Albert Eckhout e o Novo Mundo - Profª Carla Mary S. Oliveira
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Lê-las é, também, aprender a ler o outro, a ler as referências que não são<br />
nossas, a ler o mundo que não é o nosso e a partir daí perceber que o mundo<br />
é construído a partir de semelhanças e sobre diferenças que coexistem, às<br />
vezes de maneira harmônica, outras vezes conflituosa e antagônica. Este é<br />
um exercício fundamental: descobrir o outro por meio das imagens e além<br />
dos estereótipos. Compreendê-lo, respeitá-lo e dialogar com ele, além das<br />
imagens por vezes reducionistas e simplificadoras que nos são apresentadas<br />
e que, também, construímos historicamente. (PAIVA, 2006, p. 104)<br />
Nesse sentido, portanto, pretendemos ao longo de todo esse trabalho lidar da melhor<br />
maneira possível com as fontes iconográficas, considerando essa discussão a respeito de suas<br />
armadilhas, mas ao mesmo tempo, certos de que elas são, neste momento, o melhor material<br />
disponível para vencer a tarefa que nos propusemos a fazer, que é a de entender como se<br />
consolidou a imagem de <strong>Albert</strong> <strong>Eckhout</strong> como transformador do imaginário europeu sobre o<br />
Brasil e se, de fato, é esse título que lhe cabe.<br />
2.2 - A peculiaridade da obra de <strong>Albert</strong> <strong>Eckhout</strong><br />
Segundo Sylvia Ribeiro Coutinho (1999), o protestantismo foi responsável pelo<br />
surgimento de uma espírito liberto da dogmática religiosa e também pela abertura das<br />
possibilidades de novas práticas experimentais e especulativas que delinearam, ao longo do<br />
século XVII, a cultura avançada do norte europeu. Para a autora, isso interferiu e influenciou<br />
diretamente um movimento de avanço no processo de observação da natureza e do meio<br />
ambiente, pois esse então passou a ser um processo desvinculado da exortação moral e<br />
religiosa.<br />
Nos Países Baixos, essa cultura naturalista teve grande desenvolvimento e se<br />
estabeleceu de acordo com o método de observação direta e minuciosa da natureza, pelo qual<br />
se pretendia capturar a especificidade de cada objeto, marcando a arte dessa região como<br />
“uma arte capaz de captar a diferença, pois ela se constitui como um despojado espírito de<br />
observação do real – da paisagem, do homem, das cenas simples da cidade ou do interior<br />
doméstico” (COUTINHO, 1999, p. 37). É, pois, essa cultura artística que <strong>Albert</strong> <strong>Eckhout</strong> traz<br />
como influência para desenvolver seu trabalho no Brasil e é, em grande parte, devido a essa<br />
influência, que sua representação a respeito da humanidade do Brasil se diferencia, em grande<br />
parte, das representações concebidas anteriormente, especialmente aquelas produzidas pelo<br />
colonizador português.<br />
Da mesma forma que o francês Jean de Léry, <strong>Albert</strong> <strong>Eckhout</strong> desconsiderou o caráter<br />
anti-humano, até então atribuído ao índio brasileiro e percebeu, capturou e expressou, em seu<br />
trabalho, as diferenças e peculiaridades desse índio. Sua leitura a respeito dessas<br />
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