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eyond the line<br />
Cristofotolux/iStock<br />
Velho mundo X<br />
novo mundo<br />
O país, principalmente Lisboa, vive um boom<br />
econômico, <strong>de</strong>corrente das atrações turísticas<br />
Alexis Thuller Pagliarini<br />
Escrevo este texto durante minhas férias,<br />
que passo em Portugal. Além das maravilhas<br />
gastronômicas e dos belos passeios<br />
pelo <strong>de</strong>stino da moda, durante um inverno<br />
<strong>de</strong>liciosamente light, impossível <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
analisar o marketing <strong>de</strong>sse belo país e compará-lo<br />
ao praticado no Brasil. Amigos publicitários<br />
recém-chegados à Terrinha <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
pronto previnem: o mercado português é<br />
muito pequeno. Além das pequenas dimensões<br />
do país e sua população 20 vezes menor<br />
que a nossa, a cultura da “Terrinha” faz tudo<br />
parecer um tanto naive e low profile, em<br />
termos <strong>de</strong> marketing. Segundo o amigo Gui<br />
Pacheco, um <strong>de</strong>sses publicitários brasileiros<br />
neoportugueses, há ainda certa resistência<br />
dos portugueses a agências <strong>de</strong> fora. As empresas<br />
anunciantes aparentemente “protegem”<br />
os seus compatriotas, dificultando a<br />
vida <strong>de</strong> agências “<strong>de</strong> fora”. Há profissionais<br />
bons “importados” do Brasil, mas não agências<br />
tupiniquins.<br />
O país, principalmente sua capital Lisboa,<br />
vive um boom econômico, <strong>de</strong>corrente das<br />
suas atrações turísticas, a preços mais módicos<br />
que seus vizinhos, principalmente os <strong>de</strong><br />
fora da península ibérica, atraídos também<br />
pelo seu clima e ambiente <strong>de</strong> segurança. O<br />
turismo já respon<strong>de</strong> por mais <strong>de</strong> 10% do PIB<br />
do país (no Brasil, é menos <strong>de</strong> 5%). Mas é o<br />
mercado imobiliário que se apresenta mais<br />
exuberante. Num dos passeios <strong>de</strong> barco pelo<br />
Rio Tejo, com uma vista privilegiada, tentei<br />
contar os guindastes instalados pela cida<strong>de</strong>.<br />
O piloto do barco se adianta: são mais <strong>de</strong> 50.<br />
São obras <strong>de</strong> retrofit <strong>de</strong> belíssimos prédios<br />
históricos da cida<strong>de</strong>, que recebem ambientes<br />
contemporâneos no seu interior, sem alterar<br />
suas lindas fachadas históricas. Fiquei<br />
no apartamento <strong>de</strong> um amigo brasileiro num<br />
<strong>de</strong>sses prédios retrofitados, no charmoso<br />
bairro do Chiado. O resultado é fantástico:<br />
todos os benefícios <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>s largas e pé-<br />
-direito alto aliados agora a ambientes mo<strong>de</strong>rnos.<br />
Ainda faltam alguns recursos mo<strong>de</strong>rnos<br />
- garagens, por exemplo -, mas o resultado<br />
<strong>de</strong>ssa combinação do velho mundo<br />
com o novo mundo é muito bacana.<br />
Como efeito colateral, o preço <strong>de</strong> se viver<br />
nesses bairros mais nobres, em prédios<br />
remo<strong>de</strong>lados, cresceu muito, expulsando<br />
moradores antigos para bairros mais distantes.<br />
Mas os contrastes entre o velho e o novo<br />
estão presentes por todos os lados. Um dos<br />
eventos mais importantes <strong>de</strong> tecnologia, por<br />
exemplo, é realizado em terras lusitanas: o<br />
Web Summit. Mas ao caminhar pelo comércio<br />
mais tradicional, pelas ruas dos bairros<br />
históricos da cida<strong>de</strong>, nota-se quase sempre<br />
um vitrinismo simplório e merchandising<br />
ainda muito amador, sem sofisticação mercadológica.<br />
Se meus amigos que moram aqui<br />
não me contassem eu jamais saberia que a<br />
livraria Bertrand, no Chiado, é a mais antiga<br />
do mundo. Há apenas uma pequena e escondida<br />
placa ressaltando isso. Seu ambiente<br />
interno é incrivelmente simples, sem <strong>de</strong>ixar<br />
os visitantes com a sensação <strong>de</strong> estar numa<br />
livraria histórica.<br />
Não dá para enten<strong>de</strong>r. Qualquer marqueteiro<br />
tentaria reproduzir um ambiente que<br />
remetesse aos tempos antigos da livraria,<br />
mas o que vemos lá é uma livraria comum,<br />
como as <strong>de</strong>mais. Por outro lado, empreen<strong>de</strong>dores<br />
mais ativos se sobressaem e se<br />
dão bem nesse mercado em ascensão. É o<br />
caso do Midas da gastronomia José Avillez.<br />
Chef jovem e empreen<strong>de</strong>dor, Avillez,<br />
que teve como mestre o incensado Ferran<br />
Adrià, nada <strong>de</strong> braçada na gastronomia lisboeta<br />
mais refinada. Des<strong>de</strong> o seu maravilhoso<br />
Belcanto, <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> duas estrelas<br />
Michelin (não <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> experimentar na<br />
sua vinda a Portugal - é caro, mas vale cada<br />
centavo) até o Cantinho do Avillez, passando<br />
por propostas menos pretensiosas, mas<br />
todas muito criativas, como o seu Bairro<br />
do Avillez, que reúne num mesmo espaço<br />
uma mercearia, uma taberna, um páteo e<br />
um beco, cada ambiente oferecendo uma<br />
experiência gastronômica única.<br />
Foi esse contraste entre iniciativas empreen<strong>de</strong>doras<br />
e mo<strong>de</strong>rnas com outras datadas<br />
<strong>de</strong> décadas atrás, como a maioria do<br />
comércio <strong>de</strong> rua, que me fez escrever esse<br />
texto. Será que nós, que fomos educados na<br />
cartilha do marketing mais agressivo, <strong>de</strong><br />
origem americana, estamos certos? Ou os<br />
mais tradicionalistas e comedidos portugueses<br />
é que estão? De qualquer maneira,<br />
é bom viver esses contrastes. Não é agradável<br />
ver só um monte <strong>de</strong> McDonad’s e Starbucks<br />
em cida<strong>de</strong>s que antes tinham seus<br />
cafés e restaurantes tradicionais. Assim como<br />
os prédios remo<strong>de</strong>lados <strong>de</strong> Lisboa, não<br />
é nada mau ter um marketing retrofitado,<br />
fazendo conviver o velho (e belo) com o novo<br />
(e mo<strong>de</strong>rno). Concorda?<br />
Alexis Thuller Pagliarini é superinten<strong>de</strong>nte<br />
da Fenapro (Fe<strong>de</strong>ração Nacional das Agências<br />
<strong>de</strong> Propaganda)<br />
alexis@fenapro.org.br<br />
26 <strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>janeiro</strong> <strong>de</strong> <strong>2019</strong> - jornal propmark