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22<br />

1<br />

Regras ditadas pelo<br />

Instituto de Altos Estudos<br />

Cinematográficos,<br />

comumente designado<br />

IDHEC [n.d.t.].<br />

rushes que esta cortou, a Universal recortou e a Rank cortou ainda<br />

mais. Com razão, ninguém acreditava no sucesso de um filme que<br />

Sam Fuller realizou com seus pés, como o disse graciosamente Mrs.<br />

Sarita Mann: o porquê da distribuição ter sido sabotada. Mas os<br />

cortes não parecem ter tirado grande coisa ao valor de Renegando:<br />

o filme é isento do que não falta jamais às grandes produções em<br />

série, os sempiternos raccords improvisados e ridículos.<br />

FIlMar é FáCIl Para ele<br />

O que mais nos importa aqui é que este animal Fuller tenha<br />

livremente perambulado pelo Arizona por cerca de cinco longas semanas<br />

– uma de suas filmagens mais longas! –, com um orçamento<br />

de quatrocentos milhões – Deus sabe o que ele pode ter feito com<br />

isso! –, e para nos oferecer o quê? Cento e cinquenta planos, que<br />

na projeção darão duzentos, encadeados por fusões impossíveis. E<br />

que planos! Seu estilo já não possui nada de ordinário (salvo no seu<br />

primeiro ensaio, desajeitadamente clássico): é um belo estilo de um<br />

bruto! Nele, o plano americano, figura perfeita do classicismo, ou é<br />

raro ou medíocre. Quando se interessa por vários personagens ou<br />

objetos, planos gerais; se é por um ou dois, closes. Fuller é o poeta<br />

do close, que, por seu caráter elíptico, é sempre rico em surpresas<br />

(a abertura de Capacete) e que dá um relevo insólito a rostos ou<br />

fiapos de grama, objetos habituados pelo cinema comercial a pouca<br />

reverência. Mas, aqui, ele se esforça ainda menos: fala-se – muito,<br />

ou age-se – muito; quando alguém diz algo de interessante, ele não<br />

está interessado em artifícios de interpretação ou em multiplicar<br />

os ângulos para desteatralizar a cena. Cark tenta colocar O’Meara<br />

no bom caminho. Longo discurso. Contracampo? Ainda espero por<br />

este. Durante, no mínimo, quatro ou cinco minutos, assistimos aos<br />

dois, sentados imóveis um ao lado do outro, dando adeus ao A.B.C.<br />

idhecal 3 .<br />

Essa desenvoltura irrita, mas quantas riquezas surgem dali! É<br />

errado dizer que Fuller é inspirado, uma vez que isso pressuporia<br />

a possibilidade de que Fuller não fosse inspirado, quando na realidade<br />

filma ativamente. Instintivo, cineasta-nato, filmar é fácil para<br />

ele; basta-lhe permanecer idêntico a si mesmo a cada instante – o<br />

que poderíamos dizer a propósito de um Nicholas Ray menor como<br />

Quem Foi Jesse James? (The True Story of Jesse James, 1957). Seus<br />

esboços são insólitos, e mais fortes e reveladores que uma sólida<br />

construção. Ele pode se permitir a mistura de estilos: há de tudo em<br />

Fuller, um mundo neste deserto vivo, com seus bosques de árvores<br />

esféricas, até o delírio de O’Meara, perdido na fumaça, dessas traquinices<br />

plásticas a la Eisenstein à composição rigorosa e fordiana<br />

dos planos mais gerais do ataque ao forte. Descobriríamos também<br />

Fritz Lang em Casa de Bambu, na organização geométrica da cena<br />

do assalto ou naquela da partida de bilhar, ou ainda em Anjo do Mal<br />

(a morte de Moe). De que importa! Por uma espécie de homogeneidade<br />

poética, tudo isso permanece sempre Fuller, com sua força do<br />

instantâneo e do inacabado.<br />

MarlOwe e shakesPeare<br />

Aceitamos com mais facilidade a cena – que para a reflexão possui<br />

valor simbólico – na qual um jovem índio mudo vê-se preso na<br />

areia movediça e é salvo por um soldado nortista que, irritado com<br />

os acordes sincopados emitidos pelo jovem índio através de uma<br />

gaita, salva-o ao preço de sua própria vida, precisamente por essa<br />

não ser integrada ao filme: assim as intenções são constantemente<br />

corrigidas pela mise en scène. Fuller, que parecia tão fiel às suas<br />

belas ideias a respeito da América e sobre a beleza da vida democrática,<br />

se contradiz a cada imagem: é evidente que os costumes dos<br />

Sioux lhe inspiram e agradam infinitamente mais que a perspectiva<br />

da vida tranquila ao pé do fogo, que souberam tão magnificamente<br />

cantar um Brooks e um Hawks, como bem testemunham as múltiplas<br />

platitudes da mise en scène, neste sentido mise en scène de<br />

crítico, de político e de moralista.<br />

É assim que, ao fim e ao cabo, Fuller segue no itinerário inverso<br />

ao de Welles, e pode-se dizer que há entre eles uma diferença – que<br />

se inscreve igualmente no domínio dos valores – da mesma ordem<br />

que aquela entre Marlowe e Shakespeare, com todas as consequências<br />

subentendidas por esta.<br />

Embora, a princípio, sempre tenha negado isso, Welles tentou,<br />

através das diferentes formas de sua arte (que o revelam ao<br />

mesmo tempo como romântico e civilizado) produzir a síntese de<br />

suas aspirações físicas e morais; ao passo que Fuller, faustiano em<br />

princípio e prometéico de fato, embora consciente da necessidade<br />

de tal síntese e ativamente procurando por ela, é mais cedo ou<br />

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