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REVISTA BRASILEIRA 58-pantone.vp - Academia Brasileira de Letras

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Ligia Chiappini<br />

tro do Brasil, <strong>de</strong>slocando os personagens do centro do Rio <strong>de</strong> Janeiro e do Recife<br />

rumo ao Xingu. Fontoura, um dos personagens centrais, quer fincar um<br />

marco no centro geográfico exato do país, mas, quando chega ali, encontra o<br />

lugar minado <strong>de</strong> formigas carnívoras e morre entre elas, corroído ele também,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mais profundo <strong>de</strong>sse centro, pelo álcool e pela <strong>de</strong>sesperança.<br />

O caminho da reportagem à ficção é também o caminho da visão externa do<br />

drama <strong>de</strong> Canudos, por Eucli<strong>de</strong>s da Cunha, à sua visão dilacerada e trágica em<br />

Os Sertões. Da mesma forma aqui, guardadas as diferenças, o esforço do intelectual,<br />

formado nos centros mais avançados, para enten<strong>de</strong>r o universo cultural<br />

sub<strong>de</strong>senvolvido acaba sendo simultaneamente um esforço para indagar as raízes<br />

da sua própria ambiguida<strong>de</strong> como intelectual refinado em terra <strong>de</strong> gente<br />

consi<strong>de</strong>rada tradicionalmente bárbara por uma elite à qual ele não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong><br />

pertencer.<br />

No caso da abordagem do índio, as trajetórias do padre Nando e <strong>de</strong> Quarup<br />

são exemplares como a conversão euclidiana. Documenta-se aí a passagem do<br />

interesse livresco e do enfoque romântico, que o levam no início a i<strong>de</strong>alizar o<br />

Xingu como um paraíso terrestre, à vivência dos problemas reais do índio,<br />

contaminado pelo branco e em processo <strong>de</strong> extinção. Nando termina chegando<br />

a um indianismo novo, em que o índio é tratado sem nenhuma i<strong>de</strong>alização.<br />

Afirmação da vida<br />

Porém, Callado não só revela a miséria do índio, apontando também, a partir<br />

<strong>de</strong> uma vida mais próxima à natureza, para valores que po<strong>de</strong>riam resgatar<br />

um tanto as perdas da civilização corrupta. Desencanto e utopia, eis aí uma<br />

contradição dialética, evi<strong>de</strong>nte em Quarup, e uma constante nos livros do escritor,<br />

nos quais a repressão, a tortura, a dominação e a morte aparecem sempre<br />

contrapostas à imagem da vitalida<strong>de</strong>, do amor e da liberda<strong>de</strong>, simbolizados geralmente<br />

por elementos naturais: a água, as orquí<strong>de</strong>as, o sol, que travam uma<br />

luta circular com a noite, os subterrâneos e as catacumbas.<br />

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