atividades de pesquisa sobre a aquisição da ortografia realizadas na
escola pela aluna de Mestrado em Psicologia da UFRJ.
_______________________________ _______________________________
Responsável Aluno

ANEXO II
Lista de palavras infreqüentes utilizadas no ditado de palavras
• /R/ intervocálico – beterraba, corrida, surra, garra, barraca
• /r/ intervocálico – farofa, maratona, pirata, serenata, gorila
• /R/ inicial – roda, rubi, rotina, rabanada, rima
• /R/ precedido de vogal nasal – desonra, enrolado, genro, enraivecer, enriquecer
• /R/ precedido de consoante – desregrado, desrespeito
• Sufixo oso – famoso, guloso, venenoso, volumoso, populoso
• Sufixo eza – delicadeza, moleza, sutileza, agudeza, firmeza
• Sufixo esa – artesã, japonesa, polonesas, baronesa, camponesa
• Nasalização antes de P – lâmpada, empada, tampa
• Nasalização antes de B – lambida, pomba, samba
• Nasalização diante das demais consoantes – manga, pimenta, lenda, tinta,
conduta, inveja

ANEXO III
Lista de palavras contendo regularidades morfossintáticas e contextuais
utilizadas no ditado do texto
• /R/ intervocálico – correnteza, cigarra, terreno, arrastados
• /r/ intervocálico – caracol, curioso, girassol, passarinho, litoral, flores,
embelezarão, perfumarão, repara
• /R/ inicial – Rodolfo, regiões, repara, ramos, receoso
• /R/ precedido de vogal nasal – enrugado, enrosca, enrascado, honra
• /R/ precedido de consoante – desrespeitarem, desrugado
• Sufixo oso – curioso, chuvoso, receoso, cuidadoso
• Sufixo eza – correnteza, beleza, esperteza, limpeza
• Sufixo esa – inglesa, francesa, holandesa, montanhesas
• Nasalização antes de P – sempre, campo, limpeza,
• Nasalização antes de B – embelezarão, ambiente, bambu
• Nasalização diante das demais consoantes – mexendo, confortável, nunca,
enchente, correnteza, brincam, Hortência, quando, viajante, inglesa, francesa,
holandesa, honra, enrugado, enrascado, montanhesas, enrosca

ANEXO IV
Protocolo do ditado de palavras
Nome: ______________________________________________
Série:_________________
Data de Nascimento: _____________________________ Idade: _______________
1. Um atleta não tem ______________________________.
______________________________
2. Seu _____________________ é muito prestativo.
_____________________
3. Lulu Santos é um cantor ___________________________.
___________________________
4. Comi uma salada de ______________________________ no almoço.
______________________________
5. O saci pererê é uma ______________________brasileira.
______________________
6. Vamos almoçar feijão com ________________________.
________________________
7. Adoro comida _______________________.
_______________________
8. Tem ______________________ o ano inteiro em Salvador.
______________________
9. Vamos sair um pouco da ________________________.
________________________
10. Você é muito _________________________!
_________________________
11. Vou pintar a casa com ______________________ amarela.
______________________
12. Vou fazer uma _________________________ para minha namorada.
__________________________

13. A _________________________ de Fórmula 1 já vai começar.
_________________________
14. A ________________________ trabalha na roça.
________________________
15. Isso é uma grande _____________________ para mim!
_____________________
16. A China é um país _________________________.
_________________________
17. Sua jogada no xadrez foi de grande _______________________.
_______________________
18. Pedro vai levar uma _____________________ da mãe.
______________________
19. Você vai ___________________________ com o seu restaurante.
___________________________
20. A _____________________ de frango está deliciosa.
_____________________
21. Você tem uma vida muito __________________________.
___________________________
22. Aquele cogumelo é __________________________.
__________________________
23. A _______________________ do carro furou.
_______________________
24. Vou montar minha ________________________.
_________________________
25. A ________________________ queimou.
________________________
26. Seu cabelo é bastante ________________________.
_________________________
27. Seu gesto foi de grande ________________________.
_________________________

28. Seu anel de _______________________ é fantástico.
_______________________
29. Isso é um grande ___________________________!
___________________________
30. Flávio tem muita __________________________.
__________________________
31. Fernanda é uma __________________________.
___________________________
32. Onde está a ___________________________ da caneta ?
____________________________
33. A __________________________ foi a um jantar com o príncipe.
__________________________
34. Um cirurgião tem ___________________________ nas mãos.
___________________________
35. O americano ganhou a ___________________________.
____________________________
36. A ____________________________ é um sentimento comum entre as pessoas.
____________________________
37. Adoro comer ___________________________ no Natal.
___________________________
38. Joana gosta de filmes de ___________________________.
____________________________
39. Carlos está ___________________________ com o casamento.
___________________________
40. Não coloque _________________________ na comida.
_________________________
41. Você agiu com __________________________.
___________________________
42. Sua ___________________________ foi irrepreensível.
____________________________

43. Vi um _________________________ no zoológico.
__________________________
44. O cachorro deu uma _________________________ na menina.
__________________________
45. Eduardo vai ___________________________ quando descobrir.
___________________________
46. As _________________________ estão adorando o Brasil.
__________________________
47. Os versos não fazem __________________________.
__________________________
48. Uma _________________________ fez ninho no telhado.
_________________________
49. Caiu uma ________________________ da árvore.
________________________

ANEXO V
Respostas do Protocolo do ditado de palavras
Frases
1. Um atleta não tem moleza.
2. Seu genro é muito prestativo.
3. Lulu Santos é um cantor famoso.
4. Comi uma salada de beterraba no almoço.
5. O saci pererê é uma lenda brasileira.
6. Vamos almoçar feijão com farofa.
7. Adoro comida japonesa.
8. Tem samba o ano inteiro em Salvador.
9. Vamos sair um pouco da rotina.
10. Você é muito guloso!
11. Vou pintar a casa com tinta amarela.
12. Vou fazer uma serenata para minha namorada.
13. A corrida de Fórmula 1 já vai começar.
14. A camponesa trabalha na roça.
15. Isso é uma grande desonra para mim!
16. A China é um país populoso.
17. Sua jogada no xadrez foi de grande agudeza.
18. Pedro vai levar uma surra da mãe.
19. Você vai enriquecer com o seu restaurante.
20. A empada de frango está deliciosa.
21. Você tem uma vida muito desregrada.
22. Aquele cogumelo é venenoso.
23. A roda do carro furou.
24. Vou montar minha barraca.
25. A lâmpada queimou.
26. Seu cabelo é bastante volumoso.
27. Seu gesto foi de grande delicadeza.

28. Seu anel de rubi é fantástico.
29. Isso é um grande desrespeito!
30. Flávio tem muita garra.
31. Fernanda é uma artesã.
32. Onde está a tampa da caneta ?
33. A baronesa foi a um jantar com o príncipe.
34. Um cirurgião tem firmeza nas mãos.
35. O americano ganhou a maratona.
36. A inveja é um sentimento comum entre as pessoas.
37. Adoro comer rabanada no Natal.
38. Joana gosta de filmes de pirata.
39. Carlos está enrolado com o casamento.
40. Não coloque pimenta na comida.
41. Você agiu com sutileza.
42. Sua conduta foi irrepreensível.
43. Vi um gorila no zoológico.
44. O cachorro deu uma lambida na menina.
45. Eduardo vai enraivecer quando descobrir.
46. As polonesas estão adorando o Brasil.
47. Os versos não fazem rima.
48. Uma pomba fez ninho no telhado.
49. Caiu uma manga da árvore.

ANEXO VI
Texto para ditado
O Caracol Viajante
Rodolfo é um caracol curioso. Ele já viajou pelo litoral
das regiões inglesa, francesa e holandesa. Ele exibe, com
honra, a casa presa nas costas. Sua cabeça vai mexendo
solta, a se exercitar. Rodolfo nasceu e viveu sempre
confortável. Nunca pagou aluguel, nem ficou enrascado.
Um dia chuvoso acaba em enchente. Pela correnteza
são arrastados ramos e pedras montanhesas. Com esperteza,
o caracol se enrosca num galho de bambu. E enrugado
aguarda até a água baixar.
Já desrugado, Rodolfo repara na beleza do campo. Vê
crescer o girassol, a azaléia e a hortência. Essas flores
embelezarão e perfumarão o ambiente com sua exposição.
Ele olha a cigarra, o mosquito e o passarinho que brincam e
voam pelo céu, sem se desrespeitarem.
Quando se aproxima a noite, Rodolfo não fica receoso.
Cuidadoso, faz a limpeza do terreno. Qualquer local é o seu
lar!

ANEXO VII
Protocolo para ditado do texto
Nome: ______________________________________________
Série:_________________
Data de Nascimento: _____________________________ Idade: _______________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
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