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Ele torcia por algum time na Itália? E no Brasil, era Palestrino?<br />
Não tenho referências dele quanto ao gosto por futebol. Acho que na<br />
época eu também não tinha essa referência. Na verdade eu me tornei<br />
palmeirense por admiração à “academia”. Ouvir o time de 76 ser<br />
campeão e a admiração com que o narrador falava do Ademir da Guia,<br />
ou melhor do “Divino”, foi determinante. Também não tenho referência<br />
de qualquer predileção dele por alguma agremiação na Itália.<br />
Acho que o foco principal dele sempre foi o desenho, a literatura.<br />
Consta que ele, com 14 anos, frequentava a biblioteca para ler filosofia.<br />
Fico me perguntando o quanto ele leu e o quanto aprendeu. Certamente<br />
muito disso é demonstrado em sua obra.<br />
Seu avô falava português ou italiano em casa, com a “famiglia”?<br />
O nonno era poliglota, falava, naturalmente o italiano, o português,<br />
se não me engano o inglês, o francês, inclusive morou na França durante<br />
um tempo. Em casa falava o português frequentemente, mas<br />
também falava em italiano com a nonna. O mais marcante era a forma<br />
dele falar, sempre forte, determinada e rápida!<br />
Ele nunca mais voltou à Itália?<br />
Me lembro que ele fez viagens pelo Brasil, para o nordeste, onde morávamos<br />
com o meu pai, seu filho Gianluigi. E também, se não me<br />
engano, duas viagens para a Europa, retornando, entre outros países,<br />
para a Itália. Existem alguns apontamentos dessas viagens, desenhos<br />
que ele fazia, dos locais que visitava, situações cotidianas como uma<br />
senhora aguardando numa estação de trem, um artista pintando um<br />
quadro numa praça em Paris, etc.<br />
Nico Rosso tinha algum hobby que não fosse desenhar e pintar? Gostava<br />
de animais, jogava botão, algo assim?<br />
Acho que seu hobby principal era a leitura. Lembro de jogar xadrez<br />
com ele. Certa vez, jogando com ele, fiz uma jogada e meu irmão<br />
mais velho comenta que foi uma péssima jogada ou algo assim, que<br />
joguei “errado”, aí, na sabedoria que ele tinha, mostrou para mim e<br />
para o meu irmão que a minha jogada não tinha sido ruim pois mais<br />
uma ou duas jogadas a frente, se não tivesse feito daquela maneira,<br />
teria uma determinada situação final no jogo, enfim, não perdia<br />
nenhuma oportunidade de ressaltar as virtudes, e minimizar os defeitos,<br />
como disse, era um mestre, sempre respeitoso com todos.<br />
Veja, um detalhe tão pequeno e tão marcante para mim!<br />
Você tinha ideia quando era garoto de que ele era um ilustrador famoso?<br />
Lia os quadrinhos dele? Mostrava para os colegas na escola,<br />
coisas assim?<br />
Quando era garoto não tinha a noção do tamanho e do valor da obra<br />
do Nico. Os quadrinhos eu lia, na verdade eu via, pois acompanhava<br />
mais a produção das histórias sem dar maior valor à narrativa, à<br />
história ou aos personagens. Apenas anos mais tarde, quando iniciei<br />
minha coleção de HQ, é que comecei a dar mais atenção a esses aspectos.<br />
Mas confesso que o hábito de observar mais o desenho acabou<br />
ficando. Um lance que acontecia comigo, e de certa forma, era<br />
originado pelo parentesco é que a minha professora de química, na<br />
escola, me escalava para desenhar as ilustrações dos livros na lousa,<br />
para explicar a matéria a turma. Era uma sensação muito boa!<br />
Seu pai também era um excelente desenhista, bastante influenciado<br />
pelo Nico, mas muito melhor que vários de seus contemporâneos.<br />
O Luiz não conseguiu me explicar porque ele trocou esse talento<br />
pela química industrial. Você arrisca um palpite? Acha que pode ter<br />
sido a busca de uma profissão mais estável do que a de desenhista?<br />
Ou talvez sentisse o peso da comparação com o Nico? Qual sua opinião<br />
sobre isso?<br />
Perguntando para minha mãe, ao que parece o meu pai começou um<br />
curso de Geologia na USP e “tomou pau” em química. Como era um<br />
sujeito que não levava desaforo pra casa, foi cursar Química.<br />
Até por ser italiano e por haver nascido numa época onde a religião<br />
era muito importante, seu avô era um bom católico, segundo seu irmão.<br />
Ele trabalhou muito para as irmãs Paulinas, desenhando livretos<br />
de oração, catecismos e muita coisa para O Jornalzinho. Ao longo<br />
dos anos, uma faceta altamente erótica e sensual apareceu no traba-<br />
-lho dele, mulheres lindíssimas e nuas, cenas de sexo, etc. Você acha<br />
que ele teve algum dilema moral com isso?<br />
Acho que não. Ou talvez, num caso. Existe uma referência aos dese-<br />
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