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MÍDIA, MÁFIAS E ROCK'N'ROLL

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No século 19, por exemplo, o Times londrino satanizava em<br />

suas manchetes o Bacilo de Koch, sem discutir as condições sociais,<br />

paupérrimas, que levavam à contração da tuberculose. Vejamos<br />

alguns números, obviamente não constantes das reportagens que<br />

satanizavam o Bacilo de Koch. No princípio do século 19 havia na<br />

Inglaterra apenas uma aglomeração que contava com mais de cem<br />

mil habitantes: Londres. Na véspera do século 20, elas já são 33. O<br />

centro dos lanifícios, Leeds, dobra e redobra sua população. A urbe<br />

passa de 53 mil habitantes (1801) para 123 mil (1831) e 430 mil<br />

(1900). No mesmo período, Birmigham passa de 73 mil habitantes<br />

para 200 mil e depois para 760 mil residentes. Os dias de trabalho são<br />

de até 16 horas, numa carga semanal de 64 horas. Trabalha-se na<br />

fábrica seis dias seguidos. A média de trabalhadores morando numa<br />

casa é de 26. Os salários decaem de 16 shillings por semana, em 1821,<br />

para seis shillings em 1830. Nesse grupo, a esperança de vida é<br />

inferior aos 40 anos. Contratam-se para o trabalho nos lanifícios<br />

crianças de quatro, nove e sete anos de idade. É nesse quadro social<br />

que brota a tuberculose. Para o Times, porém, a culpa estava no<br />

Bacilo de Koch.<br />

Para nós, cem anos depois, a forma pela qual se noticia tais<br />

problemáticas não mudou muito. Se, no século 19, o ator culpado era<br />

o Bacilo de Koch, hoje o culpado é o gene. “Somos sistemas abertos,<br />

não fechados como um computador. Condições de trabalho, sociais,<br />

psicológicas, alteram os genes. A resposta final não está nos genes”,<br />

diz Lewontin. “A febre biotecnológica é a febre dos bilhões de dólares<br />

movimentados pelos laboratórios na venda de implementos para as<br />

experiências genéticas”, afirma.<br />

Terry Eagleton nomeia 16 formas de ideologia. Entre elas, “um<br />

corpo de idéias característico de um determinado grupo ou classe<br />

social”, “comunicação sistematicamente distorcida” e “oclusão<br />

semiótica” (em “Ideologia, uma introdução”. Boitempo, 1997). A<br />

nosso ver, tratamos de uma singular distorção quando analisamos as<br />

manchetes sobre biotecnologia. Ao lê-las, ficamos convencidos de<br />

que a genética é a solução final. Analisei 1.608 reportagens de jornal,<br />

entre 1994 e 2001, e apenas meio por cento do corpus trazia críticas<br />

à “resposta final” da biotecnologia.<br />

Vejamos alguns exemplos de como, no mundo da transparência<br />

biotecnológica, os problemas estão nos genes, a partir de manchetes<br />

publicadas pela Folha de S.Paulo. Vejamos que não só o homem, mas<br />

todo o corpo vivo, sucumbe à “resposta final”:<br />

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