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TubarAo<br />
Shark<br />
1969, 35 mm, 92 min, 1.33 : 1<br />
título alternativo: Caine<br />
Direção: Samuel Fuller<br />
roteiro: Samuel Fuller, John Kingsbridge<br />
Fotografia: Rául Martínez Solares<br />
Montagem: Carlos Savage<br />
Música: Rafael Moroyoqui<br />
Produção: Mark Cooper, Skip Steloff<br />
Companhia Produtora: Cinematográfica Calderón S.A., Heritage<br />
Entertainment Inc.<br />
elenco: Burt Reynolds, Arthur Kennedy, Silvia Pinal, Barry Sullivan,<br />
Enrique Lucero<br />
Classificação Indicativa: 16 anos<br />
Um atirador perde sua carga perto de uma pequena cidade costeira<br />
do Sudão e fica preso por lá. Quando uma mulher o contrata<br />
para invadir um navio afundado nas águas infestadas de tubarões,<br />
ele vê a chance de compensar suas perdas.<br />
Este é um filme em que as bordas são<br />
mais cintilantes do que os motivos centrais:<br />
a ambientação do hotel pulgueiro no Sudão<br />
com seu dono gordão e mau-caráter cercado<br />
de concubinas, as malandras estratégias<br />
de sobrevivência do (anti) herói oportunista<br />
Caine (Burt Reynolds), o garoto pequeno viciado<br />
em tabaco, o médico bêbado, as imagens<br />
submarinas com tubarões não adestrados,<br />
a gravidade das cenas filmadas em<br />
plongée (tomada de cima dos ventiladores de<br />
teto) e etc. Todos esses elementos possuem<br />
uma energia muito intensa, mesmo com a<br />
sujeira involuntária e com o cadenciamento<br />
um pouco exausto da montagem, bagunçada<br />
pelos produtores. É só experimentar ver o<br />
filme sem som: Fuller faz da composição e<br />
do ritmo interno dos seus planos imagenssíntese<br />
da sua força atrevida, ambígua e de<br />
sinceridade cristalina. Sinceridade, que se<br />
diga, que é postura estética antes de tudo.<br />
O diretor repudia o simulacro e não acredita<br />
na dissimulação do artifício (talvez nisso<br />
resida seu famoso desprezo por Hitchcock),<br />
por isso, mesmo em condições de produção<br />
adversas, seu talento se sobrepõe aos defeitos<br />
com radical desenvoltura.<br />
No entanto, quem conhece a obra do<br />
diretor, estranha uma parte importante da<br />
engrenagem dramática. O vilão interpretado<br />
por Barry Sullivan mais serve aos desencadeamentos<br />
do conflito roteirístico do que<br />
aos paradoxos amor/ódio, lealdade/traição<br />
que o filme aqui apenas sugere (as mesmas<br />
polaridades resultaram em maravilhas em<br />
um filme como O Quimono Escarlate); a<br />
trama da busca do ouro escondido no navio<br />
afundado – motivação primordial do drama<br />
– não tem os tradicionais paroxismos que<br />
vemos Fuller realizar em outros filmes em<br />
que as ambições dos personagens se equilibram<br />
entre o trágico e o patético.<br />
Só que essa fama de filme-problema<br />
faz mais mal à apreciação de Tubarão do<br />
que ao filme propriamente dito. Essa fama<br />
de filme “genial, mas ruim” é um clichê que<br />
não se sustenta. Se o filme fosse de um Joe<br />
D’Amato, seria chamado de obra-prima.<br />
Burt Reynolds – considerado por alguns um<br />
dos desastres do filme – é um ótimo herói<br />
fulleriano. O personagem físico e cínico se<br />
adequa bem à persona do ator. Mas como<br />
é de costume no universo cinéfilo, as verdades<br />
prontas estão à mão e o rigor crítico<br />
está em falta, e o Tubarão de Fuller passou<br />
para a história como o seu filme malquisto<br />
(porque malvisto). Um equívoco, para dizer<br />
o mínimo.<br />
Francis Vogner dos Reis<br />
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