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edição de 6 de novembro de 2017

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última página<br />

Mikolette/iStock<br />

Sobre méritos e pruridos<br />

Stalimir Vieira<br />

Uma das funções mais eticamente complexas<br />

<strong>de</strong> se lidar é a direção <strong>de</strong> criação.<br />

Principalmente quando se faz jus a ela. Circunstância<br />

em que as tentações fazem fila<br />

à porta da consciência. Chamo <strong>de</strong> fazer jus<br />

ter um bom portfólio sempre atualizado. É<br />

ele que vai dar segurança sobre sua capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> resolver as coisas criativamente<br />

– sejam os <strong>de</strong>safios a que assumiu tratar<br />

individualmente, sejam aqueles em que<br />

coor<strong>de</strong>nou e orientou as equipes.<br />

Ser capaz <strong>de</strong> fazer do conjunto <strong>de</strong>ssas<br />

obras – suas e dos outros – a<br />

marca <strong>de</strong> excelência da gestão<br />

e, por consequência, da<br />

imagem da agência, é o gran<strong>de</strong><br />

mérito do diretor <strong>de</strong> criação.<br />

Mas sabemos muito bem<br />

que a conquista <strong>de</strong>ssa percepção<br />

a favor do profissional<br />

não se dá por “combustão<br />

espontânea”. Não basta ser<br />

brilhante na realização do trabalho<br />

para se tornar famoso,<br />

é preciso ser eficaz na divulgação<br />

<strong>de</strong>sse trabalho. Então,<br />

começa o assombro das tentações.<br />

O que dizer numa entrevista sobre uma<br />

peça consagrada, criada sob a sua direção,<br />

mas em que não teve nenhuma interferência<br />

criativa direta? Uma entrevista é diferente<br />

<strong>de</strong> uma ficha técnica, on<strong>de</strong> “fazer justiça”<br />

é burocraticamente simples. Já uma<br />

entrevista é sempre envolvida por uma po<strong>de</strong>rosa<br />

ambiência política no que se refere à<br />

própria ascensão ou à afirmação do seu gênio,<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do momento da carreira.<br />

Ali o diretor <strong>de</strong> criação não estará dialogando<br />

com a sua equipe, movido por i<strong>de</strong>ais<br />

<strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> e reconhecimento dos méritos<br />

alheios, mas competindo com ambições<br />

<strong>de</strong> mercado que, para serem alcançadas,<br />

“O diretOr<br />

<strong>de</strong> criaçãO<br />

vencedOr<br />

talvez precise<br />

ter, ainda,uma<br />

habilida<strong>de</strong><br />

extraOrdinária<br />

<strong>de</strong> antecipar-se”<br />

exigem do caráter uma combinação <strong>de</strong> características<br />

menos comum, que talvez ele<br />

tenha e o restante da equipe não. Significa<br />

dizer, por exemplo, que, na disputa por<br />

glória e po<strong>de</strong>r, levar preceitos <strong>de</strong> justeza às<br />

raias da santida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong> uma ingênua<br />

ineficácia. E agora? Há quem se retroalimente<br />

com um argumento que não <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> ser verda<strong>de</strong>iro: eu criei as condições<br />

para isso, então sou coautor <strong>de</strong> tudo o que<br />

veio <strong>de</strong>pois. Mais ou menos como Deus, ao<br />

criar o mundo.<br />

Para aten<strong>de</strong>r às expectativas da mídia<br />

também hão <strong>de</strong> ser cumpridas algumas praxes:<br />

afinal, apren<strong>de</strong>mos que<br />

não basta um fato ter ocorrido<br />

para que vire notícia. Para<br />

uma obra aparecer é preciso<br />

que a autoria reverbere. E, assim,<br />

agência, cliente e criação<br />

se beneficiam. É sobre esse<br />

fio <strong>de</strong> navalha que caminha o<br />

diretor <strong>de</strong> criação, buscando<br />

equilibrar-se entre uma reputação<br />

respeitável e uma reputação<br />

respeitada.<br />

O resultado final <strong>de</strong>ssa busca<br />

vai <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r do exercício <strong>de</strong> uma inteligência<br />

capaz <strong>de</strong> afinar algumas crenças,<br />

às vezes, contraditórias. Importante, por<br />

exemplo, que sua generosida<strong>de</strong> seja sempre<br />

suficiente para atenuar os seus “pecados”:<br />

um conjunto <strong>de</strong> pequenas bonda<strong>de</strong>s constrói<br />

crédito para uma gran<strong>de</strong> “malda<strong>de</strong>”. O<br />

diretor <strong>de</strong> criação vencedor talvez precise<br />

ter, ainda, uma habilida<strong>de</strong> extraordinária<br />

<strong>de</strong> antecipar-se, junto a equipe, às eventuais<br />

injustiças contidas numa informação,<br />

que serão sempre <strong>de</strong>bitadas à negligência<br />

<strong>de</strong> terceiros.<br />

Enfim, se trata <strong>de</strong> uma missão para a qual<br />

nem todos estão preparados. Às vezes por<br />

falta <strong>de</strong> talento, às vezes por excesso <strong>de</strong><br />

pruridos.<br />

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing<br />

stalimircom@gmail.com<br />

50 6 <strong>de</strong> <strong>novembro</strong> <strong>de</strong> <strong>2017</strong> - jornal propmark

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