VOLUME 19, NÚMERO 4 • OUTUBRO, NOVEMBRO ... - SBNPE
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Introdução<br />
Com as grandes mudanças que têm ocorrido nos hábitos<br />
alimentares e no estilo de vida cada vez mais estressante, mais<br />
tem sido reconhecido que a saúde do sistema digestivo é essencial<br />
para uma qualidade de vida adequada. Isso se reflete<br />
também no fato de que o trato gastrintestinal (TGI) tem uma<br />
grande superfície e capacidade metabólica. Este reconhecimento<br />
tem levado pesquisadores a desenvolver alimentos e<br />
produtos alimentícios que contribuam para a saúde deste sistema<br />
e, indiretamente, para o bem estar geral da saúde, como<br />
os produtos ricos em fibra alimentar 1 .<br />
Um dos fatores que tem sido reconhecido como de grande<br />
importância para manutenção da saúde do sistema digestivo<br />
é a microbiota colônica, especialmente com relação aos<br />
tipos de microrganismos predominantes e aos tipos de nutrientes<br />
que são metabolizados por esses. Essa microbiota é importante<br />
pela síntese de nutrientes, como vitaminas do complexo<br />
B e vitamina K, e pela competição com bactérias nocivas.<br />
Através do consumo de carboidratos fermentáveis, a<br />
flora é capaz de criar um ambiente metabolicamente favorável,<br />
o qual auxilia na eliminação de toxinas e de substâncias<br />
carcinogênicas 1 .<br />
O câncer do cólon é uma doença que aflige cerca de um<br />
milhão de pessoas em todo mundo, causando a morte anual de<br />
mais de meio milhão de pessoas. Entre os diferentes tipos de<br />
câncer, este é o tipo mais afetado pela dieta e sua prevenção, através<br />
da manipulação dietética, tem recebido grande atenção 2 .<br />
O consumo de fibras é um dos fatores mais importantes,<br />
porém ainda controverso, relacionado ao câncer coloretal<br />
(CCR).<br />
Esta revisão enfoca os principais aspectos do efeito das<br />
fibras relacionado à prevenção deste câncer, analisando as<br />
evidências que suportam o papel positivo do consumo das<br />
fibras na redução da incidência do câncer de cólon.<br />
Visão geral da carcinogênese e do câncer<br />
do cólon<br />
O câncer é considerado uma doença genética, resultante<br />
de mutações cumulativas que alteram pontos específicos do<br />
DNA. De acordo com a hipótese mais aceita para a<br />
carcinogênese, as mutações afetam dois tipos de genes<br />
cancerígenos, os chamados supressores de tumores, que normalmente<br />
refreiam a habilidade das células em se dividir, ou regulam<br />
o processo de morte programada (apoptose), como por<br />
exemplo mutações nos genes RB, p53, e APC; e as mutações<br />
em oncogenes, que estimulam a divisão celular, como por<br />
exemplo mutações nos genes BRAF, c-fos ou c-erbb3. Assim,<br />
o mecanismo que assegura que o número de células permaneça<br />
balanceado, pela regulação da divisão celular e apoptose, é<br />
subvertido no câncer, acarretando o aumento no número de<br />
células transformadas 3 .<br />
Novas teorias têm surgido para explicar o aparecimento<br />
do câncer, postulando aumento e acúmulo de mutações<br />
randômicas em genomas de células pré-cancerosas, ou pelo<br />
papel da aneuploidia, com aberrações cromossômicas em larga<br />
escala 3 .<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202<br />
Assim, o processo carcinogênico pode vir tanto pelo<br />
aumento da habilidade das células em se proliferarem, como<br />
no decréscimo da suscetibilidade da célula à apoptose. Os<br />
tumores malignos, ou câncer, são de natureza clonal, composto<br />
por agregados de células, todas derivadas de uma célula<br />
aberrante original. Células cancerosas diferem das células<br />
normais por fenótipos específicos, como alta taxa de divisão<br />
celular, invasão de novos territórios celulares, altas taxas<br />
metabólicas e forma celular anormal 4 .<br />
O câncer do cólon é um das principais doenças do mundo<br />
ocidental, sendo o segundo tipo de câncer em nível de<br />
mortalidade nos EUA. A maioria dos casos de câncer do cólon<br />
(80%-90%) não são herdados geneticamente, sendo caracterizados<br />
como esporádicos, originados pela combinação da<br />
dieta com o efeito do ambiente, resultando em mutações<br />
somáticas 5 .<br />
As células do cólon são especialmente sensíveis a perturbações<br />
no controle da divisão celular e apoptose. As criptas<br />
do intestino grosso são compostas por células que estão em<br />
continuo processo de auto-renovação. Células colônicas<br />
possuem atividade mitótica na parte inferior da cripta e adquirem<br />
seu fenótipo diferenciado durante uma migração linear<br />
para a região superior 6 .<br />
À medida em que ocorre o envelhecimento das células<br />
colônicas, estas sofrem apoptose e são liberadas no lúmen do<br />
cólon. Esse epitélio colônico é renovado completamente a<br />
cada quatro a oito dias. Cerca de 60% da proliferação normal<br />
dos colonócitos ocorre na parte basal das criptas, e 40% na<br />
parte superior. Entretanto, o processo de proliferação paralisa-se<br />
normalmente, em determinados momentos, e os<br />
colonócitos se tornam plenamente diferenciados, para serem<br />
então liberados depois de aproximadamente sete dias de um<br />
processo de migração ascendente. A expansão do compartimento<br />
proliferativo da superfície da cripta (hiperproliferação,<br />
envolvendo 40% acima do comprimento da cripta) é<br />
considerada um indicativo pré-neoplásico.<br />
A constância do número de células na cripta está sob<br />
forte controle para garantir um balanço rigoroso entre a taxa<br />
de produção de novas células e de morte celular, e ainda<br />
muito pouco se conhece sobre a natureza desse mecanismo de<br />
controle 6 .<br />
Um vasto número de evidências indicam a desregulação<br />
da apoptose como uma das principais causas ligadas ao desenvolvimento<br />
dessa neoplasia. A apoptose é observada predominantemente<br />
na região superior das criptas colônicas e a<br />
interpretação prevalente é de que esta regulação, restringindo<br />
espacialmente a apoptose, depende de um balanço complexo<br />
entre fatores indutores da apoptose e fatores de sobrevivência<br />
celular. A indução programada da morte celular<br />
pode também representar um mecanismo pelo qual os<br />
colonócitos, quando possuem danos no DNA, possam ser<br />
eliminados 5 . Desta forma, quando as taxas de proliferação<br />
colônica são aumentadas e a apoptose é reduzida ou<br />
inativada, aumenta o risco de perpetuação de danos no DNA<br />
e da incidência do câncer 7 .<br />
Dentre os vários fatores que regulam positivamente a<br />
apoptose está a família bcl-2, da qual faz parte o gene BAX,<br />
o qual é expresso predominantemente nas zonas superiores da<br />
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