12.07.2015 Views

Revista n.° 36 - APPOA - Associação Psicanalítica de Porto Alegre

Revista n.° 36 - APPOA - Associação Psicanalítica de Porto Alegre

Revista n.° 36 - APPOA - Associação Psicanalítica de Porto Alegre

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Rosane Monteiro Ramalho<strong>de</strong>nte, situado no que fora outrora um lugar aprazível e calmo, mas que havia setornado ao longo dos anos um <strong>de</strong>sconfortável amontoado <strong>de</strong> túmulos à beira <strong>de</strong>uma movimentada estrada. Poucas pessoas estão presentes – apesar do cuidadoda filha em chamar alguns conhecidos, para que não estivessem na cerimôniasomente ela, um tio e sua esposa. Por conta <strong>de</strong> seu empenho, acabamindo ao funeral também a sua mãe (uma das três ex-mulheres <strong>de</strong> seu pai), seusdois irmãos do primeiro casamento – que <strong>de</strong>testavam abertamente o pai –,alguns alunos das aulas <strong>de</strong> artes que ele havia passado a dar após a aposentadoria,e alguns velhinhos do condomínio, uma espécie <strong>de</strong> asilo, em que elemorava no final <strong>de</strong> sua vida. Uma única pessoa presente não tinha sido convidada– uma enfermeira amiga que havia cuidado <strong>de</strong>le numa cirurgia anterior.Roth comenta:E assim terminou. [...] Em todo o estado, naquele dia, tinha havidoquinhentos funerais como este, rotineiros, normais. [...] É justamenteo que há <strong>de</strong> normal nos funerais que os torna mais dolorosos,mais um registro da realida<strong>de</strong> da morte que avassala tudo(Roth, 2007, p.17-18).Toda a história do livro gira em torno da angústia, insistente e sem remédio,do homem comum em relação à realida<strong>de</strong> da morte. Esse sentimento inquietantee atormentador o persegue. Desdobrado em várias cenas: <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seuprimeiro confronto chocante com a morte nas praias idílicas <strong>de</strong> sua infância, emque viu um cadáver inchado saindo do mar, passando pela cirurgia <strong>de</strong> hérnia aque se submeteu quando ainda era menino (e o fato <strong>de</strong> ter presenciado, naquelaocasião, a morte <strong>de</strong> outra criança, no leito ao lado do seu), a crise <strong>de</strong> peritoniteque, na sua infância, acometeu a seu pai e quase o matou, até, na velhice,<strong>de</strong>parar-se com a <strong>de</strong>terioração <strong>de</strong> seus contemporâneos, com seus própriosproblemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e a <strong>de</strong>cadência inexorável <strong>de</strong> seu corpo. Durante toda avida, sua angústia e a sua única certeza se misturavam na i<strong>de</strong>ia da inevitabilida<strong>de</strong>da morte.O homem comum trabalhara numa agência publicitária <strong>de</strong> Nova Iorque,tendo tido sucesso. Após a aposentadoria, <strong>de</strong>dicou-se à pintura <strong>de</strong> quadros –que era, na verda<strong>de</strong>, seu <strong>de</strong>sejo sempre adiado –, passando a morar na praia, amesma à qual ia com a família, quando criança, passar parte dos verões. Tevetrês casamentos, com mulheres muito diferentes. Separou-se da primeira mulherpara ficar com a amante, fato que causou gran<strong>de</strong> abalo e revolta na exmulher,e produziu nos filhos um sentimento do qual jamais se livraram – o <strong>de</strong>que não tinham mais pai. Do segundo casamento ele teve uma filha, uma das30

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!