SETEMBRO 2015

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24 Lusitano de Zurique História Setembro <strong>2015</strong> O Documento dos Nove e a Assembleia de Tancos liderada pelo primeiro-mi- Face à situação, foi ao en- com a excepção de Mar- nistro Vasco Gonçalves, e contro de Melo Antunes ques Júnior. Também a os moderados. O presi- e pediu-lhe que passasse distribuição pelas unida- dente da República, gene- ao papel o que há muito des militares para recolha ral Costa Gomes, insistiu vinham a conversar den- de assinaturas não tar- em dar posse a um novo tro do grupo a que ambos dou, enquanto uma cópia governo liderado por Vas- pertenciam. Salientou os chegou à redacção do Jor- co Gonçalves, quando, contributos de Vítor Alves, nal Novo, que a publicou 2 . Carlos Ademar mcademar@gmail.com ao longo do mês de Julho, este fora perdendo o apoio dos partidos maio- Vítor Crespo, dele próprio e de Melo Antunes 1 . Algumas horas depois, o do- A contundência marcava o texto: «É necessário denunciar vigorosamente o ritários e dos moderados. cumento estava pronto e espírito fascista subjacen- A publicação do Documento dos Nove, a 7 de Agosto de 1975, representou o desencadear público das hostilidades entre a linha gonçalvista, Vasco Lourenço afirmou a Maria Manuela Cruzeiro que após um encontro com Costa Gomes, sentiu-o determinado a conceder nova oportunidade a Vasco Gonçalves. foi rapidamente assinado por todos os moderados que pertenciam ao Conselho da Revolução (CR), 1 Maria Manuela Cruzeiro, Vasco Lourenço…, pp.445-448. te ao projecto que, dizendo-se socialista, acabará na prática numa ditadura burocrática dirigida con- 2 Maria Inácia Rezola, 25 de Abril - Mitos de uma Revolução..., p. 183.
Setembro <strong>2015</strong> História Lusitano de Zurique 25 tra a massa uniforme e Foi em ambiente consideráveis alterações, que seria o Conselho a inerte dos cidadãos. É crispado que decorreu com a redução do nú- decidir, não podia ter sido necessário repelir ener- esta Assembleia. «Houve mero dos conselheiros, mais clara. Era o mesmo gicamente o anarquismo excessos de linguagem alegadamente para mel- que dizer que entravam e o populismo, que con- de parte a parte» 5 , saídas horar a sua operaciona- os dois primeiros e saía o duzem inevitavelmente da sala intempestivas, o lidade, verificando-se, no terceiro (…). A mesa indi- à catastrófica dissolução não reconhecimento das cômputo final, uma fran- ca o comandante Martins do Estado, numa fase conclusões, demissões ca desvantagem para os Guerreiro para ler e pôr de desenvolvimento da e renúncias a cargos. Há gonçalvistas. Um dos mili- à votação o comunicado sociedade em que, sem referências a acusações tares da Marinha, Martins final, mas ele não aceita, Estado, nenhum projecto pessoais que no calor da Guerreiro, dando mostras nem concorda que se cha- político é viável» 3 . discussão não terão sido de que, com aquela As- me Assembleia do MFA ao Costa Gomes, porém, não apreciou a publicidade que os promotores quiseram dar ao Documento. Reconheceu, mais tarde, que concordava com o seu teor, mas não com a forma arquitectada para o divulgar. Por isso, na reunião de 10 de Agosto do Directório 4 , com Vasco Gonçalves, votou a favor da suspensão dos conselheiros da Revolução que o assinaram. Foi, porém sol de pouca dura já que foram reintegrados na sequência da Assembleia do MFA de Tancos, a 5 de Setembro, e que veio revelar-se decisiva para o virar de página no que ao chamado gonçalvismo respeita. 3 Adelino Gomes e José Pedro Castanheira, Os dias Loucos do PREC…, p. 243. 4 Organismo de cúpula eleito pelo CR, que integrava o PR, o PM e comandante do COPCON. evitadas. Da acta desta Assembleia, existente na Torre do Tombo, não se consegue extrair o espírito de disputa e de crispação a que alguns dos que estiveram presentes se referem. O general Costa Gomes, procurando talvez induzir na assistência a mudança que pressentia e que se viria efectivamente a dar, anunciou: «O Povo já não aceita a condução do MFA» 6 , indo, no fundo, ao encontro da frase de ordem lançada mês e meio antes pelo PS, na grande manifestação da Alameda D. Afonso Henriques: «O povo não está com o MFA». Foi também nesta Assembleia, que o Conselho da Revolução sofreu 5 António Ramalho Eanes em entrevista ao autor… 6 Costa Gomes in Sousa e Castro, Capitão de Abril, Capitão de Novembro… p. 211. sembleia, algo de profundo mudara, afirmou: «O MFA morreu. Vamos ver o que nasceu» 7 . Também alguns moderados saíram do CR, designadamente Vítor Alves, Melo Antunes e Vítor Crespo, ainda que os dois primeiros reentrassem na reunião do Conselho que decorreu no dia 8 8 . Concretamente sobre estas exclusões, será interessante transcrever uma passagem do livro, Quinhentos e setenta e nove dias de Revolução, cujo autor, Vaza Pinheiro, este presente: «Alguém perguntou se Melo Antunes, Vítor Alves e Costa Martins farão parte do novo CR. A resposta do próprio presidente [Costa Gomes] de 7 Acta da AMFA de 5 de Setembro em Tancos. (Arquivo do CR - ANTT) 8 Acta da reunião do CR de 8 de Setembro de 1975. (Arquivo do CR - ANTT) que ali se passou. A barafunda é total. Sucedem-se intervenções sem nexo, nem controlo, reflectindo cada uma o que se passava na alma de cada um. Golpada, golpada, era a palavra mais ouvida (…). Como nota final, apenas isto: nenhum comunicado foi lido e posto à votação, portanto não houve Assembleia de Tancos, mas de tamancos» 9 . O cerco às forças políticas e militares mais radicais ia-se fechando, contribuindo para a criação das condições que potenciaram o 25 de Novembro de 1975 - que colocaria um ponto final na revolução iniciada a 25 de Abril de 1974. 9 Vaza Pinheiro, Quinhentos e setenta e nove dias de Revolução – retrato de uma época. Porto: Campo das Letras, 1999, p. 259.
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