Facta #2
Revista de Gambiologia #2 Gambiologia magazine - 2nd issue 10/2013 "Acúmulo, ação criativa" / "Accumulation, a creative action"
Revista de Gambiologia #2 Gambiologia magazine - 2nd issue 10/2013 "Acúmulo, ação criativa" / "Accumulation, a creative action"
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parece ser trincheira contra o consumismo
e que propõe questões que vêm desde
Duchamp e passam tanto pela psicanálise
quanto pela política.
No Brasil, já na década de 60, o genial Farnese
de Andrade (1926-1996), mineiro radicado
no Rio, passou a criar obras a partir materiais
descartáveis naturais e industriais que recolhia,
como brinquedos destruídos, estatuetas de
santos, cacos de vidro, conchas, mariscos e
outros rescaldos marinhos. Também utilizava
móveis adquiridos em antiquários,
depósitos, brechós ou mesmo catados na rua.
Fotografias antigas, inclusive de sua própria
família, constituem outro elemento de sua
obra, em que fica evidente o peso simbólico
de peças antigas como elo entre passado,
presente e futuro.
Jac Leirner - "Todos os Cem (Lista de compras)", 1998
Coleção particular. Foto: Eduardo Ortega
Cortesia Galeria Fortes Vilaça
Os processos de realização da paulistana Jac
Leirner também implicam um longo tempo
de coleta de objetos ordinários, normalmente
ligados ao sistema de consumo. Esses objetos,
retirados de seu lugar original e inseridos
no circuito artístico, passam a sugerir
novos significados. Jac pode, atuando como
colecionadora, gastar até quinze anos para
acumular o que acha necessário para uma
obra. Na década de 80, ela realizou uma série
de trabalhos com papel-moeda. Em “Os Cem”
(1987), valeu-se de notas de 100 cruzeiros.
As cédulas foram furadas, presas em longas
tiras e espalhadas pelo chão. Já em “Corpus
Deliciti” (1985-1993), a artista reuniu objetos
que, digamos, pegou à revelia de consentimento
em aviões de carreira, como cinzeiros,
copos, cobertores e outros.
De Sara Ramo já se disse que “se apropria de
elementos e cenas do cotidiano, deslocando-as
de seus lugares de origem e rearranjando-os
em vídeos, fotografias, colagens, esculturas
e instalações. Ramo investiga o momento
em que os objetos param de fazer sentido na
vida das pessoas para criar situações em que
a calma e a ordem se perdem”. Dentre muitos
exemplos da forma intrigante e sensível com
que Sara lida com esses objetos em sua obra,
estão a instalação “Jardim das Coisas do
Sótão” (2004) e o vídeo “Traslado” (2008),
em que a própria artista encena o esvaziamento
de uma mala contendo um número de
“tranqueiras” que parece nunca acabar. A artista
parece nos provocar: o quê e quanto nos
interessa guardar de cada mudança na vida?
A acumulação e reorganização de coisas também
está na base do trabalho de Márcia X (1959-
2005), com temas (ou obsessões?) muito
bem delineados. Utilizando objetos eróticos,
brinquedos infantis e ícones religiosos – grande
parte deles garimpada na tradicional feira do
Troca-Troca, na Praça XV, no Rio de Janeiro –
suas performances e instalações eram marcadas
pela relação sexo/infância, em que objetos pornográficos
são transformados em brinquedos infantis
e estes, em objetos eróticos. O movimento,
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