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ísse para fazer xixi. O velho Hudson sorriu e explicou que o editorchefe<br />
tinha seu banheiro próprio. Eu realmente achava que o patrão<br />
ia usar esses rolos de papel de jornal como toalhas igual a nós, reles<br />
mortais? Brisbane tinha até sua própria entrada particular no prédio<br />
do Journal.<br />
Mas um dia, eu estava no escritório de Mulcahy e ouvi ele dizer<br />
a um dos assistentes mais velhos para ir até o escritório de Brisbane<br />
para um trabalho temporário de leva e traz. Eu segui o rapaz de 18<br />
anos e o vi dirigindo-se ao banheiro para lavar o rosto e pentear o<br />
cabelo. Vi minha chance e decidi aproveitar. Corri até o corredor<br />
do sétimo andar passando pela provação dos sinais proibitivos nas<br />
paredes: “Pare!” “Corredor Privativo” “Não Perturbe!” “Não Entre”.<br />
Corri para o escritório com a placa “Editor-Chefe” e me vi numa sala<br />
de espera imensa e silenciosa como um túmulo. Duas secretárias<br />
estavam trabalhando em suas escrivaninhas. Havia pilhas de jornais<br />
e revistas por todos os lados. Imponentes estantes de livros iam do<br />
chão ao teto. A sala e as secretárias pareciam intocados desde que<br />
[William Randolph] Hearst inaugurara o jornal duas décadas atrás.<br />
Uma das senhoras olhou para mim em silêncio.<br />
“Mulcahy me enviou”, eu disse, mentindo entre os dentes.<br />
Ela pegou um telefone, disse algumas palavras e em seguida<br />
apontou para uma porta de mogno entalhada. Caminhei até o portal<br />
sagrado, abri e entrei como se estivesse entrando num templo. Lá<br />
estava ele sentado atrás de uma grande mesa, o grande Arthur Brisbane<br />
em pessoa, o discípulo de Joseph Pulitzer, o cérebro por trás de<br />
Hearst! Ele era alto e forte, impecavelmente vestido, com uma testa<br />
imensa. Apesar de ter 62 anos naquele momento, ele se movia como<br />
um atleta na casa dos vinte anos. Brisbane era ainda mais impressionante<br />
do que eu imaginara. Atônito, eu o observava como se ele<br />
fosse uma criatura de um outro planeta.<br />
“Você é da editoria?”, perguntou Brisbane.<br />
“Sim, senhor.”<br />
Ele me arremessou uma pasta. “Na esquina da rua Duane, estacionado<br />
no lado esquerdo da delegacia, tem um Lincoln. O nome do<br />
motorista é George. Ele está vestindo um suéter vermelho. Leve a<br />
minha pasta até ele e me espere no carro.”<br />
“Sim, senhor.” Pausei momentaneamente, esperando por alguma<br />
instrução adicional.<br />
“Qual o seu nome?”, perguntou Brisbane.<br />
“Samuel Fuller.”, disse, “Todo mundo me chama de Sammy.”<br />
“Tudo bem, Samuel. Pode ir.”<br />
Saí correndo pelo corredor, passei pelo elevador e fui voando pela<br />
escada de pedra. Não havia vivalma ali, mas muitos já tinham corrido<br />
por esses degraus antes de mim. Trabalhávamos para um propósito<br />
comum, o de publicar notícias a cada santo dia para um jornal de cidade<br />
grande. O lugar cheirava à História. Eu amava aquele aroma.<br />
Teria sido impossível não ver o imenso Lincoln na rua Duane.<br />
Brisbane desceu alguns minutos depois e sentou-se ao meu lado no<br />
banco de trás. O carro deu partida e nós aceleramos pelas ruas em<br />
polvorosa até chegar a seu próximo compromisso. Ele revisou um<br />
texto, assinou com um “AB” e disse para voltar correndo até a editoria.<br />
Deslizei as páginas para dentro da minha jaqueta, saltei do Lincoln<br />
num cruzamento na parte central da cidade, peguei o metrô e<br />
fui correndo de volta para William Street e de lá até o sétimo andar,<br />
rápido como um relâmpago.<br />
Logo que Mulcahy descobriu minha artimanha, ele falou que ia<br />
me demitir. Passei alguém pra trás e merecia a demissão. Não menti<br />
para Brisbane, mas também não disse a ele a verdade. Verdade que<br />
eu era da editoria, só que não era a minha vez na fila dos assistentes.<br />
Quando Brisbane descobriu o acontecido, ele disse a Mulcahy que<br />
queria me ver novamente.<br />
Corri até o corredor que conduzia ao escritório de Brisbane. As<br />
secretárias velhas gesticularam para que eu seguisse adiante. Brisbane<br />
levantou quando eu entrei. Ele foi severo comigo mas admirou<br />
a minha garra. Em seguida, ele disse as palavras mágicas: “De agora<br />
em diante, Samuel, você será meu assistente pessoal”, adicionando<br />
sua expressão distintiva, “Não deixe isso subir à sua cabeça.”<br />
Nossa Senhora, eu era o rei da cocada! Nos meses seguintes, vi<br />
muitas vezes o Lincoln de Brisbane. Na frente de um hotel luxuoso,<br />
de um prédio de escritórios ou restaurante, eu dava um oi para<br />
George e sentava no banco de trás. Brisbane aparecia logo depois<br />
de uma reunião, ou após almoço de negócios. No assento largo e revestido<br />
de couro, estava o ditafone de Brisbane, com um cilindro de<br />
cera novo no tambor. Ele apertava um botão na máquina e o cilindro<br />
começava a rodar. Brisbane colocava a boca próximo do microfone<br />
do apetrecho e ditava um editorial. Quando terminava, ele me dava<br />
o cilindro e me dizia para correr até o Journal. Ele me dava um dólar<br />
de prata quando eu saía do carro.<br />
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