Facta #2
Revista de Gambiologia #2 Gambiologia magazine - 2nd issue 10/2013 "Acúmulo, ação criativa" / "Accumulation, a creative action"
Revista de Gambiologia #2 Gambiologia magazine - 2nd issue 10/2013 "Acúmulo, ação criativa" / "Accumulation, a creative action"
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por Fred Paulino
"É o estilo de época de uma época sem estilo".
(Laura Erber)
que acontece no instante exato da
morte? Dentre as mais variadas
interpretações de cunho científico,
religioso ou esotérico para essa
questão que inexoravelmente nos acompanha,
uma me parece a mais singular: há quem
acredite que o homem reveja flashes da
própria vida, em altíssima velocidade e
cronologia inversa. Como um rewind de nossa
história completa, é a chamada “experiência
de quase-morte”. Segundo essa suposição,
precisamente no evento mais único, inexplicável
e extremo da existência, a vida parece
contradizer-se: são de repente invertidas
as lógicas da experiência, do envelhecimento,
da maturidade, do tempo, para voltarmos ao
que éramos no início. Um retorno solitário e
derradeiro à nossa origem mais pessoal.
O
De forma semelhante, esta publicação, que em
seu primeiro número abordou o Apocalipse
– óbito eminente do universo – e se autodeclarou
como “nascida já morta”, agora
volta seus olhos ao passado. Seguindo nossa
proposta de abordar, de forma livre e com a
participação de uma rede de colaboradores,
temas amplos que relacionam-se de formas
distintas com a ideia de Gambiologia, desta
vez abordaremos as práticas de acumulação e
colecionismo: formas do homem relacionar-se
com o tempo a partir da aquisição e guarda
de objetos materiais.
Definitivamente não apresentaremos esses
temas a partir da amostragem de personagens
exóticos com a mania de guardar objetos.
O que esta edição da Facta investiga é como o
hábito de acumular parece estar se tornando,
no mundo contemporâneo, cada vez mais
comum. E mais: de que forma antiguidades,
velharias, refugos descartados, objetos
supostamente sem perspectiva de vida-apósa-morte
têm sido matéria prima e inspiração
valiosas para a criação de obras de arte e peças
de design.
t
A relação do cidadão contemporâneo com o
tempo soa confusa. Somos obrigados, hoje, a
imprimir ao nosso cotidiano um ritmo mais
acelerado que o humanamente razoável.
O presente passa tão rápido, que é improvável
não confundi-lo com memórias do passado e
planos para o futuro.
Já em 1967, Guy Debord 1 anunciava o que
chamou de “tempo cíclico”. Segundo ele,
há uma relação inseparável entre a “história
humana” e a “história natural”. A segunda
só existiria efetivamente na medida em que
fosse compreendida pela primeira: “a temporealização
do homem, tal como ela se efetua
pela mediação de uma sociedade, é igual a
1 " A Sociedade do Espetáculo", 1967.
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