A economia dos ecossistemas e da biodiversidade - TEEB
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Quadro 4.6: O exemplo de Vittel<br />
A empresa de água mineral Vittel (Nestlé Waters)<br />
estava preocupa<strong>da</strong> com a contaminação por nitratos<br />
causa<strong>da</strong> pela intensificação de ativi<strong>da</strong>des<br />
agrícolas. Começou então a pagar agricultores localiza<strong>dos</strong><br />
em sua área de captação para que tornassem<br />
suas práticas mais sustentáveis. Um elemento<br />
chave do sucesso dessa iniciativa foi que a<br />
Vittel ganhou a confiança <strong>dos</strong> agricultores e manteve<br />
seus níveis de ren<strong>da</strong>, oferecendo-lhes pagamentos<br />
apropria<strong>dos</strong>. Ela também financiou to<strong>da</strong>s<br />
as alterações tecnológicas necessárias, poupando<br />
os agricultores de gastarem do próprio bolso. A<br />
empresa trabalhou intensivamente com os agricultores<br />
para identificar práticas alternativas adequa<strong>da</strong>s<br />
e incentivos mutuamente aceitáveis.<br />
Perrot-Maître 2006<br />
Assim, a valoração e o compartilhamento <strong>dos</strong> benefícios<br />
<strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong>de e <strong>dos</strong> serviços ecossistêmicos podem<br />
aju<strong>da</strong>r as políticas de proteção <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong>de a atender<br />
as necessi<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des locais de maneira<br />
mais efetiva. Se os benefícios se propagam para além do<br />
nível local, transferências podem recompensar os esforços<br />
<strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des e ajudá-las a encontrar os recurde<br />
sucesso (por exemplo, Bajracharya et al. 2008), onde<br />
uma pesquisa com os moradores locais concluiu que os<br />
benefícios socioeconômicos superaram os custos.<br />
Quando os benefícios são menos diretos do que no<br />
exemplo de Ugan<strong>da</strong> citado acima, transferências fiscais<br />
entre governos central, regionais e locais podem garantir<br />
receitas locais, que representariam uma parte <strong>dos</strong> benefícios<br />
do ecossistema. O Brasil também demonstra como<br />
este tipo de financiamento funciona. Desde 1992, municípios<br />
no estado do Paraná recebem transferências intergovernamentais<br />
por conta <strong>da</strong>s áreas protegi<strong>da</strong>s. Os indicadores<br />
de quali<strong>da</strong>de que determinam os pagamentos<br />
levam em consideração as metas de conservação alcança<strong>da</strong>s.<br />
Como resultado, houve um aumento no número<br />
e na quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s áreas protegi<strong>da</strong>s. Modelos similares<br />
foram desenvolvi<strong>dos</strong> em 12 <strong>dos</strong> 27 esta<strong>dos</strong> brasileiros e<br />
outros estão considerando essa abor<strong>da</strong>gem (Ring 2008).<br />
Na Europa, Portugal lidera a utilização de transferências<br />
fiscais intergovernamentais para municípios em áreas <strong>da</strong><br />
Rede Natura 2000 no âmbito <strong>da</strong>s Diretivas para Habitats<br />
e Aves <strong>da</strong> União Europeia.<br />
Os custos <strong>da</strong> per<strong>da</strong> e degra<strong>da</strong>ção dependem do quanto<br />
as comuni<strong>da</strong>des locais dependem <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong>de e<br />
<strong>dos</strong> serviços ecossistêmicos. Muitas comuni<strong>da</strong>des indígenas<br />
são totalmente dependentes <strong>dos</strong> recursos locais<br />
para sobreviverem. Especialmente nesses casos, “áreas<br />
de conservação comunitárias” basea<strong>da</strong>s em sistemas de<br />
utilização de recursos naturais tradicionalmente sustentáveis<br />
representam mais uma alternativa, e podem ser mais<br />
eficazes do que as áreas protegi<strong>da</strong>s convencionais (IUCN<br />
2008). Elas podem ter estruturas de governança a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong>s<br />
às necessi<strong>da</strong>des locais, bem como às competências<br />
e conhecimentos locais disponíveis.<br />
Quadro 4.7: Áreas protegi<strong>da</strong>s em Ugan<strong>da</strong><br />
Desde 1995, a legislação de Ugan<strong>da</strong> deixou a<br />
gestão de recursos naturais nas mãos <strong>da</strong>s autori<strong>da</strong>des<br />
locais. Por conseguinte, a Ugan<strong>da</strong>n Wildlife<br />
Authority (UWA), desembolsa 20% de to<strong>da</strong>s<br />
as receitas do turismo em áreas protegi<strong>da</strong>s (AP)<br />
para as comuni<strong>da</strong>des locais vizinhas às AP. Esse<br />
percentual foi estabelecido sem um retrato preciso<br />
<strong>da</strong> <strong>economia</strong> de APs, mas mesmo uma aproximação<br />
grosseira <strong>dos</strong> custos e benefícios permite<br />
a melhoria <strong>da</strong> subsistência local, simultaneamente<br />
contribuindo para a preservação <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong>de.<br />
É claro que tal sistema de compartilhamento<br />
de benefícios só funciona a longo prazo se realmente<br />
compensar as comuni<strong>da</strong>des locais pelas<br />
restrições de uso impostas pela AP. Portanto, conhecer<br />
melhor os custos e benefícios envolvi<strong>dos</strong><br />
permitirá conciliar a conservação <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong>de<br />
em curso e reforçar os meios de subsistência<br />
rural (Ruhweza 2008).<br />
Algumas áreas protegi<strong>da</strong>s no âmbito do “Programa<br />
de Compartilhamento de Receitas” <strong>da</strong> Ugan<strong>da</strong>n<br />
Wildlife Authority<br />
Parque Nacional Impenetrável de Bwindi<br />
Parque Nacional <strong>dos</strong> Gorilas Mgahinga<br />
Parque Nacional do Lago Mburo<br />
Parque Nacional Rainha Elizabeth<br />
Parque Nacional <strong>da</strong>s Montanhas Rwenzori<br />
Parque Nacional Kibaale<br />
Parque Nacional Semliki<br />
Parque Nacional <strong>da</strong>s Cataratas de Murchison<br />
Parque Nacional do Monte Elgon<br />
Tendências populacionais de espécies seleciona<strong>da</strong>s<br />
no Parque Nacional do Lago Mburo<br />
Espécies 1999 2002 2003 2004 2006<br />
Zebra 2.249 2.665 2.345 4.280 5.986<br />
Búfalo 486 132 1.259 946 1.115<br />
Antílope d’água 598 396 899 548 1.072<br />
Hipopótamo 303 97 272 213 357<br />
Impala 1.595 2.956 2.374 3.300 4.705<br />
Fonte: UWA 2005<br />
Da <strong>economia</strong> à política 57