a morte e as mortes na obra de juan rulfo - Universidade Federal de ...
a morte e as mortes na obra de juan rulfo - Universidade Federal de ...
a morte e as mortes na obra de juan rulfo - Universidade Federal de ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Quanto à estrutura, o romance divi<strong>de</strong>-se em du<strong>as</strong> partes. Na primeira, encontram-se os<br />
monólogos <strong>de</strong> Juan Preciado, a evocação da voz <strong>de</strong> Dolores Preciado, a infância <strong>de</strong> Pedro<br />
Páramo e referênci<strong>as</strong> ao p<strong>as</strong>sado <strong>de</strong> diferentes perso<strong>na</strong>gens - vivificando-se a crença <strong>de</strong> alm<strong>as</strong><br />
que morreram com pecados, e que, portanto, vagam pelo mundo.<br />
Na segunda parte, encontram-se a adolescência <strong>de</strong> Miguel Páramo e outr<strong>as</strong> <strong>na</strong>rrações,<br />
direcio<strong>na</strong>d<strong>as</strong> para o <strong>de</strong>sfecho da <strong>obra</strong>.<br />
A memória do p<strong>as</strong>sado é trazida para o presente, influenciando <strong>na</strong> sensação dos<br />
perso<strong>na</strong>gens. E ess<strong>as</strong> sensações, provocad<strong>as</strong> pel<strong>as</strong> lembranç<strong>as</strong>, vão traçando o curso da<br />
história <strong>de</strong> Comala. Todos os tempos expostos, no fluir <strong>de</strong>scontínuo da memória dos mortos,<br />
dão à <strong>obra</strong> a vida literária a partir da <strong>morte</strong>, no tempo da <strong>na</strong>rrativa.<br />
Na sepultura comum, o sonhador Juan Preciado <strong>na</strong>rra seu p<strong>as</strong>sado à Dorotea Dyada.<br />
No entanto, o leitor capta um p<strong>as</strong>sado anterior a esse – o momento em que Juan Preciado<br />
ainda <strong>de</strong>sconhecia sua condição <strong>de</strong> morto.<br />
Às micro<strong>na</strong>rrações <strong>de</strong> 1ª pessoa intercalam-se às <strong>de</strong> 3ª, impessoais. Est<strong>as</strong>, por sua vez,<br />
revivem o p<strong>as</strong>sado (in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> uma organização cronológica) anterior à chegada <strong>de</strong> Juan<br />
à Comala. Revivem a infância <strong>de</strong> Pedro Páramo – o tempo do sonho - <strong>de</strong> sua maturida<strong>de</strong>, a<br />
<strong>de</strong>cadência e a <strong>morte</strong>. O <strong>na</strong>rrador, por vezes, ausenta-se totalmente em algum<strong>as</strong><br />
micro<strong>na</strong>rrações, ficando apen<strong>as</strong> os diálogos ou uma espécie <strong>de</strong> voz que se <strong>na</strong>rra. Sua presença<br />
no romance é a <strong>de</strong> um fio condutor entre <strong>as</strong> <strong>de</strong>scrições da <strong>na</strong>tureza, os elementos importantes<br />
que compõem o episódio revivido e a exposição circunstancial do momento dos perso<strong>na</strong>gens.<br />
“Pensaba em ti, Susa<strong>na</strong>. Em l<strong>as</strong> lom<strong>as</strong> ver<strong>de</strong>s. Cuando volábamos papalotes en la época <strong>de</strong>l<br />
aire (...) 144 ”.<br />
A utilização d<strong>as</strong> <strong>as</strong>p<strong>as</strong> no romance leva-nos a algum<strong>as</strong> observações importantes. Uma<br />
<strong>de</strong>l<strong>as</strong> é a <strong>de</strong> que são usad<strong>as</strong>, normalmente, para chamar a atenção <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>d<strong>as</strong> palavr<strong>as</strong>,<br />
fr<strong>as</strong>es-feit<strong>as</strong> ou provérbios. A outra, quando expressam o pensamento d<strong>as</strong> perso<strong>na</strong>gens.<br />
Porém, a principal <strong>de</strong>l<strong>as</strong> é a <strong>de</strong> ser um recurso <strong>de</strong>ntro da estrutura <strong>na</strong>rrativa para recuperar<br />
p<strong>as</strong>sados anteriores e introduzi-los livremente <strong>de</strong>ntro d<strong>as</strong> micro<strong>na</strong>rrações - como se fossem o<br />
soar dos ecos <strong>na</strong> memória. Muit<strong>as</strong> vezes, para <strong>de</strong>notar a idéia <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong>, nesses<br />
fragmentos, encontram-se repetid<strong>as</strong> <strong>as</strong>p<strong>as</strong> (“ “) <strong>de</strong> fechamento.<br />
Como recurso técnico, observa-se ainda a mudança no tipo <strong>de</strong> impressão gráfica para<br />
i<strong>de</strong>ntificar <strong>as</strong> vozes <strong>de</strong> Dolores Preciado. Veja o exemplo: “...Llanur<strong>as</strong> ver<strong>de</strong>s. Ver subir y<br />
bajar el horizonte con el viento que mueve l<strong>as</strong> espig<strong>as</strong>, el rizar <strong>de</strong> la tar<strong>de</strong> con u<strong>na</strong> lluvia <strong>de</strong><br />
144 RULFO, Juan. Obra Completa Biblioteca Ayacucho 2ª ed. 1985, p. 115 “Pensava em ti, Susa<strong>na</strong>. No ver<strong>de</strong><br />
dos montes. Quando soltávamos pip<strong>as</strong> <strong>na</strong> época <strong>de</strong> ventos...”<br />
64