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edição de 14 de janeiro de 2019

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STORYTELLER<br />

Kladyk/iStock<br />

Mulheres, cautela!<br />

“O presente é horrível<br />

e por isso o futuro é negro”<br />

Lula Vieira<br />

ara que não se me atire o impropério<br />

“P<strong>de</strong> reacionário, <strong>de</strong>siludido ou pessimista,<br />

citarei no <strong>de</strong>curso <strong>de</strong>ste texto a autorizada<br />

opinião <strong>de</strong> alguns homens que não<br />

se confun<strong>de</strong>m com a obscurida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem<br />

subscreve este artigo. O que acontece é que<br />

torna-se imprescindível uma imediata reação<br />

por parte dos homens, notadamente<br />

os chefes <strong>de</strong> família, para que o mal não se<br />

amplie ainda mais do que se tem alastrado.<br />

Digo eu que cada chefe <strong>de</strong> família que<br />

ainda não per<strong>de</strong>u a sensatez e a prudência<br />

está na obrigação inadiável <strong>de</strong> aumentar os<br />

cuidados em sua casa e no <strong>de</strong>ver imperioso<br />

<strong>de</strong>, sem subterfúgios, sem evasivas, sem<br />

tibiezas, arrancar as filhas e mulheres <strong>de</strong>ssas<br />

atitu<strong>de</strong>s que contrariam o bom senso e<br />

a dignida<strong>de</strong> como se observa hoje na vida<br />

social. Cada chefe <strong>de</strong> família, repito, tem<br />

a necessida<strong>de</strong> rigorosa <strong>de</strong> prestar atenção<br />

para o traje e os pensamentos das filhas e<br />

da consorte, para lembrar-lhes aquilo que<br />

<strong>de</strong>monstrem que esqueceram do código da<br />

virtu<strong>de</strong>. É crime <strong>de</strong> lesa-pátria o chefe <strong>de</strong> família<br />

que não afasta do lar dos ares envenenados<br />

<strong>de</strong> fora e, sob o irrisório pretexto <strong>de</strong><br />

que é moda ou pensamento geral, inva<strong>de</strong>m<br />

seu domínio pela linguagem chula, pelos<br />

pensamentos ina<strong>de</strong>quados, pelos trajes e<br />

pelas atitu<strong>de</strong>s que comprometem. Não me<br />

caberia a honra <strong>de</strong>smedida <strong>de</strong> ser brasileiro<br />

se <strong>de</strong>ixasse passar a ocasião que se me oferece<br />

a ventilar este problema. Sei bem que<br />

corro o perigo <strong>de</strong> resvalar no ridículo e escorregar<br />

na zombaria. Não existe cena mais<br />

inapropriada do que um cavalheiro <strong>de</strong> minha<br />

profissão vir a público pregar sermões<br />

<strong>de</strong> moral. Dou <strong>de</strong> ombros. Suportarei com<br />

paciência o peso do ridículo se minha voz<br />

repercutir num só ouvido. É preciso que se<br />

ouça com atenção o que os gran<strong>de</strong>s educadores,<br />

os verda<strong>de</strong>iros lí<strong>de</strong>res espirituais, as<br />

autorida<strong>de</strong>s médicas alertam. Estamos – e<br />

trata-se <strong>de</strong> conclusões respaldadas pela ciência<br />

– no limiar da <strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong>gradação<br />

da espécie e das conquistas civilizatórias.<br />

A mulher nasceu para viver no lar e respirar<br />

na família conforme nos ensina a natureza<br />

em sua sábia e divina evolução. Hoje<br />

já corre o mundo o provérbio francês que<br />

‘mulher fora <strong>de</strong> casa está <strong>de</strong>ntro do perigo’.<br />

O trabalho masculino exercido pela mulher<br />

lhe amortece a inclinação pela família,<br />

brutaliza seus sentimentos, lhe dá hábitos<br />

impróprios e lhe rouba a timi<strong>de</strong>z própria<br />

do seu sexo. Se ela trabalhando foge das<br />

responsabilida<strong>de</strong>s do lar e pensa que se<br />

torna livre, submete-se em realida<strong>de</strong> à escravidão<br />

e à <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> suas funções<br />

públicas. O convívio entre homens que não<br />

po<strong>de</strong>m respeitá-la pela ausência <strong>de</strong> laços<br />

<strong>de</strong> parentesco só lhe é nocivo. As homenagens<br />

que seus companheiros <strong>de</strong> trabalho<br />

lhe emprestam são iguais às que as abelhas<br />

ren<strong>de</strong>m às flores que têm viço e perfume,<br />

poluindo-as aos poucos e murchando-as<br />

lentamente, aniquilando-as para sempre.<br />

O presente é horrível e por isso o futuro é<br />

negro. Mães brasileiras, alerta! Moças brasileiras,<br />

cautela! Seja vosso lema, vosso<br />

estandarte a vossa ban<strong>de</strong>ira, a expressão<br />

latina da virtuosa mulher romana Cornélia<br />

Graccio inscrita no frontispício <strong>de</strong> seu lar:<br />

PROPUDOR. Isto significa que se espera da<br />

mulher compostura, <strong>de</strong>cência, pudicícia,<br />

sensatez, virtu<strong>de</strong> e pureza nos costumes”.<br />

Este texto, evi<strong>de</strong>ntemente editado por<br />

mim, respeitando a i<strong>de</strong>ia original e obe<strong>de</strong>cendo<br />

o espírito do linguajar, foi publicado<br />

na Revista Souza Cruz, em maio <strong>de</strong> 1926,<br />

assinada por Gabriel Ban<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Faria. Eu<br />

recebi <strong>de</strong> presente <strong>de</strong> Natal a coletânea em<br />

edição especial e a tenho lido como um documento<br />

precioso da evolução (ainda que<br />

tímida) das conquistas sociais e do progresso<br />

da socieda<strong>de</strong> nestes anos.<br />

Suprimi, nesta primeira fase, alguns<br />

conceitos datados que po<strong>de</strong>riam, antes da<br />

revelação da ida<strong>de</strong> do texto, suprimir a graça<br />

da coisa. Pois Gabriel Ban<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Faria<br />

cita muitos doutores que garantem que as<br />

danças mo<strong>de</strong>rnas (para a época, claro) são<br />

terríveis para a saú<strong>de</strong> da mulher, trazendo<br />

(sic) “atrasos orgânicos terríveis, inclusive<br />

perturbações circulatórias”.<br />

E mais, comemora à certa altura o tal<br />

Gabriel que felizmente nossos legisladores<br />

“ainda não cometeram a loucura <strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r<br />

o voto às mulheres” e que “enquetes<br />

recentes” mostram que 90% dos homens<br />

entrevistados confessaram que preferiam<br />

jamais casar com suas companheiras <strong>de</strong><br />

danças, pois não há esperanças para as moças<br />

que se enlaçam com homens em público,<br />

causando a si mesmas males físicos e<br />

psicológicos. Este artigo tem menos <strong>de</strong> 100<br />

anos. Evoluímos muito, se observarmos algumas<br />

opiniões <strong>de</strong> nossos contemporâneos?<br />

É só uma pergunta.<br />

Lula Vieira é publicitário, diretor do Grupo Mesa<br />

e da Approach Comunicação, radialista, escritor,<br />

editor e professor<br />

lulavieira@grupomesa.com.br<br />

28 <strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>janeiro</strong> <strong>de</strong> <strong>2019</strong> - jornal propmark

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