Gênero e Diversidade na Escola - Portal do Professor - Ministério da ...
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A força e a origi<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de desta visão <strong>do</strong> Brasil foram tamanhas que acabaram empolgan<strong>do</strong><br />
algumas organizações negras <strong>da</strong> época e tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se, sob a fórmula sintética de “democracia<br />
racial”, um rótulo que distinguia positivamente o Brasil de outros países, nos quais a<br />
discrimi<strong>na</strong>ção e o racismo eram institucio<strong>na</strong>liza<strong>do</strong>s. A fama <strong>da</strong> democracia racial brasileira<br />
empolgou também o resto <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Preocupa<strong>da</strong> em recuperar o planeta <strong>da</strong> catástrofe <strong>da</strong><br />
II Guerra Mundial, marca<strong>da</strong>, como vimos, pela tentativa de implementação de regimes de<br />
governo racistas, a Organização <strong>da</strong>s Nações Uni<strong>da</strong>s (ONU) promoveu uma série de estu<strong>do</strong>s<br />
sobre relações raciais no Brasil com o intuito de apresentar ao mun<strong>do</strong> a experiência brasileira<br />
de democracia racial.<br />
O resulta<strong>do</strong>, porém, não foi o espera<strong>do</strong>. Ao olharem atentamente para as relações entre brancos/as<br />
e negros/as, estudiosos e estudiosas brasileiros/as acabaram encontran<strong>do</strong> um país dividi<strong>do</strong><br />
por cores e raças, ain<strong>da</strong> que esta divisão não estivesse regula<strong>da</strong> pela lei. Descobriram<br />
atitudes de preconceito, embora elas fossem media<strong>da</strong>s por relações de proximi<strong>da</strong>de e cordiali<strong>da</strong>de.<br />
Eles/elas aju<strong>da</strong>ram o país a ver, enfim, que aquilo que era chama<strong>do</strong> ape<strong>na</strong>s de pobreza,<br />
tinha uma cor. Algumas déca<strong>da</strong>s depois, tais estu<strong>do</strong>s avançaram por meio <strong>da</strong> análise não só<br />
<strong>da</strong>s relações interpessoais entre brancos/as e negros/as, mas pela pesquisa sistemática <strong>do</strong>s <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
sobre emprego, ren<strong>da</strong> e crimi<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s censos oficiais. Ficou evidente, então,<br />
que a discrimi<strong>na</strong>ção era um <strong>da</strong><strong>do</strong> estrutural que organizava, em to<strong>do</strong> o país, desde a distribuição<br />
<strong>do</strong> emprego e <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> até a distribuição <strong>do</strong>s casamentos. A democracia racial deixava de<br />
ser uma reali<strong>da</strong>de para ser encara<strong>da</strong> como uma falsa constatação, um mito ou, quan<strong>do</strong> muito,<br />
como um horizonte político desejável.<br />
O segun<strong>do</strong> mito, que nos interessa aqui, tem uma existência ain<strong>da</strong> muito mais antiga e difusa<br />
e não está associa<strong>do</strong> a nenhum autor específico, mas a uma idéia de senso comum que foi se<br />
consoli<strong>da</strong>n<strong>do</strong> com o tempo. Foi o antropólogo Roberto DaMatta que o registrou pela primeira<br />
vez, ao identificar que haveria um racismo à brasileira, isto é, um sistema de pensamento<br />
que postula a existência de três raças forma<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> Brasil. Nesse sistema, o brasileiro seria o<br />
produto moral e biológico <strong>da</strong> mistura <strong>do</strong> índio, com a sua preguiça, <strong>do</strong> negro, com a sua melancolia,<br />
e <strong>do</strong> branco português, com a sua cobiça e o seu instinto miscige<strong>na</strong><strong>do</strong>r. Estas seriam<br />
as razões tanto de nossa origi<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de quanto de nosso atraso socioeconômico e, até pouco<br />
tempo atrás, de nossa necessi<strong>da</strong>de de autoritarismo.<br />
Além disso, mesmo quan<strong>do</strong> o diagnóstico não é tão desfavorável, o que esse mito fun<strong>da</strong><strong>do</strong>r racista<br />
revela é a forma pela qual os diferentes conjuntos de povos são unifica<strong>do</strong>s e hierarquiza<strong>do</strong>s<br />
em uma mesma imagem de Brasil. A afirmação <strong>da</strong> miscige<strong>na</strong>ção não os coloca no mesmo plano,<br />
porque a ca<strong>da</strong> um deles é atribuí<strong>da</strong> uma quali<strong>da</strong>de diferente <strong>na</strong> formação <strong>do</strong> caráter moral<br />
<strong>do</strong> brasileiro. É inegável que os portugueses, os vários povos indíge<strong>na</strong>s e as diferentes <strong>na</strong>ções<br />
africa<strong>na</strong>s foram os principais responsáveis pela ocupação <strong>do</strong> território brasileiro e pela forma-<br />
A democracia<br />
racial deixava de<br />
ser uma reali<strong>da</strong>de<br />
para ser encara<strong>da</strong><br />
como uma falsa<br />
constatação, um<br />
mito ou, quan<strong>do</strong><br />
muito, como um<br />
horizonte político<br />
desejável.<br />
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