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edição de 5 de agosto de 2019

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eyond the line<br />

maxkabakov/iStock<br />

A panaceia<br />

da tecnologia<br />

O importante é sabermos contrabalançar<br />

os dois mundos, o humano e o tecnológico<br />

Alexis Thuller PAgliArini<br />

Mudou a forma <strong>de</strong> reservar o campo <strong>de</strong><br />

futebol do meu condomínio. Des<strong>de</strong> o<br />

upgra<strong>de</strong> <strong>de</strong> “terrão” para grama artificial,<br />

o campo <strong>de</strong> futebol society começou a ser<br />

mais <strong>de</strong>mandado e aí a administração <strong>de</strong>cidiu<br />

estabelecer reservas por intermédio<br />

<strong>de</strong> um app, <strong>de</strong>senvolvido especificamente<br />

para tal. Até aí, tudo bem. É mais mo<strong>de</strong>rno,<br />

coisa e tal...<br />

Acontece que os pela<strong>de</strong>iros estavam<br />

acostumados a chegar <strong>de</strong> manhã à beira<br />

do campo, no domingão, e ver seus nomes<br />

escritos numa prosaica lousa, formando os<br />

dois times. Formou, o jogo começa! Se houver<br />

espera, novos nomes vão sendo inseridos<br />

na lousa, esperando o jogo terminar.<br />

Pois bem, o tal sistema “tecnológico” <strong>de</strong><br />

reserva está dando problema. Ao chegar na<br />

manhã <strong>de</strong> domingo pra jogar, os habituées<br />

do campinho <strong>de</strong>scobriram que uns garotos<br />

reservaram o campo e ninguém po<strong>de</strong> entrar...<br />

Como assim? Cadê os que reservaram?<br />

E está feita a confusão.<br />

Exponho esse singelo exemplo do meu<br />

condomínio para levantar uma questão.<br />

Nem sempre a solução mais “tecnológica”<br />

é a mais a<strong>de</strong>quada para <strong>de</strong>terminadas situações.<br />

Estamos todos nos tornando <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes<br />

da tal tecnologia, <strong>de</strong>sprezando soluções<br />

simples, mas que funcionam.<br />

Quer ver outro exemplo? Eu chego a um<br />

evento e paro no cre<strong>de</strong>nciamento. “Você baixou<br />

o QR co<strong>de</strong> da sua inscrição?” “Acho que<br />

sim, mas não sei on<strong>de</strong> salvei.” “Sinto muito,<br />

mas precisa do QR co<strong>de</strong>”. “O sistema não<br />

mostra uma relação <strong>de</strong> inscritos em or<strong>de</strong>m<br />

alfabética? O meu nome começa com A; você<br />

vai achar rapidinho...”. Dez segundos <strong>de</strong>pois,<br />

eu estava com a minha cre<strong>de</strong>ncial.<br />

Eu sei que é bacana o uso do QR co<strong>de</strong>; é<br />

mo<strong>de</strong>rno (nem tanto) e coisa e tal... Mas,<br />

gente, às vezes o processo analógico funciona<br />

muito bem. E não <strong>de</strong>vemos nos sentir<br />

menos atualizados por usá-lo.<br />

Outro exemplo: estamos num almoço coletivo.<br />

Pedimos a conta, com notas fiscais individuais,<br />

para os acertos na “firma”. O “sistema”<br />

não aceita. Peralá! Quem é esse “sistema”<br />

que está acima da vonta<strong>de</strong> humana? O<br />

que ocorre é que há uma pressão psicológica<br />

para que estejamos sempre up to date com a<br />

tecnologia. Uma simples relação <strong>de</strong> nomes<br />

em or<strong>de</strong>m alfabética para checar inscrições<br />

num evento não é algo mo<strong>de</strong>rno, não é tecnológico.<br />

Mas funciona! E, às vezes, mais rápido<br />

do que o “sistema”.<br />

Não sou resistente às mudanças, muito<br />

menos às soluções inovadoras. Muito ao contrário,<br />

por ser um tiozão, até forço para ser<br />

um early adopter <strong>de</strong> traquitanas tecnológicas.<br />

Só pra me sentir mo<strong>de</strong>rnão (rsrsrs).<br />

Mas, vamos com calma, a tecnologia<br />

não é, necessariamente, a cura para todos<br />

os males. Dia <strong>de</strong>sses ouvi a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong><br />

um dirigente <strong>de</strong> uma das gran<strong>de</strong>s – e boas<br />

– agências brasileiras dizendo-se cansado<br />

<strong>de</strong>ssa busca obstinada pelo novo, pelo tecnológico.<br />

“Às vezes, o tradicional bem feito<br />

é mais eficaz. E tudo bem! Não <strong>de</strong>vemos<br />

nos sentir ‘ultrapassados’ por isso.”<br />

E noto que essa sensação não só minha<br />

e <strong>de</strong> um grupo pequeno <strong>de</strong> tiozões. Ela foi<br />

amplamente <strong>de</strong>batida nas duas últimas<br />

edições do Cannes Lions, contrapondo a<br />

panaceia tecnológica com os valores humanos.<br />

E a conclusão a que se chega é a<br />

que <strong>de</strong>vemos aproveitar, sim, o melhor da<br />

tecnologia, mas sem abandonar o que nos<br />

<strong>de</strong>fine como seres humanos.<br />

Vamos <strong>de</strong>ixar, sim, as Siris e Alexas resolverem<br />

nossas <strong>de</strong>mandas banais, mas<br />

não vamos <strong>de</strong>ixar que elas dominem as<br />

nossas vidas.<br />

A tecnologia <strong>de</strong>ve estar a nosso serviço e<br />

não o contrário. É inevitável que muitas posições<br />

<strong>de</strong> trabalho sejam substituídas por máquinas,<br />

algoritmos e inteligência artificial.<br />

Mas outras posições <strong>de</strong> características mais<br />

humanas serão abertas, em contrapartida.<br />

Talvez a conta seja <strong>de</strong>sfavorável, mas o<br />

importante é sabermos contrabalançar os<br />

dois mundos, o humano e o tecnológico,<br />

com serenida<strong>de</strong> e sem nos submetermos<br />

facilmente ao mais mo<strong>de</strong>rno, simplesmente<br />

por ser mais tecnológico.<br />

Definitivamente, a tecnologia não é a<br />

poção milagrosa que curará todos os males<br />

do mundo. Somos nós, seres humanos, que<br />

po<strong>de</strong>mos fazer isso.<br />

Alexis Thuller Pagliarini é superinten<strong>de</strong>nte<br />

da Fenapro (Fe<strong>de</strong>ração Nacional das Agências<br />

<strong>de</strong> Propaganda)<br />

alexis@fenapro.org.br<br />

22 5 <strong>de</strong> <strong>agosto</strong> <strong>de</strong> <strong>2019</strong> - jornal propmark

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